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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Rodrigo Zukauskas Santos

A Espiritualidade e a Religiosidade na prática pediátrica

MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO NAS PROFISSÕES DA SAÚDE

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Rodrigo Zukauskas Santos

A Espiritualidade e a Religiosidade na prática pediátrica

MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO NAS PROFISSÕES DA SAÚDE

Trabalho Final apresentado à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL em Educação nas Profissões da Saúde, sob a orientação da Profª Drª Raquel Aparecida de Oliveira.

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Bibliotecário Responsável: Antonio Pedro de Melo Maricato CRB-8 / 6922 Biblioteca Prof. Dr. Luiz Ferraz de Sampaio Júnior.

Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde – PUC-SP

Santos, Rodrigo Zukauskas

S237 A espiritualidade e a religiosidade na prática pediátrica / Rodrigo Zukauskas Santos. -- Sorocaba, SP : [100.], 2013.

Orientador : Raquel Aparecida de Oliveira.

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Banca Examinadora

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AGRADECIMENTOS...

“É com o coração que se vê

corretamente; o essencial é invisível aos olhos”

Antoine de Saint Exupéry

À minha esposa Ana e minhas filhas Clara e Julia pelo amor, respeito e incentivo a todos os momentos de minha vida.

Aos meus pais pelas oportunidades e caminhos oferecidos.

Aos funcionários e professores da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da PUCSP pelo respeito e motivação.

Aos funcionários e professores da Pós-Graduação da PUC-SP pelo acolhimento e pelos ensinamentos.

Aos médicos pediatras do Conjunto Hospitalar de Sorocaba e aos residentes de pediatria da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da PUCSP pela atenção e respeito.

Aos colegas da I Turma do Mestrado Profissional em Educação nas profissões da Saúde pelo carinho e amizade.

À coragem, ao entendimento e à amorosidade de minha orientadora Profª Drª Raquel.

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RESUMO

Santos, R.Z. A Espiritualidade e a Religiosidade na prática pediátrica

Introdução: As novas concepções da física clássica, o crescente movimento religioso e as discussões bioéticas levaram a um aumento significativo de publicações a respeito da espiritualidade, inclusive suas implicações na saúde. Na atenção integral à criança e à família, a espiritualidade e a religiosidade devem estar presente no trabalho do médico em ato, local de infinitas possibilidades, como instrumento comunicacional, no respeito bioético e como força que pode influenciar positivamente o processo saúde-doença. Objetivos: Comparar a religiosidade/espiritualidade dos pediatras e dos residentes em pediatria, e como isso influencia a sua prática clínica; identificar a percepção quanto às necessidades espirituais das crianças atendidas e de seus familiares; e conhecer o quanto a religiosidade/espiritualidade das crianças e familiares influenciam no tratamento e enfrentamento das doenças. Metodologia: Foi realizada uma pesquisa quantitativa através da aplicação de um questionário sobre os dados gerais de caracterização; questões sobre a dimensão de religiosidade/espiritualidade; conhecimento do tema na saúde e a sua inserção na prática clínica dos profissionais. Resultados: Participaram 37 profissionais, sendo 25 médicos pediatras de um hospital público em Sorocaba-SP e 12 residentes em pediatria pela Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da PUC/SP. Após tratamento dos dados, constatamos que não houve diferenças entre os dois grupos quanto a sua religiosidade e espiritualidade; são profissionais com grande religiosidade intrínsica, valorizam a espiritualidade e religiosidade em suas vidas, influenciando, inclusive, suas práticas clínicas diárias. Apesar de reconhecerem a necessidade da abordagem espiritual das crianças e familiares e a influência positiva da religiosidade e da espiritualidade no tratamento e enfrentamento das doenças, poucos abordam esta dimensão, sendo apontadas como principais razões a falta de conhecimento, treinamento e de tempo. Os profissionais também se mostram abertos e dispostos a incluírem esta temática em seus trabalhos.

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ABSTRACT

Santos, R.Z. A Spirituality and Religiosity in pediatric practice

Introduction: The new concepts of classical physics, the growing religious movement and bioethical discussions led to a significant increase in publications about spirituality, including its health implications. At full attention to the child and family, spirituality and religiosity should be present in the work of the medical act, place of endless possibilities, as an instrument of communication, respect and bioethics as a force that can positively influence the disease process. Objectives: To compare the religiosity/spirituality of pediatricians and pediatric residents, and how this influences their clinical practice to identify the perception of the spiritual needs of the children served and their families, and to know how religiosity/spirituality of children and family influence in the treatment and coping of diseases. Methods: Was performed a quantitative research through a questionnaire about general data characterization; questions about the extent of religiosity/spirituality, knowledge of the subject and its inclusion in health for clinical professionals. Results: Participants were 37 professional, 25 pediatricians in a public hospital in Sorocaba-SP and 12 pediatric residents from the College of Medical and Health Sciences at PUC/SP. After processing the data, we found that there were no differences between the two groups regarding their religiousness and spirituality, are professionals with high intrinsic religiosity, spirituality and religiosity value in their lives, influencing even their daily clinical practice. While recognizing the necessity of spiritual children and families and the positive influence of religiosity and spirituality in coping and treatment of diseases, few approach this dimension. Pointed as the main reasons the lack of knowledge, training and lack of time. Professionals also show open and willing to include this issue in their work.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo o Gênero e Etnia. Sorocaba, 2012. ... 55 Tabela 2. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo idade e tempo de formado. Sorocaba, 2012. ... 56 Tabela 3. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo Religião e a sua percepção quanto à própria religiosidade. Sorocaba, 2012. ... 57 Tabela 4. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo a Religiosidade Organizacional e não organizacional. Sorocaba, 2012. ... 59 Tabela 5. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo a Religiosidade Intrínseca. Sorocaba, 2012. ... 60 Tabela 6. Entendimento dos Residentes e Pediatras do que é Espiritualidade. Sorocaba, 2012. ... 61 Tabela 7. Crenças em Deus e na existência da alma ou espírito pelos Residentes e

Pediatras. Sorocaba, 2012. ... 62 Tabela 8. Relações citadas sobre o assunto “Saúde e Espiritualidade” por médicos e

residentes. Sorocaba, 2012. ... 63 Tabela 9. Influência da religiosidade e espiritualidade na saúde segundo os Residentes e Pediatras. Sorocaba, 2012. ... 64 Tabela 10. Quanto os residentes e pediatras acham pertinente a abordagem do tema

Religiosidade/Espiritualidade com seus pacientes e como se sentem ao fazê-la. Sorocaba, 2012 ... 66 Tabela 11. Quando segundo os residentes e pediatras é apropriado o médico rezar.

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LISTA DE ABREVIAÇÕES

ABEM: Associação Brasileira de Educação Médica AC: Alojamento Conjunto

AFMA: Associação de Faculdades de Medicina Americanas AMM: Associação Médica Mundial

CEP: Comitê de Ética em Pesquisa CHS: Conjunto Hospitalar de Sorocaba

CINAEM: Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico Comissão Conjunta de Acreditação de Organizações de Saúde

CNE: Conselho Nacional de Educação

CNRM: Comissão Nacional de Residência Médica DCN: Diretrizes Curriculares Nacionais

INPCS: Instituto Nacional de Pesquisa no Cuidado à Saúde LDBEN: Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional MS: Ministério da Saúde

OMS: Organização Mundial da Saúde

PROMED: Programa de Incentivo a Mudanças Curriculares nos Cursos de Medicina PROSAUDE: Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde

PUC-SP: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo SBP: Sociedade Brasileira de Pediatria

SUS: Sistema Único de Saúde

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 17

2. IMPORTÂNCIA ... 21

3. RELIGIOSIDADE, ESPIRITUALIDADE E SAÚDE ... 23

4. ENSINO MÉDICO E ESPIRITUALIDADE ... 31

4.1. Considerações Históricas ... 31

4.2. Crise da Sociedade ... 34

4.3. O novo modelo ... 36

5. PEDIATRIA E ESPIRITUALIDADE ... 43

6. OBJETIVOS ... 49

6.1. Gerais ... 49

6.2. Específicos ... 49

7. METODOLOGIA ... 51

7.1. Tipo de estudo ... 51

7.2. Local do estudo ... 51

7.3. População do estudo ... 52

7.3.1. Critérios de inclusão ... 52

7.3.2. Critérios de exclusão ... 52

7.4. Instrumento de Coleta ... 53

7.5. Tratamento dos dados ... 54

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 73

REFERÊNCIAS ... 77

APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ... 85

APÊNDICE B - Questionário ... 87

ANEXO A - Comitê de Ética em Pesquisa ... 95

ANEXO B – Formulário de autorização de pesquisa (CHS) ... 97

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1. INTRODUÇÃO

“Da janela da sala, Podia ver luzes e sombras, Caminhos possíveis naquele momento presente...” (Rodrigo Zukauskas, 1999)

Em minha infinita jornada pela busca do entendimento do ser humano é chegado mais um momento de transformação.

