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GESTÃO DO CONHECIM ENTO CÉTICO

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Rafael Capurro

Dout or em Filosofia pela Universität Düsseldorf, Alemanha; Professor da Universit ät Stutt gart , Alemanha.

E-mail: rafael@capurro.de

Resumo

Est e artigo é um a versão m odificada de um a palest ra realizada na Akademie für Technikfolgenabschät zung St ut tgart. Ut iliza um a est ratégia herm enêut ica para a sua const rução. Abordando pressupost os do cet icism o, discut e a necessidade de um a at it ude crítica sobre o que é m uit as vezes proclam ado com o o conheciment o dent ro de uma organização, tendo em cont a suas pressuposições explícit as e im plícit as, seus im pact os e objet ivos, o que é cham ado aqui de " gest ão do conheciment o cético". Dentro de um a visão m ais am pla, est a at it ude deveria levar a " discursos de conheciment o" da sociedade, desvelando, desse m odo, a " gest ão do conhecim ent o cét ico" com o um elem ent o-chave de um a sociedade ét ica da inform ação e do conhecim ent o.

Palavras-chave: Gest ão do Conhecim ent o. Herm enêut ica. Cet icism o. Ét ica.

1 INTRODUÇÃO

“ Eu cont est o que nós sabem os se conhecem os algum a coisa ou não; e nós não sabem os se algum a coisa é ou não é” (DIELS; KRANZ, 1958, p. 1). Essa é a visão cét ica do discípulo de Dem ócrit o M et rodoro de Chios, sobrepondo-se, de algum m odo, ao cet icism o socrát ico. Podem os apenas lidar com o que é e com o que conhecem os. “ Eu cont est o que nós sabem os [...]” , port ant o, o conhecim ent o não pode ser adm inist rado. Gest ão do Conhecim ent o Cét ico – um oxim oro.

Em cont rapart ida, enfrent am os hoje um a poderosa indúst ria da inform ação e do conhecim ent o e um a t erceira revolução indust rial em grande escala baseada em t ais conceit os. A sociedade indust rial t ornou-se um a sociedade da indúst ria do conhecim ent o. Port ant o, é evident e que não apenas sabem os, m as t am bém podem os saber m uit o. É som ent e um a quest ão de com o usam os o conhecim ent o e a possibilidade de possuí-lo.

Um cét ico não t em crit érios para dist inguir opiniões verdadeiras de errôneas, por ele sim plesm ent e se abst er de julgam ent o e alcançar paz int erior (at araxia). Um cét ico conhece a t écnica de opor fenôm enos (phainomena) e pensam ent os (noumena). É sem pre capaz de descobrir um a percepção que não é com pat ível com um a já exist ent e. Poderíam os, paradoxalm ent e, dizer que um cét ico é um gest or do não-conhecim ent o. Seu objet ivo é t erapêut ico, com o dem onst rou Sócrat es. Ele deseja se curar do julgam ent o rápido, bem com o da arrogância (oiesis). Cont udo, seu m ét odo é diferent e do Socrát ico à m edida que ele quer liberar o pacient e da busca pela verdade (RICKEN, 1994).

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Versão original publicada em lingua inglesa [CAPURRO, Rafael. Skept ical Know ledge M anagement . In: HOBOHM , Hans-Christ oph (Ed.). Knowledge M anagement. Libraries and Librarians Taking Up the Challenge. Int ernational Federation of Library Associat ions and Inst it ut ions (IFLA) Publication 108. M unich: Saur 2004, pp. 47-57. Available at : ht t p:/ / w w w.capurro.de/ skepsis.ht ml].

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É paradoxal que em bora o cét ico cont radiga a busca dogm át ica pelo conhecim ent o (epist eme), ele lut a por um objet ivo fixo denom inado paz int erior. Para alcançar t al objet ivo, deve renunciar à busca da verdade, assim como aos juízos de valor. Ent ret ant o, cét icos e dogm át icos t êm algo em com um : am bos crit icam a opinião sim ples (doxa). O pensam ent o cét ico surge no m om ent o em que a diferença ent re o divino e a razão hum ana é enfat izada (LONG, 1995). Os cét icos t êm um a visão m ais radical em relação à crença no conhecim ent o divino, expandindo sua at it ude t am bém , ao conhecim ent o cot idiano (doxa) além do conhecim ent o cient ífico (epist eme). Do pont o de vist a de um cét ico, a gest ão do conhecim ent o é um a t ecnologia que aparent a algo que não pode alcançar.

