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Educação e região. Práticas anisianas e freyreanas fazem a educação do Recife/PE (1957-1964)

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KELMA FABÍOLA BELTRAO DE SOUZA

EDUCAÇÃO E REGIÃO. PRÁTICAS ANISIANAS E FREYREANAS FAZEM A EDUCAÇÃO DO RECIFE/PE (1957-1964)

RECIFE-PE 2013

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KELMA FABÍOLA BELTRAO DE SOUZA

EDUCAÇÃO E REGIÃO. PRÁTICAS ANISIANAS E FREYREANAS FAZEM A EDUCAÇÃO DO RECIFE/PE (1957-1964)

Tese apresentada ao curso de Doutorado em Educação do programa de Pós-Graduação em Educação pela aluna Kelma Fabíola Beltrão de Souza como requisito final para aquisição do título de Doutora em Educação, da área de concentração Teoria e História da Educação, sob a orientação do Professor Doutor Flávio Henrique Albert Brayner.

RECIFE-PE 2013

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Andréia Alcântara, CRB-4/1460

S729e Souza, Kelma Fabíola Beltrão de.

Educação e região. Práticas anisianas e freyreanas fazem a educação do Recife/PE (1957-1964) / Kelma Fabíola Beltrão de Souza. – Recife: O autor, 2013.

233 f.: il. ; 30 cm.

Orientador: Flávio Henrique Albert Brayner.

Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Pernambuco, CE. Programa de Pós-graduação em Educação, 2013.

Inclui Referências e Anexos.

1. Educação – História. 2. Educação - Práticas de pesquisa e ensino. 3. Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife. UFPE - Pós-graduação. I. Brayner, Flávio Henrique Albert. II. Título.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

EDUCAÇÃO E REGIÃO. PRÁTICAS ANISIANAS E FREYREANAS FAZEM A EDUCAÇÃO DO RECIFE/PE (1957-1964)

COMISSÃO EXAMINADORA

________________________________________________ Prof. Dr. Flávio Henrique Albert Brayner

1º Examinador/Presidente

________________________________________________ Profª. Drª Irenilda de Souza Lima

2ª Examinadora

_________________________________________________ Profª Drª Janete Maria Lins de Azevedo

3ª Examinadora

_________________________________________________ Profª Drª Maria Thereza Didier de Moraes

4ª Examinadora

_________________________________________________ Prof. Dr. André Gustavo Ferreira da Silva

5º Examinador

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A tantos Anísios, Gilbertos e Marias que a história da educação do

Recife tratou cuidadosamente de excluir

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AGRADECIMENTOS

A Hugo, emoção, razão, práticas do meu discurso, da minha vida. Que mesmo não compreendendo integralmente o significado deste trabalho, soube respeitar meus momentos solitários na escritura do mesmo. Que um dia, ao crescer, ele possa compreender a importância da educação na sua vida, que ele possa entender as minhas cobranças em relação a leituras, tarefas, que ele possa perceber que o mínimo, mas o melhor que eu posso deixar pra ele hoje é a Educação. Que um dia ele possa ler esta tese e compreender que Anísio Teixeira com sua sabedoria e ações deixou um legado consistente que permeou e permeia a educação que todos nós vivenciamos. Que ele possa ler Gilberto Freyre e identificar a genialidade deste “inventor” do Nordeste. Hugo, eu te amo incondicionalmente.

A Val que sofreu com minhas angústias, que participou das minhas dúvidas, que ouviu meus textos, que opinou quando necessário, que se calou também quando necessário, que mesmo compreendendo que este Nordeste é inventado, vive este Nordeste. Se não fosse você, um dos que mais acreditam no que posso fazer, eu não chegaria aqui. Muito obrigada amor da minha vida.

A Flávio que possibilitou, acreditou, deixou, permitiu mas, principalmente, acendeu meus questionamentos. Com certeza suas produções me tornaram e tornaram a minha pequisa mais estimulante e desafiadora. Suas conversas, aulas, textos, artigos, provocaram, despertaram muitos caminhos, descaminhos, interrogações...eu tenho uma felicidade imensa de poder ter você como meu orientador. Você me mostrou que não existe fórrmula para essa relação, existe desprendimento e vontade, por isso discordou, concordou, conversou, brincou, ironizou, desgostou, gostou, puxou as orelhas...Incondicional, absoluto, você é Flávio Brayner.

A Irenilda Lima minha maior gratidão a você, que nunca deixou de acreditar, empolgar, escutar, dividir e de me orientar em tantas coisas importantes nesta vida. Você é um exemplo de gente, de amiga, de professora, de mulher. Eu te adoro.

A Durval Muniz de Albuquerque Junior, minha enorme gratidão, por ter-me possibilitado ver o Nordeste de uma outra forma. Seja no começo, com o curso: Nordeste: região, identidade ou diferença, e depois com as suas empolgantes aulas

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e com os seus empolgantes textos. Bem, Foulcault não é fácil, mas prefiro me arriscar. Sou grata a você pelo resto da vida por você ter me apresentado ao mundo foucaultiano, por você ter-me mostrado o mundo freyreano, por você ter me mostrado um pouco do seu mundo. Espero ter conseguido tecer nos meus textos, na minha tese algo significativo diante das suas perspectivas deste “Nordeste inventado”. Um grande beijo e muito obrigada.

A Antônio Montenegro, que me mostrou muitas coisas interessantes desta jornada acadêmica. Tenho muita gratidão a você que sempre confiou nas possibilidades de uma “professora primária” tentando ‘investir’ no mundo da história, no mundo da ciência, no mundo acadêmico.

A Teresa Didier, mulher inteligentíssima, generosíssima, que conheci neste caminho da pós-graduação. Cuidadosa, zelosa, criteriosa nas apreciações do projeto de tese. Sou mais que grata a você.

A André, pelas interessantes e significativas ‘cutucadas’ na qualificação, foi muito interessante como você questionou alguns contornos da tese. Muito obrigada, meu querido.

A Janete Azevedo, maior honra de ter você na minha banca avaliadora, seu conhecimento na área educacional trouxe contornos relevantes para melhoria do estudo. Muito obrigada, minha querida.

À enorme gentileza de Marcondes Oliveira da Fundação Joaquim Nabuco (coordenadoria de microfilmagem. Prédio Antiógenes Chaves), sempre prestativo e cordial em oportunizar os documentos filmografados necessários para elaboração da tese.

A Myrtha Carvalho pelo grande cuidado e gentileza na revisão do texto final da tese.

A Vadinho e Nazaré, “painho” e “mainha”, que nunca deixaram de se desdobrar em esforços para que eu pudesse ter uma educação de qualidade, para que a partir desta educação pudesse me tornar um pessoa do bem. Amo vocês do meu jeito.

A Breno e a Mariana, adolescentes/irmãos de Hugo, um pouco meus filhos. Esta tese também é para vocês meu amores.

A Luany Beltrão, amiga pra todas as horas, todos os minutos, todos os segundos, amiga que escuta, que muitas vezes ligava ou mandava e-mails perguntando: cadê você? Está chateada? E eu morria de rir. Lu, você não sabe o

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quanto eu a respeito e tenho orgulho de ser prima, de uma menina batalhadora que também “carrega” o ofício de professora “primária”. Adoro-a.

A Irmã Beltrão, a Seu Beltrão e a Euler Beltrão, todos na minha “memória”. Sei que vocês seriam os mais orgulhosos da família neste momento, pois sempre cobraram o melhor que cada um podia dar nos estudos e pesquisas. Nunca esquecerei de muitas das coisas que vocês fizeram ou disseram. Muitas saudades.

A Tia Rosilda muitas saudades, muitas lembranças e um amor eterno.

A todos meus familiares: irmãos, primos, tios, tias, cunhados, sogro, sogra que de alguma forma entenderam e torceram também. E aos pequenos: Miguel, Vinicius, Maria Clara, Bárbara e Samara. Estudem muito!

