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CAPÍTULO 2. UM CENTRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS PARA UMA REGIÃO

2.4 Cursos, seminários, palestras e conferências: debates sobre educação

2.4.1 Problemas de política e administração no Nordeste Brasileiro

2.4.1.2 UMA EDUCAÇÃO PARA UMA REGIÃO

Aníbal Fernandes, ex-secretário da Justiça e da Instrução Pública de Pernambuco do governo de Sergio Loreto (1922-1926), remete-se a sua experiência na educação, constituindo uma ideia de região quando fala sobre Uma experiência no domínio da instrução primária em Pernambuco. O ex-secretário volta-se ao passado para apontar os problemas como o “banditismo” no Sertão, o espaço castigado pela seca que provoca o “êxodo à capital”:

As façanhas dos bandidos, que então cortavam aquelas veredas desertas, eram celebradas pelos cantadores populares (FERNANDES, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 26);

O que percebi então na área sertaneja percorrida é que o matar não era crime (EDUCAÇÃO E REGIÃO, FERNANDES, 1960, p. 26); A única aspiração do povo não era uma vaga na instrução, que lhes fizesse decifrar as letras do alfabeto; mas que viessem as chuvas; e que o sertão ficasse ‘verde’, única aspiração de um povo abandonado e isolado do mundo (EDUCAÇÃO E REGIÃO, FERNANDES, 1960, p. 27).

[...] zona imensa, quase inteiramente despovoada, aqui e ali com pequenos aglomerados de casas, que mais pareciam oásis no deserto, pouso de viajantes fatigados, de quase intermináveis travessias; a se sucederem caatingas e taboleiros, cuja vegetação agressiva de mandacarús, facheiros e macambiras nos oprimia como pesadelo. (FERNANDES, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 27) Percebi nesta viagem, de mais de três décadas atrás, quando as dificuldades eram quase intransponíveis, que se deveria examinar as condições de vida dessas populações esparsas, e dar-lhes instrução adequada; com o fim de não despertar no povo o gosto da burocracia ou da cidade; mas o objetivo de fixá-los na região (FERNANDES, EDUCAÇÃO E REGIÃO 1960, p. 27).

Uma região que na época de sua administração estava cheia de problemas (alguns não existem mais como o banditismo, o cangaço, outros ainda perduram – a seca, o êxodo), mas que mesmo assim foram possíveis algumas ações, algumas mudanças, como as escolas artesanais.

Gilberto Osório Andrade (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 54) ao falar do ensino rural nos anos de 1953 disse que era uma total discrepância no interior. As escolas rurais que recebiam verbas diretamentamente do governo federal tinham alunos, espaço físico e professores numa situação privilegiada enquanto as escolas ditas “de letras”, que recebiam recursos estaduais viviam em situação deplorável. Alunos das escolas rurais tinham roupas, calçados, material escolar; professores tinham moradia gratuita, gratificação extra. Uma total regalia, ou como Andrade (1960) afirmou “dualismo” no interior do Estado. Tanto ele quanto o deputado Nilo Pereira conversaram com o diretor do INEP, Anísio Teixeira sobre essa realidade. Anísio concordou plenamente, orientando uma fusão e administração mais justa em prol destas escolas. Esta intervenção foi realizada ainda na administração de Gilberto Osório Andrade, que observou, dentre outras coisas, que muitas escolas rurais construídas para prestígio de algum político, que aparentemente era tão imponente, foram construídas em locais que não eram rurais e possuíam uma composição delicada e imperfeita.

Quando o então Secretário de Educação do Estado de Pernambuco, Aderbal Jurema,231 falou sobre Situação atual do Ensino Primário em Pernambuco, “os trabalhos manuais e o ruralismo escolar”, que visam a desenvolver a habilidade

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Aderbal Jurema foi Secretário de Educação no período de 10.09.54 até 01.07.58. No momento da palestra ele exercia a função de professor de Administração Escolar do secretariado de Merval Jurema, seu irmão, que ocupou o cargo no período de 03.07.58 até 13.11.58. Ver mais em: Galeria dos Secretários. Disponível em: < http://www.educacao.pe.gov.br>. Acesso em: jun. 2011.

manual dos alunos (“o controle dos movimentos”, “o gosto artístico”, “a iniciação artesanal”) e ainda:

