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20º Congresso Brasileiro de Sociologia. 12 a 17 de julho de UFPA Belém, PA. GT 13 - Sociologia da Juventude

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20º Congresso Brasileiro de Sociologia 12 a 17 de julho de 2021

UFPA – Belém, PA

GT 13 - Sociologia da Juventude

Pré-vestibulares populares em tempos de pandemia: professores voluntários e as condições de trabalho

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Introdução

Quadro, carteira, apagador, ventilador, janela, lápis, caderno. A sala de aula é muito mais que um espaço físico onde professores e estudantes se encontram para ensinar e aprender conteúdos disciplinares. É, sobretudo, um local de troca de conhecimento, mas também de transformação, de construção de identidades, e de interação com os outros. A sala de aula é um espaço fundamental para o estabelecimento de redes de sociabilidade onde os atores sociais conjugam suas experiências de estar no mundo. É o espaço onde educadores e alunos se olham e se escutam.

Em março de 2020, com a pandemia de COVID-19 e as medidas de distanciamento social, a concepção da sala de aula que conhecemos e estamos acostumados ganhou novos aspectos. A suspensão das atividades escolares presenciais foi uma das primeiras deliberações para conter o avanço do vírus, condicionando professores e alunos ao ensino remoto e à sala de aula virtual. Essa transição abrupta trouxe desafios para diversos profissionais da educação, entre eles professores e professoras de cursos pré-vestibulares populares.

Os cursos pré-vestibulares populares são iniciativas comunitárias de cunho educacional que possuem o objetivo geral de preparar sujeitos, em sua maioria jovens oriundos de camadas populares, para os exames de seleção das universidades públicas brasileiras. Com valores simbólicos ou oferecidos gratuitamente, seus organizadores se comprometem com os debates sobre a democratização no acesso ao ensino superior, de forma a elaborar uma formação político-pedagógica por meio da educação popular, lutando por políticas públicas de ação afirmativa.

Ao reforçarem as discussões em torno das desigualdades sociais e educacionais, da discriminação racial e da segregação urbana, essas associações buscam acabar com a lógica meritocrática de que todos possuem as mesmas oportunidades e condições para o ingresso ao ensino superior - um discurso que ignora a realidade de sujeitos pobres, negros e periféricos que enfrentam um ensino público sucateado e uma formação educacional deficitária. Assim, esse movimento no contexto das lutas educacionais existe em virtude da limitada presença das camadas populares nas universidades.

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Os “cursinhos” são espaços de socialização capazes de contribuir para a ampliação de outros saberes, da mudança de perspectiva do lugar social do estudante, da sua relação com a sua própria história e com a sociedade. Esses espaços conformam na abertura de novas redes de contato, porventura novas oportunidades de trabalho antes mesmo da entrada na universidade e, assim, exploram outros campos de possibilidades tanto de acesso ao ensino superior quanto em seu cotidiano. Os conteúdos exigidos pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) são ensinados em diversos locais como salas em igrejas, associação de moradores, residências, escolas e universidades, mostrando que suas ações mobilizam muitas pessoas, desde o trabalho voluntário de professores e professoras, assim como de membros responsáveis pela coordenação, até líderes locais e associações de moradores, que se engajam na luta para o acesso à universidade pública para a população negra, de baixa renda, de bairros periféricos e de escolas públicas.

Com a pandemia, muitos dos estudantes que fazem parte dessas associações, diante de seu contexto socioeconômico, não têm acesso às plataformas digitais, aos conteúdos propostos pelos professores e, principalmente, não têm acesso à internet de qualidade. Ter uma sala de aula, um lugar onde possam trocar saberes, é essencial para que sigam com suas atividades. Mas como é possível continuar normalmente com as aulas perante uma crise sanitária?

Diversos pré-vestibulares populares implementaram iniciativas para o acesso à internet, como a criação de vaquinhas virtuais para custear pacotes de dados virtuais. No Rio de Janeiro, desde o início da pandemia, além dos esforços para manter os estudantes nos cursos pré-vestibulares populares, também foram organizadas por inúmeros coletivos e redes de pré-vestibulares populares, campanhas solidárias com o intuito de arrecadar dinheiro, materiais de higiene e alimentos para ajudar os estudantes com dificuldades durante a quarentena. Além disso, foi produzido pelo Fórum de Pré-Vestibulares Populares do Rio de Janeiro, um manifesto que pedia o cancelamento do Enem 2020, destacando a dificuldade de acesso à internet, as péssimas condições de estudo e a crise financeira que afetou principalmente as camadas populares. Fatores que tornaram o exame de seleção um obstáculo ainda maior para a democratização do acesso ao ensino superior e que reforçam as desigualdades sociais.