A Ana Carolina (que coincidentemente é sobrinha-neta de Ruy de Ayres Bello), obrigada por tudo. Por ficar de orelha coçando em escutar, por me apressar, por acreditar, por dividir tantas coisas que achamos injustas...Você foi uma aluna ótima que eu posso dizer que vi crescer enquanto pesquisadora, enquanto profissional. Tenha certeza de que você alcançará seus objetivos. Minha gratidão e respeito. Adoro-a.

A Tarcísia Travassos, Tatá, meu maior respeito como profissional nos cuidados da correção para a qualificação da Tese. Mas também meu maior carinho por dividir tantos momentos difíceis e também por rirmos e dividirmos tantas coisas semelhantes neste mundo da mulher que estuda, trabalha, tem filhos, marido e família.

A Helena, Marcílio, Kiko e Talita, amores que ‘conheci’ neste caminho tão árduo e que me ajudaram de tantas formas.

Aos especiais: Seu Oscar, D. Madalena, Iêda, Márcia e Sérgio. Sei que estão todos na torcida e fico muito feliz por esta torcida. Fiquem certos de que vocês também contribuíram no caminhar. Minha gratidão.

Aos meus alunos da Faculdade Metropolitana, que compartilharam tantas experiências, tantas conversas, tanto aprendizado, tanto apoio...mas também tiveram um enorme respeito pelo meu trabalho. Adoro vocês! Diego, Xavier, Euris, Vírginia, Edriana, Fabrina, Daniel, Michel, Mônica, Edgar, Salete, Luciclere, Alexandra, Willigton, Cibele, Ligia, Abraão, Mirlane e tantos outros.

A Ana Paula Donato, aluna cuidadosa, esforçada, disposta, disciplinada, que me ajudou muito e teve a disposição de transcrever cuidadosamente a Qualificação

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da tese, ouvindo pacientemente minhas angústias, minhas dúvidas, erros e acertos. Muito obrigada Aninha.

A todos da Faculdade Metropolitana, daqueles que cuidam da limpeza da sala aos que cuidam do acadêmico (Luciana Gondim) e da mantenedora (Manoel Monteiro). Em especial a Lara Calado, Carmen Fonseca e Priscila Marques, companheiros de jornada que muito me respeitam. Sou eternamente grata pela acolhida.

A todos que fazem parte do programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Às meninas da Secretaria; aos professores que me auxiliaram com suas disciplinas e aos colegas com quem comecei esta trajetória acadêmica em 2009.

Aos professores dos programas de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), pela oportunidade que tive de cursar algumas disciplinas específicas em História, necessárias para a construção desta tese.

Não sei que nome dar, são tantos: Deus, Zeus, Papai do Céu, Ele, energia, força...mas só sei que esteve perto, presente, junto, amparando, segurando...tantos medos, dores, angústias, imcompreensões, acertos, barreiras, tantas madrugadas, manhãs, noites de pura solidão...Tudo isso só seria possível se existisse algo assim: inexplicável.

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A verdade de hoje não será verdade amanhã e a

verdade de amanhã já não será talvez verdade um

pouco mais adiante.

Absoluto é uma pura construção mental, nascida na

cabeça do homem como um contraste entre o que é e

o que lhe parecia dever ser.

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RESUMO

Este estudo mostra outra possibilidade de abordagem da história da educação no Recife durante os anos 1957- 1964. A partir de documentos que foram encontrados, a pesquisa identifica a presença de um projeto de educação regional, instituída a partir dos autores consagrados Anísio Teixeira e Gilberto Freyre. Esses dois ‘autores’, no sentido de Foucault, já tinham seus discursos instituídos, pois produziam significados diante de outros textos e discursos. O estudo concluiu que a proposta de educação regional foi possibilitada através da criação do Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife, inaugurado em Recife em 1957. Dirigido por Gilberto Freyre e vinculado ao INEP, o Centro proporcionou pesquisas, estudos, cursos, palestras, conferências, seminários, simpósios, a tentativa de idealizar uma “ciência” da educação. No entanto, o que ele realmente fez, foi uma educação regional, um modelo de educação também presente na Universidade do Recife e no MCP.

Palavras-chaves: educação; região; Anísio Teixeira; Gilberto Freyre; Centro

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RÉSUMÉ

Cette étude montre une autre possibilite d´approche de l´histoire de l´éducation de Recife pendant les années 1957-64. A partir des documents qu´on a trouvés, la recherche a identidié la presence d´um projet éducatif regional, institué à partir d´auteurs tels qu´ Anísio Teixeira et Gilberto Freyre. Ces deux ‘auteurs’, dans le sens de Foucault, avaient déjá des discours institués, discours qui produisaint d´autres textes et discours. L`étude a conclu que La proposition d´éducation regional a été possible à travers la création du Centre Régional de Recherche Educatives de Recife, ouvert à Recife em 1957. Dirigé par G. Freyre et attaché à l´INEP, le Centre a mis em place des recherches, des séminaires, des études et des cours dans l´attente de constituer une “science” de l´éducation. Cependant, ce qu´il a effectivement réalisé, c´était une éducation régionale, un modèle d´education aussi présente à Université de Recife et dans le MCP.

Mots-clés: éducation; région; Teixeira, Gilberto Freyre; le Centre Régional de

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO

CRPE – CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS EDUCACIONAIS DE

PERNAMBUCO1

CRR – CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS EDUCACIONAIS DO RECIFE

CBPE – CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACONAIS

CNPQ – CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E

TECNOLÓGICO

CUT – CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES

DNOCS – DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS

FPS – FUNDAÇÃO DA PROMOÇÃO SOCIAL

FINEP – FINANCIADORA DE ESTUDOS E PROJETOS IAA – INSTITUTO DO AÇÚCAR E DO ÁLCOOL

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA IFOCS - INSPETORIA FEDERAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS ISEB – INSTITUTO SUPERIOR DE ESTUDOS BRASILEIROS INEP – INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

IEP – INSTITUTO DE EDUCAÇÃO DE PERNAMBUCO

MCP – MOVIMENTO DE CULTURA POPULAR

NUPEP – NÚCLEO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO DE JOVENS E

ADULTOSEM EDUCAÇÃO POPULAR

PIMES – PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA DA UFPE RBEP – REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

REBAP – REVISTA DA ESCOLA DE BELAS ARTES DE PERNAMBUCO SUDENE – SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE

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SEC – SERVIÇO DE EXTENSÃO CULTURAL

UFPE – UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

UFRPE – UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO UR – UNIVERSIDADE DO RECIFE

USAID - UNITED STATES AGENCY FOR INTERNATIONAL DEVELOPMENT UNESCO - ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A

CIÊNCIA E A CULTURA

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 16

A escolha dos documentos ... 27

O tempo pesquisado ... 30

Como organizei a Tese ... 33

CAPÍTULO 1. HISTÓRIAS, HISTÓRIAS ... 35

1.1 Várias histórias ... 35

1.1.1 História não é memória. ... 35

1.1.1Orientações gramscianas ... 38

1.1.4 Temáticas recorrentes ... 45

1.1.5 “Do oprimido ao deprimido” ou fugindo da mesmice ... 48

1.2 A tentativa de constituir um efeito de verdade na História da Educação ... 53

1.2.1 O autor: uma instituição ... 56

1.3 Uma só região, um só Nordeste. ... 67

1.3.1 Um movimento para habilitar os valores regionais e tradicionais ... 68

1.3.2 A sociologia Freyreana e o Nordeste ... 73

1.3.3 Freyre: um conciliador ... 75

1.3.3 Uma pintura regional ... 76

1.3.4 O povo e uma cultura regional ... 77

1.3.5 Outros Nordestes ... 80

1.3.6 Ainda a mesma região ... 81

CAPÍTULO 2. UM CENTRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS PARA UMA REGIÃO ... 85

2.1 “Meu caro Anísio”, “Meu caro Gilberto” ... 90

2.2 Uma sugestão para regionalização da Educação ... 100

2.3 Pesquisas para uma ciência ... 110

2.3.1 O Sistema Educacional de Pernambuco ... 114

2.3.2 “Professoras emocionalmente desajustadas no interior de Pernambuco”. ... 116