Auxiliam os educandos a obter técnicas simples que servem como magníficos auxiliares para execução de projetos sugeridos em classe; são instrumentos de aprendizagem das aulas de cultura geral, de formação de bons hábitos e concorrem para a noção de responsabilidade, para o desenvolvimento de atenção, de interesse. Através de trabalhos manuais os alunos estão aprendendo a viver. Função idêntica o das práticas agrícolas, onde se é possível fazê-la, quer nas escolas da capital, quer nas escolas do interior, e nestas com maior intensidade. (JUREMA, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 72)

Esta habilidade manual é necessária tanto aos alunos das escolas da capital quanto do interior. A conciliação do urbano com o rural foi colocado pelo conferencista através da “lições de interdependência urbana-rural que Gilberto Freyre expôs, em uma série de conferências, na Universidade Rural de Pernambuco”. Depois destas “lições”, orientando-se a associar as tendências rural e urbana, o secretário (JUREMA, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 72, 73), prefere chamar as escolas de “escola comunitária”, “escola integrada na comunidade que serve”.

Na mesa redonda sobre O fator econômico na Educação Rural composta por Moreira de Sousa, Vamireh Chacon, Lauro Borba e Paulo Maciel ‘traços’ da região nordeste vão ser enfatizados. (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960).

Vamireh Chacon (apud EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 91), sobre região, disse que independente de uma educação rural ou urbana, ela precisa:

[...] ser voltada para o mundo, para uma tomada de consciência dos problemas ecológicos de cada região. Essa justamente uma das contribuições, descontados os exageros, da corrente de Dewey: uma perspectiva mais realista dos problemas. Claro que devemos adaptar a escola a cada região do Brasil, porque, sob esse ponto de vista, há “Brasis”... não há apenas o Brasil.

Em segundo lugar gostaríamos de dizer alguma coisa sobre a industrialização do campo. Nós estamos num culto, talvez, exagerado à cidade. Mas, com o tempo, a própria agricultura se industrializará, embora em ritmo mais lento.

Outra questão que evidencia a ideia de região são algumas reflexões sobre o que a “reforma agrária” vai provocar no meio rural. Lauro Borba (apud EDUCAÇÃO E REGIÃO 1960, p. 91) é um dos que comenta:

[...] o meio rural tem hoje uma organização. Esta é composta de um grupo já numeroso de Associações Rurais no interior do país; de acordo com a lei, há uma somente em cada município; em cada Estado, uma Federação; e no Brasil, uma Confederação Rural Brasileira. É uma sistematização que vem funcionando bem. Todos os anos há uma Conferência Rural Brasileira. Essa Conferência vem sendo precedida de Conferências Regionais. O Nordeste foi uma das primeiras regiões a reclamar essas conferências regionais, que, realmente, servem para sondar as aspirações e os desejos dos diversos meios, de modo que a Conferência está se tornando uma oportunidade de condesar essas aspirações.

Aderbal Jurema (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 95), presente também no debate da mesa redonda emitiu sua opinião sobre a “reforma agrária”, fazendo com que os participantes também vejam este Nordeste, esta região dita por ele:

O assunto aqui abordado me toca muito a sensibilidade, sobretudo depois de uma conferência do Drº Gilberto Freyre, editada pela Secretaria de Educação e Cultura, sobre a política rurbana, por ocasião de um curso de professoras rurais. Nessa palestra encontrei um realismo sociológico tão flagrante que ainda mais dele me deixei impregnar. Com este realismo tenho a impressão que a reforma agrária, tal como vem sendo posta em equação, não resolverá a situação do homem do interior, e o problema da educação rural. Isso porque a reforma agrária tem sido pensada mais em teoria, sob influências ideológicas, que a luz do conhecimento ecológico.

Assim, por exemplo, no sertão e no agreste a terra vem sendo trabalhada fora de sua vocação fisiográfica.

A ideia de Jurema foi que existem especificidades na terra do Nordeste que devem ser levadas em consideração. Para que a “reforma agrária” ocorresse seria necessária antes de qualquer coisa uma investigação sobre esta terra, sobre as várias condições do seu solo, estudando “cientificamente a terra” (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 96). Integrando esta discussão, Gilberto Freyre comenta que está se chegando a conclusões que muitas vezes “máquinas desenvolvidas” para outras terras não servem aos “solos tropicais”. (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 96).

