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Suspensão de liminar e de sentença nas ações movidas contra o poder público

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL

CURSO DE DIREITO

MARÍLIA CAVALCANTE FRANÇA LIMA

SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA NAS AÇÕES MOVIDAS CONTRA O PODER PÚBLICO

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MARÍLIA CAVALCANTE FRANÇA LIMA

SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA NAS AÇÕES MOVIDAS CONTRA O PODER PÚBLICO

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Doutor Juvêncio Vasconcelos Viana.

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MARÍLIA CAVALCANTE FRANÇA LIMA

SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA NAS AÇÕES MOVIDAS CONTRA O PODER PÚBLICO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em: ______/______/______

1. BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________ Prof. Dr. Juvêncio Vasconcelos Viana (Orientador)

Universidade Federal do Ceará – UFC

_____________________________________________ Prof. José Péricles de Sousa

Universidade Federal do Ceará – UFC

_____________________________________________ Prof. Daniel Gomes de Miranda

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AGRADECIMENTOS

A DEUS, que me deu vida e inteligência, e que me dá força para continuar a caminhada em busca dos meus objetivos.

À minha mãe, Maria Cavalcante França, que me ensinou a não temer desafios e a superar os obstáculos com humildade.

Aos professores da Faculdade de Direito, pelas lições aprendidas durante os anos em que estive na faculdade, pelos importantíssimos ensinamentos jurídicos, sem os quais não poderia sequer ter iniciado o presente trabalho.

Aos professores que aceitaram o convite para participar da Banca examinadora deste estudo, notadamente ao Professor Doutor Juvêncio Vasconcelos Viana, por orientar a presente monografia.

Aos colegas de faculdade, pelo companheirismo e amizade construídos durante minha vida acadêmica, marcando um período único e inesquecível em minha vida.

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RESUMO

Este estudo trata do Pedido de Suspensão da eficácia das Liminares e de Sentenças proferidas contra o Poder Público em juízo, para proteção do interesse público primário, relacionando os efeitos do seu deferimento com eventual lesão à ordem, saúde, segurança e economia públicas. Após um breve relato sobre a criação do instituto e as transformações ocorridas através de leis supervenientes e medidas provisórias pelo Poder Executivo, examina-se igualmente seu âmbito de incidência, sua natureza jurídica, seus pressupostos, a legitimidade para sua postulação, a competência para seu julgamento, sua eficácia e os demais aspectos procedimentais pelos quais se desenvolve, trazendo entendimentos adotados pelo Supremo Tribunal Federal para o desenvolvimento do instituto.

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ABSTRACT

This study treats the Request of Suspension of effectiveness of Preliminary Verdict and sentences given against the Public Power in judgement, for protection of the public primary interest, relating the effect of its granting with eventual damage to the order, public health, security and economy. After a short report about the creation of this institute and the transformations through the publication of supervening laws and provisional mesures by the Executive Power, analyses also its extent of incidence, its legal nature, its presuppositions, the legitimacy of its postulation, the ability for its judgment, its efficiency and too many proceeding aspects by with it is developed, bringing understandings adopted for the Supreme Federal Court for the development of the institute.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 07

1. ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA ACERCA DO PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR... 09

2. ASPECTOS GERAIS ENVOLVENDO O PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR... 18

2.1. Natureza Jurídica... 18

2.2. Legitimidade para o ajuizamento do pedido de suspensão... 25

2.3. Da competência para apreciação do requerimento de suspensão... 31

2.4. Pressupostos de concessão do pedido de suspensão... 35

2.4.1. Do Princípio da Supremacia do Interesse público e do Princípio da Proporcionalidade... 36

2.4.2. Conceitos indeterminados no pedido de suspensão: da grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas... 37

2.4.3. Ilegitimidade e decisão que aprecia o pedido de suspensão... 42

2.4.4.Medidas em avalanche... 44

3. DO PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE SUSPENSÃO... 46

3.1. Do prazo para interposição... 46

3.2. Da petição inicial e do procedimento... 46

3.3. Do contraditório... 48

3.4. Da ultra-atividade da decisão que concede o pedido de suspensão... 50

3.5. Da eficácia das decisões no pedido de suspensão e do agravo de instrumento contra a mesma liminar... 53

3.6. Do agravo interno contra a decisão do pedido de suspensão... 55

3.7. A suspensão da suspensão... 57

3.8. Cumulação de suspensões... 59

CONCLUSÃO... 60

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INTRODUÇÃO

O Princípio da Supremacia do Interesse Público deve ser empregado em proveito da coletividade, sendo lícito à Administração Pública restringir alguns direitos dos indivíduos quando interesses de elevada monta estiverem em risco, desde que essas limitações sejam realizadas conforme o princípio da legalidade. Nesse sentido, vale citar as prerrogativas inerentes à Fazenda Pública, tais como: as circunstâncias disciplinadas no caput do art. 5º da Lei 4.348/64, os dilatamentos dos prazos processuais, o instituto do reexame obrigatório, a impenhorabilidade dos bens públicos, a desnecessidade de preparo na interposição de recursos, e, finalmente, a suspensão da eficácia das medidas liminares e sentenças proferidas em oposição aos fins almejados pelo Poder Público, que caracteriza o tema a ser examinado com minúcia no decorrer do presente trabalho.

Ao longo do tempo, o Poder Público estabeleceu uma série de vedações em relação ao uso do mandado de segurança, à concessão de medidas cautelares e de antecipações de tutela aos particulares, de modo que a suspensão de decisões judiciais surgiu como mais uma maneira de resguardar o interesse público que, nada obstante sua proeminência, deve sempre ser analisado tendo em vista o princípio da proporcionalidade, através de uma ponderação, não se podendo olvidar da importância da efetividade da tutela jurisdicional e dos demais princípios insculpidos em nossa Carta Magna.

De início, tem-se o propósito de efetuar uma breve análise da evolução histórica acerca do mecanismo suspensivo, apreciando sua origem remota, as primeiras previsões legislativas existentes no Brasil e as transformações legais que incidiram com o decurso do tempo, para se chegar ao panorama atual, além da elaboração de críticas às medidas provisórias utilizadas imprudentemente, em flagrante inconstitucionalidade material.

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a competência para apreciá-lo são igualmente pontos a serem visualizados no bojo da presente exposição.

Ademais, os pressupostos legais para a concessão da sustação dos provimentos judiciais exarados contra a Fazenda Pública remetem a conceitos de interesses públicos vagos e imprecisos, os quais serão explicitados na medida do possível, porquanto se referem ao risco de grave lesão à ordem, à segurança, à saúde e à economia públicas. Vale ressaltar, ainda, a incidência do chamado efeito multiplicador, atualmente de grande propagação nas demandas aforadas contra o Estado, demonstrando a indiscutível relevância do tema.

Outrossim, o processamento do instituto será esquadrinhado, destacando-se a importância do procedimento utilizado, os requisitos da petição inicial, a existência ou não de prazo para ajuizamento, a aplicação do contraditório, a eficácia ultra-ativa da decisão concessiva da sustação da decisão, os recursos que podem ser interpostos contra a mesma e as suspensões repetitivas.

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1. ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA ACERCA DO PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR

Previamente a uma abordagem mais profunda referente ao assunto que ora se explicita, é imprescindível situar o pedido de suspensão de liminar no ordenamento jurídico brasileiro, estabelecendo suas bases históricas, a origem remota do instituto, bem como as sucessivas transformações normativas que acarretaram o contemporâneo panorama de tal entidade jurídica.