2.4 Cursos, seminários, palestras e conferências: debates sobre educação ... 119

2.4.1 Problemas de política e administração no Nordeste Brasileiro. ... 123

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2.4.1.1.1 A Sociologia na Educação ... 125

2.4.1.1.2 Educação com bases na Psicologia ... 127

2.4.1.1.3 a experiência como prova ... 128

2.4.1.2 UMA EDUCAÇÃO PARA UMA REGIÃO ... 132

2.4.1.4 RELIGIÃO ... 145

2.4.2 John Dewey e uma filosofia da experiência ... 146

2.4.3 Simpósio Educação para o Brasil... 150

2.5 Uma escola experimental ... 153

2.6 Gilberto Freyre e Anísio Teixeira: partícipes no CRR ... 155

CAPÍTULO 3. A EDUCAÇÃO NA UNIVERSIDADE DO RECIFE: ENTRE A CIÊNCIA E A FÉ (E POR QUE NÃO CONCILIÁ-LAS?). ... 158

3.1 “Pedagogia do Tempo e da História” ... 165

3.2 Conciliando para inventar um sistema ... 171

3.2.1 Tentando institucionalizar uma prática ... 174

3.2.1.1 IDEALIZANDO UM PIONEIRISMO NO ‘SILÊNCIO’ E NA DESQUALIFICAÇÃO DE PRÁTICAS JÁ INSTITUIDAS ... 175

3.2.1.1 UM “SISTEMA” CONCILIADOR. ... 179

3.2.1.1.1 AINDA O ENSINO PRIMÁRIO ... 184

3.2.1.1.2 O MESMO LOCAL, A MESMA REGIÃO ... 188

4. A REGIÃO E O MOVIMENTO. ... 193

4.1 Uma prática sigilosa diante da trajetória de encontros com práticas já instituídas. ... 196

4.2 Um livro didático para ensinar sobre a Região Nordeste ... 197

4.2.1 Para sempre o Nordeste ... 201

5.CONCLUSÃO ... 205

REFERÊNCIAS ... 210

ANEXO A - ORGANOGRAMA DO CBPE ... 227

ANEXO B - QUADRO DE PESSOAL DO CRR EM 1959. ... 228

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ANEXO D - SEMINÁRIO EDUCAÇÃO E REGIÃO ... 230

(18)

INTRODUÇÃO

Quando nos reportamos à história constituída, que versa sobre a educação em Recife nos anos 1957-1964 quase nada2 se comenta sobre a presença, as ações, as práticas discursivas de Anísio Teixeira em Recife3. Como se a história tivesse tratado de esquecê-lo. Um dos livros, que de certa forma, comenta sobre um ‘esquecimento’ de maneira generalizada de Anísio Teixeira na educação é: Por que não lemos Anísio Teixeira. Uma tradição esquecida de Zaia Brandão e Ana Waleska Mendonça (2008). Para as autoras, num artigo de mesmo nome que compõe o livro, esta “tradição” esquecida deve-se principalmente ao fato de rótulos trazidos por outros estudos que associaram o pensamento de Anísio Teixeira e de outros pioneiros/escolanovistas a um pensamento liberal, conservador, no sentido de representar os interesses da “classe dominante”, ao capitalismo e contrários à Igreja Católica. Assim, para as autoras (BRANDÃO; MENDONÇA, 2008) livros como Escola e Democracia4 de Demerval Saviani; Educação e Desenvolvimento Social5 de Luiz Antônio Cunha e Ideologia e Educação Brasileira. Católicos e Liberais6 de

2 Um dos poucos estudos que mostrou essa ‘presença’ anisiana em Recife foi a Dissertação de Mestrado de Talita Maria Silva: Espaço escolar, arquitetura e Pedagogia no Recife: notas para uma modernização sem mudança, defendida em 2012, orientada por Flávio Brayner. Neste estudo a pesquisadora vai demonstrar como o projeto da Escola Nova, vias Anísio Teixeira, esteve ‘presente’ em Recife no projeto arquitetônico do Instituto de Educação de Pernambuco - IEP. Ver mais em: SILVA, Talita Maria. Espaço escolar, arquitetura e Pedagogia no Recife: Notas para uma modernização sem mudança. 127 fls. Dissertação (Programa de Pós-Graduação em Educação). Recife: UFPE, 2012.

3

É respeitável afirmar que livros que consultei de história da educação, apesar de Anísio Teixeira ser retratado, os comentários sobre a década de sessenta em Recife ficam cingidos a Paulo Freire e ao Movimento de Cultura Popular. Este aspecto será discutido no capítulo 1 da tese.

4

Saviani (2009) ressaltou alguns aspectos importantes para um afastamento da escola nova. Analisando e desaprovando aspectos como: proposta da escola nova em vincular o ensino à pesquisa; a escola nova não é crítica; “a escola nova não é democrática”; tudo isto para afirmar sua principal crítica: os representantes da escola nova são representantes da classe dominante e da burguesia, portanto improváveis de atender alguma perspectiva aos contextos educacionais, impossíveis de investir numa proposta que realmente interessasse aos contextos populares e a escola. O interessante também sobre estas críticas de Saviani (2009) foi ele não trazer nenhuma referência ou citação para que os leitores possam identificar com quem ele dialoga e o que contesta sobre a escola nova. Ver mais em: SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia. 41 ed. São Paulo: Autores Associados. 2009.

5

Luiz Antônio Cunha (1975) abordou várias questões referentes à política educacional retratada a partir do viés econômico. Uma delas trata de aliar o pensamento de Jonh Dewey e seu discípulo Anísio Teixeira aos pensamentos liberais, enfatizando ser esta corrente à expressão mais “radical” do liberalismo. Acredita que a “doutrina liberal”, a “escola nova” e o Estado tiveram a “função ideológica de dissimular os mecanismos de discriminação da própria educação, bem como os da ordem econômica”. Ver mais em: CUNHA, Luis Antônio. Educação e desenvolvimento social no Brasil. Rio de Janeiro: F. Alves, 1975 (p. 60).

6

Jamil Cury (1988), através de estudos sobre os anos 1930-1934, mostrou as tensões entre os “católicos” e os “pioneiros” (que ele chama de “liberais”) em torno do Estado. Sua intenção foi dizer

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Carlos Jamil Cury, publicados entre 1970 e 1980, possibilitam que os leitores desaprovem toda a prática de Anísio Teixeira.

Mas as críticas a Anísio Teixeira antecedem essas décadas. Em 1958, uma das situações deu-se em torno do debate travado diante do ensino laico. Agressões, cartas difamatórias, protestos, exigências de demissão geradas a partir de sua defesa ao ensino laico, acontecimentos acirrados pelos anos que antecederam a Lei de Diretrizes e Bases de 1961. Numa resposta de Anísio, em carta, a críticas feitas pelo escritor católico brasileiro Gustavo Corção sobre a liberdade de ensino, o então diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) afirmou:

[...] Acompanho com extrema curiosidade a sua luta entre a independência intelectual, que me parece o seu natural, e o "dogma", sempre pendente sobre sua cabeça, como "Jeovah" sobre os hebreus. Essa espada de Damocles suprime o senso de humor. Como os hebreus, Corção não ri. Condena, adverte, aponta, profetiza tal qual um hebreu. Whitehead nota essa falta do riso entre os hebreus. Certo amigo lhe retorquiu que, quando o assunto é demasiado sério, não se pode rir. Este também me parece o caso Corção.

Anísio (1958) continuou a carta explicando que defende, como ele (Corção), a liberdade de ensino, pois a educação, seja “privada” ou “pública”, deve ser “sujeita” à “sociedade”. Para isso é necessário um governo autônomo: “conselhos locais, de composição popular. No fundo, conselho de pais. A política educacional seria fixada por esses conselhos, ajudados pelos profissionais da educação, isto é, os professores.” Ainda respondeu Anísio Teixeira a Corção:

O senhor deseja ao que parece, a mesma coisa. Como, porém, não defende a tese como uma plausibilidade imparcial, para a solução da educação dada pelo Estado e, ainda assim, independente, mas simplesmente como recurso de transferir o poder de educar à Igreja, toda sua argumentação soa falso. Não quer acompanhar a idéia até o fim.