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Assim como diversos professores e professoras da rede de ensino federal, estadual, municipal e privada, o corpo docente dos cursos pré-vestibulares também teve que encarar o desafio de disponibilizar aulas não presenciais para os estudantes, passando a utilizar a internet como meio fundamental de ensino-aprendizagem. Nesse processo de adaptação ocasionado pela pandemia e o novo formato de ensino, podemos observar que tanto os docentes quanto os discentes são afetados. De um lado, os professores e professoras tentam estimular os estudantes preparando slides, gravando vídeos de seus conteúdos, utilizando materiais de filmagem, imprimindo seu material, e até mesmo colocando quadros improvisados em suas casas. De outro lado, os estudantes que conseguem ter algum acesso a esse conteúdo, tentam conciliar seus estudos com as tarefas da vida cotidiana num tempo de completa incerteza. A dedicação à educação é ainda maior, fazendo com que muitos se sintam mais indispostos quando falamos em ensino remoto.

Tendo em vista o universo empírico, o presente artigo tem como objetivo analisar como se dão as práticas pedagógicas de professores e professoras e seus campos de possibilidades diante da pandemia de COVID-19, tendo como lócus privilegiado o pré-vestibular comunitário Oásis, para compreender as dificuldades de realizar suas atividades educacionais de forma remota e os impactos causados na educação dos estudantes. As questões sobre isolamento social em um período de dedicação aos estudos somado a tarefas da vida cotidiana são pertinentes para pensar o universo de pesquisa: como lidam com a ansiedade, o medo e as angústias em meio a situação que estão vivenciando? De que maneira a distância física pode ser um agente facilitador ou um agravante na aprendizagem dos alunos e nos ensinamentos dos professores?

Para responder a esses questionamentos e atingir os objetivos propostos, esta pesquisa assumiu uma perspectiva qualitativa para compreender os significados e características das ações dos sujeitos e suas práticas de representação do cotidiano.

Desta maneira, destaco o trabalho dos professores e professoras do Pré-Vestibular Comunitário Oásis, localizado na Ilha do Governador, região norte da cidade do Rio de Janeiro. Acompanhei este curso utilizando a netnografia como recurso metodológico no âmbito educacional, assistindo regularmente as aulas e

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as dinâmicas de ensino, bem como as reuniões do corpo docente, além de fazer entrevistas remotas e utilizar questionários para a sistematização de informações coletadas referentes às questões de trabalho, renda, escolaridade, lazer, motivações para o magistério e dificuldades nas práticas pedagógicas.

Pré-vestibulares populares: breve histórico, estratégias e desafios

Nas últimas décadas do século XX, foram mobilizadas diversas ações políticas em torno de uma educação de qualidade no Brasil. Nos anos 1980, com o processo de redemocratização do país, protagonizado por diversos setores da sociedade brasileira, como sindicatos, partidos, movimentos de trabalhadores rurais, professores e estudantes, entre outras frentes de luta1, possibilidades de mudanças estruturais na esfera pública foram desenvolvidas. Segundo Gohn (2011), nos últimos anos do regime militar, vimos os resultados dessas ações por meio de trabalhos da educação popular que, com a organização de propostas para a Constituinte e para a Constituição Federal de 1988, estimularam a descentralização das esferas de poder e fortaleceram as novas formas de participação social. Posteriormente à promulgação da Constituição foram implementadas leis complementares, emendas constitucionais e mecanismos institucionais pertinentes para a efetivação da educação como direito social. Demandas específicas como a educação do campo, a educação escolar indígena e os programas de inclusão e diversidade no ensino superior, que hoje se apresentam por meio do conjunto de ações afirmativas e de educação especial, estavam presentes nas pautas da época (COSTA, 2018). No entanto, ao longo dos anos 1990, a realidade nacional brasileira atingiu um novo cenário: a globalização da economia avançou, políticas públicas neoliberais ganharam espaço, o desemprego se expandiu e a economia informal

1 Na luta pela educação destacaram-se a ampla mobilização a União Nacional dos Estudantes (UNE), fundada em 1938, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), fundada em 1948, a Associação Nacional de Educação (ANDE), fundada em 1977, o Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), fundado em 1978, a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPEd), fundada em 1979, a Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior (ANDES), fundada em 1981, a Associação Nacional de Estudantes de Pós-Graduação (ANPG), fundada em 1986, e o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP), instituído em 1987.