Ao adentrar nesta pesquisa, lanço-me em uma longa viagem repleta de reflexões e significados para a minha vida pessoal e profissional ao trazer o tema da religiosidade e da espiritualidade na discussão do meu trabalho como médico e como futuro educador.

As perguntas que surgem despertam-me a curiosidade, transformando-se em ação pela busca do saber. Desta ação, dependente da informação e da vontade, construo meu universo e reconstruo-me como Pediatra.

Nesse contexto, ao cursar o Mestrado em Educação para as Profissões da Saúde tive a oportunidade de levar para minha prática médica reflexões sobre a bioética, as metodologias ativas e o processo de ensino-aprendizagem, a gestão e as políticas em saúde, mas além, a oportunidade das discussões e o respeito ao pluralismo, à diversidade cultural e à prática multidisciplinar.

A minha formação médica foi pautada em um modelo de ensino-aprendizado fragmentado em disciplinas básicas, como anatomia, histologia e fisiologia, disciplinas clínicas. Era do tipo depositário em forma de aulas expositivas projetadas por repetidas transparências, muitas vezes impregnadas pelo bolor dos anos e anos de uso. O ensino da prática médica era realizado no hospital, centrado na busca pela doença.

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cardiopatas e nefropatas. Eram quartos onde as histórias de cada paciente permaneciam do lado de fora, não era permitida a sua entrada. O indivíduo doente perdia cada vez mais espaço e importância no seu próprio contexto e significado.

Este modelo reducionista e biologista proporciona ao aluno uma formação fragmentada do ser humano, passando a doença a ser mais valorizada e interpretada que o próprio doente.

No final do século XX, período da história em que ocorreu a minha Graduação, a evolução tecnológica supervalorizava os aspectos científicos em relação aos aspectos humanistas, levando o ensino médico não só a retirar o estudo de humanidades, incluindo a religião, de seu currículo, como também a desprestigiar e até ridicularizar qualquer tentativa nesta direção (SIQUEIRA, 2006).

O primeiro contato com a disciplina de Pediatria na graduação e a escolha da especialidade como pós-graduação trouxe uma nova oportunidade. A criança abrira para mim um novo universo dentro da Medicina, trazendo mais clara a noção da transcendência, permitindo-me utilizar e valorizar comunicações antes esquecidas e ocultadas pelo modo materialista daquele saber que me formava.

O meu trabalho como Pediatra ocorre nos campos de batalhas das urgências e emergências, em que crianças e famílias vivem sentimentos que se afloram somente em situações de intensos conflitos. Vivencio a dor da doença e da morte de crianças, mas também, presencio a cura de pacientes muitas vezes já desacreditados pela equipe de trabalho. Nesse contexto, percebo o quanto a religiosidade/espiritualidade são ferramentas possíveis a serem utilizadas pela busca de bem estar e conforto para as famílias e suas crianças.

A abordagem da religiosidade/espiritualidade no processo de trabalho do pediatra consiste na oportunidade de ampliar o olhar sobre a criança e sua família, de respeitar o ser em vulnerabilidade e de rever conceitos do processo saúde-doença.

Partindo, portanto, do respeito bioético ao ser humano integral que vive e interpreta o seu processo saúde-doença, trilhei este trabalho no sentido de primeiro fazer um diagnóstico no meu ambiente de trabalho, explorando o tema no universo do médico recém-formado (residente) e no do pediatra já inserido na dinâmica da sociedade.

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seguintes questões: Qual a religiosidade/espiritualidade dos médicos residentes em pediatria e dos pediatras? Eles conhecem a importância e valorizam o tema? Aplicam tal temática em sua prática diária?

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2. IMPORTÂNCIA

Transparente e límpida, Permanecia imóvel, reluzente... Sob as folhas verdes daquela manhã de primavera...

(Rodrigo Zukauskas, 1997)

Neste novo século, a humanidade vem questionando alguns valores por muito esquecidos: o olhar, o toque, a compaixão, a atenção e o estar presente, necessidades essenciais do ser humano.

Boff (2001), afirmou que

O século XXI será um século espiritual que valorizará os muitos caminhos espirituais e religiosos da humanidade ou criará novos. Esta espiritualidade ajudará a humanidade a ser co-responsável com o seu destino e com o da Terra, mais reverente diante do mistério do mundo e mais solidária para com aqueles que sofrem. A espiritualidade dará leveza a vida e fará que os seres humanos não se sintam condenados a um mar de lágrimas, mas se sintam filhos e filhas da alegria de viver juntos neste mundo, sob o arco-íris da graça e benevolência divina.

A humanização, a bioética, a transdisciplinaridade e a ecologia profunda, entre outros temas atuais, trazem à sua luz a espiritualidade em suas perspectivas e concepções.

A Religião e a Ciência estão novamente se reencontrando, nas ciências da vida e da saúde bem como em outras ciências. A espiritualidade e suas interfaces nas profissões da saúde causam novas transformações com potencial impacto sobre a saúde física e como possível fator de prevenção ao desenvolvimento de doenças na população previamente sadia, e eventual redução de óbito ou impacto de diversas doenças. (GUIMARÃES; AZEVUM, 2007).

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fortificar nos indivíduos condições positivas, já abalizadas pela ciência como recursos eficazes no combate a doenças.

A discussão da espiritualidade pela metodologia científica vigente pode trazer aos sentidos físicos aspectos além da linguagem atual, caracterizar e conceituar comunicações ainda não completamente codificadas. Trata-se de uma área repleta de desafios, preconceitos e mistérios.

Assim, estudar cientificamente a espiritualidade se torna muito entusiasmante, pois permite adentrar em campos ocultos, almejando os entender, mas na certeza da busca pelo respeito ao ser humano em seus diversos aspectos, estes capazes conjuntamente de influenciar no dinâmico processo saúde-doença.

A religião e a espiritualidade influenciam as atitudes e decisões dos seres humanos, bem como as suas relações e, portanto devem ser valorizadas também na saúde. (KOENIG, 2007). Portanto, nas práticas em saúde, torna-se essencial a discussão desses aspectos. Neste sentido, o ensino e a prática médica presente passam por uma reavaliação e reflexão, em que espaços cada vez maiores deverão ser ocupados pela valorização do ser integral de corpo, espírito e de suas relações com o mundo em toda a sua complexidade.

Identificar e ficar atentos às necessidades espirituais como parte dos cuidados em saúde dos pacientes pode resultar em grande número de benefícios, até mesmo com impacto na qualidade de vida. (KOENIG, 2007; KRISTELLER, et al.,2005; PARGAMENT, 1997).

No processo de tomada de decisão, o sistema de crenças de uma pessoa tem papel fundamental. Estas crenças, incluindo-se as religiosas, afetam a sua percepção e leitura do mundo, o conjunto das alternativas disponíveis e a seleção da ação que irá ser realizada ou não. Os aspectos religiosos ou espirituais devem estar também incluídos em uma reflexão bioética, sempre preservando o caráter plural da discussão e não assumindo uma posição sectária. (GOLDIM, 2007).