Paulo Maciel (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 96), que compõe a mesa redonda, recorda-se de outro artigo de Freyre “que fala da reinculturação dos valores rurais através do folklore, mostrando que o mais interessante é a infiltração de valores rurais através do tratamento urbano”.

Num debate, ainda nesta mesa redonda sobre os “centros de interesses” expostos por Dewey e Claparède, Paulo Maciel e Aderbal Jurema tentam entender tais centros na perspectiva da região, dos ‘nossos’ interesses, dos ‘nossos’ centros

de interesse. Jurema (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 98) afirmou que se deve fazer do “método Dewey um fim e não um meio”, para isso é necessário fazer, como ele fez, “investi contra as exposições decorativas nas escolas”:

Essas exposições eram o seguinte: surgiam nas escolas as pinturas decalcadas, surgia a invasão dos trabalhos de agulha, etc. Eu não desprezei este trabalho, mas mostrei que devíamos usar os meios regionais de expressão da alma. O Drº Gilberto Freyre viu nossa exposição no Grupo Escolar Murilo Braga, de um curso de dois meses, que demonstrou que ecologicamente nos estamos certos: toda professora pernambucana conhece nossas fibras, nossos doces caseiros, etc. É uma coisa que digo com orgulho.

Outra conversação se dá entre Jurema e Lauro Borba, que se reportam à “industrialização da zona do São Francisco”. Para Jurema, investimento fracassado; para Borba houve uma mudança nos planos. Tentando dismistificar em Jurema uma “ideia pessimista sobre o solo sertanejo”, Borba explica:

Precisamente aquele plano que houve era destinado a aproveitar as terras fertilíssimas da margem do São Francisco. O que houve é que um plano agrícola foi transformado num plano industrial absurdo; porque não se concebe construir um prédio de três pavimentos, para se fazer uma xarqueada numa zona em que não havia probabilidade de rebanho.

Mas qualquer estudante de geologia sabe que os afluentes do São Franscisco inundam largamente as suas margens; e que essa inundação dá lugar a uma sedimentação secular. Nós temos terrenos com dois metros de profundidade de húmus!

Jurema logo tratou de se explicar afirmando que se referia ao alto sertão e não as terras margeadas pelo rio São Francisco.

Em 6 de setembro de 1958 o conferencista foi Paulo Rosas, técnico do Centro Regional de Pesquisas Educaconais do Recife: A escola confessional em Pernambuco, baseada na pesquisa feita por ele mesmo. Mesmo intencionando falar sobre o ensino confessional, Rosas contextualiza sua palestra diante da perspectiva de uma educação que almeja, pretende ser regional e anuncia:

Faz algum tempo, por sua evidência, a preocupação com um sistema regional de educação ou pelo menos adaptável à região empolga os professores nordestinos. O “I Congresso Nacional de Professores do Ensino Secundário” deu ênfase à flexibilidade dos currículos, visando a um melhor ajustamento do plano às exigências regionais. Os professores médios estamos de acordo quanto à inoperância de programas rígidos e iguais para São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Pará (DOXA, dez/1958, p. 62).

Dando continuidade, questionou Rosas (DOXA, dez/1958, p. 62): “A própria

linguagem dos livros didáticos adequados aos James Deans e Elvis Presley do ‘Snack Bar’ será adequada aos nossos?”

Para Rosas (DOXA, dez/1958, p. 62) quando Gilberto Freyre escolhe ter como temática do centro o curso sobre “Problemas de Política e Administração Escolares no Nordeste”, o fez porque hoje esta perspectiva é comum em meio aos professores, e porque arremessa “para o debate um dos traços mais definidores de sua interpretação sociológica do Brasil – a visão regionalista”.

A posição regionalista, para Rosas (DOXA, dez/1958, p. 62), também foi a “inspiração destes Centros Regionais de Pesquisas Educacionais, desde quando eram chamadas de Altos Estudos Educacionais até a feliz oportunidade do ‘documento Klinenberg’”. Mas, contemplar o regionalismo, nesta ocasião, também foi uma estratégia do professor para inserir o tema principal: a educação religiosa232, tanto que ao discorrer sobre o ensino confessional Rosas buscará exemplos na história de ações de padres e ex-seminaristas com atuação na educação.

Algumas ideias sobre a região Nordeste também estavam presentes na conferência Educação e Política – suas relações no meio Nordestino, do professor Rafael de Menezes, ex-secretário de Educação da Paraíba, proferida em 20/09/58.