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se intensificou. As políticas de abertura comercial e de ajuste econômico realizadas a partir do governo Collor que visavam a reestruturação econômica do país, trouxeram consequências sérias à vida dos trabalhadores. Os salários passaram a ser desvalorizados, as formas de contratação foram flexibilizadas, os direitos trabalhistas reduzidos, e postos de trabalho foram extintos como forma de garantir à indústria nacional melhores condições de competição internacional. Diante desse contexto desalentador de desregulamentação e precarização do trabalho, outras formas de participação política ganharam espaço como contraponto às consequências do modelo neoliberal, dentre elas os movimentos sociais com práticas vinculadas à educação e ao exercício de cidadania. Estes movimentos buscaram contribuir com o debate da educação nacional e com a construção democrática de um Plano Nacional de Educação (PNE) que atendesse aos anseios da sociedade brasileira e garantisse, em seu processo de construção e implementação, a interlocução entre o executivo nacional e a sociedade civil. Segundo Zago (2008, p. 261) com a expansão do ensino básico, pela urbanização e pelas transformações do mercado de trabalho, houve uma demanda da população pelo ensino superior, intensificando também a relação candidato-vaga nas universidades públicas, ocasionando o fortalecimento de iniciativas sociais pela defesa do ensino público.

Nos discursos e políticas sociais, a questão educacional se tornou um instrumento de reivindicação de direitos de cidadania e de defesa das minorias. Novos atores sociais passam a querer suas demandas reconhecidas na esfera pública, entre eles, o movimento de pré-vestibulares populares - movimento social que integra um conjunto de iniciativas pela democratização do ensino, na luta contra as desigualdades de acesso ao ensino superior.

As primeiras iniciativas de contribuir para o acesso da população historicamente marginalizada ao ensino superior vêm do movimento sindical, do movimento estudantil, dos movimentos comunitários, de profissionais da educação básica e superior, e também do movimento negro2 - com os exemplos do Pré-Vestibular para Negros e Carentes (PVNC) e do movimento Educação e Cidadania

2O PVNC e EDUCAFRO são pré-vestibulares sociais que exerceram um papel fundamental na luta pela democratização do acesso à universidade pública. Surgiram na região da Baixada Fluminense com forte influência de pessoas ligadas ao movimento negro e à Igreja Católica. Um dos principais expoentes dessa experiência pedagógica é o Frei Davi que ajudou a fundar ambos os cursos.

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de Afrodescendentes e Carentes (EDUCAFRO), surgidos em meados dos anos 90, e que espalharam seus núcleos pelo Rio de Janeiro e São Paulo. Em 1998, foi criado o Exame Nacional do Ensino Médio como forma de avaliação dos alunos do ensino médio. Em 2009, foi criado o Sistema de Seleção Unificada (SISU), que utiliza as notas do ENEM como forma de seleção nas instituições de ensino superior federais, na qual um candidato ou candidata por tem sua nota classificada em um ranking na disputa por vagas, podendo ingressar em universidades por todo o país. Em 2013, a Lei de Cotas3 foi implementada, possibilitando ao aluno concorrer pelas vagas através de cotas (estudante de escola pública e cota racial para negros, pardos e indígenas) ou ampla concorrência (PICANÇO, 2016). Apesar do aumento das vagas nas universidades, as desigualdades não se reduziram, dessa maneira, medidas governamentais foram adotadas para ampliar o acesso ao ensino superior, como: o Programa Universidade para Todos (PROUNI) 4 e o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI)5. Nesse contexto, surgem diversos cursos pré-vestibulares populares que visam preparar jovens e adultos para os exames de seleção para o ensino superior, entre eles o ENEM. Originando-se nos movimentos comunitários, parte significativa das experiências dos pré-vestibulares populares surge de projetos liderados por diretórios acadêmicos, do movimento estudantil, da participação de instituições religiosas, de associações comunitárias, de universidades, de estudantes, de egressos dos cursos pré-vestibulares populares, de professores, entre outros sujeitos e instituições.

3 Lei 12.711/2012, sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, que destina 50% das vagas em instituições federais a estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a meio salário mínimo, a estudantes oriundos de escolas públicas, com distribuição proporcional para candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas.

4 Nos anos 2000, o FIES (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior) se vinculou ao PROUNI (Programa Universidade para Todos), criado em 2004. O PROUNI é um programa que concede bolsas de estudos, integrais e parciais, em instituições particulares de ensino superior, para estudantes selecionados a partir de sua classificação no ENEM.

5 Criado em 2007 com o objetivo de conceder às instituições condições de expandir o acesso e garantir condições de permanência no ensino superior, o REUNI oferece às universidades investimentos, de acordo com o plano apresentado, para a recuperação das instalações, para equipamentos laboratoriais, para contratação de professores e funcionários administrativos, entre outros, seguindo as diretrizes para a redução das taxas de evasão, do aumento de número de vagas e a ocupação de vagas ociosas.

