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Coco Chanel e a construção da figura feminina Um estudo sobre a transição entre a La Belle Époque e a moda do século XX

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Academic year: 2021

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5 2° CICLO DE ESTUDOS EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

ÁREA DE ESPECIALIZAÇÃO EM ESTUDOS DE MÉDIA E JORNALISMO

Coco Chanel e a construção da figura

feminina

Um estudo sobre a transição entre a La Belle

Époque e a moda do século XX

Luiza Victoria Trápaga

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Luiza Victoria Trápaga

Coco Chanel e a construção da figura

feminina

Um estudo sobre a transição entre a La

Belle Époque e a moda do século XX

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Ciências da Comunicação, orientada pelo Professor Doutor António Machuco Rosa

Faculdade de Letras da Universidade do Porto

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Luiza Victoria Trápaga

Coco Chanel e a construção da figura

feminina

Um estudo sobre a transição entre a La

Belle Époque e a moda do século XX

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Ciências da Comunicação, orientada pelo Professor Doutor António Machuco Rosa

Membros do Júri

Professor Doutor António Machuco Rosa Faculdade de Letras – Universidade do Porto

Professor Doutor José Bragança de Miranda

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Universidade Nova de Lisboa

Professor Doutor (escreva o nome do/a Professor/a)

Faculdade (nome da faculdade) - Universidade (nome da universidade)

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“Clothes aren't going to change the world. The women who wear them will.”

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Sumário

Declaração de honra ... 8 Agradecimentos ... 9 Resumo ... 10 Abstract ... 11 Índice de ilustrações ... 12 Introdução ... 13 Metodologias ... 16 2. Coco Chanel ... 18 2.1. Gabrielle Chanel ... 19

2.2 Chanel conquista Paris ... 25

2.2.1 Chanel Modes ... 28

2.3 Primeira Guerra Mundial ... 31

2.3.1 Consolidação do nome, marca e personagem... 33

3. A construção da figura feminina na moda ... 36

3.1 Desenredando a moda ... 36

3.1.1 Gostos e modernidades ... 37

3.1.2 Imitação e afirmação ... 40

3.1.3 Novidades e tendências ... 42

3.2 Evolução da figura feminina na moda ... 44

3.2.1 Moda na Antiguidade ... 45

3.2.2 Idade Média ... 48

3.2.3 Transição entre a Renascença e a Idade Moderna ... 50

3.2.4 A modernidade e o fenômeno dos ícones de estilo ... 52

3.2.5 Idade Contemporânea ... 56

4. Construindo o cenário ... 64

4.1 La Belle Époque ... 65

4.2 Último suspiro antes da guerra ... 66

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4.3.1 Mudanças no papel feminino ... 70

5. A relevância de Chanel ... 75

5.1 O abandono do espartilho ... 77

5.2 A estética Chanel ... 86

5.2.1 Corpos magros ... 87

5.2.2 Dandismo x Cultura das celebridades ... 88

5.2.3 Estética masculina ... 89

5.2.4 Tempos de guerra: traços militares e sobriedade ... 92

5.2.5 O protagonismo do jérsei ... 95

6. Libertação x um novo molde ... 98

Conclusão ... 103

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Declaração de honra

Declaro que a presente dissertação é de minha autoria e não foi utilizada previamente noutro curso ou unidade curricular, desta ou de outra instituição. As referências a outros autores (afirmações, ideias, pensamentos) respeitam escrupulosamente as regras da atribuição, e encontram-se devidamente indicadas no texto e nas referências bibliográficas, de acordo com as normas de referenciação. Tenho consciência de que a prática de plágio e auto-plágio constitui um ilícito académico.

Porto, 15 de setembro Luiza Victória Trápaga

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Agradecimentos

A conclusão de uma dissertação, assim como qualquer outra conquista, nunca é alcançada sem uma base de apoio e inspiração. Por isso, não posso deixar de agradecer por todos os personagens essenciais na minha trajetória. Primeiramente, gostaria de agradecer ao meu orientador, Professor Doutor António Machuco Rosa, por acreditar no meu projeto e somar demasiado conhecimento sobre os assuntos abordados no projeto. Esse apoio foi fundamental para a minha inspiração e reflexão ao longo de todo o processo.

Também registro minha gratidão aos amigos e familiares que estiveram ao meu lado com palavras de apoio – pessoalmente ou de coração, do norte de Portugal ao sul do Brasil. Eu tenho muita sorte por ter todos vocês. Entre esses, deixo um agradecimento especial ao meu pai do coração, Sérgio, por ter sempre me apoiado a expandir meus conhecimentos e explorar o mundo. Nunca vou poder agradecer o suficiente por acreditar em mim.

Por fim, é impossível não separar um parágrafo inteiro para agradecer à pessoa mais importante da minha vida: mãe, você é a minha maior inspiração como pessoa, mulher e profissional. Obrigada por ter sido tão forte ao longo de todos esses anos. Eu não mudaria uma vírgula em tudo o que nós vivemos e conquistamos juntas. Se eu cheguei tão longe, é por todo o teu trabalho, apoio e amor.

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Resumo

Esta dissertação busca realizar um estudo sobre a influência da estilista Coco Chanel na construção da figura feminina no início do século XX. A partir da execução de uma pesquisa bibliográfica, o objetivo do trabalho é avaliar a relevância da estilista francesa para a mudança de estilo e comportamento das mulheres da sua época. Para isso, o capítulo inicial da tese realiza uma apresentação sobre a figura emblemática de Coco Chanel. No segundo capítulo, segue uma análise dos conceitos e da trajetória histórica da indumentária. Logo após, o contexto da atuação de Chanel é apresentado a partir da transição entre o requinte da La Belle Époque e o estilo simplista e prático exigido pela Primeira Guerra Mundial. Nesse cenário, a influência de Coco Chanel é analisada através de momentos históricos significativos relacionados com os dados das obras pesquisadas. Para isso, o capítulo quatro apresenta a estética de Chanel e os principais fatores que influenciaram na construção da “mulher Chanel”. A partir da análise, surge um capítulo direcionado para a análise sobre a linha tênue entre a “libertação” proposta por Chanel a imposição de um novo padrão estético. Por fim, utilizando todos os tópicos analisados ao longo dos capítulos anteriores, a conclusão busca responder qual foi a dimensão da influência de Coco Chanel na construção da figura da mulher do século XX.

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Abstract

The main aim of this dissertation is to study the influence of the fashion designer Coco Chanel in the construction of the feminine figure in the beginning of the 20th century. Based on a bibliographic research, the focus of the study is the analysis of the relevance of Chanel for the change in the style and behavior of the women of her time. For this, the first chapter examines the life and work of the iconic figure of Coco Chanel. In the second chapter, there is an analysis of the concept and historical trajectory of clothing. In this scenario, the influence of Coco Chanel is analyzed through significant historical moments related to the data of the researched works. For this, chapter four presents Chanel's aesthetics and the main factors that influenced the construction of the “Chanel woman”. From the analysis, a chapter is born for the analysis of the fine line between the “liberation” proposed by Chanel and the imposition of a new aesthetic standard. Finally, using all the topics analyzed throughout the previous chapters, the conclusion seeks to answer what was the extent of Coco Chanel's influence in the construction of the figure of the 20th century woman.