O ex-secretário inicia a palestra citando “o bom senso regionalista” do senador do Império Nabuco de Araújo, quando dizia que as leis teriam que ter “relações com as circunstâncias locais”. E reclama:

Dependendo, por exigência legal ou por cômoda imitação do que se faz no Sul – onde as normas e os sistemas já são o mais das vezes transcritos de experiências européias e americanas, levamos à ordem institucional e a muitos aspectos da nossa maneira de viver, um artificialismo que emperra e se arrebenta, como os automóveis de luxo das nossas estradas carroçáveis. Não chega ao termo da viagem e nos deixando nas zonas suburbanas não nos permitem uma penetração mais longinquas com os núcleos de nossa realidade mais característica. (MENEZES, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 103)

Esta reclamação foi para inserir seu “depoimento”, “experiência”, com as questões específicas do Estado da Paraíba, que, de certa forma é diferente de

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É em 1958 que os Bispos Católicos entregam um Memorial ao presidente da República, pedindo o afastamento de Anísio Teixeira do Ministério da Educação (diretor do INEP e da Capes) por razões relacionadas ao temor da Igreja Católica perder seu poder diante da proposta de um ensino laico. Este assunto será discutido no próximo capítulo.

Pernambuco e do Ceará por não ter “uma função metropolitana”, mas é semelhante e conciliador quando traz “traços comuns ao Nordeste”. “Traços” de uma região que devem ser buscados por uma “política regionalista”, “traços” que devem ser respeitados pelos “órgãos de ensino”, pois fornecem “sentido aos processos pedagógicos”. Menezes ainda comenta tecendo uma ideia de região:

E como as linhas de força da nossa história são pautadas por diferenças regionais expressivas, a refletir a variedade geográfica e social de um país – continente, órgãos de ensino precisam respeitar essa realidade, tanto quanto possível – sem menosprezar as experiências e as conclusões de outros povos ou de outras regiões brasileiras, os princípios gerais que dão sentido aos processos pedagógicos – tanto quanto possível devem buscar numa política regionalista o bom senso que há de fazer a eficácia das instituições (MENEZES, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 111).

Foi com simpatia para uma política regionalista no ensino, que o debatedor Cláudio Souto se posiciona, afirmando sua satisfação com o palestrante, um “católico ortodoxo”, questionando se seria este tipo ideal de homem “cristão socialista” que se deve favorecer ou existe outro. Foi neste momento que Moreira de Sousa, diretor do Departamento de Pesquisas Educacionais do CRR, pergunta: “se não seria a desejar que o Centro Regional fixasse uma orientação de política educacional, ou mesmo uma filosofia da educação, em que o sentido cristão fosse respeitado e fosse seguido.”(MOREIRA APUD MENEZES, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 112).

Quem anunciou sua ideia de região foi o então diretor da Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais Moreira de Sousa (agosto/1959). A palestra de título: Tentativa Expressa de Escola Regional foi sobre o tempo em que esteve incumbido da educação no Estado do Ceará. O diretor disse (SOUSA, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 133, 134) como a “escola regional” foi orientada:

Pretendi, quis, preguei e orientei uma escola tipicamente regional, com educação especial para uma região, fora dos moldes clássicos e do modelo nacional, visando ao bem-estar de um povo que podia ser feliz, numa gleba que tem tudo para ser próspera – fertilidade da terra, salubridade do clima, energia do povo, faltando, apenas, administradores esclarecidos, com programas ajustados às exigências geográficas do meio físico e às veras necessidades da gente que a habita.

O diretor colocou todo o Ceará como comparte da região Nordeste, em especial o “Polígono das Secas”, citando o art. 198 da Constituição Federal vigente

no período. Ele denota o Ceará como o local que exprime maiores características dentre os Estados do “polígono”, por causa da “sua configuração geográfica”, “sua climatologia”, “sua fauna”, “sua flora”, “sua gente”, “sua economia” (SOUSA, EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 134). No Ceará:

O fenômeno metereológico das secas assola-o, periodicamente, reduzindo as reservas físicas e morais de seu povo, emprestando- lhe, por isso feição própria no conjunto da vida nacional. É terra diferente, de gente diferente, na amplitude do território brasileiro. Crê-se em virtude dessa singularidade não lhe caber, razoavelmente, uma escola copiada de regiões diversas, esquecidas de fisionomia fisiográfica e entropogeográfica, que lhe são peculiares.