Já que Corção não quis acompanhar o raciocínio, Anísio (1958) o faz para ele:

A educação pertence aos pais. Muito bem. Como vão eles organizá-la? Entregando à Igreja. Ótimo. Mas há várias igrejas... E há os que

que no fim desta disputa na década o Estado tentou contemplar ambos os lados. Ele afirma que essa postura do Estado explica-se porque tanto Estado, quanto “católicos” e “pioneiros” servem a ideologia e os interesses da classe dominante. Ver mais em: CURY, Carlos R. Jamil. Ideologia e educação

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não têm igreja... Daí a necessidade de uma escola imparcial. Assim, parece, que os conselhos eleitos, à maneira democrática, seria a melhor solução. Por que não a defende? Como imagina o senhor organizar os pais para a educação de todos? Já notou que "pais" às vezes significa "pais" de certa classe? E os pais das outras classes? Os padres substituiriam os pais. Mas já notou o Sr. como os padres são poucos no Brasil?

No artigo de hoje, porém, o que desejo notar é sua revelação que o poder de educar pertencerá ao diretor do colégio ou ao reitor da universidade, que pensaria, segundo creio, de acordo com a confissão religiosa do estabelecimento. E os estabelecimentos públicos? Não tenho dúvidas em aceitar escolas confessionais - mas, desejo também liberdade para as escolas públicas. Não seria possível aceitar a idéia dos pais organizados em conselhos dirigindo também o ensino público? Essa idéia que é mais extrema que a sua ainda não encontrou nenhum apoio católico. Será que os católicos não acham que vão ser a maioria nos conselhos? Ou, na realidade, não têm confiança nos pais, mas nos padres? Defenderá o Sr. realmente, como defendo eu a liberdade do ensino, ou a transferência a outro senhor, à Igreja? Havendo os pais conquistado a liberdade de crença, não devem ter eles logicamente a liberdade de escola? Essa liberdade só existirá com uma escola imparcial entre as religiões. Essa imparcialidade não é irreligião, mas, simplesmente, tolerância entre as religiões. O dogma porém não o deixa ser tolerante. Parece traição.

Nas afirmações da carta de Anísio Teixeira, escrita em 1958, em resposta7 ao Católico Gustavo Corção, posso identificar um pouco das opções de Anísio Teixeira: as suas preocupações de tornar a escola pública laica, as muitas dificuldades enfrentadas na época8 e principalmente o seu misto de indignação, inteligência, conhecimento de causa, confiança no que pensa e deseja e principalmente sua

7 Anísio ainda continou sua carta, já que a “intolerância” de Corção não ficou restrita só a educação: “Quer outra demonstração dessa intolerância, dessa dureza, desse sectarismo? O mau gosto de suas observações sobre o índio brasileiro, nesse mesmo artigo de hoje. Por que tanta raiva do índio? Foram a nação vencida. Muito bem. Mas o Sr. sabe que o vencido não se extingue mas confunde-se com o vencedor e sobre ele exerce influência por vezes considerável. Afinal somos índios, negros e brancos. E um dos nossos maiores orgulhos é o de havermos contribuído para o que parece uma verdadeira democracia racial. Como os índios não eram católicos, o Sr. não os julga brasileiros. Brasileiros são apenas os brancos católicos que aqui aportaram em 1500. E os pretos? Será que também não são a nação? Essa idéia de nação sectária será realmente cristã. O samaritano era o próximo para Jesus. Para Corção, nem o índio é o seu próximo. E possivelmente, nem o preto. E também, por certo, nenhum nativo desta terra, que não aceite as suas crenças. Francamente, neste mundo diverso e plural, a questão não é de ortodoxia, mas de tolerância entre as ortodoxias. É uma pena que o Sr. não possa contribuir para essa generosa convivência humana. A leitura do padre Teithard de Chardin podia ajudá-lo a ver mais globalmente a aventura do homem na terra. Afinal ser católico deveria ser um dos modos de ser universais”. Ver mais em TEIXEIRA, Anísio. Carta a Gustavo Corção, Rio de Janeiro, 23 fev.1958. Disponível em: <http://www.bvanisioteixeira.ufba.br>. Acesso em: ago. 2012.

8

(21)

disposição em ‘travar’ essa batalha, diante de um grupo e uma ‘tradição’, a Católica, que não se conforma em ‘perder’ tal poder.

Mas, voltando-me para educação em Recife, Anísio Teixeira, sendo liberal ou não, de certo foi que as suas práticas estavam presentes em Recife nos contextos educacionais nos anos 1957-1964, como, por exemplo, na “tese de concurso” Educação e Atualidade Brasileira de Paulo Freire (2003)9. Assim, criticar, questionar, discordar das práticas anisianas é permitido, mas ‘esquecer’ que elas estavam presentes, bem como o significado das suas práticas, o que elas possibilitaram, como elas foram possíveis, que outras práticas se uniram a elas, ou a negaram neste momento é, no mínimo imperdoável, principalmente às ‘consciências tão atentas e críticas’.

Na história da educação também quase nada se comenta sobre ações de

Gilberto Freyre na área educacional. Sua associação com algumas ideias tidas

como conservadoras, bem como seu apoio ao golpe militar de 1964 de certa forma o desaprovam, principalmente, no meio acadêmico. Enrique Larreta e Guillermo Giucci (2007, p. 13), no livro Gilberto Freyre: uma biografia Cultural, dizem que sua “personalidade forte e expressiva” lhe rendeu “adesões incondicionais, mas também ódios profundos”10

.

Paulo Rosas, por exemplo, no texto: Recife: Cultura e Participação (1950-1964) (APUD FREIRE, 2003), enquanto ex-integrante do Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife11, dirigido por Gilberto Freyre, tenta alternar suas explicações sobre Freyre ressaltando a importância das suas análises culturais sobre Pernambuco, porém tomando Freyre como pessoa de reflexões e ações políticas e sociais conservadoras.

9 Discutirei a “tese” de concurso de Paulo Freire no capítulo 3. 10

Na década de trinta, após a publicação do livro Casa Grande & Senzala e da realização do Congresso Afro-Brasileiro, Gilberto Freyre sofreu vários ataques da “direita” da Igreja Católica que enfatizou o protestantismo de Gilberto Freyre e associou suas ideias na sociologia ao socialismo e comunismo. Alceu Amoroso Lima associava Gilberto Freyre ao comunismo e Vicente do Rego Monteiro através da Revista Nova Fronteira tinha proposta de censurar o livro Casa Grande & Senzala (LARRETA; GIUCCI, 2007). Larreta e Giucci (2007, p. 562, 563) traduzem as críticas em relação Freyre: “seu tratamento da moral sexual dos colonizadores do Brasil era sacrílego e indecoroso e seus comentário sobre a religião católica, considerados preconceituosos derivados da sua educação protestante.”

11

O Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Pernambuco, ou Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife ou CRR, como comumente era tratado nos ofícios entre o Centro e o Instituto Brasileiro de Pesquisas Educacionais (INEP), foi um dos Centros organizados em conjunto com outros: o de Minas Gerais; o do Rio Grande do Sul, o da Bahia e o de São Paulo. Estes, criados, por Anísio Teixeira eram articulados ao Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e ao INEP. Abordaremos sobre o CRR no capítulo 2.

(22)

O fato é que estudos atuais ainda demonstram animosidades diante do sociólogo, como é o caso da dissertação de mestrado Sociabilidades Letradas no Recife: a Revista Estudos Universitários (1962-1964)12, de Dimas Brasileiro Veras (2010), que traz algumas passagens de Freyre. Veras (2010, p. 63, 148) usou vários termos para rotulá-lo: “pai da tropicologia”, “vaidade intelectual do sociólogo”; “auto-crítica freyreana (com tom de auto-elogio)”; “mandarim recifense”, entre outros.