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Índice de ilustrações

Figura 1 - Retrato de Gabrielle Chanel em 1910 __________________________________ 19 Figura 2 - Coco Chanel cavalgando com as mesmas roupas destinadas aos homens da época __________________________________________________ Erro! Indicador não definido. Figura 3 - Gabrielle Chanel utilizando roupas tradicionalmente utilizadas apenas por

homens. __________________________________________________________________ 27 Figura 4 - Atriz Gabrielle Dorziat com um figurino composto por chapéu de Chanel e vestes de Jacques Doucet para Le Diable Ermite, 1913 __________________________________ 30 Figura 5 - Peplos, vestimenta feminina oficial na Grécia Antiga. _____________________ 47 Figura 6 - Ilustração contendo a vestimenta feminina clássica durante a Idade Média. ___ 49 Figura 7 - Retrato da Rainha Elizabeth I da Inglaterra (1533-1603) __________________ 53 Figura 8 - Retrato da Rainha Maria Antonieta, "Marie Antoinette de France" (Jean-Baptiste Gautier Dagoty, 1775) ______________________________________________________ 56 Figura 9 - Ilustração da silhueta feminina em "S", popularizada durante a Era Vitoriana. _ 59 Figura 10 - Ilustração dos trajes femininos propostos pela ativista norte-americana Amelia Bloomer (1818-1894) _______________________________________________________ 61 Figura 11 - Mulheres atuando nas indústrias durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). ___________________________________________________________________ 70 Figura 12 - Quadro Nascita di Venere, Sandro Botticelli (1485). _____________________ 78 Figura 13 - Anúncio de um "espartilho saudável", supostamente menos nocivo para a saúde da mulher. ________________________________________________________________ 80 Figura 14 - Comparação radiográfica publicada por Ludovic O'Followell entre um tronco feminino normal e a mudança estrutural dos ossos sob a compressão de um espartilho. ___ 81 Figura 15 – Criações de Paul Poiret, 1908. Ilustradas por Paul Iribe._________________ 83 Figura 16 - Croquis de Coco Chanel apresentando túnicas com cintos e saias de jérsei. __ 85 Figura 17 - Coco Chanel durante uma tarde em polo, acompanhada de Etienne Balsan, por volta de 1910. _____________________________________________________________ 90 Figura 18 - Mulheres na década de 1920, utilizando modelos de tailleurs, popularizados por Chanel. __________________________________________________________________ 94 Figura 19 - Gabrielle “Coco” Chanel vestindo uma de suas criações em jérsei na década de 1920. ____________________________________________________________________ 97

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Introdução

Em seus princípios, a indumentária surgiu com a finalidade exclusiva de proteger o corpo. No decorrer da trajetória humana, as roupas ganharam um papel cultural, refletindo questões sociais, econômicas e políticas de cada povo. Durante esse processo, também influenciadas por essas mesmas questões, as vestimentas femininas e masculinas gradualmente passaram a se diferenciar. Por fim, com a chegada da modernidade, a moda transformou-se em um sistema muito mais complexo do que o simples ato de se vestir.

No mundo moderno, a importância da indumentária alcançou níveis imensuráveis. A roupa ganhou papel de mensagem, protesto, identificação, pertencimento, diferenciação, entre tantos outros. Moda virou política, economia e cultura. Por todos esses significados e implicações, falar sobre moda não é uma tarefa simples.

Neste trabalho, a abordagem principal é o papel milenar da moda como fabricante dos padrões estéticos da figura humana. De acordo com Assunção (2015): “ao longo da história, o corpo é torcido, esticado, alargado, puxado e deformado, em função do tipo de revestimento e de estruturação que a roupa lhe oferece, transformando e modelando as aparências, em um misto de prazer e tirania.” (Assunção, 2015, p. 37).

Para a mulher, a moda expressa de forma ainda mais explícita a contradição entre prazer e tirania apontada por Assunção (2015). Com seus ornamentos, cores e texturas, as roupas se transformaram em objeto de desejo, ferramenta de expressão e vitrine de personalidades. Para muitas mulheres, acompanhar a efemeridade das roupas virou uma paixão e construir estilos se transformou em uma forma de lazer.

No entanto, para outra parcela considerável do público feminino, moda é sinônimo de opressão: ela conquistou uma relação direta com a beleza e a sexualidade, moldando o corpo feminino de acordo com o padrão estético valorizado por cada época. Ao longo da história humana, inúmeras gerações de mulheres fizeram uso de artifícios para se transformarem em exemplares do considerado “belo”.

A partir da ambição em estudar a relação complexa entre a roupa e a silhueta feminina, a pesquisa buscou um objeto de estudo capaz de representar essa temática de forma competente. Após a observação da linha do tempo relativa à história da moda feminina, o início do século XX foi escolhido como período de análise devido a um ponto interessante e inédito no âmbito da indumentária feminina: sua transformação estética está acompanhada de uma mudança significativa no papel da mulher dentro da sociedade.

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Após séculos de uma atribuição exclusiva fixada à mulher como mãe e dona de casa, a indumentária feminina refletiu um novo posicionamento da mulher na organização da sociedade. Em meio a esse contexto, a estilista Gabrielle “Coco” Chanel (1883-1971) ganha protagonismo por seu destaque no cenário das transformações transcorridas neste exato momento histórico.

Reunindo esses fatores e os objetivos citados anteriormente, a pesquisa busca questionar a dimensão da influência de Coco Chanel na construção da figura feminina do século XX. Para uma análise fundamentada do tema em questão, a pesquisa é dividida em cinco capítulos. Na primeira parte do estudo, a personagem Gabrielle “Coco” Chanel é apresentada a partir de parte da sua trajetória. Durante o capítulo de abertura, são destacados pontos e eventos considerados relevantes para a formação pessoal e profissional da estilista, com o foco principal para o período entre o seu nascimento e a Primeira Guerra Mundial.

Para isso, o capítulo aborda essa trajetória de forma cronológica: o cenário conturbado da infância e adolescência de Chanel; os primeiros contatos com a alta sociedade e a moda; os relacionamentos amorosos relevantes para a sua história; a chegada e fixação em Paris; o início da carreira como estilista; a criação da marca Chanel; e a ascensão do estilo singular da estilista. Por fim, o capítulo é finalizado abordando a relevância da Primeira Guerra Mundial como um momento de consagração do “estilo Chanel” dentro da indumentária feminina.

No capítulo seguinte, denominado “A construção da figura feminina na moda”, o estudo tem como foco a construção da figura feminina dentro da moda. Como ponto de partida, um espaço é dedicado para uma melhor compreensão do que é a moda e dos fatores que ocasionaram a evolução do simples ato de se vestir até a consolidação da moda como sistema. Para isso, o capítulo também aborda a trajetória da indumentária feminina entre a Antiguidade e o século XX. Por se tratar de uma história extensa e complexa, a abordagem é realizada através da seleção de alguns eventos que se mostraram especialmente relevantes para as transformações da figura feminina.

Posteriormente, o capítulo “Construindo o cenário” tem como objetivo principal a contextualização do cenário que ambientou a mudança na figura feminina entre o período da La Belle Époque e a Primeira Guerra Mundial. Para isso, o estudo apresenta a virada do século XX e os seus primeiros anos em meio à emblemática La Belle Époque francesa. Em complemento, um subcapítulo é dedicado para apresentar a transição contrastante entre o glamour do início do século e o clima de incertezas precedente ao período de guerra.

Ainda no desenvolvimento do capítulo, o cenário da Primeira Guerra Mundial é destacado. Buscando a contextualização mais relevante para a pesquisa vigente, o foco dessa

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abordagem são as implicações do conflito bélico na vida em sociedade, principalmente na realidade feminina. Nesta questão, um subcapítulo é dedicado para destacar os efeitos da Primeira Guerra Mundial na mudança do papel feminino nos âmbitos pessoal, profissional e social.

Em um novo capítulo, denominado “A relevância de Chanel”, todo o embasamento criado ao longo do estudo é essencial para a abordagem sobre a relevância de Coco Chanel no contexto da transição entre o padrão estético feminino da La Belle Époque e a “nova mulher” construída durante a Primeira Guerra Mundial.

Para o início do desenvolvimento, o espartilho é escolhido como uma peça representativa dessa transição. No início do século XX, o espartilho já estava consagrado há séculos como uma peça obrigatória do guarda-roupas feminino - com o seu uso iniciado ainda durante a infância e continuado até o fim da vida. Ao comprimir o tronco feminino, o espartilho era utilizado para afinar a cintura e levantar os seios, ocasionando um formato curvilíneo que foi ideal de beleza ao longo de muitos séculos. Nesse contexto, são abordados os efeitos do espartilho na estrutura corporal feminina, o seu simbolismo e os eventos que marcaram o início da abdicação da peça entre as mulheres. Nesse momento, Coco Chanel é citada como uma das figuras mais expressivas no movimento para o abandono do espartilho.