Peirce, Wit t genst ein e Heidegger pert encem , de acordo com Ricken, à t radição cét ica, um a vez que eles quest ionam afirm ações fundam entalist as rem ont ando a Descart es. Form as cét icas de argum ent ação com o os Tropos de Agripa (Século I, a.C) – cham ado: discordância (diaphonia), regresso infinit o, o relat ivism o da pessoa que pronuncia um julgam ent o e o argum ent o circular são redescobert os hoje, por exem plo, em algum as crít icas ao realism o ingênuo com o o “ Trilem a de M unchhausen” de Hans Albert (RICKEN, 1994, p. 161). A ant iguidade reagiu ao cet icism o com est rat égias diferent es com o a crít ica de Plat ão ao conceit o sensualist a do ser ou a distinção de Arist ót eles ent re os diferent es t ipos de conhecim ent o.

A at ual discussão sobre gest ão do conheciment o nos negócios m ost ra que algum as quest ões e argum ent os ant igos das t radições crít icas e cét icas, par t icularm ent e da herm enêut ica e da t eoria da ciência, são redescobert as, incluindo a t ipologia do conhecim ent o arist ot élico.

2 CONHECIM ENTO TÁCITO E EXPLÍCITO OU HERM ENÊUTICA REVISADA

Em seu livro “ A dim ensão t ácit a” , M ichael Polanyi (1966) m encionou a im port ância do “ conhecim ent o t ácit o” na biologia. Segundo Polanyi, o pensam ent o hum ano est á fundam ent ado em nosso corpo de m aneira que est a dim ensão corporalm ent e t ácit a é a base do denom inado conhecim ent o explícit o, ou objet ivo em sua obra clássica “ A com panhia da criação do conhecim ent o” .

Ikujiro Nonaka e Hirot aka Takeuchi (1995) colocam o conceit o de “ conhecim ent o t ácit o” no cent ro de sua t eoria de com o o conhecim ent o é criado dent ro das com panhias, em com paração à visão t radicional que leva em consideração apenas o processam ent o da inform ação explícit a (digit al). A inform ação com o “ um a diferença que faz um a diferença” (BATESON, 1985, p. 582) t em que est ar int egrada a um dinâm ico cont ext o predom inant em ent e im plícit o de pensam ent o e ação. A t ransform ação do conhecim ent o im plícit o em explícit o é uma condição essencial para a criação de conhecim ent o novo. De acordo com Nonaka e Takeuchi, est e pr ocesso inclui quat ro t ipos de t ransform ações do conhecim ent o:

- do conhecim ent o im plícit o para o im plícit o: socialização; - do conhecim ent o im plícit o para o explícit o: ext ernalização; - do conhecim ent o explícit o para o explícit o: com binação; e - do conhecim ent o explícit o para o im plícit o: int ernalização.

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subjet iva do cont ext o dependent e, o qual perm anece predom inant em ent e t ácit o. O objet ivo dos aut ores é com preender com o as organizações m obilizam esse recurso criat ivo básico para além da visão t radicional da gest ão do conhecim ent o (TAKEUCHI, 1998). Seguindo essa linha de pensam ent o, Von Krogh, Ichijo e Nonaka (2000) colocam a quest ão da seguint e form a: “ est e livro t rat a da capacit ação do conhecim ent o. É nossa fort e convicção de que o conhecim ent o não pode ser gerido, apenas ensinado” (KROGH; ICHIJO; NONAKA, 2000, vii). Em out ras palavras, o que pode ser gerenciado é a inform ação ou o conhecim ent o explícit o que é som ent e part e do processo de criação do conhecim ent o. De fat o, nós só podem os adm inist rar a criação das condições de possibilidade de criação do conhecim ent o, o que eles cham am de “ capacit adores do conhecim ent o” , t ais com o:

- inst igar um a visão do conhecim ent o; - gerenciar conversações;

- m obilizar at ivist as do conhecim ent o; - criar o cont ext o corret o; e

- globalizar o conhecim ent o local.