Pouco foi dito sobre sua abordagem sociológica, quiçá sobre sua empreitada na área educacional, apesar de citar que Freyre foi diretor do Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife. De certo que não foi o propósito de Veras (2010, p. 96) sistematizar ideias sobre Gilberto Freyre; o pesquisador se propõe a falar de Paulo Freire “jovem”. Mas falar do “jovem” Paulo Freire é não se esquecer de dizer que em 1957, ainda no primeiro mês de instalação do Centro Regional de Pesquisa Educacionais do Recife, dirigido por Gilberto Freyre, Paulo Freire inscreveu o projeto Vocabulário infantil de crianças de 7 a 12 anos em Pernambuco13. Que entre março de 1958 a junho de 1959, participou também do curso Problemas de Política e Administração Escolares no Nordeste Brasileiro promovido pelo Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife. Nessa ocasião, Paulo Freire apresentou a conferência Escola e Comunidade – considerações a propósito de suas relações (30/08/1958) e debateu a conferência Reflexões Humanísticas sobre o Ensino Oficial no Nordeste proferida pelo professor Cônego Hélio Souza (27/09/1958)14. Que em 1960, no Simpósio Educação para o Brasil, também promovido pelo Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife, Freire proferiu a conferência Escola Primária para o Brasil, cujo texto foi publicado na revista do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos - INEP15.

Um dos poucos trabalhos que se remetem a estudar Gilberto Freyre no contexto educacional é o artigo (relatório de pesquisa) de Simone Meucci (2011): Pesquisa Social e política educacional: Gilberto Freyre no comando do CRPE – PE

12

Num enfoque bourdiesiano o estudo mostra a dinâmica da produção cultural da Universidade do Recife, através da publicação dos seus intelectuais, principalmente na Revista Estudos Universitários. 13

PROJETOS DE PESQUISA. 1957-1964. INEP – CRP/ NE. Pesquisa Filme n. 001. Caixa nº 266. Fundação Joaquim Nabuco. Filmografado.

14

CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS EDUCACIONAIS DO RECIFE. Educação e Região:

Problemas de Política e administração escolares no Nordeste brasileiro. Recife:

CRPE/INEP/MEC, 1960. CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS EDUCACIONAIS DO RECIFE.

Cadernos Região e Educação. Recife: CRPE, 1963. (Vol. 3, nº 6) 15

Ver dados em: FREIRE, Paulo. Escola Primária para o Brasil. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro: Inep, 1961 (Vol. XXXV, n. 82).

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(1957-1964). A pesquisadora inicia reclamando da falta de pesquisas que sistematizem e explorem esse viés de Freyre e acha importante continuar pesquisas sobre o sociolólogo após a década de trinta. Meucci (2011) faz uma investigação inicial discorrendo sobre a organização (algumas pesquisas, funcionamento, etc) do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Recife, bem como a atuação de Gilberto Freyre enquanto diretor da instituição que o qualifica como “administrador dedicado” e prevenido com a burocracia.

É apropriado expor também que existe um artigo elaborado pela ex-funcionária do CRR Maria Graziela Peregrino, de título: Gilberto Freyre, orientador e diretor do CRPE do Recife elaborado em 1987. No apoucado texto, com ares bastante pessoais a ex-responsável pela Divisão de Formação de Magistério (DAM) do CRR, conta um pouco das realizações do Centro desde o ano de 1960 quando assumiu essa responsabilidade.

Ainda sobre a história da educação do Recife quase nada é reportado ou estudado sobre as ideias da professora Maria do Carmo Tavares de Miranda. Essa filósofa disputou o concurso com Paulo Freire para Cátedra de História e Filosofia da Universidade do Recife (UR)16 e foi aprovada. Veras (2010, p. 108, 109), também em sua dissertação, sobre este concurso, afirmou que por mais que tente entender num prisma de disputa entre pedagogias diferentes, reconhece que o “conteúdo talvez seja o menos importante”, pois o que estava em jogo mesmo era a disputa de “um filho dos subúrbios recifense que brigava pelo emblema e espaço de distinção da ‘aristocracia’ intelectual que era a cátedra”. As compreensões de Veras (2010) estão especialmente relacionadas ao enfoque bourdiesiano, pois mesmo Pierre Bourdieu oferecendo possibilidades de compreender as dinâmicas a partir da representação, quando discute o poder este ainda está muito associado às expectativas “da luta simbólica entre as classes”17

. Observo este aspecto, por exemplo, quando Veras enfatiza o poder de Maria do Carmo Tavares de Miranda, como um poder associado às condições de classe, as condições econômicas. Porém, Veras (2010, p. 109) quando acena para a possibilidade de o Reitor João Alfredo propor a criação de duas vagas para inserir Paulo Freire num concurso em que ele não foi aprovado, ou até mesmo criar o Serviço de Extensão Cultural (SEC) para disponibilizar um local para Paulo Freire trabalhar, a questão do poder é

16

Atual Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). 17

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amenizada, fazendo-me pensar que, para o pesquisador o poder é traduzido apenas nas condições de classe, nas condições econômicas.

Sobre as aproximações de Paulo Freire e do Reitor João Alfredo, Rosas (1991, sem paginação) no texto 70 anos de Paulo Freireno Mundo18 afirma que mesmo Paulo Freire perdendo o concurso não se afasta da Universidade do Recife, pois contava “com a amizade e o respeito do Reitor João Alfredo”. Ainda diz Rosas neste mesmo texto:

Não lhe reduz o mérito admitir que a instalação do SEC foi facilitada pela amizade que o ligava ao então Reitor, João Alfredo Gonçalves da Costa Lima. O Reitor João Alfredo respeitava a competência de Paulo Freire e envidou esforços para mantê-lo na Universidade. Por sua vez, Paulo Freire avaliava favoravelmente a ação de João Alfredo como Reitor, de acordo com o que então se esperava de um dirigente acadêmico.

Por fim, esses questionamentos que trago sobre Anísio Teixeira, Gilberto

Freyre e Maria do Carmo Tavares de Miranda, servem para anunciar as tensões

de uma produção historiográfica19 sobre a educação, ocorrida em Recife, entre os anos de 1957-1964.

Percebo que a história da educação apresentada aos alunos do curso de Pedagogia, das diversas licenciaturas, das pós-graduações da Universidade Federal de Pernambuco, bem como de outras instituições ao estudarem o que ocorreu em Recife na educação no período citado, muitas vezes, produziu um discurso instituindo o que é permitido e o que não é, o que podemos ver e o que não podemos, o que podemos fazer e o que não fazemos e como podemos ver e como não podemos. A disciplina, o comentário e o autor são procedimentos internos20 desse discurso que tentam limitar sua produção. Como afirmou Michel Foucault (2009 a, p. 33) na aula inaugural no Collège de France, retratada na Ordem do Discurso: “no interior de seus limites, cada disciplina reconhece proposições

18 O texto data de 09 de novembro de 1991. Ele foi “lido em Reunião Plenária do Conselho Estadual de Educação de Pernambuco, realizada em 18 de setembro de 1991, em homenagem ao Professor Paulo Freire, pelo transcurso de seu 70º aniversário.”

19

Na História da educação, além dos estudos que estão delimitados na área, contemplo também alguns estudos de outras áreas, como a Sociologia, pois de certa forma atendem e são utilizados para compreender a História sobre educação do Recife.

20

Como procedimentos internos que regulam o acontecimento discursivo temos ainda o comentário e o autor: “o comentário limitava o acaso do discurso pelo jogo de uma identidade que teria a forma de repetição e do mesmo. O princípio do autor limita esse mesmo acaso pelo jogo de uma identidade que tem a forma da individualidade e do eu” (FOUCAULT, 2009a, p.29)

(25)

verdadeiras e falsas; mas ela repele, para fora de suas margens, toda uma teratologia do saber”.