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Segundo Nascimento (2012), parte dos cursos pré-vestibulares populares têm outros objetivos que vão além do planejamento para o ENEM. Eles possuem interesses políticos que se explicitam nas ações e discursos de seus organizadores e nas atividades desenvolvidas por eles: buscam criar uma consciência social nos alunos ao trabalhar temas sobre racismo, preconceito, discriminação, questões de gênero, por exemplo.

O trabalho dos cursos pré-vestibulares populares indica, também, a insistência dos setores subalternizados da sociedade em acreditar que há razões para prosseguir lutando por cidadania, por igualdade racial e social, pelo respeito à diferença e à diversidade, por uma outra sociedade e pela vida (NASCIMENTO, 2012, p.2).

Sobre os processos educativos dos cursos em questão, podemos relacioná-los às reflexões de Bourdieu (1998) sobre as funções escolares de reprodução cultural e social. Para o autor, a escola é também responsável por manter e legitimar as desigualdades sociais ao trabalhar através de um discurso de igualdade formal que disfarça os privilégios de quem detém uma herança cultural, criando diferenciações profundas entre classes sociais. Através da perspectiva bourdieusiana podemos observar que os cursos pré-vestibulares populares se apoiam nas questões sobre desigualdades nas instituições de ensino, compreendendo os privilégios das classes dominantes em acessar o ensino superior, enfrentando os discursos hegemônicos sobre educação ao conceder protagonismo às camadas populares.

Além disso, muitas dessas associações trabalham com base na educação popular. Existe a tendência de utilizar as correntes pedagógicas de Paulo Freire sobre os conteúdos escolares, destacando a diversidade e o multiculturalismo em suas propostas educacionais. Como nas experiências de educação popular, essas iniciativas procuram modos alternativos de ensinar, valorizando os saberes populares, de forma a manter um espaço de criação de cidadania, dos comportamentos, das trajetórias, das visões de mundo, das condições sociais, das práticas e posturas cotidianas de seus alunos e de sua relação com outros grupos sociais, promovendo através da educação uma consciência crítica (SANTOS, 2005).

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contribuir com a ampliação do acesso ao ensino superior, esses projetos atuam em um espaço de transição entre a escola e a universidade, estando sujeitos à realidade conteudista das provas de seleção e o que se ensina nas escolas públicas. Aqui percebemos uma desarticulação entre o fazer pedagógico pautado nas práticas da educação popular como ferramenta de construção coletiva e crítica do conhecimento, e a proposta de capacitação das temáticas disciplinares para os exames – que podem nem ao menos ter sido citadas na vida escolar de estudantes da rede pública em comparação às redes de ensino privadas.

Quando levamos em conta a realidade do sistema de ensino brasileiro, conseguimos observar as diferenças de formação desde a educação básica. Como aponta Whitaker (2010), os estudantes de camadas populares enfrentam um ensino público sucateado, enquanto os estudantes de classes mais abastadas, são preparados para exames de seleção desde muito cedo, e ambos são avaliados da mesma forma. Segundo Rosistolato et. al (2011, p.619), as trajetórias de escolarização dos sujeitos em escolas públicas e periféricas impedem ou prejudicam a consolidação dos saberes que são considerados básicos. Nesse sentido, na disputa por vagas, alguns estudantes dos cursos já começam seus estudos em desvantagem, pois aprendem certos conteúdos tardiamente.

Apesar dessas circunstâncias, os pré-vestibulares populares têm se mostrado como uma das principais portas de entrada para os estudantes oriundos de camadas populares que buscam, através do diploma universitário, uma mudança significativa em questões de realização pessoal, formação profissional e inserção no mercado de trabalho.

Pré-vestibular Comunitário Oásis

Diante do extenso número de cursos pré-vestibulares populares espalhados pela cidade do Rio de Janeiro e da quantidade de organizadores vinculados a essas associações, destaco neste trabalho as ações do curso pré-vestibular comunitário Oásis, a partir das narrativas de professores e coordenadores envolvidos com este movimento para me ater principalmente às condições atuais de seu trabalho.

O Pré-vestibular Oásis se encontra em um dos bairros da Ilha do Governador, região localizada na zona norte da cidade. Na Ilha do Governador

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residem cerca de 210 mil habitantes (IBGE, 2010), espalhados por dezessete bairros que compõem a região. O Oásis é promovido pela Igreja Nossa Senhora D’Ajuda, no bairro da Freguesia (Ilha do Governador), desde 1998. A ideia de elaborar um curso pré-vestibular partiu do Movimento Oásis, onde um grupo de jovens tinha a pretensão de realizar uma atividade social na qual os egressos do ensino médio pudessem conquistar vagas em universidades públicas. Em seus primeiros anos de atuação, o curso ocupava as salas de aula do Colégio Estadual Mendes de Moraes, também localizado na Freguesia, até que em 2003, a igreja cedeu o local no qual está desde então.