Essa abordagem suscit a alguns argum ent os e pensament os relat ivos à t radição cét ica, a exem plo do que foi desenvolvido pela herm enêut ica e t am bém pelo racionalism o crít ico de Popper que, de fat o, prima facie, reduz t odo o conhecim ent o ao “ conhecim ent o objet ivo” , m as, ao m esm o t em po, reit era que o conhecim ent o é basicam ent e “ conject ural” , ist o é, baseado em crenças, disposições e “ horizont es de expect at ivas” “ se est es são inconscient es ou não” (POPPER, 1973, p. 345). Algum as polêmicas superficiais cont rárias à herm enêut ica (ALBERT, 1994), a principal ideia com um , refere-se à percepção da nat ureza int erpret at iva do conhecim ent o, conform e se const at ou na herm enêut ica com o conceit o de “ pré-com preensão” (CAPURRO, 1986, p. 17).

Em um a cart a a Paul Feyerabend sobre o fam oso livro de Hans-Georg Gadamer, “ Verdade e M ét odo” (GADAM ER, 1975), Hans Albert escreve:

[...] algum as part es do livro são m uit o interessant es, sobret udo, a que se refere ao conhecim ent o t endencioso (vorut eile), em que parece apoiar um pont o de vist a semelhante, a exem plo de Popper em suas Conject uras! Eu fiquei surpreso. Popper est á à frente cerca de 16 anos! O pobre rapaz (der Gut e) (i.e. Gadam er) usou (Karl Popper) um pouco sempre que necessit ou? (GRODIN, 1999, p. 336, t radução nossa).

Algo similar poderia ser dit o no que se refere à relação ent re Popper e Heidegger, que no “ Ser e o Tem po” , publicado em 1927, uns 20 anos ant es do livro de Popper, analisa a est rut ura da pré-com preensão (HEIDEGGER, 1976, p. 31-34). “ O pobre rapaz” (i.e. Popper) deveria t ê-lo usado (Heidegger) um pouco sem pre que necessit ou?

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qualquer out ra m udança de m ídias, as redes de inform ação elet rônicas criam possibilidades novas de geração do conhecim ent o, ajudando-nos, por exem plo, a superar de um a m aneira diferent e os lim it es de t em po e espaço com o no caso do encont ro corporal ou da t ecnologia im pressa. A herm enêut ica clássica t em debat ido int ensam ent e as diferenças ent re a t ransm issão e a int erpret ação de t ext os escrit os (e impressos) com o dist int os do diálogo face a face. Esse já foi um pont o principal na crít ica de Plat ão à escrit a.

Para Essers e Schreinem akers, da Escola de Gest ão de Rot erdã (Universidade Erasm us), a Gest ão do Conheciment o Corporat ivo não pode ser reduzida ao paradigm a de Popper do “ conhecim ent o objet ivo” , ao m enos at é a m edida que t al paradigm a im plique em um a visão enciclopédica do conhecim ent o dent ro de um a em presa (ESSERS; SCHREINEM AKERS, 1997). Isso faz a diferença no que t ange à “ t eoria dinâm ica da criação do conhecim ent o organizacional” , o que im plica que o conhecim ent o é com part ilhado por um a com unidade de pessoas ou especialist as. A ideia de que o conhecim ent o não pode ser separado de prát icas específicas, inst it uições, inst rum ent os, et c., não difere do que Thom as S. Kuhn cham ou de “ paradigm as” (KUHN, 1962). Cont udo, Essers e Schreinem akers ressalt am as seguint es diferenças ent re os t ipos de conhecim ent o em am bos cont ext os:

- a Teoria da Ciência est á int eressada na análise da ciência a part ir de um a perspect iva t eórica, enquant o a Gest ão do Conhecim ent o t rat a das quest ões de aplicação e uso; e

- um a organização não est á preocupada apenas com o conhecim ent o cient ífico, m as t am bém com out ros t ipos de conhecim ent o.