Na sequência, a estética de Chanel é abordada para explicar a silhueta criada pela estilista - a qual viria a se consolidar como a “mulher Chanel”. Para essa compreensão, são apontados fatores fundamentais na construção desse novo estilo: o destaque para a magreza; a influência da indumentária masculina; os traços do dandismo e os princípios da cultura das celebridades; as referências militares e a sobriedade dos tempos de guerra; e o olhar visionário sobre o jérsei.

Por fim, através do capítulo “Libertação x um novo molde”, a pesquisa destaca alguns pontos controversos dentro da transformação da silhueta feminina proposta por Chanel. Em frente à rigidez do espartilho, a adoção de roupas mais confortáveis e menos marcantes sugere uma ideia evidente de libertação promovida pela estilista. Contudo, a “mulher Chanel” também surge acompanhada de um padrão estético claro, regido pela valorização da magreza e outros aspectos físicos. Com isso, é possível qualificar a atuação de Chanel verdadeiramente como libertadora?

Nas considerações finais, a questão inicial é retomada e respondida de acordo com as reflexões ocasionadas pelo estudo. Por fim, são apresentadas propostas de algumas questões interessantes originadas ao longo da pesquisa, buscando abrir caminhos para estudos futuros e estimular a produção de outros pesquisadores.

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Metodologias

Com o objetivo de realizar uma análise aprofundada de questões culturais envolvendo a moda e a vida em sociedade, a pesquisa será desenvolvida através de uma abordagem qualitativa. De acordo com Triviños (1987), anteriormente à sua aplicação na investigação acadêmica, “(...) a pesquisa qualitativa tem suas raízes nas práticas desenvolvidas pelos antropólogos, primeiro e, em seguida, pelos sociólogos em seus estudos sobre a vida em comunidades.” (Triviños, 1987, p. 120).

Através dessa abordagem com enfoque qualitativo, a dissertação será realizada por meio do método dialético. Segundo Gil (2010), “a dialética fornece as bases para uma interpretação dinâmica e totalizante da realidade, já que estabelece que os fatos sociais não podem ser entendidos quando considerados isoladamente, abstraídos de suas influências políticas, econômicas, culturais etc.” (Gil, 2010, p. 33). Por essa qualidade plural, o método foi entendido como a forma mais adequada de relacionar os temas do estudo.

Em complemento aos métodos citados, buscando a criação de um embasamento qualificado para a análise determinada pelo estudo, será realizada uma pesquisa bibliográfica dentro dos temas propostos. Também de acordo com Gil (2010), “a pesquisa bibliográfica é elaborada com base em material já publicado. Tradicionalmente, esta modalidade de pesquisa inclui material impresso como livros, revistas, jornais, teses, dissertações e anais de eventos científicos” (Gil, 2010, p. 29).

Para isso, foram escolhidos autores relevantes para cada área trabalhada. Sobre Coco Chanel, as obras Coco Chanel: An Intimate Life (2011), de Lisa Chaney e Mademoiselle: Coco Chanel and the Pulse of History (2014), de Rhonda Garelick, destacam a trajetória da estilista de forma competente e eficaz. Em complemento, os relatos de Chanel a Paul Morand no livro The Allure of Chanel (1976) também são extremamente relevantes para a legitimidade dos fatos apresentados.

Em relação à moda e suas complexas questões, diversas obras são pertinentes. Devido ao destaque do estudo para a relação entre moda e sociedade, duas das publicações fundamentais são: O Império do Efêmero (1987), de Gilles Lipovetsky, e Moda: Uma Filosofia (2010), de Lars Svendsen. Já no contexto da trajetória da indumentária, Rebecca Rissman apresenta essa linha do tempo de forma extremamente competente no livro A History of Fashion (2015).

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Especificamente sobre a indumentária feminina, destacam-se obras como Adorned in Dreams: Fashion and Modernity (1985), de Elizabeth Wilson, e Tudo Sobre Moda (2013), de Marnie Fogg. Somando de forma enriquecedora para o tema, o livro Moda e feminismos em Portugal: O género como espartilho (2017), da portuguesa Cristina Duarte, também se mostra indispensável.

As obras apresentadas são apenas alguns títulos da bibliografia essencial para a elaboração deste estudo. Além dos livros publicados, artigos acadêmicos e reportagens jornalísticas também são utilizados ao longo da pesquisa para a criação de um conteúdo fundamentado e verossímil. Em complemento, com função ilustrativa, imagens adicionam qualidade estética para o conteúdo, buscando promover maior dinamismo ao estudo e um entendimento mais claro para o leitor.

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2. Coco Chanel

Entre tantos personagens marcantes ao longo da história, o que transforma uma pessoa em um ícone? Existe uma forma legítima de mensurar a relevância de um único indivíduo sobre uma sociedade inteira? Essas questões podem gerar desacordos e discussões complexas, mas é inevitável apontar que algumas figuras deixaram marcas incontestáveis na história. Entre elas, Coco Chanel é ao mesmo tempo personagem, empresa e referência sociocultural. Ultrapassando as paredes imaginárias da indústria da moda, o sobrenome Chanel deixou sua marca em vários âmbitos da sociedade.

Para compreender essa relevância, julga-se necessário estudar diversos aspectos que influenciaram a construção da figura emblemática de Gabrielle “Coco” Chanel. Neste primeiro capítulo, o estudo é iniciado através de uma análise aprofundada da trajetória de vida da estilista, com destaque para os eventos mais significativos em sua história. Como ponto de partida, as origens de Chanel são apresentadas a partir de uma infância e adolescência marcadas por infortúnios e solidão. Posteriormente, a maioridade é um momento determinante para os contatos iniciais com a vida em sociedade e o meio artístico, assim como o envolvimento com Etienne Balsan - acompanhado pela introdução ao estilo vida da alta sociedade.

Nesse momento, o capítulo destaca os primeiros passos de Chanel dentro do universo da moda, através do seu estilo singular e instigante. Paralelamente, a aproximação com Arthur Capel surge como um ponto relevante, especialmente por ter ocasionado a transição da jovem para Paris. Em seguida, o subcapítulo “Chanel Modes” apresenta a abertura da primeira loja oficial da estilista, o começo das suas criações originais e o registro do início da ascensão de Chanel no contexto da alta sociedade francesa.

O estilo de Chanel faz parte da sua essência, visível mesmo antes da consolidação profissional e do status de celebridade. Contudo, na ausência do conhecimento técnico e teórico sobre costura e moda, esse estilo ainda se apresentava de forma muito abstrata e informal durante a juventude da estilista. Foi apenas durante a primeira década de Chanel em Paris que ela assumiu o título de couturière e aprendeu sobre cultura, arte e política - conhecimentos essenciais para o seu empoderamento como mulher e profissional.

Por fim, o capítulo aborda a atuação visionária de Chanel em frente ao cenário adverso da Primeira Guerra Mundial. Contrariando as contrariedades do cenário social e econômico, o conflito bélico é apresentado como um momento determinante para a disseminação do nome e estilo Chanel.

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2.1. Gabrielle Chanel

Figura 1 - Retrato de Gabrielle Chanel em 1910.

A história que viria a moldar a vida de Gabrielle “Coco” Chanel (1913-1980) iniciou-se muito antes de iniciou-seu nascimento. Numa França predominantemente rural da primeira década do século XIX, Henri-Albert Chanel nasceu em Nîmes, na região da Occitânia. Filho dos vendedores ambulantes Henri-Adrien e Angélina, Albert originou-se em meio à vida nômade e aderiu à profissão dos pais ainda na adolescência.

Aos 26 anos, no percurso de uma das suas principais rotas de vendas, Chanel chegou à vila de Courpière, onde conheceu a jovem Eugénie Jeanne Devolle, no auge dos seus 16 anos. Com fama de galanteador e muito talento com o público feminino, Albert conquistou Jeanne em pouco tempo. Três meses depois, o vendedor ambulante deixou a cidade em busca do próximo destino - e a tradicional família de Jeanne Devolle se deparou com uma gravidez inesperada.

Sucumbindo à pressão familiar, Jeanne descobriu o paradeiro de Albert Chanel e atravessou o país em busca do pai do seu filho. Contudo, iniciar uma família não estava nos planos de vida do vendedor. Dessa forma, Albert Chanel reconheceu a paternidade, mas recusou a proposta de casamento, convidando Jeanne para seguir como sua companheira ao longo da vida nômade. Apesar da reprovação familiar, a jovem aceitou a proposta, iniciando uma trajetória sem roteiros ao lado de Albert por toda a extensão do país. Aos 17 anos, Jeanne deu à luz a sua primeira filha, Julia-Berthe Chanel.