É esta a percepção que tenho sobre a história da educação tecida nestes anos: a ideia de práticas que instituem uma “ordem discursiva”21 (FOUCAULT, 2009a). Práticas discursivas elaboradas sobre história da educação22, através dos professores/pesquisadores, bacharéis, especialistas, mestres e doutores, que fizeram perguntas, escolhas, deram respostas que foram aceitas, aprovadas e publicadas. Penso que foi produzida uma “vontade de verdade” entre as instituições (cursos, programas, Faculdades) que cuidam da história da educação instituindo ‘uma’ verdade, justificando assim um discurso sobre educação nos anos 57-64 em Recife. O discurso é permeado por uma “vontade de verdade” regida pelo desejo e pelo poder, que se desloca num suporte que exclui e ostenta apenas uma “verdade”, que é amparada por um “suporte institucional”(FOUCAULT, 2009ª):

é ao mesmo tempo reforçada e reconduzida por todo um compacto conjunto de práticas como a pedagogia, é claro, como o sistema dos livros, da edição, das bibliotecas, como as sociedades de sábios outrora, os laboratórios hoje. (FOUCAULT, 2009a, p. 17)

Tal “suporte institucional”, bem como a forma como ele é repartido, desempenha sobre os outros discursos uma “espécie de pressão”. E muitas vezes, por mais que se tente recolocar esta vontade de verdade, esse suporte institucional está lá para justificá-la como verdade e excluir outras verdades (FOUCAULT, 2009a).

A ordem que trata de eleger, repelir e reatualizar o campo discursivo, converge (numa outra dimensão, já que elas não fazem críticas ao discurso historiográfico aos moldes foulcaultianos) com os estudos sobre História da Educação de Eliane Lopes e Ana Maria Galvão (2005). As autoras afirmam que é comum entre os pesquisadores dessa área eleger ideias, movimentos oriundos ou favoráveis às camadas populares, considerando-os na História como os progressistas; enquanto outras idéias e outros movimentos seriam os conservadores. E acrescentam: “os que eram julgados negativamente caíam em uma espécie de limbo, na medida em que não valia a pena pesquisar algo ou

21

Compreendo que esta Ordem à qual Foucault se refere não é constituída de forma linear e progressiva.

22

É válido salientar que existem discursos que estão estabelecidos em outras áreas, como sociologia e não se propõem a fazer ‘história’, mas são utilizados para compreender a história da educação.

(26)

alguém que não tivesse contribuído ou não pudesse contribuir para a transformação revolucionária da sociedade”. (LOPES; GALVÃO, 2005, p. 38).

Quando significo essa ordem do discurso, indicando tensões que estão presentes na educação e sua história, oriento-me também pelo que diz Michel de Certeau (2008, p. 42) em A Escrita da História: “a distância do tempo, e, sem dúvida, uma reflexão mais epistemológica permitem hoje revelar os preconceitos que limitaram a historiografia mais recente. Eles aparecem tanto na escolha dos assuntos quanto na determinação dos objetivos dados ao estudo”23

.

É essa análise que faço sobre a história da educação retratada nos anos 1957-1964 em Recife. Análise pormenorizada no capítulo 1 desta pesquisa, na qual evidencio estudos que retratam esses anos: a memória, as orientações gramscianas, temáticas recorrentes etc. Práticas que ‘suspendi’ para questionar a educação desses anos.

Assim afirmo que meu objeto se constrói a partir dessas tensões no discurso sobre educação, quando ‘suspendendo’ as ‘verdades’ estabelecidas nesta “ordem do discurso”, questionei: - Quais as instituições que estavam presentes neste momento, em Recife, que instituíram discursos sobre a educação? Qual o sentido da educação existente nessas instituições entre os anos 57-64? Ou melhor, o que era recorrente em seus discursos, através das suas práticas?

A partir daí, ‘desmontando os livros’, no contato com documentos e tentando compreender o discurso como práticas, ao responder estas perguntas, penso que, se os efeitos de verdade na história da educação constituem uma ordem discursiva sobre este período, colocando as ações do Movimento de Cultura Popular (MCP) e de Paulo Freire como singulares e autênticas, intenciono construir um outro efeito de verdade, mostrando que existiram outras práticas discursivas institucionalizadas que chamo de práticas anisianas e práticas freyreanas, respectivamente significadas por Anísio Teixeira e Gilberto Freyre. Considero-os, a partir do que afirmou Michel Foucault em conferência O que é um autor?, “autores” instituídos pois denotam significados, bem como “instauradores” no campo discursivo, porque possibilitam diante de outras práticas,. afinidades e contestações (FOUCAULT, 2009c; FOUCAULT, 2009e).

23

Michel de Certeau (2008, p. 42) faz esta afirmação ao analisar os conflitos da Igreja e Estado e os debates do historiador. Ver mais CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.

(27)

Estas práticas foram possibilitadas por alguns fatos históricos que ocorreram em Recife, como: a Instalação do Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife (CRR), dirigido por Gilberto Freyre, vias Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (INEP), dirigido por Anísio Teixeira; ações pontuais que evidenciam as tensões na área educacional que tenta se instituir no mundo científico da Universidade do Recife, em especial na Faculdade de Filosofia, na Escola de Belas Artes e na organização do Serviço de Extensão Cultural (SEC); e na organização do Movimento de Cultura Popular (MCP). Acrescento a esses fatos, as recomendações sobre educação apresentadas na Carta da Salvação do Nordeste24 (1955) e na conclusão do Seminário para apresentar o II Congresso Nacional de Adultos25 (1958). Nacionalmente outros fatos concorreram para tensionar tais acontecimentos como as discussões em torno do projeto de lei 2.222 B/57 (BRASIL, 1957); a própria efetivação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação 4.024/ 1961 resultado do projeto (BRASIL, 1961); O Manifesto dos Educadores mais uma vez convocados (1959)26.

Posso dizer, sem querer imprimir uma origem, mas no sentido de fatos que instituíram vagarosamente27 e de maneira diversificada o espaço regional e educacional, que o Manifesto Regionalista (1926) e o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova28 (1932), foram eventos que também tensionaram os anos de 1957-1964. Esses fatos, na tentativa de instituir uma Região e de instituir uma Educação

24

Carta retirada da conclusão do Congresso de Salvação do Nordeste em agosto de 1955. O congresso levantou muitas problemáticas sobre o Nordeste, dentre elas a educação. Ver mais em AZEVEDO, Janete M.ª Lins de. Reconstituição Oral da história recente da educação popular em

Pernambuco: O Movimento de Cultura Popular; Recife; Relatório final de pesquisa. Departamento de

Fundamento sócio – filosóficos da educação. CE – UFPE. 1986 25

Congresso que ocorreu no Rio de Janeiro de 9 a 16 de julho de 1958. Ver mais em PAIVA, Vanilda Pereira. Educação Popular e educação de adultos. São Paulo: Edições Loyola, 1973.

26

Em termos internacionais as ações diante da Guerra Fria e as orientações da Igreja Católica com as Encíclicas Papais Mater et Magistra e Pacen in Terris.

27

Durval Muniz Albuquerque Júnior (2009, p. 88) ao analisar as práticas que instituiram a Região Nordeste, afirma que há fatos que possibilitam práticas que se cartografam “lentamente” e de forma variada para construir uma ideia.

28

Antes de assinarem o manifesto os signatários já tinham feito algumas reformas pelo Brasil: Sampaio Dória em São Paulo (1920-1921); Lourenço Filho no Ceará (1922-1923); Anísio Teixeira na Bahia (1924); através de um plano elaborado por Fernando de Azevedo Do Distrito Federal (1922-1926); José de Menezes em Minas Gerais (1927); Lisimaco Costa no Paraná (1927-1928) e por Antônio Carneiro Leão em Pernambuco (1928). Ver em: MENDONÇA, Maria Christina Araújo de. A Escola Nova em Pernambuco. Dissertação (Mestrado). Recife: UFPE, 1987 (p. 35). A dissertação de Maria Christina Mendonça (1987), teve por objetivo mostrar como o ideário da Escola Nova (“urbana, democrática, liberal, científica, vanguardista, arreligiosa”) na década de 20 em Pernambuco, constituiu-se diante de um Estado “rural, oligárquico, moralista, coronelista, religioso”. A autora (MENDONÇA, 1987, p. 175) conclui seu estudo afirmando que, mesmo “discordando das intenções ou do pensamento que provavelmente embasavam tais medidas, há que se admitir que foram proveitosas para a educação em Pernambuco”.