A abordagem da religiosidade/espiritualidade na formação do estudante pode oferecer recursos cognitivos ao aluno para resolução de possíveis conflitos que possam aparecer na relação médico-paciente-família, além de valorizar a espiritualidade como instância construtiva do ser humano, desenvolvendo mecanismos de respeito e tolerância para com o paciente. (DANTAS FILHO; SÁ, 2007).

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3. RELIGIOSIDADE, ESPIRITUALIDADE E SAÚDE

“Encontram-se no passado, e se encontram até hoje, sociedades que não possuem ciência, nem artes, nem filosofia. Mas nunca existiu sociedade sem religião.”

(BERGSON, 1978)

Em toda a sua história, o homem busca a religiosidade e a espiritualidade para entender o significado da vida e da morte, a sua presença no mundo, melhorar sua saúde e como ferramenta para lidar com as adversidades e a dor, seja ela física, moral ou espiritual.

A relação entre saúde e religiosidade é muito antiga, presente em mitos gregos, rituais indígenas e nas inscrições bíblicas que influenciaram e ainda vem influenciando a cultura ocidental nos tempos atuais. (BOTELHO, 1991).

As grandes civilizações do passado sempre usaram os conhecimentos religiosos para tratar as doenças, seja isoladamente ou como coadjuvantes às práticas médicas incipientes. Além disso, utilizava-se a espiritualidade, também, para obter melhor qualidade de vida na saúde mental, garantindo paz e harmonia. (SANTOS, 2009).

Estudos antropológicos têm demonstrado que as dimensões religiosas continuam presentes em todas as camadas sociais como parte importante da compreensão do processo de adoecimento e cura. (IBÁNEZ; MARSIGLIA, 2000).

Na antiguidade, as funções de sacerdote e médico eram realizadas pela mesma pessoa e a cura espiritual e física eram administrados pela orientação divina. (NEELY; MINFORD, 2008).

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então muitos monges médicos e vice-versa. As necessidades físicas e espirituais eram abordadas ao mesmo tempo.

Com o avanço das ciências na idade moderna, especialmente com o aparecimento de uma Medicina baseada, exclusivamente, em biologia, física e química orgânica, a associação entre saúde e espiritualidade começou a ser questionada. (SANTOS, 2009).

Assim, no século XVI, o poder da igreja cristã sobre a Medicina começou a declinar, diminuindo gradativamente com o Iluminismo e com a Revolução Francesa. A visão dualista, inerente ao paradigma newtoniano e cartesiano, da ciência moderna separou o mundo da matéria do mundo do espírito, tornou ilegítima a consideração das dimensões religiosas da vida humana na investigação da gênese das doenças e na busca de medidas terapêuticas. A partir de então, as discussões relacionadas à espiritualidade durante um bom tempo foi considerada inapropriada ao estudo das questões ligadas à saúde. As pesquisas indicavam que os profissionais da saúde possuíam uma consciência muito limitada das necessidades espirituais dos pacientes. (PUCHALSKI; LARSON; LU, 2001).

Porém, como observa Nobre (2004), no século XX as revoluções conceituais da Física contribuíram para uma nova visão da realidade, a matéria cedeu lugar à energia, o tempo é variável, o movimento descontínuo, a comunicação é não local, a consciência é capaz de influir nos eventos e selecionar possibilidades e existe a possibilidade real da existência de mais de quatro dimensões em nosso universo e todas as coisas existentes estão interconectadas.

No novo paradigma, tudo é um imenso mar de incertezas até a presença de um observador. A consciência ou o observador são capazes de influir nos eventos e selecionar possibilidades. Não há tempo e espaço até a consciência escolher o caminho a ser traçado, somos então, criadores da nossa realidade.

Os conhecimentos da física quântica passam a ser utilizados nas outras ciências, mudam-se pensamentos e valores. O pensamento passa de auto afirmativo a integrativo, de racional a intuitivo, de reducionista a holístico e de linear a não linear. Os valores também mudam de expansão à conservação, de competição à cooperação, de quantidade à qualidade e de dominação à parceria. (CAPRA; STEINDL-RAST, 1993).

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macrocosmo, e não têm nenhum pudor em reconhecer a complementaridade entre ciência e religião, valorizando a espiritualidade na vida humana. (NOBRE, 2004). De um período de fechamento da Medicina científica em relação à espiritualidade, há hoje uma grande abertura para a sua aceitação. (PESSINI, 2007).

Em 1998, a OMS, durante a 101st session of the Executive Board, eighth

meeting, propôs a emenda de sua Constituição (Resolution EB101. R2), passando a conceituar saúde como um estado dinâmico de completo desenvolvimento físico, mental, espiritual e bem-estar social e não meramente a ausência de doença ou enfermidade (NEELY; MINFORD, 2008). Portanto, percebe-se a importância desta dimensão da assistência ao paciente.

Desta forma, a atenção ao aspecto da espiritualidade se torna cada vez mais necessária na prática de assistência à saúde, pois os profissionais passaram a apreciar a importância da espiritualidade tanto para a saúde e bem-estar de seus pacientes, como para suas próprias vidas. (PUCHALSKI; LARSON; LU, 2001).

A espiritualidade e sua relação com a saúde tem se tornado claro paradigma a ser estabelecido na prática médica diária moderna. O sofrimento espiritual não identificado frequentemente é o culpado em um plano terapêutico mal sucedido. (LIESSI; SANTOS; LOURES, 2010).

Estudos têm revelado que os profissionais de saúde estão cada vez mais sensíveis a essa dimensão do cuidado; entretanto, as habilidades para identificá-la e avaliá-la ainda necessitam de maior conhecimento, esclarecimentos de conceitos, aprimoramento profissional e fundamentação científica por meio da realização de mais pesquisas sobre o tema espiritualidade e religiosidade. (PUCHALSKI; LARSON; LU, 2001).

Há um aumento de mais de 600% das publicações científicas envolvendo espiritualidade e saúde em 10 anos. (STEFANEK; MCDONALD; HESS, 2005). Este aumento pode ser relacionado às manifestações de insatisfações ao modelo da biomedicina, que acabou por impulsionar:

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Os termos religiosidade e espiritualidade são utilizados frequentemente como sinônimos, mas seus significados não são os mesmos. Torna-se necessário neste momento fazer uma clara distinção entre eles, e existem na literatura várias definições acerca de religiosidade e espiritualidade. Isto é importante porque, em uma sociedade secular crescente, muitas pessoas que não têm fé religiosa específica, têm espiritualidade que dá a sua vida significado e propósito (NEELY; MINFORD, 2008).

Lukoff, Lu e Turner (1992) definem religiosidade como adesão a crenças e práticas relativas a uma igreja ou instituição religiosa organizada, e espiritualidade, como a relação estabelecida de uma pessoa com um ser ou uma força superior a qual acredita. Worthington et al. (1996) definem uma pessoa religiosa como aquela que possui crenças religiosas e que valoriza a religião como instituição. Já uma pessoa espiritualizada é aquela que acredita, valoriza ou tem devoção a algum poder superior, mas não necessariamente possui crenças religiosas ou é devoto de alguma.

Para Giovelli et al. (2012), a religiosidade trata de uma relação com a força divina ou sobrenatural; está ligada ao sagrado e a uma doutrina; serve como veículo pelo qual o indivíduo expressa sua espiritualidade, a partir de valores, crenças e práticas rituais que podem fornecer respostas às perguntas essenciais sobre as questões de vida e morte. É a aceitação de determinados conjuntos de valores e suas implicações.

A espiritualidade, por sua vez, possui inúmeras definições. Boff (2001) a relaciona com as qualidades do espírito humano, tais como amor e compaixão, paciência e tolerância, capacidade de perdoar, comportamento, noção de responsabilidade, noção de harmonia, que trazem felicidade para a própria pessoa como para os outros. Saad, Masiero e Battistella (2001) a definem como um sistema de crenças que enfoca elementos intangíveis e que transmite vitalidade e significado a eventos da vida. Tal crença pode mobilizar energias e iniciativas extremamente positivas, com potencial ilimitado para melhorar a qualidade de vida das pessoas.