Mesmo após o nascimento da primogênita, Albert não mudou seu estilo de vida. Com viagens constantes, envolvimento com diversas mulheres e longos períodos de ausência, a

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relação de Jeanne e Albert nunca se tornou sólida. Poucos anos depois, em 1883, Jeanne descobriu uma segunda gravidez. Em 18 de agosto, em meio ao verão francês, Gabrielle Bonheur Chanel nasceu na comuna de Saumur, no noroeste da França.

Após o nascimento de uma segunda criança, a pressão familiar foi decisiva para uma mudança na vida do casal. Em 1884, Albert aceitou uma oferta de cinco mil francos para largar a vida nômade, casar com Jeanne e se estabelecer como vendedor no mercado de Issoire, à beira do Rio Couze. Contudo, o casamento forçado e a proibição de viajar transformaram Albert em um homem nitidamente perturbado. Em consequência do descontrole emocional, ele gastou todo o dinheiro recebido com o vício em bebida. De forma inevitável, sua relação com Jeanne piorou gradativamente.

No decorrer dos dois anos seguintes, Jeanne deu à luz a mais duas crianças: Alphonse e Antoinette. Em busca de ajuda e condições mais favoráveis para as crianças, Jeanne convenceu Albert a retornar para perto da família na vila de Courpière, mas logo os desentendimentos familiares levaram Albert de volta à estrada. Inicialmente, Jeanne e as crianças Chanel ficaram para trás. Contudo, em poucos meses, a jovem deixou os filhos e voltou seguir Albert pelo país, retornando ocasionalmente à Courpière para encontrar as crianças.

Com um começo de vida conturbado, Gabrielle Chanel cresceu com raiva e muita imaginação. Como forma de lidar com a realidade, a jovem criava cenários alternativos em universos de fantasia. Em meio ao conservadorismo da época, a forma singular de Gabrielle se comportar a transformou na “ovelha negra” da família logo em seus primeiros anos de vida. Anos mais tarde, ficaria visível o quanto a inconstância, solidão e opressão familiar durante a infância agiram como fatores definidores para a construção da mulher sóbria e retraída que Chanel viria a se tornar.

Em 1895, aos 11 anos de idade, Gabrielle perdeu a mãe para a tuberculose. Com a ausência do pai e a rejeição do restante da família, a jovem e suas irmãs foram encaminhadas para o orfanato do convento Aubazine, no centro da França. Por muito tempo, a própria Chanel escondeu a obscuridade desse período da sua trajetória, criando histórias para acobertar o abandono e a rejeição familiar que sofreu. Contudo, a realidade foi dura e incontestável: com a morte da mãe e a negligência do pai, Gabrielle, Julia-Berthe e Antoinette se transformaram em órfãs sob o cuidado das rígidas freiras do convento Aubazine.

While we catch only glimpses of these crucial formative years, over time Gabrielle found ways to tell her story. She described repeatedly, for example, a profound antipathy for a group of women she called her “aunts.” Unpicking the web of

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misinformation she wove around herself, one sees that these “aunts” were not one but two sets of women. They were a conflation of her real aunts and the sisters of Aubazine. Together they took the brunt of Gabrielle’s youthful resentment, the memory of which still rankled more than half a century later. Above all, she believed that for her “aunts”—her family and the nuns—“Love was a luxury and childhood a sin.”15 Surrounded as she was by unloving authority figures, Gabrielle’s early experience was one of disharmony, repression and neglect. (Chaney, 2011, p. 50)

Após a infância sofrida, a morte da mãe, o abandono do pai e a rejeição da família, o ressentimento de Gabrielle com a realidade foi inevitável. Todas a frustrações da jovem se transformaram em raiva e hostilidade, resultando em uma adolescência conturbada entre as paredes do convento. Contudo, apesar da fraqueza da educação, rigidez excessiva e o isolamento promovido por Aubazine, foi sob a disciplina das freiras que Gabrielle aprendeu a arte da costura (Garelick, 2014, p. 59).

Assim como todas as jovens que habitavam o orfanato, Gabrielle precisou deixar Aubazine ao completar 18 anos - quando Chanel foi transferida para o convento de Notre Dame, na cidade de Moulins. No local, a jovem encontrou Adrienne, irmã de seu pai, mas apenas dois anos mais velha do que ela. Com uma natureza alegre e calorosa, Adrienne foi a primeira pessoa a fazer Gabrielle sentir afeto e aceitação. Em meio ao isolamento proporcionado pelo convento, as duas partilhavam a mesma vontade de melhorar de vida e cultivaram uma amizade que duraria para a vida inteira.

Também nesse período, Gabrielle conheceu a irmã mais velha de Adrienne, Louise. Apaixonada por chapéus, Louise foi a responsável pelo primeiro contato de Gabrielle com a moda. Junto com Adrienne, utilizando o conhecimento de costura adquirido em Aubazine, Gabrielle viu a oportunidade de escapar das paredes do convento ao conseguir um emprego de assistente em um armarinho no centro de Moulins.

Na cidade, a jovem passou dois anos trabalhando na loja House of Grampayre, aperfeiçoando seu conhecimento em costura (Madsen, 1990, p. 24). Foi também durante esse período, através de um primeiro contato com a vida em sociedade e o conceito de lazer, que Chanel decidiu ser artista. Aos 21 anos, cansada dos seus rígidos empregadores, a jovem resolveu deixar para trás a vida monótona e começar a se apresentar em cabarés.

Foi nesse momento, ao lado de Adrienne, que Gabrielle Bonheur Chanel se transformou pela primeira vez em “Coco” Chanel. Durante as apresentações de cabaré, duas das músicas mais frequentes no repertório das jovens eram “Ko-ko-ki-ko” e “Qui qu’a vu Coco”. Ambas as canções, com refrões semelhantes e grande repetição da expressão “coco”, viraram favoritas

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dos oficiais que frequentavam o local - os quais designaram o apelido oficial de Coco para a bela e carismática Gabrielle:

While Gabrielle can’t have had much of a voice, by some accounts this is when she acquired the sobriquet by which the world came to know her. One of the songs she is supposed to have sung to greatest effect was a verse from a popular caf’conc revue called Ko Ko Ri Ko. Another was “Qui qu’a vu Coco dans l’Trocadéro?” (“Who’s Seen Coco at the Trocadéro?”). She was game, with a quick sense of humor, and character was what the cabarets wanted above all. Her admirers were noisy in their approval. For an encore, they simply chanted the word found in both her songs: “Coco! Coco! Coco! And at La Rotonde she was soon La Petite Coco. (Chaney, 2011, p. 41)

Devido à falta de aptidão, a carreira artística de Gabrielle não perdurou. Entretanto, o tempo no cabaré permitiu a oportunidade para a jovem conhecer Étienne Balsan, figura que viria a ter um papel importante para o início da carreira de Chanel na indústria da moda. De família rica, o jovem fazia parte do 10º Regimento de Cavalaria e era frequentador assíduo do cabaré. O envolvimento entre soldados e as jovens artistas de cabarés era comum, mas eles não costumavam durar mais do que algumas noites. De forma surpreendente, o interesse de Balsan por Chanel foi além do interesse sexual e não demorou muito para os dois iniciarem um relacionamento.

Apesar da riqueza e de uma carreira militar de sucesso, o sonho de Étienne sempre foi criar cavalos puro-sangue (Chaney, 2011, p. 63). Foi a partir desse desejo que o jovem adquiriu o território do Château de Royallieu, ao norte da França. Para a surpresa do círculo social que o rodeava, Balsan convidou Chanel para residir em sua casa. Dessa forma, no auge dos seus 23 anos, Coco Chanel tornou-se oficialmente uma “concubina”. Com uma infância pobre, adolescência em um convento e juventude em um cabaré, morar com um homem fora do casamento foi o ponto final para qualquer possibilidade de uma reputação dentro da sociedade da época.