Sem personalidade jurídica, o curso possui contribuição voluntária de 25 reais mensais por aluno, no entanto, caso algum estudante não consiga arcar com a mensalidade pode seguir seus estudos no pré-vestibular desde que avise a coordenação. Segundo Renato, um dos coordenadores responsáveis, todo o dinheiro arrecado é destinado a manutenção do pré-vestibular como sala de aula, materiais de limpeza, materiais escolares, lanches oferecidos nos intervalos das aulas e, em algumas ocasiões, passagem de ônibus para alunos e professores do curso

O curso é direcionado a alunos maiores de idade ou que completem a maioridade no decorrer do ano em que estão inscritos, que tenham concluído ou que estejam cursando o último ano do ensino médio. Nesse sentido, é comum encontrar pessoas que estão afastadas dos estudos há muito tempo e que precisam de apoio. Além disso, o curso conta com profissionais da área de educação, com formação comprovada ou participação autorizada pela coordenação do curso, voluntários e maiores de 18 anos. O Pré-Vestibular Comunitário Oásis possui quatro grupos em seu núcleo: a coordenação, o corpo docente, o corpo discente e o corpo de apoio. Quatro coordenadores, dezesseis professores em sua grade curricular, quatro monitores e cerca de 50 alunos por ano. Para fazer parte da coordenação é necessário que seja feito o convite pelos coordenadores do curso ou pelo Conselho do Movimento Oásis - Ilha do Governador. O Oásis não possui projeto político-pedagógico, mas conta com um regimento interno que os auxilia em suas funções diárias.

Através do regimento, o pré-vestibular determina deveres para todos os participantes do movimento, de forma a conseguir manter o controle de possíveis

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imprevistos durante o ano letivo. Segundo um de seus coordenadores, é uma maneira de fazer com que todo o corpo do curso siga uma só linha de raciocínio, com a intenção de manter uma imagem de unidade. Assim, são atribuições da coordenação elaborar a chamada para o ano letivo, convidar professores, estabelecer metas, organizar o calendário e a grade curricular, promover reuniões, entre outras atividades.

Os professores têm liberdade para seguir sua própria metodologia de ensino, desde que promovam o bom relacionamento com os alunos. Podem estimular os estudantes ao pensamento crítico com debates acerca do mundo atual, elaborando atividades fora da sala de aula quando possível.

A gente tem um pensamento de forma coletiva. Resultado para nós não é aprovação na universidade. É o que eu digo para eles desde o primeiro momento: a gente não está aqui por números de aprovação, a gente fica muito feliz com a aprovação de vocês, mas não importa no que estão sendo aprovados, muito menos a posição em que estão sendo aprovados e também não importa se você largar o curso porque você viu que não é o que você quer fazer. É o que que costumo falar em minhas aulas ou sempre que tenho que brigar com eles. A universidade é uma escolha, mas tem outros caminhos que não passam pela universidade então se você achar que em um determinado que isso não é o que você quer. ‘Não é medicina o que eu quero, eu quero ser técnico de enfermagem. E aí eu preciso fazer isso dessa forma para chegar no meu objetivo.’ Vai lá e vai ser feliz. A gente não se preocupa com dinheiro, se vai ganhar mais ou menos. A gente quer que essas pessoas que passam pela gente atinjam seus objetivos e consigam elas mesmas seus resultados.

No entanto, as obrigações dos professores estão sujeitas ao calendário previamente elaborado pela coordenação que, se interrompidas, podem causar a evasão de estudantes mais preocupados com resultados no vestibular. Dessa forma, as tarefas, simulados e provas, seguem sendo as principais práticas de ensino entre os professores.

O corpo de apoio é formado por ex-alunos e voluntários que procuram o Oásis para ajudar no que for preciso durante o período de aulas. Eles são responsáveis por abrir ou fechar o curso (com chaves fornecidas pela coordenação), por comunicar qualquer fato ocorrido em desacordo com o regimento, auxiliar os professores durante as aulas, imprimir materiais para uso do corpo discente, limpeza das instalações, etc. Além disso, durante o ano letivo, o

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curso promove confraternizações entre o corpo estudantil, fazendo com que se crie também uma rede de solidariedade e afeto entre eles.

Ao acompanhar o Pré-Vestibular Comunitário Oásis percebi que eles possuem uma postura rígida em relação às questões referentes aos direitos e deveres dos alunos. “Trajar-se adequadamente” e “evitar entrar sem autorização na sala da coordenação” estão entre as regras do pré-vestibular. Além disso, se porventura desistirem do curso devem informar por escrito à coordenação, ficando sujeitos a análise de matrícula no ano seguinte.