A gest ão do conhecim ent o se int eressa pelo lado subjet ivo do conhecim ent o ou, na linguagem da t eoria da ciência, preocupa-se m enos com o cont ext o de just ificação do que com o cont ext o de descobert a e aplicação. No ent ant o, o “ conhecim ent o objet ivo” , ent endido com o “ M undo 3” de Popper exerce, t am bém , um papel preponderant e na concepção de Nonaka no que se refere à geração de conhecim ent o. A relação do conhecim ent o explícit o, com valores e int eresses im plícit os, suscit a a quest ão de diferent es t ipos de conflit os, por exem plo, no que diz respeit o à dificuldade de chegar a um consenso ent re em pregador e em pregado quant o a decisão de um novo produt o.

Um a out ra quest ão crít ica levant ada por Essers e Schreinem akers t em a ver com o cont ext o de just ificação. Os aut ores se report am a um art igo de Nonaka de 1994 no qual não se discut e o papel dos crit érios cient íficos clássicos em oposição aos econôm icos (ret orno sobre o invest im ent o). Essa visão relativa do conhecim ent o cient ífico, de um pont o de vist a pragm át ico, pode ser vist a com o um a form a cét ica de gest ão do conhecim ent o. Est e é o caso t am bém , com relação à quest ão discut ida, principalment e, acerca da incom ensurabilidade de paradigm as. Nonaka, paradoxalm ent e, parece não considerar essa sit uação prát ica nos conflit os e rupt uras cot idianas. Ainda m ais, ele parece om it ir esses t ipos de conflit os na base de um pont o de vist a orient ado de m odo harm onioso. Essers e Schreinem akers evidenciam a im port ância da sit uação de “ discordância int erparadigm át ica” em um a organização, ou seja, o que podem os cham ar de gest ão do conhecim ent o cét ico com o “ função crucial para a, com o usualm ent e é denom inada, civilização globalizada de nosso t em po” (ESSERS; SCHREINEM AKERS, 1997, p. 31). Assim , os aut ores fazem um a correção im port ant e com relação à ideia difundida de que esses t ipos de problem as possam ser dogmat icam ent e resolvidos com base na visão de um a organização.

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m udança de paradigm a em relação às quest ões t eóricas. Parece que esses t ipos de quest ões pressupõem um a análise dos diferent es t ipos de conhecim ent o e seu papel na vida de um a organização, ao m enos, conquant o nem t odos os crit érios que possam ser aplicados ao “ conhecim ent o cient ífico” pr ovem ser adapt áveis ao “ conhecim ent o corporat ivo” . Todavia, conhecim ent o baseado em boas razões ou saber o porquê t em um papel im port ant e, o qual não é do m esm o t ipo da diferença ent re conhecim ent o explícit o e im plícit o. Isso levant a a quest ão da t ipologia do conhecim ent o.

3 A TIPOLOGIA DO CONHECIM ENTO EM ZAHN E ARISTÓTELES

Em sua cont ribuição quant o à quest ão sobre “ vant agens com pet it ivas por m eio da gest ão do conhecim ent o” Zahn et al (2000), seguindo um a descrição de R. Sanchez, dist inguem ent re:

- saber como ou o conhecim ent o acerca de com o part es diferent es de um sist em a (um produt o ou um sist em a de produção) pert encem junt as e com o esse sist em a funciona. Saber com o é um conhecim ent o prát ico usado em um a sit uação específica para o cum prim ent o eficient e de um a dada t arefa;

- saber o porquê ou o conheciment o que fornece uma explicação causal de um det erminado

est ado de assunt os; e

- saber o quê ou Gest alt ungsw issen é o conhecim ent o sobre o saber com o e o saber o porquê deveriam ser usados. Esse t ipo de conhecim ent o é básico para a habilidade das organizações em responder eficient em ent e a m ercados m ut áveis (ZAHN et al, 2000, p. 246-248).