Muitos anos depois, a própria Chanel afirmou que nunca amou Balsan (Morand, 1976). Entretanto, foi em Royallieu que ela teve o primeiro gosto do estilo de vida da alta sociedade francesa. Pela primeira vez em uma trajetória repleta de pobreza e repressão, ela vivenciou o prazer da vida boêmia e o luxo de tecidos finos e pedras preciosas. Esse período também foi uma experiência importante de observação: Chanel aprendeu como a alta sociedade se comportava, seus gostos, interesses e a estrutura hierárquica que regia aquele grupo de pessoas em suas atividades diárias.

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Mesmo sentindo-se inadequada em muitos momentos - com um visual muito diferente das concubinas da época - ela usou sua inteligência e perspicácia para se encaixar em um mundo tão diferente e ao mesmo tempo fascinante. No entanto, entre as rodas de conversa, passeios com Étienne e noites regadas à riqueza, Chanel sentia falta de uma ocupação produtiva. Foi nesse momento, explorando seu talento na customização de chapéus, que Coco Chanel deu o primeiro passo dentro do universo da moda.

Em um contexto social movido pela aparência e novidade, não demorou muito tempo para as mulheres da sociedade local tomassem interesse pelos chapéus diferenciados que a jovem exibia. Assim, aos 23 anos, como um hobby, Chanel distribuiu as primeiras criações com a sua assinatura.

The hats were a sensation, not least because they fit a woman’s head. Coco had always worn her own hats low on her forehead, to keep them on in the wind, she said. But most ladies’ hats at this time simply balanced atop their heads like plates, held on with pins and veils—a custom Chanel found absurd and impractical. With the likes of Emilienne d’Alençon wearing Coco’s creations, it was only a matter of time before other high-profile ladies started coveting her hats as well. At first, when asked where they’d procured their charming new headwear, Coco’s friends would fib, vaguely citing Paris shops. Soon enough, however, Chanel’s name was mentioned. Suddenly, she had a little business on her hands. (Garelick, 2014, p. 60)

Ainda durante o tempo em Royallieu, Gabrielle começou a entender o quanto as roupas destinadas às mulheres da época eram restritivas. Quando ela desenvolveu um gosto pelo mundo dos cavaleiros e aprendeu a cavalgar com Balsan, viu em suas próprias roupas um empecilho para a prática. Assim, ela foi a um costureiro e ordenou um traje de cavaleiro para si (Chaney, 2011, p. 83). Confuso, o costureiro acreditou que Chanel falava de um vestido adaptado para mulheres cavalgarem. Logo, seguindo as coordenadas da jovem para o design, ele entendeu que o pedido de Gabrielle era simples: uma roupa exatamente igual à que os homens da época utilizaram para cavalgar.

A photograph shows her sitting astride her horse in her new riding gear: a short-sleeved, mannish shirt, a knitted tie and those rather shocking men’s jodhpurs. Nudging again at tradition, Gabrielle has also substituted the woman’s riding hat—either a top hat or a bowler—for one both less formal and more feminine-looking, wide brimmed and made of soft felt. With her slight figure and broad young face, in this outfit she could almost have been mistaken for a boy. (Chaney, 2011, p. 61)

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Figura 2 - Coco Chanel cavalgando com as mesmas roupas destinadas aos homens da época.

As primeiras aparições públicas de Chanel em roupas masculinizadas provocaram alvoroço. Para as figuras conservadoras, a jovem Gabrielle era a exemplificação de tudo o que contrariava a moral e os bons costumes. Entre os jovens, Chanel instigou a curiosidade. Mesmo antes da fama, impondo-se naturalmente às regras da sociedade com sua personalidade forte, Chanel começava a mostrar indícios do papel que viria a ter na história da figura feminina do século XX.

Foi nesse mesmo ano, em 1908, que Gabrielle conheceu pela primeira vez a figura masculina mais emblemática da sua trajetória: Arthur Capel. Chamado de “Boy” pela juventude da época, ele fazia jus ao teor cativante do seu apelido com uma postura charmosa e misteriosa. O aristocrata inglês era amigo de Étienne Balsan e conquistou Chanel à primeira vista, como ela mesma conta em suas memórias a Paul Morand (1976): "o jovem era bonito, muito bronzeado e atraente. Mais do que bonito, ele era magnífico. Eu admirava sua indiferença e seus olhos verdes. Ele montava cavalos arrojados e muito poderosos. Eu me apaixonei por ele." (p. 51).

Apesar da origem aristocrata de Capel, Chanel entendeu sem demora que o cavaleiro se diferenciava dos outros jovens da época por sua maneira de enfrentar a vida. Apesar de obter

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uma fortuna suficiente para uma vida inteira de luxo sustentada apenas por rendas e aplicações, Arthur Capel escolheu trabalhar. Dono de uma personalidade empreendedora, Capel era ambicioso e tinha interesse no mercado econômico. A mente dinâmica do jovem inglês intrigou Chanel, da mesma forma que o espírito revolucionário da estilista não passou despercebido por Capel. O fascínio foi mútuo e o envolvimento inevitável.

A linha do tempo exata do início da relação nunca foi completamente esclarecida pelos envolvidos. Contudo, relatos apontam que o romance já estava consolidado em apenas algumas semanas. Não muito depois, movida pela paixão - por Capel e pela possibilidade de novos horizontes - Gabrielle anunciou à Étienne Balsan sua mudança com Boy para Paris. O início do relacionamento com Arthur Capel e a mudança para Paris mudaram a vida de Chanel em diversos aspectos. Pela primeira vez, ela amava e era amada. Ainda mais importante, em uma trajetória marcada pela solidão, ela finalmente tinha alguém que a apoiava na luta por um futuro extraordinário.

2.2 Chanel conquista Paris

O início da segunda década do século XX foi marcante para a construção da personagem emblemática na qual Coco Chanel viria a se transformar. Na obra Mademoiselle (2014), Ronda Garelick destaca esse período como um dos mais equilibrados e positivos ao longo de toda a trajetória de Chanel: "os anos entre 1910 e 1914, dos 27 aos 31 anos, foram provavelmente os melhores da vida de Coco Chanel, trazendo sua realização nos dois domínios que Freud considerou necessários para a felicidade: amor e trabalho." (Garelick, 2014, p. 137).

A relação entre Chanel e o amor é provavelmente o ponto mais complexo de todo o estudo da sua trajetória. Mesmo durante a infância, o conceito de amor foi muito abstrato na vida da estilista. Com a morte precoce da mãe, o abandono do pai e a rejeição do restante da família, Chanel nunca conheceu a definição clássica de amor familiar. Ela foi tolerada, mas nunca amada.

Em Aubazine, o isolamento e a rigidez excessiva estimularam uma adolescência marcada pela introversão e solidão. Sem amizades e relacionamentos amorosos, as irmãs Chanel e Adrienne foram os únicos laços de afeto significativos relatados por Gabrielle nos seus primeiros 20 anos de vida. Por fim, até mesmo a relação com Étienne Balsan foi baseada essencialmente na atração física e na conveniência. De forma previsível e compreensível, Gabrielle Chanel se tornou uma figura movida pela razão.

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Em frente a isso, o efeito avassalador de Arthur Capel na história da estilista se torna ainda mais intrigante. Acima de tudo, esse efeito não foi apenas no sentido romântico: Boy foi o primeiro e único capaz de ultrapassar a barreira criada por Chanel e influenciar diretamente a sua forma de pensar e se comportar. Em contraste a singularidade e desprezo da opinião alheia que Chanel apresentava em relação ao restante do mundo, Arthur a questionava e desafiava.

“He gave birth to me,” Chanel said of Capel and, metaphorically, it was so. Coco became “Coco” via Boy’s love and tutelage. He awoke her mind, thrilled her body, taught her to think, inspired her business acumen, and introduced her to art, literature, politics, music, and philosophy.

Balsan had offered amiable companionship and some limited financial support—he had opened an important new window for Coco. But Boy flung open the doors. He could “see” Coco, looking beyond her façade of sharp-witted little seamstress to the hungry, brilliant, yearning spirit beneath. (Garelick, 2014, p. 114)

Nesse cenário de paixão e estímulo, dividindo um apartamento próximo à Avenida Champs-Élysées com o influente Arthur “Boy” Capel, Gabrielle se tornou uma figura presente e singular na luxuosa vida da alta sociedade francesa.