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Assim, a espiritualidade é uma experiência universal que abrange o domínio existencial e a essência do que é ser humano; não significa uma doutrina religiosa, mas sim uma filosofia do indivíduo, seus valores e o sentido atribuído à vida, não se limitando a qualquer tipo de crença ou prática religiosa. A dimensão da espiritualidade visa a favorecer a harmonia com o universo, esforçando-se para responder a questões sobre o infinito e entra em evidência quando o indivíduo se encontra em situações de estresse emocional, doença física e morte, buscando um sentido para os acontecimentos, a integridade, a paz e a harmonia. Está relacionada com a essência da vida e produz comportamentos e sentimentos de esperança, amor e fé, em uma perspectiva de subjetividade e transcendência, que, pode ou não levar ao desenvolvimento de práticas religiosas. (GIOVELLI et al., 2012).

Portanto, pode-se ter espiritualidade sem religião, mas não pode ter religião sem espiritualidade. A espiritualidade faz com que o significado flua na vida diária.

A espiritualidade é uma questão de confiança naquele supremo pertencer que você vivencia em momentos de pico, de entendimento e percepção profunda. Estes momentos aparecem muitas vezes em situações como mudanças, doenças ou conflitos como uma compreensão súbita ou iluminação (CAPRA; STEINDL-RAST, 1993).

De fato, até o momento, os termos espiritualidade e religiosidade envolvem diversos conceitos. Segundo Koenig (2008), a espiritualidade estaria muito mais relacionada ao cuidado com o paciente do que a religiosidade que, por ser mais facilmente aferida, teria papel importante nas pesquisas científicas.

Apesar dos significados distintos, o certo é que as crenças religiosas e espirituais demonstram serem recursos auxiliares na promoção de saúde e no enfrentamento de acontecimentos estressores, como no processo saúde-doença.

Os conceitos espiritualistas provenientes da nova ciência podem e devem ser aplicados na saúde e na relação médico-paciente. Acreditando que o trabalho vivo1 em ato seja capaz de criar infinitas possibilidades, modificando o objeto, ajudando-o na sua reestabilização, é neste contexto que a espiritualidade se insere. No trabalho em saúde o consumo do produto pelo usuário dá-se imediatamente na produção da

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ação, construindo um espaço intercessor entre o trabalhador e o usuário que sempre existirá nos seus encontros, mas só nos seus encontros e em ato. (MERHY, 2003)

Segundo Dal-Farra e Geremia (2010), excluir completamente os fatores religiosos e espirituais ou desconsiderá-los como parte importante do ser humano pode gerar uma oposição desnecessária, afetando as interconexões entre as diferentes dimensões do ser humano biopsicossocioespiritual. Por outro lado, uma posição conciliatória com o objetivo de construir a sinergia entre os vários elementos, pode contribuir para a saúde e o bem-estar, resultando inclusive em maior aderência aos procedimentos preventivos e terapêuticos.

Segundo Neely e Minford (2008), nos últimos anos tem havido um interesse renovado nas ligações entre a espiritualidade, religião e saúde, refletida em um volume crescente de literatura sobre as relações entre eles. É reconhecido e lembrado que um paciente precisa ser tratado como uma pessoa inteira e não apenas como uma doença ou condição. A pessoa inteira tem dimensões físicas, emocionais e espirituais que interagem umas com as outras e conta para o bem-estar pessoal.

Cada vez mais a ciência se curva diante da grandeza e da importância da espiritualidade na dimensão do ser humano e o tema espiritualidade aparece nas principais revistas e conferências médicas. A interação entre mente e corpo, e a influência da espiritualidade sobre parâmetros de saúde estão amplamente demonstradas na literatura, indicando claramente que os aspectos ligados à espiritualidade auxiliam na promoção de tranquilidade e bem-estar em face das doenças e na prevenção e recuperação de pacientes, havendo uma relação positiva entre envolvimento espiritual e saúde física e mental (BARNES et al., 2000).

Segundo Koenig (2003), verifica-se que, nos momentos de acometimentos físicos e emocionais, as questões espirituais se tornam mais importantes, bem como as relativas ao significado e propósito da vida, assumindo, portanto, maior relevância em países como o Brasil, em que a população idosa está em franco crescimento e a prevalência de doenças crônicas se amplia proporcionalmente.

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As influências da religião dos pacientes, familiares e médicos se expressão no atendimento em saúde, desde a escolha do profissional a ser consultado, nas escolhas terapêuticas e na adesão ao tratamento. Segundo Pessini (2007), há a crença de que ambientes humanizados são fatores de saúde e cura; os valores humanos, que até há pouco tempo não eram tidos como importantes, são retomados no cuidado em saúde.

Vários estudos prospectivos descobriram que aqueles que são mais religiosos têm pressão arterial mais baixa, menor número de eventos cardíacos, melhores resultados após a cirurgia cardíaca e maior sobrevida em geral. (LUCCHETTI, et al., 2012; NEELY; MINFORD, 2008).

Um extenso conjunto de publicações em bases de dados como Medline, PsycLIT, Embase, Ciscom e Cochrane Library têm identificado evidências de que o envolvimento religioso está favoravelmente associado a indicadores de bem-estar psicológico, incluindo a satisfação na vida, a felicidade, menor frequência de depressão e de utilização de drogas de abuso, entre outros. (MOREIRA-ALMEIDA; LOTUFO NETO; KOENIG, 2006).

Culliford (2002) apontou uma extensa lista de 1.200 estudos e 400 revisões sobre correlações estatísticas e estudos longitudinais relacionando benefícios de práticas espirituais em pacientes com doenças cardíacas, hipertensão, doenças cerebrovasculares, imunológicas, câncer, dor e disfunções em geral, comportamentos saudáveis e a prática de exercícios, tabagismo, drogas, síndrome de burnout, relacionamentos conjugais e familiares, psicoses, depressão, ansiedade, suicídio e transtornos de personalidade. Os resultados indicaram claramente que os aspectos ligados à espiritualidade auxiliam na promoção de tranquilidade e bem-estar em face das doenças e na prevenção e recuperação de indivíduos afetados.

Podem, ainda, positivamente, auxiliar no processo saúde e doença, desde comportamentos como respeito ao corpo (menor uso de tabaco, drogas e atividade sexual de risco) e o suporte social da comunidade, até os efeitos psico-neuroimunológicos da prece, da meditação e dos rituais. (LEVIN, 1996).

McCullough et al. (2000), em metanálise de 42 estudos independentes, avaliando cerca de 125.826 participantes, demonstraram que o envolvimento com prática religiosa foi significativamente associado à menor mortalidade.

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indicadores de saúde mental e adaptação ao estresse em pessoas que praticam atividades ditas religiosas. (MOREIRA-ALMEIDA; LOTUFO NETO; KOENIG, 2006).

Considerando que os estados de doença provocam uma ruptura nos aspectos biológicos, psicológicos, sociais e espirituais dos pacientes, as ações de cura deveriam atender a todos esses fatores. (SULMASY, 2002)

Para Saad e Almeida (2008), quando um indivíduo se sente incapaz de en-contrar um significado para os eventos da vida, como a doença, ele sofre pelo sentimento de vazio e desespero. Porém, a espiritualidade oferece um referencial positivo para o enfrentamento e ajuda a suportar melhor os sentimentos de culpa, raiva e ansiedade.

A espiritualidade proporciona crescimento nos vários campos do relacionamento: no campo intrapessoal (consigo próprio), gera esperança, altruísmo e idealismo, além de dar propósito para a vida e para o sofrimento; no campo interpessoal (com os outros) gera tolerância, unidade e o senso de pertencer a um grupo; no campo transpessoal (com um poder supremo), desperta o amor incondicional, adoração e crença de não estar só. (SAAD; ALMEIDA, 2008).