O nascimento do instituto é remetido ao direito romano, notadamente no que dizia respeito à intercessio1, que inspirou a suspensão de decisões exaradas contra o Poder Público no Brasil e em outros países que praticam medidas análogas à nossa, de maneira especial porque aquele mecanismo se fundava no poder de veto de um juiz em relação a atos proferidos por outros magistrados, não se caracterizando como um tipo de recurso, e sim como ação ou meio político de controle e proteção de direitos individuais.

No direito brasileiro, a previsão legislativa explícita da suspensão de execução das decisões judiciais surgiu com o advento da Lei nº. 191, de 16 de janeiro de 1936, que regulou o mandado de segurança disciplinado na Constituição de 1934, o qual estava submetido à fortíssima influência do habeas corpus, de acordo com Marcelo Abelha Rodrigues:

“a legislação do mandado de segurança com a previsão do incidente de suspensão de execução de liminar (e posteriormente de sentença), que nele era concedida, veio surgir justamente porque não era mais possível continuar a dar uma interpretação mais elástica ao habeas corpus, cuja finalidade e natureza eram a tutela da liberdade física.”2

Cumpre dizer, para melhor elucidação do tema em liça, que a elaboração do writ decorreu da necessidade de englobar situações jurídicas não abrangidas pela concepção clássica do habeas corpus, a qual vinha sendo desvirtuada, de modo que, por extenso período de tempo, este último era o único remédio competente

1Em relação a este antigo meio de impugnação: “No período republicano, em princípio, não se conhecem

recursos tendentes ao exame das decisões proferidas, conhecendo-se, porém, certos meios processuais dirigidos contra a sentença. Entre eles conheciam os romanos a intercessio, a revocatio in duplum e a restitutio in integrum. Pela intercessio, um magistrado da mesma categoria ou de categoria superior à daquele que proferiu

sentença impedida por meio de veto que o ato fosse executado”. CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de direito romano. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 429.

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para resguardar direito líquido e certo, porquanto o primitivo texto da Constituição de 1891 possibilitava seu alargamento para situações não penais. Por conseguinte, a partir das prescrições encerradas no art. 113, §33, da Constituição de 19343, fixou-se que o mandado de fixou-segurança acompanharia o mesmo procedimento do habeas corpus, ainda que as inúmeras dúvidas sobre o assunto tenham ensejado o surgimento de regramento específico a respeito da ação mandamental, consubstanciado na Lei nº. 191, de 16 de janeiro de 1936.

O art. 11 da sobredita lei estabelecia a impossibilidade de incidir o efeito suspensivo nos recursos interpostos caso fosse concedida a segurança, in verbis:

“Cabe recurso, dentro de cinco dias, contados, da intimação, da decisão que indeferir in limite o pedido ou que, a final, conceder ou denegar o mandado. O recurso não terá efeito suspensivo, porém, nos próprios autos originários”.

Todavia, o pedido de suspensão disposto no artigo 13 da Lei nº. 191, de 16 de janeiro de 1936 foi criado para sobrestar a eficácia das liminares no mandado de segurança e, em momento ulterior, de sentenças, com o intuito de conceder efeito suspensivo ao recurso interposto contra decisão benigna ao impetrante, com ênfase no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, nos seguintes termos:

“Nos casos do art. 8º, §9º, e art. 10, poderá o Presidente da Corte Suprema, quando se tratar de decisão da Justiça Federal, ou da Corte de Apelação, quando se tratar de decisão da Justiça Local, a requerimento do representante da pessoa jurídica de direito público interessada, para evitar grave lesão à ordem, à saúde ou à segurança pública, manter a execução do ato impugnado até o julgamento do feito, em primeira ou em segunda instância.”

Observe-se que a intenção do legislador, quando da primeira previsão normativa abrangendo o pedido de suspensão de segurança, era de que o mesmo fosse efetuado simultaneamente à interposição do recurso cabível, nada obstante atualmente não seja necessária essa circunstância para o seu emprego. A partir daquele momento facultou-se às pessoas jurídicas de direito público a suspensão das decisões judiciais que proporcionassem lesão a interesses públicos relevantes.

3O texto legal assim dispunha: “Dar-se-á mandado de segurança para a defesa de direito certo, líquido e

incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O processo será o mesmo do habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a pessoa de direito público interessada. O

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Marcelo Abelha Rodrigues explica que a proposta original do anteprojeto referente à Lei nº. 191/1936 dispunha, em seu artigo 5º, §3º:

“Não terá efeito suspensivo o recurso da decisão que conceder o mandado. Se, entretanto, o cumprimento imediato acarretar dano irreparável à ordem ou à saúde pública ou à segurança nacional, o Presidente do Tribunal ad quem poderá suspender, a requerimento da autoridade, a execução do mandado até a decisão do recurso”.

Assim sendo, verifica-se que o propósito do pedido de suspensão era conferir efeito suspensivo ao recurso interposto contra decisão proferida no writ, de maneira que a medida teria sua duração limitada ao julgamento do recurso. Todavia, a

expressão “do recurso” foi substituída pela expressão “do feito” 4 quando da promulgação da lei, desvinculando-se o pedido de suspensão do recurso eventualmente interposto.

A Carta de 1937 retirou do mandado de segurança sua garantia de remédio constitucional, em razão do momento político enfrentado pelo país, derivado do golpe de Estado conduzido por Getúlio Vargas, concomitante ao início do Estado Novo, tendo sido mantido o mesmo como norma infraconstitucional. Evidencia-se, além disso, que a mencionada Constituição não consentia a impetração do writ quando a autoridade coatora fosse Presidente da República ou Ministro de Estado, de modo que os atos por eles praticados restavam impossibilitados de serem contestados em sede de mandamus, o que limitou sobremaneira a aplicação do mecanismo de suspensão.

Nesse diapasão, o Código de Processo Civil de 1939 revogou a Lei nº. 191, de 16 de janeiro de 1936, estabelecendo em seu artigo 328, em relação ao procedimento do mandamus:

“Art. 328. A requerimento do representante da pessoa jurídica de direito público interessada e para evitar lesão grave à ordem, à saúde ou à segurança pública, poderá o presidente do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal de Apelação, conforme a competência, autorizar a execução do ato impugnado.”

É forçoso reconhecer que tal mudança legislativa advinda com o CPC/39 tornou a regra referente ao pedido de suspensão mais concisa que aquela anteriormente prevista no bojo da Lei nº. 191, vez que deixou de assinalar tempo

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determinado para a duração do instituto, embora a doutrina da época entendesse que a suspensão subsistiria até a substituição da liminar pela sentença ou pelo acórdão, tal qual dispunha a lei antecedente.

Ressalta-se, bem assim, que a questão da competência mostrou-se mais clara, como se denota no artigo acima transcrito, artigo este que, ao mesmo tempo, deixou à mostra elementos importantes para a compreensão do mecanismo suspensivo, sobretudo ao especificar as hipóteses em que seria cabível o pedido, os legitimados ativos, além dos pressupostos indispensáveis para que fosse provido.

Posteriormente, a Constituição promulgada em 1946 restabeleceu o status de garantia constitucional do mandado de segurança, suprimindo as antigas restrições, mormente em razão do disposto no artigo 141, §24, que assim estatuía:

“Para proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus, conceder-se-á mandado de segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.”

Por oportuno, impende destacar que a Lei 1.533, de 31 de dezembro de 1951, a qual sobreveio com o intuito de preencher lacunas existentes no CPC de 1939, revogou expressamente as disposições contidas nesse código relativas ao processamento do mandamus, assentando novas regras acerca do mandado de segurança e do pedido de suspensão das decisões judiciais em sede de writ, notadamente no artigo 13 da Lei 1.533, que se segue:

“Quando o mandado for concedido e o Presidente do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal Federal de Recursos ou do Tribunal de Justiça ordenar ao juiz a suspensão da execução da sentença, desse seu ato caberá agravo de petição para o tribunal a que presida.”