Naquele momento da história, Paris ainda era o maior centro de luxo e beleza do mundo. A “cidade das luzes” fazia jus ao seu apelido com um estilo de vida boêmio, bailes extravagantes e banquetes regados a champagne. A ostentação fazia parte da identidade da cidade e esse gosto pelo luxo refletia diretamente na sua população (Jullian, 1989). Em meio a isso, a moda ainda era guiada pela extravagância. De forma inevitável, o contraste entre Chanel e as mulheres que frequentavam esse meio era gritante. Nas fotos reproduzidas até os dias de hoje, a jovem se destacava entre vestidos volumosos e corpetes com suas roupas com cortes simples e estética masculinizada.

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Figura 2 - Gabrielle Chanel utilizando roupas tradicionalmente utilizadas apenas por homens.

Em uma festa temática organizada por Gabrielle em Royallieu, Chaney (2011) descreve o estilo escolhido pela jovem Chanel em meio a uma fotografia em grupo: "vestida na seção de meninos de uma loja de departamentos parisiense, ela usa calças que não atingem os tornozelos, meias claras, botas de cano curto, uma camisa com colarinho Peter Pan e um colete realçado por uma pequena jaqueta escura". (Chaney, 2011, p. 99). A contradição apresentada por Coco Chanel provocava a sociedade da época. De um lado, roupas masculinas e um corpo desprovido de curvas e volume. De outro, um comportamento sutilmente sedutor combinado com uma astúcia singular. Não existia ninguém como Chanel.

Em complemento à personalidade da jovem, Arthur Capel era a exemplificação do dandismo. Guiado pelo bom gosto e elegância, ele apresentava o encontro entre a figura tradicional do cavaleiro inglês e a modernidade. Com isso, esteticamente, Chanel e Capel formavam um dos casais mais instigantes e cheios de personalidade da juventude que animava as noites parisienses.

Contudo, é inevitável destacar que o desprendimento de Arthur Capel em relação às convenções sociais era questionável. Enquanto o herdeiro inglês apreciava a vida boêmia e a sua imagem de moderno entre os jovens parisienses, ele nitidamente valorizava a tradição do nome Capel entre a alta sociedade da época. O sustento de “concubinas” era um hábito comum

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entre os homens poderosos, mas incluir essas mulheres no convívio social era completamente fora da considerado apropriado. Dessa forma, Boy desfilava com Chanel entre os bares e cabarés, mas deixava a estilista fora do círculo frequentado por sua família e amigos.

(...) But whatever he may have told her, Capel never intended to legitimize their union. For all his open-mindedness and genuine appreciation of Coco, Boy Capel was still a man of his times and class. He limited their appearances in public and introduced her only to some of his friends, mainly artists or intellectuals. (Garelick, 2014, p. 143) A extensão do incômodo de Chanel em relação ao contexto que cercava o relacionamento nunca foi esclarecida pela própria estilista. Chanel era consciente sobre seu status, mas também não escondia que o seu principal anseio não era um relacionamento enquadrado dentro das convenções sociais, mas ser protagonista do amor e afeto de Capel. Se as atitudes de Capel feriam seu orgulho, ela não hesitou em deixar seus sentimentos mascarados.

2.2.1 Chanel Modes

Em 1910, com o apoio e o financiamento de Capel, Coco Chanel abriu sua primeira loja oficial: Chanel Modes, localizada no número 21 da Rua Cambon (Garelick, 2014). Nesse endereço icônico, a estilista iniciou a venda da criação que já era sucesso absoluto em Royallieu e havia se transformado em sua marca registrada: chapéus simples e elegantes, perfeitos para qualquer ocasião. Acompanhada de um carisma indiscutível e o apoio das mulheres da alta sociedade que havia conhecido nos últimos anos, o nome de Coco Chanel e a originalidade das suas criações se espalharam rapidamente por Paris. Em poucos meses, em meio a um atelier constantemente movimentado, a estilista executava diariamente criações exclusivas para adornar o visual das parisienses.

Muito além de uma estilista “da moda”, Chanel se destacou pela sua originalidade. Em meio a um mar de roupas e pessoas iguais, a jovem estilista trouxe o alternativo. Como conta Chaney (2011), “como tantas vezes no passado, sob a influência de atrizes e demimondes, as mulheres da sociedade começaram a prestar atenção. No início de 1912, o trabalho de Gabrielle foi descrito como "original", e ela mesma foi aclamada como ‘essa artista visionária’." (p. 94). Por um lado, as mulheres da sociedade da época buscavam se destacar. Por outro, Chanel carregava a solução para esse desejo em seu talento e na sua própria singularidade.

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Entretanto, é importante destacar que o início da trajetória profissional da estilista não foi marcado apenas pelo sucesso. O talento e o bom gosto de Chanel contrastavam com a sua falta de conhecimento em empreendedorismo, administração e economia. Para Morand (1976), Chanel narra um jantar com Capel no bairro Saint-Germain, onde ela se gabou do sucesso nos negócios e de como era simples ganhar dinheiro. Observando a ignorância de Chanel em relação às questões citadas, Capel confessou que, na realidade, ela estava em débito com o banco. Incrédula, a estilista questionou como era possível ela estar em débito e o banco continuar provendo empréstimos para o crescimento do atelier.

Instantaneamente e em tom óbvio, Capel respondeu: “o banco lhe dá dinheiro porque eu depositei títulos como garantia." (Morand, 1976, p. 67). Impactada com a dureza da declaração, foi nesse momento que Chanel percebeu a sua ignorância como mulher de negócios e a sua dependência em Capel. Declarações posteriores também apontam essa ocasião como o momento no qual Coco Chanel decidiu que nunca mais seria dependente de ninguém (Morand, 1976).

Algumas semanas após o ocorrido, durante uma viagem com Capel para o resort Deauville, Chanel voltou a lembrar o quanto as roupas femininas da época não apresentavam a praticidade que o local demandava. Incomodada com as únicas alternativas estéticas apresentadas para as mulheres, ela decidiu utilizar algumas peças do guarda-roupas de Capel durante uma tarde de polo (Chaney, 2011). Vestindo uma camiseta listrada, calças e um suéter, a imagem casual da jovem estilista surpreendeu, mas também implantou uma semente de curiosidade nas jovens ornamentadas por camadas de tecido em meio às altas temperaturas do verão europeu.

Em pouco tempo, Gabrielle já recebia visitas de mulheres em busca de roupas tão práticas e confortáveis quanto as dela. Foi a partir dessa agitação que a estilista desenhou suas primeiras peças: vestidos leves e confortáveis, completamente desprovidos de espartilhos e camadas. Eles eram especialmente inovadores para as mulheres que desejavam praticar esportes. “(...) para o pequeno grupo de mulheres mais jovens como Gabrielle, que jogavam tênis ou golfe ou realmente iam à praia nadar, o que queriam naquele momento era moda com maior facilidade de movimento." (Chaney, 2011, p. 108).

Sempre com uma visão empreendedora, Capel e Chanel observaram a revolução trazida por essas criações como uma oportunidade para a expansão dos negócios. Para isso, o casal planejou a abertura de outra loja, desta vez localizada em Deauville. Oferecendo tecidos leves e cortes simples, o sucesso foi gigantesco entre as frequentadoras do resort. Na altura, Chanel

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não percebeu a importância desse episódio, mas ele foi marcante para o começo da influência de Chanel na figura feminina francesa do início do século XX.

In Gabrielle’s boutique, with its striped awning proudly bearing the name “Gabrielle Chanel,” she offered clothes and hats based on simplified elements. There were open-collar blouses; simple sweaters; loose, belted jackets and long skirts for relaxed and outdoor living. Most famously, Gabrielle had taken familiar items of men’s practical clothing and turned them to her advantage. (...). Borrowing from those workaday wardrobes, she amazed and delighted her audience by demonstrating that the practical and the everyday could be the source of high style, until then invariably rooted in luxury and the exotic. (Chaney, 2011, p. 108)

Além de alcançar uma parcela considerável das jovens francesas, a disseminação do nome de Chanel também teve uma grande influência da sua afinidade com a excentricidade e a originalidade do mundo artístico. Em meio à Paris dos Ballets Russos, música e arte, Chanel se encaixava perfeitamente entre as rodas de artistas e boêmios. Consciente dessa semelhança, Arthur Capel apresentou Coco para os nomes mais conhecidos das noites parisienses.