Zahn et al (2000) t am bém ressalt am a diferença ent re conhecim ent o explícit o e im plícit o e, ainda, descrevem o que poderíam os cham ar de dilem a da gest ão do conhecim ent o: se o conhecim ent o t orna-se explícit o ele é m ais perene, no ent ant o, m ais difícil de prot eger, se perm anece im plícit o é m ais fácil de fazê-lo, porém , m ais difícil de t ransm it ir. Isso explica as duas est rat égias diferent es da gest ão do conhecim ent o descrit as por Hansen, Nohria e Tierney (1999). A prim eira é cham ada de est rat égia de codificação orient ada para o conhecim ent o explícit o, o qual é arm azenado e acessível via bancos de dados. As em presas de consult oria Andersen e Ernest & Young são exem plos de prát ica dest a est rat égia. A segunda é a est rat égia de personalização. Nesse caso, o conhecim ent o fica rest rit o à pessoa que o adquiriu. O com put ador é apenas um m eio para o int ercâm bio de conhecim ent o. Exem plos dest a est rat égia são ident ificados pelo Grupo de Consult oria Bain, Bost on e M ckinsey.

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Essa t ipologia é prima facie apenas ligeiram ent e diferent e daquela na “ Ét ica a Nicôm aco” , na qual Arist ót eles dest aca: o conhecim ent o t écnico (t echne), o conhecim ent o cient ífico (epist eme), o conhecim ent o prát ico (phronesis), o conhecim ent o dos prim eiro princípios (sophia), e o raciocínio int elect ual (nous), por um lado, t am bém , o conhecim ent o conject ural (hypolepsei) e a opinião (doxa) de out ro (ARISTOTLE, 1985, VI, 1139b, p. 15-18). O conhecim ent o prát ico refere-se ao raciocínio a respeit o dos m elhores m eios para se alcançar bons objet ivos. Não é som ent e a int eligência, preocupa-se, ent ret ant o, com a form ação do carát er por m eio de virt udes ét icas, assim com o do int elect o por m eio das dianoét icas. Em out ras palavras, phronesis t rat a de descobrir quais seriam os m elhores m eios de se obt er um a vida boa em um a sit uação concret a (ROWE, 1989). Arist ót eles m ant ém dist ância dos objet ivos ét icos super-hum anos de Plat ão.

Há um a diferença ent re essas duas t ipologias concernent es à relação ent r e conhecim ent o e verdade. Na “ M et afísica” , Arist ót eles salient a o conhecim ent o adquirido por int erm édio da percepção de sent ido (aist hesis). Tal conhecim ent o est ét ico é “ a-lógico” e, port ant o, não relacionado à verdade. A verdade, propriam ent e dit a, é uma m aneira afirm at iva ou negat iva de “ descobrir” os fenôm enos na base do logos. A t ipologia na “ Ét ica a Nicôm aco” não inclui esse t ipo de conhecim ent o “ a-lógico” . Dent ro dessa últ ima t ipologia, Arist ót eles faz um a diferença ent re as cinco prim eiras form as de conhecim ent o, as quais ele considera lidar sem pre com a verdade (alet heia), ou seja, sem pre “ descobrir” (a-let heia) os fenôm enos, enquant o as duas últ im as formas de conhecim ent o, dit as conhecim ent o conject ural e opinião, t am bém podem om it ir os fenôm enos e, assim , serem “ erradas” .

É por essa razão que elas não pert encem às virt udes dianoét icas. Essas form as de conhecim ent o podem ser diferenciadas com relação aos t ipos de fenôm enos que elas afet am com o, por exem plo, fenôm enos perenes (epist eme, sophia, nous) ou fenôm enos m ut áveis (t echne, phronesis). Techne se int eressa pela produção de coisas m at eriais (poiesis), já o

phronesis se preocupa com as ações hum anas (praxis). Esses diferent es t ipos de conhecim ent o se referem aos diferent es t ipos de verdade, a saber: “ t eórico” , “ prát ico” e “ poiét ico” .