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4. ENSINO MÉDICO E ESPIRITUALIDADE

"Tão importante quanto conhecer a doença que o homem tem,

é conhecer o homem que tem a doença". (Osler, 1849)

4.1. Considerações Históricas

Na antiguidade clássica, a filosofia abraçava todos os campos do saber. Era na Grécia antiga, de todas as ciências humanas, a Medicina, a mais afim das ciências éticas de Sócrates. Dotada de uma visão holística, entendia o homem como um ser de corpo e espírito, atuando em uma série de fatores causais. (JAEGER, 1995).

Na Idade Média, da Filosofia surge um primeiro ramo, a Teologia. Ao final da Idade Média, vinculados à Igreja Cristã, surgem os hospitais, depositários de doentes sem condições de recuperação, obra de caridade e local de institucionalização da educação médica na época. (SCLIAR, 1996).

No século XVI, inicia-se uma fase de exploração dos mistérios do corpo e a Medicina passa a ser tratada como arte e ciência. Com Newton, a Filosofia começa a se fragmentar de forma definitiva e com Descartes a Matemática passa a ser o modelo de todas as ciências que surgiam. O homem começava a ser visto como uma máquina com aparelhos e sistemas concretos.

A Idade Moderna é marcada por um novo papel do hospital, agora, lugar de cura e de recuperação dos enfermos, restabelecendo-os ao seu papel produtivo na sociedade capitalista mercantil da época. (SCLIAR, 1996).

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Nos Estados Unidos, no final do século XIX, difunde-se a necessidade nas escolas médicas de laboratórios, mestres e pesquisadores.

A evolução tecnocientífica em velocidade cada vez maior, principalmente após as Grandes Guerras do século XX, levou a extrema valorização dos aspectos científicos em detrimento dos aspectos humanistas. (DANTAS FILHO; SÁ, 2007).

Na segunda década do século XX, nos Estados Unidos, um estudo encomendado pela Carnegie Foundation denominado relatório Flexner, acaba por se tornar paradigma para o ensino superior, principalmente nas carreiras biomédicas. A nova concepção, a partir de então, era que o ensino médico deveria ser construído em atividades na enfermaria e no laboratório. Propunha, ainda, a divisão do curso em disciplinas básicas e clínicas, a criação dos departamentos e sistemas de créditos. Estas modificações acabam fortalecendo uma visão individualista, tecnicista, biologista e hospitaliza a educação médica (FLEXNER, 1910).

A atenção dos médicos transferiu-se dos pacientes para a doença. Localizaram, diagnosticaram e classificaram patologias. Os hospitais passam a ser centro de diagnósticos, terapia e ensino. Iniciou-se a tendência a especialização. (CAPRA, 2001).

Esta visão organicista promoveu a divisão do ser humano, em nível do corpo, em aparelhos, sistemas e órgãos e influenciou uma ruptura gradual da relação médico-paciente, a medicalização e a supervalorização da tecnologia médica.

O paradigma, até então, da formação dos médicos se caracterizava pelo predomínio da dimensão biológica do homem não havendo espaços significativos para o desenvolvimento da relação profissional/cliente. A doença e as especialidades eram os focos principais, não sendo considerados os determinantes sócios econômicos culturais e políticos que envolvem o processo saúde-doença. (BOGHOSSIAM, 1996).

Este modelo histórico de formação médica mecanicista, fragmentado e reducionista, separou o corpo da mente, o sentimento da razão, a ciência da ética, refletindo em uma prática médica com vínculos superficiais, falta de reforços positivos, pressa, ações corporais ofensivas entre colegas, falhas de comunicação e pouca responsabilização na condução das histórias de vida e registro dos pacientes. (BINZ; MENEZES FILHO; SAUPE, 2010).

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do paciente transformou-se, quase que exclusivamente, em uma intervenção exterior, dirigida à anormalidade biológica, através de drogas de todos os tipos e ações. A atenção do médico desviou-se do paciente para a doença. A intensa valorização dos aspectos tecnológicos e científicos acabou por afastar o estudante de Medicina da formação ética e humanística.

Nos cuidados médicos modernos, a tecnologia pesada passou a ocupar lugar central, promovendo, ainda mais, a especialização, deixando o médico de olhar o paciente como um todo, produto de uma integração do corpo, espírito e mente com seu ambiente social e natural.

Nos anos 90, as discussões sobre o ensino médico no Brasil ganharam maior articulação a partir da criação da CINAEM, renomeada anos depois de Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação das Escolas Médicas, na qual estão representados praticamente todos os órgãos de classe e de ensino médico. A CINAEM foi criada em novembro de 1990, durante a realização do XXVIII Congresso da ABEM com o objetivo de avaliar o ensino médico no país. Para compor esse grupo foram convidadas entidades representativas da comunidade acadêmica e da classe médica.

Em 1994 dados do CINAEM mostravam que a maioria dos cursos no Brasil se dividia em ciclos básico, clínico, pré-clínico e internato, o ensino era departamentalizado e havia pouca integração de conhecimentos. O CINAEM mostrou que o modelo de ensino vigente é centrado na doença, sem visão integradora do indivíduo e da sociedade; que o aluno privilegia os conhecimentos técnicos e em menor grau as habilidades e a relação com o paciente; há baixa titulação docente; predominam as atividades docentes no ensino e na assistência e em menor proporção na pesquisa; há especialização precoce do aluno, decorrente principalmente da associação entre a escola médica e o hospital universitário, cuja organização se baseia na divisão da prática por especialidades e subespecialidades, na utilização acrítica de tecnologia e na concepção de prática da Medicina liberal (COMISSÃO INTERINSTITUCIONAL NACIONAL DE AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS MÉDICAS, 1994).

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qualquer formação didática, com exceção de disciplina eventualmente existente na pós-graduação. Em geral, os bons docentes referem-se a modelos de bons docentes que tiveram em seus tempos de faculdade e que procuram reproduzir. Os alunos, por seu lado, referem-se aos bons docentes como aqueles que possuem nítido interesse em ensinar; estabelecem boas relações com seus alunos; sabem selecionar o conteúdo de ensino relevante para a formação de graduação e se portam de forma compassiva e ética frente aos pacientes e a seus pares. E, claramente, há uma boa dose de paixão embutida nisso. (BALZAN,1996).

4.2. Crise da Sociedade

O mundo depende de você e daquilo que você comunica a outras pessoas. Ele depende daquilo que você acredita que é real”

Goswami, 2000 Na sociedade deste século, seres humanos buscam caminhos de integração e respeito e valorizam a vida espiritual.

Reflexões sobre a humanização, a bioética, a diversidade étnica e sexual e a pluralidade cultural devem estar presentes na formação deste novo médico.

Reencontrar e revalorizar as humanidades nos cursos de Medicina implica em ampliar os conhecimentos capazes de propiciar a crítica, incrementar a construção de recursos de vínculo por esses novos profissionais médicos, incorporar informações sobre as comunidades, cuidados e continuidade da assistência, bem como priorizar as ações de atenção, conforme as necessidades concretas da população. (AMORETTI, 2005).

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A preocupação crescente com as mudanças necessárias na educação em saúde fomenta estudos e debates sobre a formação médica e os caminhos para a mudança. (BRASIL, 2006).

Nos últimos anos, iniciativas governamentais, como as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), o Programa de Incentivo a Mudanças Curriculares nos Cursos de Medicina (Promed) e o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde), demonstram a preocupação em consolidar mudanças na formação dos recursos humanos, conforme a visão moderna de saúde, levando a uma formação crítica e humanista do profissional médico (BINZ; MENEZES FILHO; SAUPE, 2010; LAMPERT, 2004).

As premissas enfatizadas nas novas diretrizes incluem integração entre teoria e prática, pesquisa e ensino e entre conteúdos biológicos, psicológicos, sociais e ambientais do processo saúde-doença, além da inserção precoce e responsável dos estudantes em atividades formativas nos serviços de saúde e o estímulo à participação ativa destes na construção do conhecimento, atitudes estas que instigam uma interação ativa entre estudantes, professores, profissionais de saúde e usuários. (NOGUEIRA, 2009).