Quando os russos Sergei Diaghilev e Igor Stravinsky movimentaram a capital francesa com o polêmico ballet The Rite of Spring (1913), Chanel estava na noite de estreia (Chaney, 2011). Gerando admiração e curiosidade, a estilista tinha acesso aos bastidores, as festas de elenco e os encontros exclusivos. Em pouco tempo, Gabrielle entrou oficialmente para esse universo através da criação de figurinos para as produções teatrais que movimentavam Paris. Logo, as criações da estilista chegaram às revistas nos corpos das artistas de destaque da época.

Figura 3 - Atriz Gabrielle Dorziat com um figurino composto por chapéu de Chanel e vestes de Jacques Doucet para Le Diable Ermite, 1913.

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2.3 Primeira Guerra Mundial

A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) foi um momento determinante para consolidação de Coco Chanel como uma figura revolucionária dentro da moda e da sociedade. Com uma inteligência singular, a estilista compreendeu a conveniência entre o cenário desfavorecido da guerra e a modéstia inovadora das suas criações. Com isso, em poucos meses, Chanel evoluiu de jovem estilista promissora para referência mundial de estilo e comportamento. Contudo, para compreender essa ascensão, é necessário contextualizar o cenário político e social que a favoreceu.

O início da Primeira Guerra Mundial foi um baque para a alta sociedade francesa. A escassez e a desgraça inevitáveis em uma guerra iam contra todo o modelo de perfeição que a La Belle Époque valorizava. Por isso, por mais que o cenário econômico e político mundial tivesse transformado a guerra em um acontecimento inevitável, a camada mais elevada da sociedade parisiense negou essa realidade até o último minuto.

Entretanto, isso não significa que o medo da guerra não existia - muito pelo contrário. Na verdade, segundo Chaney (2011), essa ignorância proposital foi uma espécie de acordo silencioso entre os membros da sociedade para ignorar a calamidade iminente. Com essa estratégia, a ostentação descontrolada foi a forma escolhida para mascarar os primeiros indícios da guerra: “quanto mais a catástrofe iminente se aproximava, uma aceleração impressionante no luxo e na alta qualidade de vida podia ser observada.” (Chaney, 2011, p. 18).

Contudo, o universo de fantasia da sociedade francesa não foi imune à realidade. Em meio à rivalidade histórica entre França e Alemanha - complementada por uma Europa evidentemente dividida - o início da Primeira Guerra Mundial foi declarado em julho de 1914. Em pouco tempo, a dura realidade da guerra atingiu toda a população europeia. O medo constante, as separações familiares e a escassez em todos os setores mudaram completamente o estilo de vida e a organização da sociedade da época.

Nesse momento, homens de todas as idades e classes foram convocados para o exército, deixando lacunas preocupantes na mão de obra que movia o sistema econômico europeu. Para preencher esses espaços e evitar o colapso da indústria e do funcionamento da sociedade, as mulheres foram enviadas para o mercado de trabalho. Com influência dos interesses políticos e ideológicos, mulheres das classes mais baixas foram direcionadas diretamente para as indústrias, enquanto as pertencentes às famílias da elite ganharam funções em enfermarias, orfanatos e outras instituições.

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Foi em meio a esse cenário que Coco Chanel apresentou seus vestidos de jérsei ao mundo pela primeira vez (Chaney, 2011, p. 166). Inicialmente, o lançamento surgiu como um baque em uma sociedade acostumada com vestidos feitos majoritariamente de materiais nobres, como cetim e seda. Contudo, a verdade era indiscutível até mesmo para os amantes da moda ostentosa: as particularidades de corte e tecido das criações de Chanel eram exatamente o que a sociedade francesa precisava em tempos de guerra.

Além da mudança significativa do papel feminino, a França também enfrentava outra questão preocupante: a escassez de materiais para a produção de vestimentas. Com isso, em meio ao racionamento de matérias primas durante a guerra, o jérsei era um dos tecidos mais baratos e fáceis de se adquirir. Longe de ser considerado um tecido nobre, ele nunca havia sido utilizado em roupas exteriores pelas altas camadas da sociedade. Na realidade, em uma sociedade com demarcações sociais determinadas e declaradas, o jérsei era genuinamente considerado um material de uso exclusivo dos pobres.

Coco Chanel percebeu essa abertura na crise têxtil a partir de conversas com fornecedores (Chaney, 2011, p. 167). Ao reunir a simplicidade do jérsei com cortes finos, Chanel produziu peças extremamente confortáveis e práticas - exatamente o que ambas as mulheres e a indústria da moda precisavam durante o período de guerra.

At first, she used Rodier’s natural cream and gray jersey; then, when he saw that she really could sell it, they collaborated to create some beautiful new colors, as noted above. They also developed corals, Madonna blue, what was described as “old-blue,” and various greys. By 1916, when Women’s Wear Daily heralded the fact that Gabrielle was “the one to bring jersey into prominence,” Vogue described her salon as “The Jersey House.” (Gabrielle wasn’t the only designer to use the fabric, but she was undoubtedly the most innovative, and the one who transformed it into a high-fashion textile.) War shortages and high prices meant that through Gabrielle’s triumphant lead, jersey would overtake more familiar materials such as twill-woven serge, now in great demand for the armed forces’ uniforms. (Chaney, 2011, p. 125)

O êxito das criações da jovem estilista foi gigante. Como conta Chaney (2011), "em fevereiro de 1916, a renomada Women's Wear Daily relatou que, na França, "não é incomum que mulheres inteligentes façam pedidos de três ou quatro roupas Chanel em jérsei em diferentes cores de uma só vez.” (p. 130). De forma indiscutível, o jérsei foi a “jogada de mestre” de Chanel para o sucesso e a sua primeira peça de roupa transformada em ícone.

Contudo, o jérsei foi apenas o primeiro passo executado por Chanel no cenário da Primeira Guerra Mundial. Observando a reorganização da sociedade e o novo papel exercido

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pelas mulheres da época, a estilista reuniu de forma pioneira a praticidade e a beleza. Como cita Chaney (2011), “abraçando o que via como a realidade de seus tempos, ela não apenas deu às mulheres roupas práticas e estilosas, mas também as tornou elegantes.” (Chaney, 2011, p. 159).

Nesse contexto, o ponto principal do pioneirismo de Chanel não está particularmente na criação de roupas mais leves e práticas para as mulheres. No início do século XX, essas peças já podiam ser encontradas dentro de alguns mercados da indústria têxtil, como o esporte e o lazer. O pioneirismo de Coco Chanel ocorreu no modo como a estilista levou essas peças para o mundo da alta-costura. Antes de Chanel, a simplicidade era relacionada exclusivamente com as classes mais baixas e a falta de recursos financeiros. Com a influência da estilista, o estilo minimalista se transformou em sinônimo de elegância.

Although jersey was to be the material Gabrielle used most commonly during the war for day clothes, she would also make inspired use of a small number of other fabrics, such as suede for hats as well as coats and jackets, sometimes embroidered with decorative bands. For afternoon and evening, she created dresses of satin, velvet and tulle. On occasion, these were embroidered with cotton, silks or beads. At their best, her clothes were astonishingly beautiful in their masterly unification of fabric, simplicity of design and decoration. (Chaney, 2011, p. 169)

Nas criações de Chanel, as mulheres das classes mais elevadas enxergaram a oportunidade de manter aspectos da vaidade mesmo em meio à escassez da guerra. Ao transformar a simplicidade em elegância, a estilista revolucionou o conceito de “vestir-se bem” apontado nas páginas das revistas de moda da época. Pela primeira vez na história do vestuário, a elegância não dependia exclusivamente da ostentação ou da ornamentação excessiva.