No que t ange à diferença ent re o conhecim ent o explícit o e im plícit o, o conhecim ent o em pírico deixa a causalidade im plícit a, já o conhecim ent o t écnico e cient ífico t ornam explícit o o part icular e o geral. O conhecim ent o est ét ico perm anece im plícit o. O conhecim ent o prát ico (phronesis) t orna-se explícit o por m eio do im port ant e processo de conselho ét ico. No ent ant o, as “ regras” m ut áveis que governam a vida individual e social (et hos escrit a com a let ra grega Et a) podem se t ornar explícit as apenas na educação (didaskalia), enquant o que perm anecem im plícit as t ornam -se “ habit ual” (et hos escrit o com a let ra grega Épsilon) (ARISTOTLE, 1985, II, 1103a, p. 17-18).

Podem os correlacionar prima facie as tipologias do conhecim ent o de Zahn e Arist ót eles dest a m aneira:

- saber com o: empeiria/ t echne; - saber o porquê: epist eme; e - saber o quê: phronesis.

E seguindo um a sugest ão de M anfred Rohr, m em bro da Academ ia de Avaliação de Tecnologia de St ut t gart , podem os acrescent ar:

- saber onde; - saber quando; e - saber quem .

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(eu zen). Do cont rário poderia acont ecer de esquecerm os as relações ent re sabedoria, conhecim ent o e inform ação, ou, para colocá-las nas fam osas palavras de T. S. Eliot : “ Onde est á a sabedoria que perdem os no conhecim ent o? Onde est á o conhecim ent o que perdem os na inform ação?” (ELIOT, 1986)2.

Um eco dessas diferenças se encont ra no fam oso dit o de Dr. Johnson quando est ava na bibliot eca do Sr. Cam bridges exam inando as cont racapas dos livros:

“ [...] o conhecim ent o é de dois t ipos. Conhecem os um assunt o por nós m esm os, ou sabem os onde podem os encont rar inform ação sobre aquele. Ao indagarm os a respeit o de qualquer assunt o, a prim eira coisa que t em os que fazer é saber quais livros trat am do assunt o. Isso nos leva a pesquisar em cat álogos e nas cont racapas dos livros nas bibliot ecas” (BOSWELL, 1986, p. 186).

Desde a m odernidade t em os nos int eressado pela quest ão de localizar o conhecim ent o im presso explícit o dent ro das coordenadas de espaço e t em po de uma bibliot eca ou de um a enciclopédia. Com as redes de relacionam ent o elet rônicas conseguim os um a disponibilidade global de conhecim ent o para t odo m undo, a qualquer m om ent o e em t odo lugar. Paralelo a isso, est am os cient es de que devem os desenvolver algum tipo de desconfiança no que diz respeit o à int ernet , a fim de lidar com sua est rut ura caót ica (KUHLEN, 1999).

Adem ais, deveríam os cult ivar um a at it ude crít ica acerca do que é, com freqüência, proclam ado com o conhecim ent o dent ro de um a organização, considerando suas pressuposições explícit as e im plícit as, im pact os e objet ivos. Cham o essa at it ude de “ gest ão do conhecim ent o cét ico” . Dent ro de um a visão m ais abrangent e, essa at it ude deveria levar aos “ discursos do conhecim ent o” da sociedade (NENNEN, 2000). Para esclarecer esses assunt os, apresent a-se o cam po que est á sendo cham ado de ética da inform ação (ICIE, 2011; CAPURRO, 2000b, 2002).

4 PROSPECTOS

Se observarm os a quest ão da represent ação do conhecim ent o no at ual cont ext o das redes digit ais, ficam os cient es da m udança m et afórica básica, no que se refere ao conceit o de “ circulo do conhecim ent o” ou “ enciclopédia” , o qual era predominant e na t eoria e na prát ica, part icularm ent e, no m undo das bibliot ecas desde o Ilum inism o.