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Nova, com bases na ciência e orientada para uma educação regional, foram demoradamente elaborados por vários “intelectuais e artistas”29, de um lado, e por vários educadores30, de outro. Nos anos 57-64, em Recife, algumas dessas práticas já estavam consolidadas e anunciavam vários significados diante de ‘autores’ já instituídos: Anísio Teixeira e Gilberto Freyre. As práticas discursivas anisianas e freyreanas encontram-se especialmente na organização do Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife. Esses autores, já insituídos em 1957, são evidenciados e possibilitam a partir de tensões, silêncios, analogias, desaprovações que, em outras instituições em Recife, constitua-se uma educação de práticas significativamente regionais, entre outras. No meu entender este viés regional urdido pela instituição anisiana na intenção de uma educação científica e sistemática, mas descentralizada no sentido de contemplar as especificidades da região, do local, do município foi ao encontro da insituição freyreana que fomentou um Nordeste sofredor, mas também original, autêntico, embebido por uma cultura ímpar. Uma cultura que consegue conciliar o Rural com o urbano, o negro com o português, a ciência com a prática; esta última, tais quais as práticas anisianas, procuravam também conciliar.

Essa região Nordeste, de bases sociológicas, colocada por Freyre, tem o significado anunciado por Durval Muniz de Albuquerque Júnior (2009, p. 128) no livro A Invenção do Nordeste e outras artes, quando afirma que este Nordeste tradicional seria uma “invenção” baseada na exaltação de “lembranças, experiências, imagens” etc, como recurso para produzir um efeito de verdade.

Diante do que expus nesta Introdução, o objetivo geral desta tese é:

 Avaliar como Anisio Teixeira e Gilberto Freyre, ‘autores instituídos’, através das suas práticas e significados possibilitaram analogias e diferenças, bem como o agenciamento de outras instituições e práticas, diante do Centro

29 Os “intelectuais e artistas” é o termo que Albuquerque Júnior (2009, p. 92) usa para referir-se àqueles que possibilitaram a ideia de Nordeste através de suas práticas: nos anos vinte e trinta, Gilberto Freyre e a “escola tradicionalista de Recife”, principalmente José Lins do Rego e Ascenso Ferreira; nos anos quarrenta, Luis Gonzaga, Zé Dantas e Humberto Teixeira; nos anos cinquenta, os pintores Cícero Dias e Lula Cardoso Ayres e o poeta Manoel Bandeira. Percebo que durante os anos 1957-1964, que me proponho a investigar, mesmo tendo como principal foco as práticas instituídas por Gilberto Freyre, outras práticas trazidas pelos ‘seus pares’ são possibilitadas para autenticar uma ideia de Nordeste.

30

Anísio Teixeira nos anos 1957-1964 denota significados, produz práticas que o identificam, mas também se insere e permite que ‘seus pares’, em especial que assinaram o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, circulem no espaço de constituir uma educação laica, pública e gratuita. Fernando de Azevedo, M. Gergstrõm Lourenço Filho e outros que realizaram ações neste contexto como Carneiro Leão.

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Regional de Pesquisas Educacionais do Recife, da Universidade do Recife e do Movimento de Cultura Popular entre os anos 1957 e 1964.

Especificamente este estudo pretende:

 Mostrar como o Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife/INEP possibilitou o encontro de Anisio Teixeira e Gilberto Freyre, e suas práticas já instituídas, fazendo com que eles conseguissem lhe dar com outras circurstâncias visando a seus objetivos na educação e na região, através de outras funções que assumiram.

 Avaliar como as práticas anisianas e freyreanas se encontram num esforço de uma educação de bases científicas, regional articulado a um projeto (CRR) que pretende descentralizar o ensino, voltando-o para a localidade, para a municipalização, bem como articular a educação a ciência e a outro projeto que pretende constituir uma ideia de região com características peculiares, mas baseada também na ciência;

 Avaliar a tensão na Universidade do Recife diante das práticas anisianas, freyreanas e das práticas da Igreja católica, demonstrando como elas possibilitaram outras práticas na UR; inclusive discursos que aprovaram, silenciaram ou desqualificaram essas práticas já insitituídas, tentando imprimir-se como novo.

 Identificar como o “sistema Paulo Freire” tenta instituir-se como prática diante de outras práticas existentes, bem como se transmitir diferente e inovador diante delas;

 Conhecer como as práticas anisianas e freyreanas já instituídas vias CRR, INEP ou não, estavam presentes no Movimento de Cultura Popular (MCP), especialmente através do aparelhamento do Livro de Leitura para Adultos;

A escolha dos documentos

Quando comecei a escolher os documentos que iria investigar sobre educação nos anos 1957 a 1964, sempre havia uma indicação: “tese” de Paulo Freire, Livro de Leitura para adultos de Josina Godoy e Norma Porto Carreiro. Fora estes ‘documentos’ comuns, eram disponibilizadas também algumas publicações de

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Paulo Freire sobre o seu “Sistema” na Revista Estudos Universitários, escrito por ele e outros autores nesta mesma revista. A partir desses textos, observando as notas de rodapé, identificando outras referências, identifiquei documentos importantes para constituição da tese. Para isso, foi importante a leitura e conhecimento de livros e outros textos que foram utilizados desde a elaboração da Monografia de especialização em História de Pernambuco (1999). Foi essencial, também para a concretização das observações a orientação de Foucault (2009a), no sentido de questionar a verdade que está posta. Não esqueço aqueles textos que, de alguma forma, me ajudaram a escolher este caminho: O grande massacre de gatos31, e outros episódios da história cultural francesa (1986) e Os dentes falsos de George Washington32. Um guia não convencional para o século XVIII de Robert Darton (1986; 2005); O queijo e os vermes 33: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição de Carlo Ginzburg (2006) ; Dos meios às mediações34 de Jésus Martin-Barbero (2006) e A queda do Angelus Novus35: para além da equação moderna entre raízes e opções de Boaventura de Souza Santos (1997).

31 Darnton (1986) de forma significativa, interconecta, mas não interligada “como a que existe entre as partes de um tratado sistemático”, começa com os contos dos camponeses e excursiona pelo massacre de gatos, passa pela cidade de Montpellier, pelos arquivos públicos de um inspetor de polícia e termina com abordagens sobre a Encyclopédie e sobre como os leitores respondem ao romantismo de Rousseau. Os textos de certa forma não estão interligados, são abordados numa perspectiva de “demonstrar” como era a França, a cultura francesa antes do novo regime. Através de alguns documentos pouco convencionais, ele mostrou como é possível “ouvir” vozes que jamais foram ouvidas.

32

Darnton (2005) mostrou que célebres do século XVIII (George Washington, Brissot, Rousseau, O rei da França Luís XVI) possuem diversidades não apresentadas na história convencional, por exemplo, Jean-Jacques Rousseau ao mesmo tempo em que escrevia sobre direitos iguais repudiava seus filhos bastardos à Igreja.

33

Carlo Ginzburg (2006) em O queijo e os Vermes desenvolveu seu estudo a partir dos autos de inquisição aplicada a realidade de um moleiro, vulgo Menocchio, queimado por ordem do Santo Ofício. A preocupação do autor não foi definir quem é este camponês, mas mostrar como ele absorveu e transformou idéias a partir das várias leituras que fez: “O importante não é o que Menocchio leu ou recebeu – é como leu, é o que fez das suas experiências” (GINZBURG, 2006, p. 194). O autor de forma não representativa nos mostra uma fala demarcada por desvios e contradições bastante peculiar: a maneira que Menocchio entende o mundo, sua cosmologia (sua idéia sobre a origem do mundo, quem é Deus, de onde viemos etc). A leitura sobre mundo (transpassado por dois eventos históricos a imprensa e a Reforma) de um camponês.