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Marcelo Abelha Rodrigues leciona, sobre o assunto:

“Parece que o ‘esquecimento’ do legislador com relação a identificação das hipóteses que ensejariam a suspensão da execução foi propositado, no sentido de permitir que ficasse a critério dos presidentes os motivos que justificassem a suspensão, tendo como parâmetro jurídico a legislação anterior.”5

O artigo 13 da Lei 1.533 recebeu inúmeras críticas, pois que não agrupou as novas regras sobre mandado de segurança de modo sistematizado. Por outro lado, a menção à possibilidade de interpor agravo de petição em face da decisão que concede a suspensão se configurou como inovação positiva. Além disso, cumpre salientar que a doutrina e jurisprudência dominantes na época interpretavam de modo amplo o sobredito dispositivo, para atingir também as medidas liminares concedidas em mandamus, além das sentenças.

Acerca do tema em exposição, Celso Agrícola Barbi assevera que:

“A Lei 1.533/51, no art. 13, mantendo o mesmo sistema da legislação anterior, permitia a suspensão da execução da ‘sentença concessiva’ do mandado de segurança, por ato do presidente do Supremo Tribunal federal, do tribunal federal de recursos ou do Tribunal de Justiça. Não fazia, porém, referência à suspensão da execução da ‘medida cautelar’ concedida no início da ação. Todavia, considerando a identidade de fins, a menor importância da liminar em comparação com a sentença final e a inutilidade do texto legislativo, se interpretada literalmente, a opinião predominante, e mais acertada firmou-se no sentido de permitir a suspensão da execução da ‘liminar’, nos mesmos termos em que permitia a suspensão da execução da sentença definitiva da ação.”6

Ademais, sobreveio a Lei nº. 4.348, de 26 de junho de 1964, a qual supriu a omissão existente na Lei 1.533/51, alargando, de modo expresso, o uso do pedido de suspensão para liminares e sentenças, prestigiando o princípio da segurança jurídica, ao corroborar as posições adotadas pela doutrina e jurisprudências atinentes ao instituto em comento.

Igualmente, enunciou o referido diploma legal os pressupostos para a concessão da suspensão, quais sejam: grave lesão à ordem, à segurança, à saúde e à economia públicas. Do mesmo modo, a Lei nº. 4.348/1964 despontou com o fito de evitar o uso imoderado do mandado de segurança, haja vista o período de ditadura militar, durante o qual os direitos e liberdades se encontravam limitados.

5 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de Segurança: São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. P. 80.

6 BARBI, Celso Agrícola.

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A mencionada regra proibiu a concessão de liminar em mandado de segurança para reclassificar, equiparar, estender vantagens ou conceder de aumentos a servidores públicos7 e, de mais a mais, previu em seu artigo 4º:

“Quando, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso (vetado), suspender, em despacho fundamentado, a execução de liminar, e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo, no prazo de dez (10) dias, contados da publicação do ato.”

A Lei nº. 4.348/1964 ampliou o rol dos bens protegidos, em razão da prevalência do interesse público sobre o privado, inovando quanto à possibilidade de sustação da eficácia de decisões judiciais que ocasionassem grave lesão à economia pública, além daquelas hipóteses outrora previstas no Código de Processo Civil de 1939, sendo essencial tal alteração para fundamentar o efeito multiplicador, tão disseminado recentemente.

Convém acrescer que o art. 4º da Lei nº. 4.348/1964 estabeleceu prazo para interpor o recurso de agravo, previsão esta indispensável àquela época, porquanto o entendimento dominante era no sentido de que o mandado de segurança não estaria submetido às regras constantes no Código de Processo Civil de 1939, em virtude da revogação dos dispositivos relativos ao mandamus pela Lei nº. 1533/51. Nesse contexto, cabe salientar que atualmente é cabível a interposição de agravo tanto da decisão que defere a suspensão de segurança, assim como da que indefere, inclusive, tendo o Supremo Tribunal Federal revogado a Súmula 5068, abaixo reproduzida:

“O agravo a que se refere o art. 4º da lei 4.348, de 26/6/1964, cabe, somente, do despacho do Presidente do Supremo Tribunal Federal que defere a suspensão de liminar, em mandado de segurança; não do que a denega”.

Nessa linha, Marcelo Abelha Rodrigues expõe que:

“Aliás, é interessante observar que a impossibilidade de utilização do sistema recursal do CPC de 39 em sede de mandado de segurança (redação original do art. 19 da Lei nº 1.533/51), bem como o fato de que a

7 O art. 5º da Lei nº. 4.348/66, ainda vigente, dispõe que: “Não será concedida a medida liminar de mandados de

segurança impetrados visando à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de

aumentos ou extensão de vantagens”.

8 Relativamente a mencionada revogação, cumpre observar a decisão prolatada na SS 1.945, AgR-AgR-AgR-QO

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própria LMS não previa recurso contra liminar no mandamus, e, somado ao decisivo fato de que estávamos num regime militar, com nacionalismo exacerbado, em que toda manifestação contra atos do poder Público (inclusive por mandado de segurança) era ofensivo ao interesse público, fez com que fosse aberto um fertilíssimo campo para florescimento do instituto da suspensão de segurança, visto aí como um sucedâneo recursal do agravo em prol da Fazenda Pública, nos casos ali previstos. Sem dúvida, a impossibilidade de agravar contra liminares em mandado de segurança e a simplicidade do procedimento de suspensão de segurança foram um prato cheio para o uso demasiado e sem um mínimo de rigor da suspensão de segurança por parte da Fazenda Pública.” 9

A Lei nº. 4.348/1964 permanece em vigor, embora tenha sofrido algumas modificações, tendo sido utilizada como base para ampliar o mecanismo de suspensão para outras situações além do mandado de segurança, tal qual elucida o artigo 12, §1º, da Lei 7.347/1985, relativo à ação civil pública, bem como o artigo 4º da Lei 8.437/1992 e artigo 16 da Lei nº. 9.507/1997, referentes à ação cautelar e ao habeas data, respectivamente.

Olvidou-se legislador da importância de uniformizar os institutos ao prever a suspensão de decisões exaradas contra o Poder Público em outros diplomas legais, sendo perceptível que tal extensão não foi decorrente de minuciosa análise técnica, e sim da evidente tentativa de restringir o uso de decisões de execução imediata, desvirtuando a finalidade inerente ao pedido de suspensão, qual seja, a proteção a interesses públicos relevantes.

A regra contida no artigo 12, §1º, da Lei 7.347, atinente à ação civil pública para defesa dos interesses difusos e coletivos, assim prescreve:

“A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada, da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação do ato.”

Diante desse fragmento legal constata-se que praticamente não existiram mudanças, se for estabelecida uma comparação com o artigo 4º da Lei nº. 4.348/1964. Contudo, notável transformação ocorreu no prazo para o manejo do recurso de agravo, que passou a ser de cinco dias nesse tipo de demanda, além de apenas ser aceito o pedido de suspensão de liminar, de modo que a sentença de procedência com execução provisória em ação civil pública não era passível de ser

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sustada através do mecanismo em liça, anteriormente ao aparecimento da Lei nº. 8.437/92, norma inovadora que previu categoricamente a possibilidade de suspensão de sentença em ações civis públicas, ações cautelares e ações populares.