Além disso, os alunos devem informar à coordenação sua aprovação no ENEM e colocar-se, na medida do possível, à disposição para comunicar à próxima turma suas dificuldades e obstáculos vencidos, com a finalidade de motivar os próximos colegas a atingir o mesmo destino. Devem ser cordiais, pontuais (não podendo faltar mais que 25% das aulas), respeitosos, zelosos pela limpeza e manutenção das instalações do curso, entre outras regras de conduta. No regimento podemos encontrar doze deveres dos alunos, mas somente quatro direitos como: comparecimento às aulas regulares, autorização da matrícula no curso durante dois anos consecutivos a critério da coordenação do curso; acesso à biblioteca do curso; acesso ao material didático preparado pelos professores e coordenação; acesso a jornais e revistas, na medida que o curso venha a recebê-los a título de doação. Caso o aluno transgrida qualquer norma sua matrícula é cancelada.

O Pré-Vestibular Comunitário Oásis segue um modelo mais sistemático voltado para resultados nos exames, comumente encontrado em pré-vestibulares particulares. No entanto, o projeto contribui para a diminuição das desigualdades no campo da educação visto que a metodologia utilizada pelo pré-vestibular comunitário é voltada para a construção do saber, direcionada para a realidade de vida dos participantes, para a formação de sujeitos com possibilidades de intervir na sociedade e de melhorá-la.

Tem gente que gostaria de estar continuando e a gente tenta do nosso jeito de fazê-los continuarem, mas às vezes não dá por causa da família, do trabalho. Não é só questão de dinheiro e de querer estar ali, é uma realidade mais complexa. Eu entrei pela oportunidade de começar no que estava me formando, para criar minha rede de contatos e dar um retorno daquilo que ganhei e

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aprendi numa universidade pública. Fui pra coordenação porque poderia continuar ajudando, mas do lado mais gerencial, que eu sempre gostei mais. Também porque eu saberia que saindo da sala eu poderia dar oportunidade pra outra pessoa começar. Eu prefiro estar ali sem receber dinheiro, para não falar gastando com passagem, extremamente cansado, depois de trabalhar o dia todo…do que trabalhar em colégios para receber metade do piso, fazer meu trabalho, e ainda acharem que é pouco.

Com a pandemia de COVID-19, no ano letivo de 2020 o Oásis sofreu com a evasão de alunos. Deixaram de cobrar pelas mensalidades e tiveram que mudar radicalmente sua metodologia de ensino presencial para o ensino remoto. Muitos estudantes nesse ano, não somente pela dificuldade de acesso à internet, mas pelas angústias ocasionadas pela crise sanitária e as incertezas do que viria pela frente, resolveram deixar o curso. De mais de 40 alunos matriculados, apenas 4 permaneceram ligados ao curso assistindo as aulas remotamente. Além disso, alguns professores também aflitos com a situação pandêmica, com as dificuldades de adaptação ao ensino remoto, se afastaram do curso por tempo indeterminado até que conseguissem se ajustar às novas condições de trabalho.

Cada professor que permaneceu no curso determinava qual plataforma digital utilizaria para suas aulas. Alguns apenas colocavam seus conteúdos disciplinares em grupos de redes sociais, outros utilizavam videoconferências, outros imprimiam seus materiais e deixavam na sede do Oásis. Cada um à sua maneira procurando encontrar a melhor forma de auxiliar os estudantes no período em que eles mesmos buscavam alguma segurança.

Em 2021, os coordenadores agora mais acostumados a essa experiência, decidiram montar um esquema de organização das aulas completamente voltado para as atividades remotas. Utilizando a plataforma da empresa Google para videoconferências, montaram uma grade curricular com horários entre 18h30 e 22h30 (os mesmos horários de aulas presenciais), dividindo as disciplinas de acordo com a disponibilidade relatada por cada educador. No mês de janeiro, os organizadores fizeram uma chamada em sua página oficial do Facebook para alunos e alunas que quisessem participar do curso, mas destacando que as aulas seriam online até que todos fossem vacinados e a situação da pandemia estivesse controlada. Mais de 50 alunos se inscreveram e foram matriculados no curso e novos professores também passaram a fazer parte do corpo docente. No entanto,

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ao longo dos meses de 2021, alguns estudantes foram deixando de participar das reuniões, chegando atualmente ao número de 25 alunos assistindo às aulas regularmente.