E uma educação que pudesse combater esta natureza infausta era o que Moreira de Sousa (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 137, 138) pretendia, pois:

Nunca se dissera que nessa parte do Brasil a gente podia ser feliz e que a terra é boa, para, com trabalho, se tornar rica e próspera. Ricos e felizes são outros torrões, para onde se mandava que o povo emigrasse...Quando muito se ensinava a ler, promovendo o abandono do sertão, cálido e poeirento, com a indicação do litoral, onde se encontram a civilização, o progresso e o bem-estar...

Sousa (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960), tece uma região castigada pela seca, mas cuja terra na verdade poderia ser aproveitada se tivesse a devida atenção. Evitaria assim o êxodo do Sertão e a ilusão de que só em outros lugares a população pode ser feliz.

Mas nessa região, castigada pela seca e com problemas específicos da ‘terra’ também é necessária uma escola regional. Voltada para as áreas mais hostis, para o sertão, para o interior. É essa a “escola regional típica” instalada por Moreira de Sousa quando esteve à frente da Administração Escolar do Estado. “[...] Uma escola regional típica para uma terra de gente pobre, doente e ignorante [...]”. Matrículas dobraram em 5 anos, foi criado um “jardim da infância”. E em reação aos moldes antigos das escolas “nos sertões” buscou o administrador “transformá-la em síntese da vida” na qual “a criança se preparasse para os eventos da existência, no meio social, em que ia viver e a que devia servir”. Essas foram as ideias do Diretor da Divisão de Educação do CRR, Moreira de Sousa ainda ditas na sua palestra em 1959.

2.4.1.3 TEMÁTICA RECORRENTE: “ENSINO PRIMÁRIO”

O ensino “primário”, a educação “primária”, a instrução “primária” foi anunciado em quatro dos títulos das conferências ainda no ano de 1958: Uma experiência no domínio da instrução primária em Pernambuco de Aníbal Fernandes; Alguns problemas administrativos do ensino público primário em Pernambuco de Gilberto Osório; Situação atual do ensino primário em Pernambuco de Aderbal Jurema; e Alguns comentários sobre estatísticas do ensino primário no Nordeste Oriental de Antônio Carolino Gonçalves.

Aníbal Fenandes (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 29) usou, citando Anísio Teixeira, em especial no seu trabalho: Escola pública, universal e gratuita, reproduzindo: “A educação já não pode ficar circunscrita à alfabetização ou à transmissão mecânica das três técnicas básicas da vida civilizada – ler, escrever e contar”. Como solução do ir além do “ler, escrever e contar” e prender as populações rurais às terras do sertão, são as “escolas artesanais”; estas existem em alguns municípios que habilitam o aluno na “marcenaria, serralharia mecânica, sapataria, alfaiataria, etc”, fundadas em 1957 (EDUCAÇÃO E REGIÃO, FERNANDES, 1960, p. 30). Ainda sobre isso, Fernandes (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 32) disse:

Assim melhor nos parece que o Estado, ao lado da escola primária, que Anísio Teixeira considera e muito bem o fundamento, a base da educação de toda nação, dê também ao povo a instrução artesanal, capaz de estabelecer o que Anísio chama a “base igualitária de oportunidade”. Porque o ABC, em si, não confere essa base; e deve ser considerado como um dos maiores responsáveis pelo abandono do interior, em busca das cidades, e no fomento do jogo do bicho, para o que o menino só precisa saber escrever e as 4 peças de conta.

A escola primária deve ser o mínimo oferecido gratuitamente para toda população pelo Estado. Citando ainda Anísio Teixeira, Fernandes (EDUCAÇÃO E REGIÃO, 1960, p. 35, 36) reproduz as palavras de quem ele chama de “lúcido educador”:

A meu ver, os recursos – sabiamente assegurados pela Constituição à educação – devem ser aplicados como algo de sagrado e à luz de dois critérios básicos: primeiro de assegurar a cada brasileiro o mínimo fundamental de educação gratuita, isto é, a escola primária; segundo somente custear com recursos públicos a educação post- primária de alunos escolhidos em livre competição, a fim de que o favor da educação gratuita não se faça meio de manter os privilégios,