Cássio Scarpinella Bueno leciona, sobre o assunto:

“Já sob a égide da Constituição de 1988, a Lei nº 8.437/92 acabou por estender, genericamente, a todas as outras ações que dirigidas (ou potencializadas) contra os atos praticados pelo Poder Público, pudessem assumir caráter cautelar (inclusive liminarmente), as restrições encontradiças no sistema jurídico para concessão de liminares em se tratando de mandado de segurança (individual), já referidas.” 10

Já a suspensão da execução de acórdãos proferidos em mandados de segurança de competência originária de tribunal foi mais claramente disciplinada pela Lei nº. 8.038/90, que, em seu artigo 25, caput, possui o seguinte texto:

“Salvo quando a causa tiver por fundamento constitucional, compete ao presidente do Superior Tribunal de Justiça, a requerimento do Procurador-Geral da República ou da pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, suspender, em despacho fundamentado, a execução de liminar ou de decisão concessiva de mandado de segurança, proferida, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal.”

É mister chegar-se à conclusão de que tal regra previu, além da competência do STF ou STJ para apreciar o pedido de suspensão em writ de competência originária de tribunal, dependendo da matéria envolvida, a legitimidade para o Ministério Público, além de prazo diferenciado de cinco dias para o oferecimento do agravo regimental, se confrontado com aquele disposto na Lei nº. 4.348/64.

Ademais, é de se dizer que a Medida Provisória nº. 1570, de 26 de março de 1997, permitiu a utilização do pedido de suspensão nas antecipações de tutela concedidas em desfavor da Fazenda Pública, medida esta a qual, posteriormente às reedições 1.570-1, 1570-2, 1570-3, 1570-4, 1570-5, foi convertida na Lei nº. 9.494/97, cujo artigo 1º apresenta a seguinte redação:

Art. 1º. Aplica-se à tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de processo Civil o disposto nos arts. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei nº. 4.348, de 26 de junho de 1964, no art. 1º e seu §4º da Lei nº 5.021, de

10 BUENO, Cássio Scarpinella.

Liminar em mandado de segurança: um tema com variações. 2. ed., São Paulo:

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09 de junho de 1966, e nos arts. 1º, 3º e 4º da lei nº. 8.437, de 30 de junho de 1992.

Demais disso, a última edição da Medida Provisória 2.180-35, proferida pouco tempo antes do surgimento da Emenda Constitucional nº. 3211, emenda esta que consagrou a eficácia das medidas provisórias que lhes fossem anteriores, acabou

por “congelar” o procedimento de suspensão, inserindo uma série de modificações no instituto relativamente a prazos, concomitância com recurso, novo pedido de suspensão e pedido de suspensão coletivo, de modo que não existiram conversões em lei das inúmeras alterações da mencionada MP nos últimos anos.

Várias críticas foram publicadas, demonstrando a incongruência da alteração do procedimento de suspensão pelo Executivo, por meio de medidas provisórias, sem prazo para conversão em lei. Bem a propósito do tema, conceitua Cássio Scarpinella Bueno, a saber:

A Medida Provisória n. 2.180-35, de 24 de agosto de 2001, como era previsto à época, trouxe uma série de novidades. Previsível porque se avizinhava o dia em que se promulgaria o que veio a ser a Emenda n. 32, de 11 de setembro de 2001, e já era certo que haveria uma norma de transição infame, que ‘conservaria’ como leis todas as medidas provisórias até então editadas. Tratou-se, inequivocadamente, de se estabelecer um ‘direito adquirido’ às medidas provisórias até então criadas. Transformam-se ‘medidas provisórias’ em medidas ‘não provisórias’.12

Nesse mister, percebemos que a influência política do Executivo, através da MP 2.180-35 e suas reedições, que modificaram vários aspectos da Lei nº. 8.437/92 e 4.348/64, acarretando verdadeira ofensa ao processo legislativo federal, em flagrante inconstitucionalidade formal, deve ser analisada com certa desconfiança, inferindo-se que está em risco a segurança das relações jurídicas causada pelo mencionado congelamento.

11 Emenda Constitucional nº. 32/2001- “art. 2º: As medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação

desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até

deliberação definitiva do Congresso Nacional”.

12 BUENO, Cássio Scarpinella.

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2. ASPECTOS GERAIS ENVOLVENDO O PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR

2.1. Natureza jurídica

Inicialmente, cumpre dizer que a natureza jurídica do pedido de suspensão da eficácia de decisões judiciais proferidas contra a Fazenda Pública é um tema que envolve controvérsias13, existindo várias correntes doutrinárias que tratam o assunto de forma diferenciada. Afirmam alguns doutrinadores que o instituto teria caráter político-administrativo, enquanto outros defendem que o mesmo teria natureza recursal, se configurando como ação cautelar incidental de impugnação14, ou, ainda, como mero incidente processual.

Nada obstante, é imprescindível esclarecer que o pedido de suspensão possui a finalidade de sustar os efeitos de liminar ou sentença que acarrete grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia pública, não havendo reforma, desconstituição ou anulação da decisão15, apenas sendo retirada a executoriedade da mesma, o que comprova a impossibilidade de conferir-se natureza de recurso processual ou sucedâneo recursal ao instituto em tela, em que pese não apreciar eventual erro ou acerto do julgado.

Nesse sentido, segue lição de Marcelo Abelha Rodrigues:

“Nunca é demais repetir que o pedido de suspensão requerido ao presidente do tribunal não pretende a reforma ou anulação da decisão, o que significa dizer que, mesmo depois de concedida a medida, o conteúdo da decisão permanecerá incólume. As razões para se obter sustação da eficácia da decisão não está no conteúdo jurídico ou antijurídico da decisão concedida, mas na sua potencialidade de lesão ao interesse público, como bem salientou o Min. Edson Vidigal no AgRg 39-SC (2003/018807-1) ao dizer que “pedido de suspensão de liminar não possui natureza jurídica de recurso, ou seja, não propicia a devolução do conhecimento da matéria para eventual reforma. Trata-se de um instrumento processual de cunho eminentemente cautelar, que tem por finalidade a obtenção de providência absolutamente drástica, excepcional e provisória. (...) Daí não ser admitida sua utilização como simples mecanismo processual para modificar decisão desfavorável ao ente público.” 16

13 Cf. VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do Processo em face da Fazenda Pública. São Paulo:

Dialética, 2003, p. 237.

14 Nesse sentido, Cristina Gutierrez. Suspensão de Liminar e de Sentença na tutela do interesse Público. Rio de

Janeiro: Forense, 2000, citado por Viana, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do Processo em face da Fazenda Pública. São Paulo: Dialética, 2003, p. 237.

15 CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em juízo. 5. ed., São Paulo: Dialética, 2007, p. 437. 16 RODRIGUES, Marcelo Abelha.

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Os recursos são regidos pelo princípio da taxatividade, porquanto apenas aqueles expressamente previstos em lei são considerados como tal, o que não é o caso do pedido de suspensão que, como á fácil comprovar, não preenche os requisitos genéricos de admissibilidade dos recursos, tais como: tempestividade, preparo, devolutividade, legitimidade, competência, etc.

Não há prazo peremptório previsto em lei para que a pessoa jurídica de direito público interponha o pedido de suspensão, embora o STF já tenha considerado que o mesmo deve preceder à efetivação da medida17. Além disso, o efeito devolutivo relativo aos recursos, previsto no artigo 51218 do Código de Processo Civil, como forma de manifestação do princípio dispositivo, não incide no requerimento da suspensão, vez que este não visa reforma, anulação ou desconstituição de decisão.

Ao mesmo tempo, a legitimidade ativa para o pedido de suspensão é bem mais restrita que a legitimidade recursal19, limitando-se ao Ministério Público e às pessoas jurídicas de direito público. Outrossim, o interesse processual entre as duas espécies também é diverso. Nos recursos, a necessidade/utilidade está diretamente ligada à intenção de reformar, integrar, anular ou aclarar a decisão judicial guerreada, enquanto no pedido de suspensão este interesse correlaciona-se com o intento de sobrestar a eficácia de decisões contrárias a interesses públicos de extraordinária importância.