Narrativas de professores e professoras

Se os cursos pré-vestibulares populares são espaços de socialização e de sociabilidades, eles são capazes de reunir diferentes grupos com diferentes necessidades, que se definem no plano das identidades, no modo como se percebem e percebem o outro, afirmando suas diferenças enquanto indivíduo ou grupo (ROCHA E TOSTA, 2009). Podem ser entendidos como núcleos de aprendizagem que carregam experiências e saberes que singularizam os sujeitos através da aspiração à educação superior. O curso pré-vestibular popular se torna um local onde estudantes e professores, compartilham suas experiências cotidianas, sendo um espaço não somente de preparação para o vestibular, mas de socialização, de reciprocidade, e de autoestima (SANGER, 2003).

Assim, essa pesquisa busca compreender os significados presentes em suas atividades pedagógicas através das narrativas dos docentes envolvidos com o pré-vestibular comunitário Oásis. Como objetivo geral, buscou-se analisar de que maneira a pandemia de COVID-19 contribuiu com novas responsabilidades aos docentes, afetando tanto as condições de trabalho como as condições emocionais dos profissionais da educação.

Na metodologia de pesquisa foi utilizado um questionário com perguntas de identificação pessoal e de formação profissional, bem como as motivações para o magistério e para a atuação em um curso pré-vestibular popular, além das dificuldades de adaptação para o ensino remoto. O questionário6 foi direcionado para três jovens professores7, de idades entre 20 e 29 anos, recém formados ou ainda em formação universitária, que lecionam as disciplinas de Português,

6 O questionário foi respondido entre abril e maio de 2021.

7 Fazendo parte da categoria juventude, meus interlocutores não estão determinados por uma

imagem esquemática proposta a partir de critérios biológicos e puramente aritméticos, mas fazem parte de um grupo de trajetórias diferenciadas como protagonistas em curso. Segundo Novaes (1997), o termo “juventude” no plural é utilizado para que se evite compreendê-lo como algo objetivamente definido por uma faixa etária. Se entendermos juventude como uma “idade da vida”, pode-se ocultar as diferenças entre jovens em termos de culturas, classes, grupos e configurações sociais. Com isso, compreendo a juventude não a partir de uma mera categorização etária, mas como uma categoria que engloba diferenças sociais e culturais.

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Literatura e Geografia, e que foram identificados respectivamente como Professora A, Professor B e Professor C. A partir de suas narrativas, sublinho os temas que mais se manifestam conjuntamente em suas falas, sobretudo, dando ênfase às condições de trabalho na pandemia.

Sobre as motivações para o trabalho voluntário em um curso pré-vestibular popular, os entrevistados apontaram principalmente a oportunidade de transformação social de seus alunos. A professora A conta: “Além da satisfação

pessoal em contribuir para a sociedade, a possibilidade de ajudar a proporcionar um ambiente de estudos de qualidade, pelo qual muitos não podem pagar”. O

professor C, que foi aluno do curso em questão, revela que seu compromisso é afetivo: “Eles [o Oásis] fizeram parte da minha caminhada até a faculdade. Então,

pela minha paixão pelo magistério e como uma forma de retribuir todo apoio que me ofereceram, hoje faço parte da equipe docente”.

Existem interesses particulares em torno dessas iniciativas. Existem aqueles que entendem a dimensão política de sua participação e existem aqueles que a negam. No caso dos entrevistados, todos compreendem o valor do trabalho voluntário como forma de construir uma sociedade mais inclusiva e participativa, possibilitando que grupos socialmente excluídos possam ingressar na universidade, compreendendo a importância política desse movimento. No entanto, existem aqueles que negam a dimensão política de sua atuação, ou entendem sua participação como oportunidade de formação profissional, nesse sentido, as motivações em torno dos cursos pré-vestibulares são plurais:

Os pré-vestibulares aparecem, portanto, como um movimento social em cuja base de formação e motivação não se encontra em projetos societários globalizantes alternativos ao hegemônico na nossa sociedade, mas que se apoia em um conjunto de valores e projetos que se referenciam a múltiplas contradições. (SANTOS, 2005, p. 191)

Assim, no interior dessas associações podemos encontrar indivíduos de segmentos sociais distintos, que possuem valores e projetos societários diferentes, que não necessariamente se entendam como militantes e que nem sempre estão de acordo com as ideologias do movimento em questão.