Na realidade da atenção em saúde, surgem as questões da relação entre as necessidades do sistema de saúde histórico. A LDBEN (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional) define dentro de suas finalidades o estímulo ao conhecimento dos problemas do mundo atual (Nacional e Regional) e a prestação de serviço especializado à população, estabelecendo com ela uma relação de reciprocidade. (MITRE, 2008).

O Conselho Nacional de Educação através da resolução CNE/CES Nº 4 de 2001, institui em seu artigo 3º:

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4.3. O novo modelo

“Ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho; as pessoas se educam entre si, mediatizadas pelo mundo” (Paulo Freire, 1987)

Assim, frente ao desafio de aperfeiçoar o cuidado do ser humano nos estados de saúde e doença, respeitando-o como um ser integral, muitas faculdades de Medicina têm incluído atividades relacionadas à importância da espiritualidade para a saúde e o bem-estar das pessoas.

No ensino médico, a excessiva valorização dos aspectos tecnológicos e científicos da profissão, que ganhou força extraordinária após o Relatório Flexner, acabou por afastar brutalmente o estudante de Medicina da formação ético-humanística, que além de relegada a um segundo plano, não raro era considerada supérflua ou até ridícula. Não há dúvida, porém, que a crença das pessoas afeta radicalmente sua visão de mundo e influencia desse modo todas as suas atitudes e decisões. Essa influência pode facilitar ou dificultar suas relações interpessoais, incluída aí a relação médico-paciente. (DANTAS FILHO; SÁ, 2007, p. 273).

Em resposta a esta necessidade, a Associação de Faculdades de Medicina Americanas e o Instituto Nacional de Pesquisa no Cuidado à Saúde, reconhecendo a importância da bioética e o aumento de evidências sobre a interconexão entre espiritualidade e saúde, têm patrocinado conferências para praticar o desenvolvimento curricular desta temática nos cursos de Medicina nos Estados Unidos. (PUCHALSKI; LARSON; LU, 2001).

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sentidos últimos da existência individual e coletiva”, como bem lembra Vasconcelos (2009, p. 325).

Os portadores de doenças graves vivem crises subjetivas intensas e mergulham com profundidade em dimensões inconscientes da subjetividade. É nessa elaboração subjetiva profunda que são construídos novos sentidos e significados para suas vidas, capazes de mobilizá-los na difícil tarefa de reorganização do viver exigida para a conquista da saúde. Há uma milenar tradição do uso da espiritualidade no enfrentamento dos problemas de saúde que pode ser resgatada, mas que necessita ser atualizada para as atuais características da sociedade. (VASCONCELOS, 2009, p. 325).

A inserção de temas envolvendo espiritualidade e religiosidade no curso de Medicina seguem os caminhos dessa visão mais ampla de ser humano, que supera os paradigmas tecnocientífico e comercial-empresarial da Medicina atual, integrando o paradigma humanitário-solidário, a partir do qual o paciente é visto, além de exclusivamente por sua biologia, também por sua biografia, (MARTIN, 1998). É a busca de um conceito ainda mais global de saúde, incorporando ao clássico conceito da OMS de “bem-estar físico, mental e social” (SILVA, 1998) o “bem-estar espiritual”. (MARTIN, 1998).

Neste novo século, o avanço tecnológico, as reflexões sobre as metodologias de ensino e as publicações científicas e discussões da espiritualidade sobre a saúde humana são repercussões das alterações do mundo no ensino em saúde. (DAL FARRA; GEREMIA, 2010).

Sobre as metodologias, vivemos um momento do ensino e aprendizado em transição de um modelo tecnocrático, depositário e fragmentado para um novo modelo construído por valores, em conjunto e integralista, permitindo a correlação entre o significado e a contextualização do conhecimento em questão.

Desta forma, o processo de ensino e aprendizagem passa a valorizar o desenvolvimento de habilidades técnicas cognitivas e atitudinais, através da busca ativa, autoformação, articulação do conhecimento, raciocínio crítico, habilidades de comunicação, saber atuar em equipe, discussão bioética, étnica, diversidade sexual e transcultural.

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As situações didáticas são pontos fundamentais para desencadear o processo de aprendizagem. O docente, ao criar condições para que o aluno possa sentir/pensar/agir, promove a integração dos conteúdos, dos alunos entre si, e a relação professor/ alunos. (SANTOS; TENÓRIO; KICH, 2011, p. 61).

De acordo com Dellaroza e Vannuchi (2005) existem alguns princípios para a construção de um currículo integrado, são eles: totalidade, interdisciplinaridade, relação entre teoria e prática, e deve ser considerado um processo permanente aberto para discussão, crítica, avaliação, sendo reconstruído sempre. Nesse sentido, deve ser valorizada a integração do ensino, do serviço e da comunidade, assim como a problematização (exercer uma análise crítica sobre o problema) e a aprendizagem significativa (o mais importante é aquilo que o aprendiz já sabe).

É preciso que a ação educativa esteja pautada na vivência dos aprendizes, oportunizando a elaboração de novos conceitos, a resolução de problemas e a tomada de decisões, tanto individual como coletivamente. Assim, dizemos que esse processo tem como resultados as aprendizagens significativas desses alunos. (SANTOS; TENÓRIO; KICH, 2011, p. 62)

Módulos interdisciplinares substituem a função administrativa das disciplinas, e devem garantir habilidades cognitivas (saber), psicomotoras (saber fazer) e atitudinais (saber ser e saber conviver) necessárias para o alcance de desempenhos e competências. (DELLAROZA; VANNUCHI, 2005). Na formação em saúde, surge também o conceito de aprender fazendo, ação-reflexão-ação presente ao longo de toda a carreira.

O armazenamento e entendimento das informações se processam na relação estabelecida entre o significado e o contexto, o que já se sabe, para que se serve, e aonde se insere em minha realidade. Portanto, na aprendizagem significativa se estabelece a relação destes dois processos: o da continuidade, relações estabelecidas com o conhecimento prévio e o da ruptura, ao problematizar a realidade por sujeito crítico e reflexivo. Ao problematizar o discente, torna-se responsável por sua comunidade e sociedade real, um agente de transformação social, pois mobiliza discussões éticas, políticas e sociais.

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O conhecimento surge da intenção e desejo da busca de resposta à própria realidade da vida humana. Surge como trabalho morto2 da ação comportamento.

Esta relação realidade, pergunta, conhecimento, comportamento e nova realidade se retroalimentam dentro de realidades que se encontram, se transformam, se criam e recriam-se. E nestes intercruzamentos de realidade é que os preceitos bioéticos surgem. (PEGORARO, 2002.).

Em nosso País, o Ministério da Saúde, aprovou a Portaria n. 1820, de 13 de agosto de 2009 (BRASIL, 2009), que “dispõe sobre os direitos e deveres dos usuários da saúde nos termos da legislação vigente” (art. 1º), que passam a constituir a “Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde” (art. 9º), publicada no Diário Oficial da União, 14 de agosto de 2009. O artigo 4º e parágrafo único afirmam:

Toda pessoa tem direito ao atendimento humanizado e acolhedor, realizado por profissionais qualificados, em ambiente limpo, confortável e acessível a todos. Parágrafo único: É direito da pessoa, na rede de serviços de saúde, ter atendimento humanizado, acolhedor, livre de qualquer discriminação, restrição ou negação em virtude de idade, raça, cor, etnia, religião, orientação sexual, identidade de gênero, condições econômicas ou sociais, estado de saúde, de anomalia, patologia ou de deficiência, garantindo-lhe: III – nas consultas, nos procedimentos diagnósticos, preventivos, cirúrgicos, terapêuticos e internações, o seguinte: (...); d) aos seus valores éticos, culturais e religiosos; (...); g) o bem-estar psíquico e emocional; X – a escolha do local de morte; (...) XIX – o recebimento de visita de religiosos de qualquer credo, sem que isso acarrete mudança na rotina de tratamento e do estabelecimento e ameaça à segurança ou perturbações a si ou aos outros.