Verifica-se a desnecessidade, no pedido de suspensão, de impugnar especificamente os fundamentos da liminar concedida ou da sentença prolatada, além da inexistência do efeito substitutivo relativamente à decisão que se pretende sustar, já que não cabe ao Presidente do Tribunal a quem é dirigido o requerimento da suspensão a análise do mérito da ação que o ensejou.

Sábias são as palavras de Juvêncio Vasconcelos Viana sobre o assunto:

“Não se faz, no procedimento de suspensão, controle de mérito da ação proposta. Busca-se, ali, tão-só, a ocorrência ou não dos pressupostos de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

17 STF. Pleno. SS nº 3046/RS. Min Rel. Nery da Silveira. DJ Data 19/12/1991, p. 19709

apud FILHO, Napoleão

Nunes Maia. Estudos processuais sobre o mandado de segurança. 2ª ed. Fortaleza: UFC, 2002, p.137.

18Código de Processo Civil, “Art. 512. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a sentença ou a decisão

recorrida no que tiver sido objeto de recurso”.

19Código de Processo Civil, “Art. 499. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro

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20

Atendidos tais pressupostos, a suspensão é deferida, ainda que a liminar tenha sido concedida com a observância de seus requisitos legais. Doutra sorte, não demonstrados tais pressupostos, não há como suspender-se a execução da decisão.” 20

Além disso, a Constituição de 1988 não dispôs sobre a competência para apreciar o pedido de suspensão, inexistindo a instituição, pela Carta Magna, de um órgão ad quem para examinar tão pedido, concluindo-se que, se o mesmo fosse considerado um recurso21, seria inconstitucional.

Outros doutrinadores consideram que o pedido de suspensão teria natureza extraprocessual, como uma espécie de ato ou medida administrativa22. Através desse posicionamento, afirma-se que o Presidente do Tribunal exerceria função atípica de administração, suspendendo decisões judiciais em razão de seu poder de polícia, em decorrência do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

Othon Sidou foi o primeiro doutrinador a defender esse juízo, segundo assevera Marcelo Abelha Rodrigues, conquanto atualmente este pensamento seja alvo de muitas críticas, visto que, ao se conferir caráter administrativo ao ato que concede a suspensão, realizado pelo presidente do tribunal, estar-se-ia possibilitando que decisão administrativa fosse apta o bastante para tornar ineficaz decisão judicial, sobrepondo-se à mesma, em afronta ao princípio da separação dos poderes.

Essas são as palavras de Othon Sidou:

“O sentido exato do art. 13 da lei 1.533 não se pode dirigir, em apreço à técnica jurídica, à medida liminar e muito menos à sentença. Vale por um incidente extraprocessual, e se traduz como uma ordem em que o presidente do tribunal previne ao juiz da causa que tal ato tem sua autorização para executar-se ou deixar de executar-se, autorização que a lei lhe confere e até que sobre o ato duvidoso decida ordinariamente o corpo judiciário a que preside, ou até que sobre a autorização, incidentemente, decida o mesmo tribunal, por ser o competente para conhecer do eventual

20 Cf. VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do Processo em face da Fazenda Pública. São Paulo:

Dialética, 2003, p. 237.

21 Julgado que prestigia a tese de que o pedido de suspensão se trata de um recurso: 1ª Turma do STJ, REsp.

175360/DF, DJ 09-11-98, p. 33.

22 Precedentes do STJ no sentido de que o pedido de suspensão ostentaria feição política: Acórdão unânime da 2ª

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recurso. A ordem, portanto, não se atém à relação nem ao normal andamento do feito.” 23

Defendendo esse posicionamento, Ellen Gracie Northfleet se manifestou pela seguinte via:

“A leitura dos dispositivos que regem a matéria permite, desde logo, distinguir que a natureza do ato presidencial não se reveste de caráter revisional, nem se substitui ao reexame jurisdicional na via recursal própria. Para Francesco Conte, ‘trata-se... de um ato de caráter administrativo, que, sob este prisma, será examinado pelo presidente do tribunal, não se ajustando na moldura de ação ou mesmo ao conceito de recurso”. Em suma, o que ao presidente é dado aquilatar não é a correção ou equívoco da medida cuja suspensão se requer, mas a sua potencialidade de lesão a outros interesses superiormente protegidos, como se verá adiante. Pode ser que a liminar ou sentença sejam juridicamente irretocáveis, mas, ainda assim, ensejem risco de dano aos valores que a norma buscou proteger e, portanto, antes do trânsito em julgado, devam seus efeitos permanecer sobrestados. O requerimento de suspensão de segurança não constitui, portanto, recurso e, menos ainda ação.

(...)

De tudo isso se conclui que nesta excepcional autorização, a Presidência exerce atividade eminentemente política avaliando a potencialidade lesiva da medida concedida e deferindo-a em bases extra-jurídicas. Porque não examina o mérito da ação, nem questiona a juridicidade da medida atacada, é com discricionariedade própria de juízo de conveniência e oportunidade que a Presidência avalia o pedido de suspensão.”24

A despeito do raciocínio dos doutrinadores que sustentam a natureza político-administrativa do mecanismo suspensivo, urge reconhecer que esta é incompatível com a legislação pertinente ao tema, vez que o recurso de agravo é aquele previsto para reformar a decisão exarada pelo presidente do tribunal ao apreciar a suspensão, ao passo que é manifesto que um recurso de natureza processual, como o agravo, somente é cabível contra decisão de caráter judicial. Desse modo, como poderia um recurso de agravo, cabível contra decisões judiciais, ser manejado contra decisão administrativa? Esse é o motivo pelo qual rejeitamos o entendimento acima esposado.

Salienta-se que não cabe recurso extraordinário nem recurso especial contra acórdão que, em agravo interno ou regimental, confirma ou reforma a decisão exarada pelo presidente do tribunal no exame do pedido de suspensão. Contudo, tal

23 J. M.Othon Sidou. Do mandado de segurança. 2. ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1959. p. 452-453 apud

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de Segurança: sustação da eficácia de decisão judicial proferida contra o Poder Público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 100.

24 NORTHFLEET, Ellen Gracie. Suspensão de sentença e de liminar. Revista do processo nº 97, jan.-mar. 2000,

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22

proibição não é decorrente da natureza administrativa do instituto, e sim da vedação da análise de fatos e provas pela Súmula 279 do STF e Súmula 7 do STJ, pois a caracterização de lesão à segurança, saúde, ordem e economia públicas por muitas vezes depende do contexto fático contido na demanda25.

Desse modo, se tal decisão realmente se configurasse como medida administrativa, impossível seria sua impugnação por meio de agravo, a via adequada seria a de um novo mandado de segurança contra o presidente do tribunal que analisou a suspensão. Logo, reitera-se que não resta alternativa senão afastar a teoria de que a suspensão teria natureza administrativa, mesmo porque, se assim fosse, poderia o presidente do tribunal agir de ofício, prescindindo de requerimento da Fazenda Pública para suspender provimentos de urgência26.

Nesse contexto, assevera Elton Venturi:

“quando os tribunais, através de seus juízes presidentes ou de suas composições plenárias são chamados a decidir sobre os pedidos de suspensão, exercem inquestionável atividade jurisdicional, caracterizada, sobretudo, pela imparcialidade, pela substitutividade da vontade das partes em litígio e pela vinculação do julgamento à observância das normas constitucionais e legais.” 27

Na realidade, não se pode negar a natureza jurisdicional do pedido de suspensão das decisões judiciais contrárias ao Poder Público, motivo pelo qual serão analisadas as outras correntes que discutem a natureza jurídica do instituto.