34

Martin-Barbero (1996, p. 31) mostra as ambigüidades presentes na história diante dos movimentos que fizeram uso do povo. Ele diz que existem “O que contraditoriamente põe em marcha o mito do povo na política (ilustrados) e na cultura (românticos); e o que fundindo política e cultura afirma a vivência moderna do popular (anarquistas) ou a nega por sua ‘superação’ no proletariado (marxistas)” Mostra-nos também os variados usos que os “movimentos” fizeram do povo, as contradições e os meios que vão utilizar fazendo surgir o povo-mito e o povo-classe. Sua intenção não é o que é o povo, mas como estes movimentos pensavam e interpretavam o povo e sua cultura. O autor elege o povo para interligar momentos diversos, mas que foram significativos na “idéia” de povo. Seu tratado elege um mapa histórico e geográfico alargado, mas unido pelo povo. (MARTÍN-BARBERO, 2006) 35

Sua análise sobre as interpretações históricas, evidencia que o movimento sempre orientado para o futuro recebeu vários nomes: “a revolução, o progresso, a evolução”. Esta evolução poderia ser

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Na contramão da ordem discursiva busquei a tese de concurso de Maria do Carmo Tavares de Miranda e outros textos seus que sinalizaram a existência de outras revistas na então Universidade do Recife: Doxa, Revista de Sociologia, Revista da Escola de Belas Artes e a Estudos Universitários; revistas que utilizei como documentos para tecer a tese. A partir delas, pude identificar outros professores e alunos que publicavam textos sobre educação. Identifiquei também que muitas das publicações das revistas eram resultado de outros acontecimentos: ensaios, teses, provas, conferências, cursos, discurso de colação grau, etc. Busquei também a Revista Syposium na Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) que trazia algumas questões sobre educação. Minha maior dificuldade com estes documentos, com a exceção da Revista Symposium, foi a indisponibilidade da documentação. As revistas da Universidade Federal de Pernambuco estão localizadas na Sessão Piu que está desde 2010 em reformas. Mesmo com todas as dificuldades houve o acesso ao material, porém não por completo. Havia revistas que não estavam disponíveis e revistas como a Doxa de 1958, em que havia páginas arrancadas.

Identifiquei a partir do próprio texto de Paulo Freire, publicado na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos do INEP, que ele havia participado como conferencista no Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife/INEP. Foi esta mesma revista e a procura de outras publicações de Paulo Freire em que pude identificar publicações sobre educação, porém de Gilberto Freyre. Estranhei o fato de que Gilberto Freyre também proferisse palestras e fizesse conferências sobre a educação em Recife nestes anos, de 1957 a 1964. Comecei a reler alguns textos usuais sobre o MCP e estar atenta ao Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife/INEP. A própria revista Brasileira de Estudos Pedagógicos/INEP me ofereceu muitos caminhos. E diante da organização do acervo da Biblioteca da UNICAP pude encontrar alguns documentos importantes como os Cadernos Região e Educação, organizados pelo Centro de Pesquisas Educacionais do Recife/INEP. A partir da compreensão de que existiu ‘um’ Centro de Pesquisas Educacionais aqui

burguesa ou operária, ora consagrando o capitalismo ora superando-o (o evolucionismo). O que foi comum às teorias da história foi relegar o passado e supervalorizar o futuro. “O passado foi visto como passado e, portanto incapaz de fazer a sua aparição, de irromper no presente. Pelo contrário, o poder de revelação e de fulguração foi todo transposto para o futuro.” (SANTOS, 1997)

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em Recife e que este centro foi dirigido por Gilberto Freyre, encaminhei-me para Fundação Joquim Nabuco.

Ao contrário das dificuldades que tive em encontrar documentação sobre a Universidade do Recife, a Fundação Joaquim Nabuco disponibilizou documentos filmografados, segundo o responsável, quase nunca procurados. E se tive poucos documentos sobre a Universidade do Recife, tive em abundância de documentos sobre o Centro de Pesquisas Educacionais do Recife. A preocupação neste momento foi escolher sobre quais documentos me debruçar, já que além destes, já tinha como documentação todos os Cadernos Região e Educação publicados desde 1961. Na Fundação Joaquim Nabuco foram 21 caixas, marcadas do nº 248 até o nº 269, com exceção do nº 265 não encontrado. Destas caixas, excluí as sinalizadas com acervo do material que não me interessou, diante do meu objeto e tipo de pesquisa: documentos específicos da escola experimental (construção, fotografia da construção, termo de ajuste, prestação de contas, contabilidade escolar, custeio, assuntos financeiros, ficha pessoal, entre outros); documentos da secretaria (escala de férias, requerimento da passagem, contrato de prestação de serviços, tomada de contas do almoxarifado, frequência, boletim de frequência, livro de ponto); custeio; coleta de preços; prestação de contas; autorização de pagamento (água, luz, telefone, balancete, etc); contabilidade; livro diário; livro razão; livro de caixa; hábitos do consumo de energia elétrica, fotogramas, etc. Por outro lado outros documentos me interessaram: Secretaria (correspondência recebida – 1957/72; correspondência emitida - 1957/62); secretaria (correspondência expedida -1962/1968); projetos de pesquisa 1957/1964; projetos de pesquisa – 1957/1964.

Para produzir este discurso historiográfico acadêmico, recorri também, além das informações obtidas nos documentos acima citados, ao estudo do Livro de Leitura para adultos, elaborado pelo Movimento de Cultura Popular, especialmente pelas autoras Norma Porto Carreiro e Josina Godoy.

O tempo pesquisado

A proclamação da República no Brasil não foi suficiente para termos um “projeto de escola republicana”. Só em 1932, com o Manifesto dos Pioneiros da

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Educação Nova, tivemos algo formalizado em relação a um projeto republicano em educação, foi o que afirmou Flávio Brayner (2008, p. 68) no livro Educação e Republicanismo. Experimentos arendtianos para uma educação melhor. Para ele, este projeto apresentava:

[...] metodologias e didáticas renovadas (e inspiradas no pragmatismo americano, sob a grande influência de Anísio Teixeira), exigindo a incorporação das massas à educação escolar plena e voltada para o desenvolvimento social e econômico de uma nação que, cansada de ‘macaquear’ a Europa, gostaria, agora, de se inventar.

O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova36 (2010, p.33, 34) trazia “um balanço” da realidade atual “da educação pública, no Brasil”, após 43 anos de República, detectando a “falta de espírito filosófico e científico, na resolução de problemas da administração escolar”. A partir daí, a proposta dos mesmos foi a aplicação de uma educação nova, cujo princípio era servir aos interesses individuais vinculando a escola ao meio social, já que o homem é um ser social. O sistema de uma educação nova propõe ao Estado prover esta educação, com gratuidade e obrigatoriedade, laicidade, princípios científicos em todos os níveis de ensino, baseados na psicologia e nas ciências sociais.

Mas tentar pôr em prática uma escola laica, universal e gratuita era um grande desafio, principalmente porque a Igreja Católica não se mostrava favorável a esta perda de poder. As perseguições contra aqueles que assinaram o manifesto eram constantes e o regime ditatorial instalado por Getúlio Vargas dificultou mais ainda as estratégias em relação aos projetos de uma educação republicana. O próprio manifesto foi resultado do embate travado na IV Conferência Nacional de

36 O Manifesto evidenciava a Escola Nova, um movimento “que inspirou a criação de escolas inovadoras, por Cecil Reddie, ainda no séc. XIX, na Inglaterra”. Muitas instituições foram fundadas na Inglaterra, na Alemanha e em outros países europeus, americanos e asiáticos as ideias da Escola Nova foram bastante difundidas. A intenção era que as escolas novas deveriam ser um “laboratório de Pedagogia prática e constituir um internato, como um meio mais eficaz para educação integral”. Dentre outras coisas, quanto a formação intelectual na escola nova “recomenda-se preparar o espírito mediante o cultivo da capacidade de julgar e a aplicação do método científico: observação, hipótese, comprovação e lei. O trabalho individual deve consistir nas investigações de fatos ou documentos e na sua classificação, de acordo com a idade do educando, e o coletivo, na ordenação em comum do resultado dos trabalhos particulares. O ensino deve ser ministrado pela manhã, deixando a tarde livre ou dedicada ao estudo, segundo a idade.” (MENDONÇA, 1987, p. 22, 23, 24) Estas foram algumas características da Escola Nova que orientou ações pelo Brasil em seus aspectos gerais ou em seus aspectos específicos.

Referências

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