2.3.1 Consolidação do nome, marca e personagem

O ano de 1916 marcou dois momentos importantes na vida de Coco Chanel: a abertura da sua terceira loja, em Barritz, e o início da sua real independência financeira. Com o sucesso nos negócios, a estilista decidiu separar parte dos seus lucros e pagar na totalidade o investimento feito por Arthur Capel na abertura das suas lojas. Segundo declarações da própria estilista, o seu objetivo sempre foi esse. Chanel não desejava o dinheiro como ferramenta de consumo, mas como sinônimo de liberdade.

Para Paul Morand, ela confessou: “para começar, você quer dinheiro. Então você desenvolve um gosto pelo trabalho. O trabalho tem um sabor muito mais forte que o dinheiro.

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Em última análise, o dinheiro não é nada mais do que o símbolo da independência.” (Morand, 1976, p. 130).

A partir desse momento marcante dentro da sua vida profissional, a estilista passou a dedicar seu tempo de forma integral ao trabalho. Nesse cenário, é curioso observar o quanto Chanel lutou para manter a imagem de quem não precisava aplicar esforços para conquistar dinheiro e sucesso. Segundo Chaney (2011), era exatamente isso que a estilista desejava que todos pensassem: “ela reconheceu que, para adquirir uma reputação melhor do que a dos seus colegas estilistas, seria sensato cultivar a impressão de que não precisava trabalhar duro; que, por implicação, ela era igual a seus clientes." (Chaney, 2011, p. 133).

Entretanto, a imagem de mínimo esforço ostentada não poderia estar mais longe da realidade. Chanel se dedicou completamente às suas criações e ao crescimento do seu negócio. Ao longo dos primeiros anos em Paris, a estilista passava dias e noites criando e se inovando dentro das paredes do atelier. Quando estava longe dos croquis, o tempo era dedicado para disseminar o nome e a marca Chanel para a sociedade parisiense através de aparições estratégicas, contato com figuras relevantes e outras ações de puro marketing - mesmo antes mesmo do termo ser inventado.

Por outro lado, Chanel não estava equivocada ao insinuar sua equidade em frente aos seus clientes. Algumas décadas antes, Frederick Worth (1825-1895) havia se consagrado como o primeiro nome da moda a transformar o papel do costureiro dentro da sociedade - fazendo a nobreza se deslocar até o atelier e sujeitar-se às escolhas estéticas do estilista. Ao mudar a dinâmica social, Worth tirou o nome dos estilistas da obscuridade e elevou essas figuras ao protagonismo. Mais de 50 anos após a reviravolta promovida por Worth, com longas filas na porta do atelier, Coco Chanel se transformou em uma verdadeira celebridade.

A necessidade de se inserir no cenário da moda parisiense fez Gabrielle decidir não ser apenas uma estilista, mas se transformar em uma personagem dentro da sociedade francesa. De acordo com Chaney (2011), "quando a autoconfiança inata de Gabrielle começou a florescer, ela também foi desenhando os contornos de uma persona.” (p. 133). Especialmente conectada com a imprensa, ela foi umas das primeiras pessoas a viver o conceito de figura pública.

Além da sua ascensão ao sucesso profissional, foi também durante o período de guerra que seu relacionamento com Arthur Capel, o grande amor da sua vida, entrou em ruínas. Em outra situação, destacar a vida amorosa da personagem estudada poderia ser irrelevante. Contudo, a relação entre Capel e Chanel teve muita relevância dentro da vida profissional de Chanel e na personagem que a estilista decidiu apresentar para o mundo.

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Assim como todos os soldados sobreviventes ao conflito, Arthur Capel mudou muito com a Primeira Guerra Mundial. O jovem inglês foi convocado para o campo de batalha nos primeiros dias do conflito. Atuando em diversas frentes de batalha, a ausência de Capel foi constante ao longo dos anos que se seguiram. Apesar de retornar ocasionalmente para cuidar de negócios e rever Chanel, a relação foi modificada. Enquanto Chanel consolidava a sua carreira, Arthur se envolvia com interesses políticos e inúmeras mulheres.

Foi durante esse período de distanciamento que Capel se envolveu pela primeira vez com Diana Wyndham, sua futura esposa e um divisor de águas para o fim do relacionamento de quase 1nos com Chanel. Diferentemente das relações paralelas anteriores de Capel, movidas pelo desejo e jogo da conquista, o envolvimento com Diana atingiu questões mais complexas: suas raízes conservadoras e seus interesses profissionais.

Nesse cenário, Capel foi atraído justamente pelas características de Diana que mais a diferenciavam de Chanel: extrema feminilidade e descomplicação. Enquanto Chanel era uma figura altamente controversa e complexa, Wyndham estava dentro de todos os padrões sociais e possuía objetivos de vida triviais, guiados por um bom casamento e a construção de uma família. Após tantos anos guiado por ideais modernos, Capel encontrou em Diana Wyndham o cenário perfeito de união entre a tradição da alta sociedade inglesa e suas ambições políticas.

Em paralelo ao surgimento de Wyndham, Boy, que foi um grande apoiador de Chanel desde o início do relacionamento, pela primeira vez sentiu o impacto das mudanças da estilista e da figura empoderada que ela havia se formado. Em meio à construção biográfica de suas memórias, a própria Gabrielle contou à Paul Morand (1976) que, um dia, de forma melancólica, Capel confessou: "Eu pensei que havia lhe oferecido um passatempo, mas eu lhe ofereci a liberdade." (Morand, 1976, p. 69). A constatação de Capel não deixava de ser verdadeira: em menos de cinco anos de trabalho, Chanel já possuía uma estética consolidada e era completamente independente financeiramente. Em contraste ao cenário econômico conturbado da Primeira Guerra Mundial, Coco Chanel prosperou. Mesmo em um dos centros geográficos e políticos do conflito, foi durante os anos de guerra que Gabrielle consolidou seu nome e a marca Chanel no mercado europeu.

É nítido que a história de Coco Chanel se estende por muitas décadas após a Primeira Guerra Mundial. Por isso, seria inconsequente afirmar que é possível analisar toda a influência dessa figura a partir de um fragmento curto da sua trajetória. Contudo, o período que abrange o nascimento da estilista até o fim da Primeira Guerra Mundial foi escolhido como objeto de estudo para a pesquisa devido a sua relevância para a construção da própria Coco Chanel como estilista e personalidade.

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3. A construção da figura feminina na moda

O relacionamento entre a mulher e a estética da moda é longo e complexo. A construção dessa relação ocorreu ao longo de muitos séculos, penetrando em questões políticas, sociais, religiosas e ideológicas. Por isso, para compreender a construção da figura feminina na moda, é necessário adentrar além do superficial.

Primeiramente, é fundamental entender o que é a moda - como ela surgiu, os conceitos que a concedem significado e os fenômenos que a movem. Para isso, o capítulo é iniciado a partir da abordagem da moda dentro das suas características de destaque: ferramenta expositora de gostos, símbolo de modernidade, alvo de imitação, artifício de afirmação social, sinônimo de novidade e criadora de tendências.

Após a análise do conteúdo que caracteriza a moda, a pesquisa propõe a melhor compreensão da construção da figura feminina na moda através de uma linha do tempo desse fenômeno. Para isso, o capítulo inicia a abordagem na Antiguidade, atravessando a Idade Média, o Renascimento e a Idade Moderna. Por fim, o capítulo é concluído com a chegada da Idade Contemporânea e suas peculiaridades.

De forma mais específica, o intervalo apresentado engloba a trajetória entre a Antiguidade e as transformações trazidas pela Primeira Guerra Mundial. Com essa delimitação temporal, o estudo busca compreender a evolução profunda entre as origens do vestuário e a consolidação da moda como sistema capitalista.

3.1 Desenredando a moda

Afinal, o que é moda? Analisando diversos autores e teorias construídas ao longo dos últimos séculos, as respostas para essa pergunta podem preencher bibliotecas inteiras. Nos dias de hoje, a palavra moda é associada frequentemente com a forma de se vestir - englobando tendências, marcas, desfiles e inúmeros elementos que formam o universo que cerca a indumentária. Contudo, é importante compreender que o significado da moda não tem sua essência nesse cenário.

Mesmo no contexto do vestuário, a moda pode ser abordada através de diversos enquadramentos e perspectivas. Podemos apresentar a moda como economia, política, consumo, comunicação, cultura, indústria, sociedade, entre tantos outros cenários. Entretanto,

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