Marcelo Abelha Rodrigues é um dos doutrinadores que defendem a natureza jurídica de incidente processual voluntário28 do requerimento de suspensão de execução de uma decisão judicial, o qual se manifestaria por intermédio de uma questão incidente, por sua vez provocada por uma defesa impeditiva argüida por parte da Fazenda Pública29, incidente este cuja competência é dos tribunais.

25 CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em juízo. 5. ed., São Paulo: Dialética, 2007. P. 438. 26 Brandão, Flávia Monteiro de Castro. Ob. Cit, p. 31

apud CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda

pública em juízo. 5. ed., São Paulo: Dialética: 2007.

27 VENTURI, Elton.

Suspensão de liminares e sentenças contrárias ao Poder Público. São Paulo: RT, 2005, n.

4.2, p.52.

28 Precedentes jurisprudenciais nesse sentido: 2ª Turma do STJ, REsp. 46405, DJ 22-09-97, REsp. 120.530/SP,

DJ 22-09-97

29 RODRIGUES, Marcelo Abelha.

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Leciona, ainda, que o mesmo possui finalidade preventiva e é acessório de um processo principal, do qual depende para sua existência. De fato, o incidente de suspensão não é dotado de autonomia, tendo sua origem a partir de uma liminar ou sentença proferida em uma ação, pois que se inexistente a decisão judicial causadora de grave lesão aos interesses públicos relevantes previstos em lei, não há que se falar no instituto em tela. Do mesmo modo, não faz parte da estrutura ordinária do processo, tratando-se de questão que surge incidentalmente.

Candido Rangel Dinamarco é adepto dessa posição, asseverando que o pedido de suspensão não acarreta formação de novo processo, apenas gerando expressivos desvios procedimentais. Sustenta que a suspensão seria um mero incidente do processo, da seguinte forma:

“Não surge um processo novo, mas a lei elabora um sistema mais complexo, ou menos, de apreciação de questão de ordem pública suscitada pela entidade de direito público. Esse incidente chega ao ponto de sujeitar-se a uma competência hierarquicamente diferenciada da competência para o próprio processo de impetração. É, todavia, um mero incidente do processo, tanto quanto uma exceção de incompetência relativa – e não processo incidente.”30

Além disso, cumpre acrescentar que o pedido de suspensão possui características de contracautela, para restabelecer equilíbrio entre as partes processuais. De acordo com Leonardo José Carneiro da Cunha:

“Atualmente, o pedido de suspensão cabe em todas as hipóteses em que se concede provimento de urgência contra a Fazenda Pública ou quando a sentença contém efeitos imediatos, por ser impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo. É que, sempre que se concede uma “cautela” contra o Poder Público, se admite, em contrapartida, uma contracautela. O pedido de suspensão é, pois, contracautela que se concede à Fazenda Pública.”31

A jurisprudência do STF tem prestigiado a corrente que atribui natureza cautelar ao pedido de Suspensão, consoante pode ser visto na Suspensão de Segurança 228, Rel. Min. Rafael Mayer, RTJ 125/904), o Min. Sepúlveda Pertence (AGRSS 846-3/DF), confere à decisão suspensiva natureza de contracautela, senão vejamos:

I. Suspensão de segurança: natureza cautelar e pressuposto de viabilidade do recurso cabível contra a decisão concessiva da ordem. A suspensão de

30 DINAMARCO, Cândido Rangel. Suspensão do Mandado de Segurança pelo Presidente do Tribunal. Revista

de Processo, nº 105, jan.-mar. 2002, p. 193.

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24

segurança, concedida liminar ou definitivamente, é contracautela que visa à salvaguarda da eficácia pleno do recurso que contra ela se possa manifestar, quando a execução imediata da decisão, posto que provisória, sujeita a riscos graves de lesão interesses públicos privilegiados - a ordem, a saúde, a segurança e a economia pública: sendo medida cautelar, não há regra nem princípio segundo os quais a suspensão da segurança devesse dispensar o pressuposto do fumus boni juris que, no particular, se substantiva na probabilidade de que, mediante o futuro provimento do recurso, venha a prevalecer a resistência oposta pela entidade estatal à pretensão do impetrante. (...)32

De outra banda, a lesão aos interesses públicos previstos na legislação, que possibilita a interposição do pedido de suspensão, equipara-se ao periculum in mora da medida cautelar, logo, pode haver um mínimo de delibação do mérito, vinculada à plausibilidade jurídica do pedido formulado, do mesmo modo que é importante a plausibilidade das razões da entidade pública.

Por fim, a posição mais acertada parece ser a de considerar o pedido de suspensão como um incidente processual de contracautela, medida acautelatória de eventual recurso contra decisão concessiva de liminar ou sentença, visando o impedimento do começo ou da continuidade de danos ao interesse público, originados por decisões judiciais.

Em nosso entendimento, embora a doutrina seja eivada de divergências acerca dessa cautelaridade, esta não é relativa ao pedido imediato efetuado pelo requerente, vez que o pedido de suspensão não é instrumental a um processo principal, e sim quanto à finalidade a ser alcançada pela medida, a qual é preventiva.

Sobre o assunto, essa é a importante lição de Juvêncio Vasconcelos Viana:

No STF, houve uma mudança de entendimento para, reconhecendo ares de cautelaridade ao pedido de suspensão, permitir, na via desse, o exame dos fundamentos da ação originária. Assim, por exemplo, cuidando-se de causa a respeito da qual já esteja firmada jurisprudência a favor do autor, não deveria a presidência suspender a execução da liminar. Faria a presidência juízo acerca da probabilidade de reforma da decisão – ou da sentença -; um exame da aparência do bom direito da entidade requerente. Ou seja, passa-se a verificar os requisitos próprios da tutela cautelar, quais sejam, o fumus boni iuris e o periculum in mora, sendo que este último permeia-se nas diversas espécies de “grave lesão”, citadas pela lei.

A linha anterior sempre foi a de não analisar o presidente se os pressupostos para a concessão da liminar estavam presentes ou se a

32 STF. Pleno. Agravo Regimental na suspensão de segurança nº. 846/DF. Min. Rel. Sepúlveda Pertence. Data

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decisão foi dada corretamente. Vê-se, agora, uma tendência ampliativa da cognição da presidência, permitindo a essa realizar sumario cognitio acerca dos fundamentos da ação principal.”33

Nesse sentido, Flávia Monteiro de Castro ensina:

“Uma vez que a finalidade desse instituto é sustar os efeitos de uma medida de urgência concedida contra o poder público (cautelar e antecipatória), seria a possibilidade de suspensão dos efeitos desta suspensão medida de natureza cautelar. O fato de a lei não determinar a existência do fumus boni iuris como pressuposto, mas apenas os casos de perigo (grave lesão à ordem, à saúde, à economia e à segurança públicas), não exclui a necessidade de sua demonstração.”34

Pode-se constatar, de pronto, que em determinadas situações o mérito da demanda originária será analisado quando da apreciação do pedido de suspensão, em razão da necessidade de verificação do fumus boni iuris e periculum in mora, embora a Suprema Corte ainda possua entendimentos divergentes sobre essa possibilidade, inexistindo um posicionamento pacificado sobre o tema.

2.2. Legitimidade para o ajuizamento do pedido de suspensão

A legitimação para interpor pedido de suspensão é concedida explicitamente pela lei às pessoas jurídicas de direito público e ao Ministério Público, afastando-se, em princípio, a possibilidade de tal requerimento ser efetuado por pessoas jurídicas de direito privado, até mesmo por aquelas componentes da Administração Pública Indireta, assim como concessionárias e permissionárias de serviços públicos.