Essa m et áfora, usada por Denis Diderot e Jean Le Rond D’Alem bert é, de fat o, m ais ant iga – o t erm o enkyklos paideia rem ont a ao sofist a grego (SCHALK, 1972) – porém , enciclopedist as franceses fizeram um t ipo de t roca de paradigm a, ao m udarem , seguindo Ephraim Cham ber, de um a ordem sist em át ica para uma ordem alfabét ica. De fat o, essa ordem não é m ais enciclopédica, ent ret ant o, com o poderíam os cham á-la, “ endict iopédica” (dikt yon é a palavra grega para rede). A “ Cyclopaedia ou um Dicionário Universal de Art es e Ciências” , projet ada pelo escrit or inglês Ephraim Cham ber (1728), foi um sucesso, com o dizem os hoje, orient ado ao usuário.

Cham ber pressupôs que, com o observou D’Alem bert , “ a m aior part e dos leit ores” é educada de t al m aneira que buscam o significado das palavras relacionadas com os cont ext os em que elas est ão encravadas. Consequent ement e, a enciclopédia francesa deveria t er incluído t esauros diferent es, o que não foi o caso. Segundo D’Alem bert , isso t eria gerado m ais

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desorient ação no que se refere aos procediment os de busca, t ornando o pr odut o ainda m ais volum oso e o sucesso econôm ico t eria est ado em perigo (D’ALEM BERT, 1997, p. 96-97).

O desenvolvim ent o seguint e não t rouxe apenas um a fragm ent ação das disciplinas cient íficas e de seus vocabulários, ent ret ant o, com o vem os hoje, um a rede de conhecim ent o que vai além das form as enciclopédica e “ endict iopédica” de represent ação do conhecim ent o. Não apenas docum ent os, m as t am bém os seres hum anos est ão ligados dent ro de um a endict iopédia global e digit al que é, sim ult aneam ent e, um canal de inform ação e com unicação. Esse desenvolvim ent o é um a oport unidade ou um a am eaça para o pensam ent o cét ico, ou seja, crít ico? Seguindo a fam osa crít ica à escrit a de Plat ão (Phaidr, 275), cada fixação de conhecim ent o significa um a descont ext ualização que t em que ser recont ext ualizada. Em out ras palavras, a art e da m em ória com o é cult ivada pelas bibliot ecas t radicionais e t am bém pelas redes digit ais precisa do com plem ent o da art e da lem brança.

Cont udo, da m esm a form a que as bibliot ecas t radicionais não são apenas est ant es de livros, m as t am bém lugares nos quais as pessoas se conhecem , a int erface possui habilidades orais que não podem subst it uir o face a face, m as podem deslocá-lo e am pliá-lo de diferent es m aneiras. Dado o perigo da exclusão social, t écnica, econôm ica e cult ural em escala local e global (“ rupt ura digit al” ), a gest ão do conhecim ent o cét ico é um elem ent o-chave ét ico de um a sociedade da inform ação e do conhecim ent o, a qual pode evit ar o t ornar-se inflada e arrogant e. Tal sociedade não é part e da solução, é um a part e do problem a.

Agradecim ent os

Agradeço a Thom as J. Froehlich (Kent St at e Universit y, USA) pelos com ent ários crít icos e correções.

Agradeço a Denise de Oliveira Port o e a Alan Curcino Pedreira da Silva, respect ivam ent e, pela t radução e revisão final para publicação.

Skeptical Know ledge M anagement

Abstract

This art icle is a modified version of a lect ure held at the Akademie für Technikfolgenabschät zung St ut t gart . It uses a hermeneutic st rat egy for it s const ruct ion. Approaching assumpt ions of skept icism, discusses t he need for a crit ical at titude about what is oft en proclaimed t o be know ledge w ithin an organizat ion considering it s implicit and explicit presupposit ions, impact and goals, w hat is called here t he " management of knowledge skept ical". Within a larger view this at tit ude should lead t o societal " know ledge discourses" . Within a broader view , t his at tit ude w ould lead to " discourses of know ledge" of societ y, revealing thus " know ledge management skept ic" as a key element of an et hics of information societ y and knowledge.

Keyw ords: Knowledge M anagement. Hermeneut ics. Skept icism. Et hics.

Art igo recebido em 19/ 12/ 2010 e aceit o para publicação em 15/ 02/ 2011

REFERÊNCIAS

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