A Associação Médica Mundial, na “Declaração sobre os Direitos do Paciente” (UNESCO, 2005), diz que “O paciente tem o direito de receber ou recusar conforto espiritual ou moral, incluindo a ajuda de um ministro de sua religião de escolha”. A dimensão da espiritualidade é fator de bem-estar, conforto, esperança e saúde, e precisamos urgentemente de que nossas instituições de saúde se organizem no atendimento desta necessidade humana.

Em 1993, menos de cinco escolas médicas dos Estados Unidos tinham a disciplina de religião/espiritualidade. Em 1994, apenas 13% das escolas médicas dos EUA ofereciam ensino sobre questões religiosas e espirituais aplicada à

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Medicina (17 das 126 escolas médicas americanas ofereciam cursos sobre Espiritualidade). Atualmente a maioria destas escolas oferecem em seus cursos tal temática. Os médicos educadores americanos tornaram-se mais conscientes de que a espiritualidade é um componente integral da assistência integral ao paciente e passaram a se esforçar para formar médicos mais compassivos. Os estudantes de Medicina estão sendo ensinados a atender às expectativas dos pacientes em respeitar e incorporar as suas perspectivas espirituais em seus cuidados. (NEELY; MINFORD, 2008).

Dados da Harvard Medical School de 2007 apontam que mais de 100 escolas médicas americanas das atuais 141 (70,9%), já possuem cursos de espiritualidade na Medicina (FORTIN; BARNETT, 2004). Da mesma forma, instruções a respeito de espiritualidade nos programas americanos de residência médica em psiquiatria já são obrigatórias. (PUCHALSKI; LARSON; LU, 2009).

Neely e Minford (2008) realizaram um estudo no Reino Unido objetivando investigar a natureza do ensino sobre a espiritualidade no currículo de graduação em Medicina, bem como verificar como os estudantes de Medicina são preparados para identificar as necessidades espirituais dos pacientes. Concluíram que apesar de 59% das escolas médicas do Reino Unido fornecer alguma forma de ensino sobre a espiritualidade, há pouca uniformidade entre as escolas médicas no que diz respeito ao conteúdo, forma, quantidade ou forma de ministrar o ensino.

No Canadá, pesquisa realizada pelo George Washington Institute for Spirituality and Heath (GWISH) em 2001 demonstrou que haviam 4 escolas médicas com cursos de espiritualidade, 24% das 17 escolas. Em decorrência disso, foi criado o Gwish Canada Initiative em 2004, envolvendo líderes de 12 escolas médicas canadenses (70% do total) para implementação maciça de cursos de espiritualidade na Medicina do Canadá.(NEELY; MINFORD, 2008).

Pouca informação existe sobre o ensino de Espiritualidade e Saúde nas Faculdades de Medicina na América Latina, Ásia, Austrália ou África. (BORGES et al., 2012).

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padronizados e poucas universidades oferecem oportunidade para os estudantes realmente praticarem o que eles aprenderam.

No Brasil, a primeira instituição a oferecer um curso a respeito do assunto foi a Universidade de Santa Cecília, localizada em Santos, Estado de São Paulo, no ano de 2002. Contudo, a primeira faculdade a promover a inserção do tema no currículo acadêmico foi a Universidade do Ceará, somente em 2006. Nos anos posteriores, outras Instituições, como as Universidades Federais de São Paulo, Rio Grande do Norte e do Triângulo Mineiro, passaram a oferecer algum curso relacionado à espiritualidade, todos no currículo de optativas. (LUCCHETTI; GRANERO, 2010).

O Brasil conta também com grupos de pesquisa especializados em espiritualidade e saúde, como o PROSER (Programa de Saúde, Espiritualidade e Religiosidade) do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, o NUSE (Núcleo Universitário de Saúde e Espiritualidade) da Universidade Federal de São Paulo e o NUPES (Núcleo de Pesquisa em Espiritualidade e Saúde) da Universidade Federal de Juiz de Fora, os quais são responsáveis por grande parte das publicações relacionadas à Medicina e espiritualidade no Brasil.

Lucchetti et al.(2012) afirmam que atualmente há um consenso geral entre os médicos e os professores das escolas médicas sobre a importância da espiritualidade na saúde, sendo necessária então, a inserção do tema no currículo das Faculdades de Medicina.

Verifica-se, neste processo, a inclusão de atividades variadas e com diferentes objetivos em cada instituição. Fortin e Barnet (2004) ao estudarem as formas de inclusão da espiritualidade em atividades acadêmicas nas Faculdades de Medicina, constataram que elas são estruturadas de diferentes formas, tais como palestras, discussões em pequenos grupos, entrevistas padronizadas de pacientes, acompanhamento de capelães e leituras específicas.

É muito importante que as inter-relações entre a espiritualidade e saúde sejam efetivamente contempladas na formação dos médicos e demais profissionais de saúde, abordando-se, inclusive práticas educativas.

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Mesmo que muitas vezes não seja verbalizada nas interações dos pacientes com os médicos, a influência das questões espirituais estará sempre presente, compondo, em maior ou menor grau, a subjetividade do indivíduo, segundo uma perspectiva ética de abordagem. Deste modo, a inserção da espiritualidade no ensino na área da saúde representa considerá-la uma variável importante na constituição dos seres humanos, assim como os demais aspectos que os compõem como sujeitos, objetivando aumentar o conhecimento sobre as diversas religiões, desenvolvendo mecanismos de respeito e tolerância para com o paciente visto como ser integral e autônomo; revisar os conceitos pessoais dos estudantes, promovendo um exercício de busca de soluções para os possíveis enfrentamentos entre os conceitos (e preconceitos) próprios e os do paciente. (DANTAS FILHO; SÁ, 2007).

As abordagens em educação devem ser realizadas de forma gradual e com uma inserção harmoniosa com as demais disciplinas. É fundamental que os médicos respeitem os aspectos espirituais dos pacientes diante da importância que representam na vida das pessoas.

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5. PEDIATRIA E ESPIRITUALIDADE

“A Pediatria não é uma área de atividade dentro da Medicina: ela é toda a Medicina.” (Pedro de Alcantara, 1979)

A Pediatria é o campo da Medicina que atende os problemas da criança, isto é, do ser humano em seu período de desenvolvimento, da fecundação à puberdade e tem como condição de existência e validade o amor à criança, o interesse por seu bem estar presente e futuro, o prazer de sua presença e na sua contemplação. (ALCANTARA, 1979)

A criança nos abre ao transcendente, a gratuidade de amor, à expansão da existência para níveis que nos sobrepassam/transcendem, provocam em nós cumplicidades e a consciência de unidade.

No processo do trabalho do pediatra, o objeto, a criança, não é só de corpo, como também de espírito e relações. Muitas vezes, a criança não se expressa pela linguagem codificada surgindo na comunicação símbolos e linguagens únicas. Os sentidos devem ser ampliados, devendo o pediatra estar atento a todos os sons e a todos os silêncios, e utilizar de outros instrumentos fora os oriundos da física clássica como termômetros, estetoscópios e aparelhos de pressão.

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Em consequência de ser a Medicina da pessoa em vulnerabilidade, a Pediatria condiciona, mais do que outros ramos da Medicina, modalidades de espírito e de conduta do médico.

Pela susceptibilidade emocional da criança, a Pediatria induz ao médico a gentileza e à doçura no seu trato, a fim de conquistá-la para sua propedêutica. Essa conduta, entretanto, deve ser a exteriorização de um sentimento profundo, que é a atitude espiritual e afetiva do pediatra frente à vulnerabilidade da criança e da injustiça dos males que a acomete. (ALCANTARA, 1979).

E exatamente por tratar de um período de vida da pessoa em que esta se encontra extremamente vulnerável que se torna muito importante o reconhecimento da espiritualidade no cuidado a saúde, como fonte de fortalecimento para o enfrentamento da doença, incentivando comportamentos e práticas saudáveis e fornecendo interações sociais.