Cumpre destacar, porém, que a literalidade da regra que assim dispõe vem sofrendo mitigações, desde o aparecimento do art. 4º da Lei 4.348/64, para estender a legitimidade a outros entes, sendo importante ressair os dizeres de Hely Lopes Meirelles, citado por Juvêncio Vasconcelos Viana, sobre o assunto:

“a redação desse dispositivo é evidentemente defeituosa, porque não só a entidade pública, como também o órgão interessado têm legitimidade para pleitear a suspensão da liminar, como ainda as pessoas e órgãos de direito privado passíveis da segurança e que suportarem os efeitos da liminar podem pedir a sua cassação”(...) 35

33 VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do Processo em face da Fazenda Pública. São Paulo: Dialética,

2003, p. 238. Grifo nosso.

34BRANDÃO, Flávia Monteiro de castro. “A suspensão das medidas de urgência nas ações contra o poder

Público à luz do devido processo legal”. Revista Dialética de Direito Processual n. 4. São Paulo: Dialética,

jul/2003, pp. 29/41. Grifo nosso.

35 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção,

Habeas data. 14ª ed., São Paulo: Malheiros, 1992 apud VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do Processo

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26

Merece registro que além dos legitimados legais para requerer a suspensão da eficácia de decisões judiciais proferidas contra a Fazenda Pública, como as pessoas jurídicas de direito público – União, Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias e fundações públicas nos âmbitos federal, estadual, distrital e municipal, e o Ministério Público, as pessoas jurídicas de direito privado podem ajuizar pedido de suspensão em algumas situações especiais, quando estiver ameaçado o interesse público conferido a elas pela Administração, excluindo a possibilidade de interposição do incidente quando o interesse seja meramente privado ou patrimonial da demandante. Nesse sentido já decidiu o STJ reiteradas vezes:

AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. BRASIL TELECOM S⁄A. LICITAÇÃO. FORNECIMENTO DE ACESSO À INTERNET. CONCORRÊNCIA COM EMBRATEL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO. ILEGITIMIDADE ATIVA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. NÃO-CONHECIMENTO DO AGRAVO. SÚMULA Nº 182⁄STJ.

1.São partes legítimas para pleitear suspensão de execução de decisão, nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, o Ministério Público ou a pessoa jurídica de direito público, nos termos da Lei nº 4.348⁄64, art. 4º.

2.A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem admitido também o ajuizamento da excepcional medida por entidades de direito privado no exercício de atividade delegada da Administração Pública, como as sociedades de economia mista e as concessionárias prestadoras de serviço público, quando na defesa de interesse público, naturalmente.

3.Tal construção jurisprudencial tem a finalidade de assegurar a preservação do interesse público, evitando-se a sobreposição do interesse privado.

4.Evidencia-se a ilegitimidade da Brasil Telecom S⁄A para propor pedido de suspensão de segurança, tendo em vista que manifesta o intuito de defender interesse próprio, eminentemente particular, pretendendo a adjudicação de contrato com órgão público, em igualdade de concorrência com outra concessionária pública, a Embratel.

5.Constitui pressuposto objetivo de admissibilidade de qualquer recurso a motivação, cumprindo ao recorrente não apenas declinar as razões de seu inconformismo, mas atacar precisamente os fundamentos que embasaram a decisão recorrida (CPC, art. 514, II).

6.Ausente a impugnação dos fundamentos da decisão que negou seguimento ao pedido de suspensão, esta permanece íntegra. Súmula nº 182 do STJ.

7.Agravo Regimental não-conhecido. 36

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O Supremo Tribunal Federal perfilha entendimento análogo:

“O pedido, entretanto, ao ver do Ministério público, não merece ser provido. Para legitimar as pessoas jurídicas de direito privado como postulantes da suspensão de segurança, ou de medida liminar, tem-se construído jurisprudência que busca temperar o rigor da norma regimental com a tutela do interesse público que, em certo grau, se encontra subjacente em empresas que, por delegação, concessão ou permissão, desenvolvem atividades originariamente afetas ao Poder Público. A partir daí, se o permissionário ou concessionário sofre as conseqüências da decisão concessiva da cautelar ou da segurança, com reflexos na ordem, na segurança, na saúde ou na economia pública, é possível interpretar a norma do art. 297 do RISTF com elastério tal que permita àqueles entes valer-se do pedido de suspensão. Assim, p. ex., entendeu o Ministro ANTONIO NEDER na SS 114, ao asseverar que as pessoas jurídicas de direito privado, com delegação do Poder Público, que venham a suportar os efeitos da liminar, estão legitimados a pedir a suspensão (RTJ 92/943). No mesmo sentido, proclamou o em. Ministro RAFAEL MAYER que “entidades da administração indireta, revestidas de personalidade de direito privado, estão legitimadas a postular, quando em causa o interesse público de que sejam titulares”, acrescentando estarem incluídas na abrangência desse conceito “as pessoas jurídicas particulares, quando concessionárias do serviço público e quando afetada a própria atividade que lhes foi, por concessão ou permissão, confiadas pelo poder Público” (DJ de 15.12.87, p. 28.616). Noção, portanto, preponderante dessa extensão interpretativa é, como se viu, a concorrência do interesse público que não pode, para esse efeito, ceder lugar a interesses de natureza estritamente privada. No caso, inobstante a relevância dos fundamentos invocados, não entrevê o Ministério Público a existência de tal pressuposto, senão mero pretexto para, sob o seu manto, obter-se a tutela de interesses exclusivamente particulares, que não podem comportar solução no âmbito da medida excepcional eleita.” 37

Assim, apenas quando a execução de liminares e sentenças contrárias às concessionárias e permissionárias de serviços públicos acarretarem lesão aos interesses públicos relevantes previstos na lei, bem como para resguardar os interesses da coletividade submetida aos serviços públicos delegados, é cabível o pedido de suspensão, nada obstante existam defensores da impossibilidade do pedido nessas circunstâncias, como Napoleão Nunes Maia Filho38, o qual assevera a inviabilidade de equiparação de entidades de direito privado às pessoas jurídicas de direito público.

37 Supremo Tribunal Federal. SS nº 227/RJ. Data do Julgamento: 25/04/1988. DJ 29/04/1988, p. 9856, rel. Min.

Rafael Mayer. Grifos nossos

38“A pessoa jurídica de direito privado, mesmo quando exerce função delegada do Poder Público não reveste

qualidade para curar macro-interesses públicos e a submissão dos atos de seu dirigente ao controle mandamental visa reforçar as garantias do indivíduo e não conferir ao ente privado qualquer privilégio, máxime o de nivela-lo,

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28

Caso almejem defender seus interesses particulares, cabe às pessoas jurídicas de direito privado o manejo de agravo de instrumento ou apelação para reforma da decisão, inexistindo legitimidade para o pedido de suspensão, a qual é justificada, especialmente, pelo princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

Demais disso, em relação às pessoas físicas, pode-se dizer que em regra não lhes é conferida legitimidade para interposição do pedido de suspensão, mormente para defesa de interesses particulares. Sem embargo de tal linha de raciocínio, em casos excepcionais se aceita que agente político, como prefeito municipal, afore requerimento de suspensão para sustar medida liminar que o tenha afastado do exercício do mandado eletivo, vez que nítido o interesse público que dá ensejo à contracautela:

Suspensão de segurança. Competência do Supremo Tribunal Federal. Legitimidade ativa para o requerimento. Questões supervenientes que prejudicam a suspensão. 1. Havendo discussão de questões constitucionais, seja no processo cautelar, seja no mandado de segurança, que dele resultou, a competência para a suspensão deste é do Presidente do Supremo Tribunal Federal (art. 4º da Lei nº. 4.348, de 26.06.1964, art. 297 do R.I.S.T.F. e art. 25 da Lei n.8.038, de 28.05.1990). 2. O Prefeito Municipal, alijado do exercício do mandado, por efeito de medida liminar em mandado de segurança, tem legitimidade para requerer a suspensão desta. 3. Julga-se prejudicado, no Supremo Tribunal Federal, o agravo regimental contra o deferimento de tal suspensão, se, após o processo de IMPEACHMENT, a que se submeteu o Prefeito, foi definitivamente afastado do exercício por decisão não questionada ainda perante a Corte. Agravo Regimental prejudicado porque superada a eficácia da liminar, que fora suspensa, e sua própria suspensão.39

Do mesmo modo, o STF já decidiu ser possível que pessoa física ocupante de função pública ajuíze pedido de suspensão com o fito de proteger as prerrogativas inerentes à função que exerce:

Suspensão de liminar: legitimação ativa. A exemplo do que se decidiu a propósito da qualificação do prefeito para requerer a suspensão de segurança que o destituíra (AgrSS 444, RTJ 141/380), o Procurador-geral junto ao Tribunal de Contas do Estado está legitimado para requerer a suspensão de liminar, confirmada pelo Tribunal de Justiça, que implicou o seu afastamento do exercício da função.40

É de se dizer, igualmente, que órgãos despersonalizados, porém com personalidade judiciária, tais como Assembléias Legislativas e Tribunais de Contas,

39 STF. Pleno. SS 444 AgR/MT, rel. Min. Sydney Sanches, j. 20/05/1992, DJ de 4/9/1992, p. 14.088

40 Stf. Pleno. Agravo Regimental da Petição nº. 2225/GO. Rel. Min. Maurício Corrêa. J. 10/02/2003. DJ de

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serão legítimos para requerer o incidente de suspensão para amparar suas prerrogativas institucionais, como apregoa Juvêncio Vasconcelos Viana:

“Assim, inclusive mediante precedentes jurisprudenciais, sustenta-se a possibilidade de órgãos despersonalizados, bem como de pessoas administrativas privadas no exercício de atividade delegada pelo Poder Público, os quais, em dadas situações, findam por suportar efeitos da medida, fazerem uso do pedido de suspensão, alargando-se, por razões sistemático-teleológicas, o rol dos legitimados.” 41

Assim já deliberou o STF, corroborando essa tese:

E M E N T A: Suspensão de segurança: liminar que susta realização de plebiscito para criação de município: legitimação da Assembléia Legislativa para requerer a suspensão, a qual, no caso, e de deferir-se. 1. A exemplo de que se consolidou com relação ao mandado de segurança, é de reconhecer-se a legitimação, para requerer-lhe a suspensão, ao órgão público não personificado quando a decisão questionada constitua óbice ao exercício de seus poderes ou prerrogativas. 2. No processo de instituição de municípios, a realização da consulta plebiscitária não gera efeitos irreversíveis: por isso a sua sustação só e de deferir-se - o que não e o caso -, quando extremamente plausível a impugnação a sua validade, mormente quando do adiamento resultar a frustração por longo tempo da emancipação aparentemente legitima.42

Além do mais, terceiro interessado também pode intentar pedido de suspensão, se compreendermos que a proteção dos direitos coletivos ultrapassa a pessoa jurídica, justificando o alargamento do elenco dos legitimados43. Ademais, é permitido a todos os legitimados para aforamento de ação coletiva ou a quem seja acometido por dano que reflita na ordem, economia, saúde e segurança públicas o ajuizamento pedido de suspensão44. De acordo com Marcelo Abelha Rodrigues:

“Vale dizer, ainda, que pouco importa se a pessoa já tenha sido parte no processo. Nada impede que tal incidente seja o primeiro momento de intervenção deste terceiro que até então não participara do feito. Claro que, a partir do momento em que é admitido o seu ingresso, deixa a condição de terceiro prejudicado e passa a ser mais um sujeito do processo”.

Assim já decidiu o STF:

- SUSPENSÃO DE LIMINAR. ART. 297 DO RI. CAESB. LEGITIMIDADE. LESÃO GRAVE A ORDEM ADMINISTRATIVA. EMPRESA PÚBLICA, ÓRGÃO DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA DO DISTRITO FEDERAL, LEGALMENTE INCUMBIDA DE TIPICO SERVIÇO PÚBLICO, A CAESB ESTA LEGITIMADA PARA INTERPOR PEDIDO DE SUSPENSÃO DE

41 VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Efetividade do Processo em face da Fazenda Pública. São Paulo: Dialética,

2003, p. 240/241.

42 STF. Pleno. Agravo Regimental na Suspensão de Segurança 936 / PR

– PARANA Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE Julgamento: 07/12/1995 DJ 23-02-1996 PP-03625 (grifo nosso)

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30

SEGURANÇA, QUANDO OS PRESSUPOSTOS DA MEDIDA SEJAM PERTINENTES A SUA ÁREA DE ATUAÇÃO. LESA GRAVEMENTE A ORDEM ADMINISTRATIVA A MEDIDA LIMINAR QUE INTERFERE EM CURSO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO TENDENTE A

SOLUCIONAR, INTERNA CORPORIS, PELA AUTORIDADE

COMPETENTE, CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES ENTRE ÓRGÃOS DO GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.45

Com efeito, indispensável é a presença do interesse jurídico, sendo necessária a demonstração do liame nas relações de direito material do processo original, da seguinte forma:

“(...) desde que demonstrada, pela pessoa jurídica de direito público, que o ato impugnado pela via do pedido de suspensão tem aptidão para interferir, negativamente, em sua própria competência administrativa, num daqueles valores constantes do dispositivo legal em foco – repita-se: ordem, saúde, segurança e economia públicas – ipso facto é, para os fins daquele

dispositivo legal, pessoa interessada e, consequentemente, legitimada.”46

Em relação à legitimidade do parquet para o pedido de suspensão, a Lei 8437/9247 traz essa hipótese, valendo ressaltar que, em razão do dever institucional deste órgão de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e serviços de relevância pública, aludida legitimidade é decorrente do art. 127 Constituição Federal, mesmo que o mencionado órgão não tenha sido sujeito do processo, inclusive, não prevendo a legislação a existência de óbices quanto ao requerimento do incidente de suspensão na justiça estadual, pelo Ministério Público Federal48, em consonância ao princípio da unidade institucional.

Dessa forma, o resguardo ao interesse público justificaria a legitimidade do Ministério Público para ajuizamento do pedido de suspensão, mesmo em relação às liminares concedidas em mandado de segurança, cuja Lei nº. 4348/64, referente ao processamento do writ, não prevê expressamente a possibilidade. Este é o sentido que rege a jurisprudência atual da Suprema Corte, conquanto renomados autores, tais como Hely Lopes Meirelles e Napoleão Maia Nunes Filho, rejeitem a

45 SS-AgR 202 / DF - DISTRITO FEDERAL

, DJ 05-02-1988 PP-01380,Relator(a): Min. RAFAEL MAYER

46 BUENO, Cássio Scarpinella. Liminar em mandado de segurança: um tema com variações. 2. ed., São Paulo:

Editora revista dos Tribunais, 1999. P. 233 (grifo do autor)

47 Art. 4º da Lei nº. 8437/92: “Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo

recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução de liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à

segurança e à economia públicas”.

48 RODRIGUES, Marcelo Abelha.

Referências

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