A literatura pediátrica contém poucas pesquisas sobre as relações entre a prática pediátrica e a espiritualidade (BARNES, et al., 2000; GROSSOEHME et al., 2007). Em recente busca na base Medline, entre os períodos de 2002 a 2013, foram encontradas 22 referências da relação espiritualidade e pediatria. Historicamente, as primeiras publicações na literatura científica relatavam os efeitos negativos desta relação, incluindo as objeções religiosas aos cuidados médicos, autoritarismo, castigo, sentimentos de culpa ou indignidade. (ARMBRUSTER ; CHIBNALL ; LEGETT, 2003).

Somente a partir do final do século XX é que algumas publicações passaram a explorar o potencial positivo dos efeitos da espiritualidade no cuidado com a criança, incluindo diversos mecanismos como: respeito ao corpo; menor uso de tabaco, drogas e risco sexual; suporte social das comunidades religiosas; e os efeitos psiconeuroimunológicos da prece, meditação e dos rituais. Da mesma forma, outras publicações demonstram os efeitos das filosofias de vida nas tradições espirituais e religiosas como sentimentos de otimismo, amor e esperança e os significados do conforto espiritual nas crises existenciais como no final da vida. (ARMBRUSTER ; CHIBNALL ; LEGETT, 2003; LEVIN, 1996).

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responsáveis, comunidade e sistema de saúde, que são inseparáveis no momento da tomada de decisão e manejo terapêutico.

E este atendimento é fortemente afetado por crenças e valores, desigualdades sociais, avanços tecnológicos e questões morais da sociedade, resultando em vivências que, muitas vezes, são geradoras de dilemas éticos e espirituais. (GUEDERT; GROSSEMANN, 2011).

Segundo Alcantara (1979), o pediatra deve estar atento a problemas orgânicos e psíquicos, em caráter preventivo e curativo. Cada um destes quatro aspectos deve ser considerado isoladamente e em suas múltiplas interdependências, à luz da constituição da criança; à luz das condições econômicas; das condições espirituais da família; e das condições do ambiente físico (clima, casa e terreno, agasalhos, condições propícias a acidentes), tudo isso em caráter evolutivo, conforme o progressivo desenvolvimento da criança, contribuindo para a formação de uma pessoa física e mentalmente sadia e socialmente útil.

As crianças, em particular, não distinguem espiritualidade e religião e cada vez mais jovens têm ideias claras sobre realidade divina, fé e reza. (COLES, 1990).

Eisemberg et al. (1998) concluíram que o senso de espiritualidade na criança ou o engajamento em alguma comunidade religiosa pode promover um enfrentamento estratégico positivo frente à doença e que diferentes tradições religiosas possuem diferentes interpretações do processo saúde-doença.

Segundo Barnes et al. (2000), as tradições religiosas podem desempenhar vários papéis na vida das crianças, como por exemplo, fornecer estrutura para o desenvolvimento moral e para a socialização da criança em diferentes ideais de personalidade e comportamento e influenciar suas ideias a respeito da doença, do sofrimento, enfrentamento e cura, questões estas de grande relevância para a prática pediátrica e bem-estar infantil.

Nos Estados Unidos, cerca de 100 milhões de crianças recebem anualmente atendimento pediátrico, sendo que estudos demonstram que a religião e a espiritualidade parecem influenciar os pediatras na abordagem dos cuidados às crianças (CATLIN et al., 2008).

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pediatras sobre religiosidade e espiritualidade e como estas poderiam influenciar no cuidado aos seus pacientes. (CADGE; ECKLUND, 2009).

Em um estudo feito por Siegel et al. (2002), constatou-se que os pediatras exercem um importante papel no desenvolvimento das crianças e de suas famílias, bem como a religião e espiritualidade parecem influenciar a conduta dos pediatras quando do atendimento. Estes autores realizaram um estudo com pediatras e residentes em pediatria, e verificaram que apesar da maioria dos pesquisados acreditarem que a fé desempenha um papel na cura dos pacientes, apenas alguns deles perguntam sobre espiritualidade e religiosidade a seus pacientes. Verificaram, ainda, que os pesquisados com forte orientação religiosa e/ou espiritual demonstraram atitudes mais positivas para incorporar a religião e a espiritualidade em sua prática pediátrica.

Os profissionais de saúde devem reconhecer o sofrimento da criança e dos membros de suas famílias ouvindo as suas histórias, proporcionando reflexões e auxiliando-os a encontrar seus significados de vida. Devem então identificar a necessidade de cuidado espiritual da criança e de sua família incorporando as questões éticas e oferecendo apoio.

O pediatra tem o papel de facilitar o acesso aos recursos espirituais, assim como reconhecer e aceitar as práticas espirituais das famílias sob seus cuidados. A espiritualidade pode ser usada como estratégia de enfrentamento para amenizar o estresse vivido com a doença e oferecer conforto espiritual. (CALLAGHAN, 2005).

Ebmeier et al. (1991) sugerem que a espiritualidade pode desempenhar um papel importante na vida diária de uma criança, que pode intensificar durante períodos de crise, como períodos de problemas de saúde, que envolvam experiências traumáticas (dano físico ou emocional), eventos de risco de vida (doença e morte).

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desenvolvimento. (McSHERRY; SMITH, 2005). Portanto, é necessário compreender as formas que as crianças podem expressar sua espiritualidade.

A necessidade de significado e de integração afetiva, unida à capacidade simbólica própria dos primeiros anos levam, a criança, ao limiar da religiosidade, tornando-a particularmente disponível para a reflexão e relação com o transcendente.

A constatação de que existe, aparentemente, uma associação positiva entre práticas espirituais e saúde nos faz naturalmente pensar em por que, como, quando e o que devemos abordar em espiritualidade na prática clínica. A provisão do cuidado espiritual pelo pediatra caracteriza-se como um desafio, dentre os papéis que lhes são atribuídos, ressaltam-se o estar presente, as habilidades de saber ouvir às demandas dos familiares e respeitar suas crenças e valores. (PAULA; NASCIMENTO; ROCHA, 2009).

Desta forma, a espiritualidade e crenças pessoais dos pacientes necessitam ser inseridas no entendimento da prática clínica do pediatra (GIOVELLI et al., 2012). Trazer, portanto, a espiritualidade à discussão da prática do pediatra faz parte da ética dos seres vivos, o respeito e o reconhecimento do outro.

Em todos os encontros clínicos, os pediatras podem ou não identificar a tradição espiritual e religiosa particular dos seus pacientes e familiares, e podem exibir diferentes graus de receptividade à dimensão espiritual nos seus cuidados. (BARNES et al., 2000).

Um estudo realizado por Stern, Canda e Doershuk (1992) examinou a relação entre saúde, religião e espiritualidade das crianças e evidenciou que práticas religiosas e espirituais são comuns e muitas vezes percebida pelas crianças como úteis. O senso de espiritualidade e/ou envolvimento de uma criança em uma comunidade religiosa pode contribuir para o enfrentamento positivo de uma determinada doença, já que elas passam a se sentir apoiadas, assistidas frente às experiências difíceis, especialmente nos casos de medo noturno, problemas psiquiátricos, hospitalização, deficiência, câncer, doenças terminais. (BARNES et al., 2000).

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6. OBJETIVOS

6.1. Gerais

Comparar a religiosidade/espiritualidade dos pediatras e dos residentes em pediatria, e como isso influencia a sua prática clínica.

Identificar a percepção dos pediatras e residentes em pediatria quanto às necessidades espirituais das crianças atendidas e de seus familiares.

6.2. Específicos

Correlacionar os aspectos da religiosidade/espiritualidade na prática do pediatra e dos residentes.

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Tabela 1. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo o Gênero e Etnia. Sorocaba, 2012
Tabela  2.  Distribuição  dos  Residentes  e  Pediatras  segundo  idade  e  tempo  de  formado
Tabela 3. Distribuição dos Residentes e Pediatras segundo Religião e a sua percepção quanto  à própria religiosidade
Tabela  4.  Distribuição  dos  Residentes  e  Pediatras  segundo  a  Religiosidade  Organizacional  e  não organizacional
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