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Partindo para a utilização de recursos utilizados para a aplicação das aulas na pandemia, os professores se mostraram preocupados em como motivar seus alunos, visto que muitos não se sentem confortáveis em falar durante as disciplinas em videoconferência:

A distância, principalmente com as câmeras desligadas, impede que o professor capte aquele feeling, sabe, aquele retorno dos alunos... Aquelas caras de quem não entendeu nada, ou que mostram que estão acompanhando e você pode seguir com o conteúdo. Além do que fica fora da sala de aula... Do aluno poder te procurar pra qualquer assunto, da amizade, do carinho que a gente acaba cultivando com a turma. (Professora A)

Nessa mesma temática o professor B comenta: Sinto falta do quadro e da

convivência em sala de aula, mas principalmente da participação dos alunos. Acredito que em sala de aula isso seja mais natural. O ensino remoto por meio de

videoconferência, foi o principal recurso utilizado para que as aulas prosseguissem, no entanto, essa ferramenta apesar de aproximar pessoas localizadas em espaços diferentes, mas presentes fisicamente de forma on-line, ao mesmo tempo, prejudica as dinâmicas de uma aula comum.

[...] a videoconferência virtualiza a sala de aula também porque problematiza o papel do professor. Ao incluir a obrigatoriedade do conhecimento tecnológico como condição de existência da aula, amplia as exigências de atuação do docente, que precisa dominar os recursos e operar câmeras e microfones para que ocorra a comunicação com os alunos e, por consequência, a aprendizagem. (CRUZ, 2008, p. 204)

Nesse sentido, a videoconferência se mostra como um desafio para os professores. Durante as apresentações o professor nem sempre consegue ver a reação dos estudantes e perceber se estão interessados pelo tema e, assim, devem lidar com os silêncios frequentes nessa dinâmica de ensino. Silêncios, porque os alunos não ligam suas câmeras (porque não possuem câmeras, se sentem desconfortáveis em mostrar sua imagem, gastam mais dados de internet, entre outras razões) e não tiram dúvidas durante as apresentações, o que prejudica o conteúdo proposto. Assim, através de um monitor não é possível identificar com clareza as dificuldades e anseios dos alunos.

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Eu falo para eles que podem ligar a câmera, que tudo bem, mas que se não querem por alguma timidez tudo bem também. Eu ligo a câmera todas as vezes, mas não fico forçando para que eles liguem, porque eu não consigo vê-los quando estou apresentando. Eu quero que eles fiquem à vontade. O silêncio acontece com frequência, eu encaro de forma natural, seguindo a aula. Tento hora ou outra quebrar o gelo. Mas é uma das principais questões que a gente enfrenta sobre a participação dos alunos, que neste momento não está sendo tão boa. (Professor C)

O professor além de ter que saber dominar as ferramentas digitais, também deve ajustar seu planejamento para motivar os estudantes, tentando achar a metodologia mais eficiente para manter o envolvimento da turma durante suas apresentações. Nesses casos de videoconferência, muitas vezes o professor elabora um material digital da temática de sua disciplina em formato Powerpoint, levando mais tempo para desenvolver seus conteúdos, já que deve elaborar um material resumido e que, ao mesmo tempo, chame a atenção dos alunos.

Em relação a outras metodologias, os professores destacam além do uso de videoconferências para aulas expositivas, o envio de links de vídeo aulas disponibilizadas no Youtube em grupos em redes sociais como WhatsApp e Facebook, para que seus alunos possam assisti-los no celular - recurso mais utilizados pelos estudantes. Além disso, constantemente os professores disponibilizam materiais digitalizados de livros e apostilas para os alunos nas mesmas redes sociais.

Aos estudantes que não possuem acesso às plataformas digitais, são elaboradas apostilas impressas desenvolvidas pelos próprios professores que são depositadas na sede do curso. Nesses casos, a comunicação entre professores e alunos fica mais frequente e mais pessoal. Por não conseguirem assistir as aulas durante as apresentações online, os professores gravam seu material por mensagens de voz e enviam aos alunos para que saibam o que foi dito em aula e sanem suas dúvidas posteriormente. Um processo ainda mais dificultoso e que revela as condições mais desiguais escancaradas pela pandemia, ocasionado pela exclusão digital de inúmeros estudantes.

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Conta o professor B: com o ensino remoto passei a usar outras formas de

passar o conteúdo aos alunos com vídeos e um material online que disponibilizo no drive da turma para auxiliar o estudo dos alunos.

Sobre a adaptação ao ensino remoto e ao trabalho em casa, os professores B e C respectivamente relatam:

O computador que para de funcionar do nada, professor que cai durante a chamada, eu mesmo já cai diversas vezes durante a aula. Tem dias que a internet não funciona direito e tudo mais. Sem contar o ambiente, às vezes, a gente não está sozinho em casa. Tem familiares que estão em casa junto com a gente. Então são diversas coisas que meio que dificultam o ensino online.

Agora que a gente está no home office, passamos parte do nosso tempo no mesmo ambiente em que a gente trabalha, estuda e dorme. Então eu passo horas e horas do meu dia assistindo aulas da faculdade e logo em seguida eu tenho que dar aula, então as coisas ficam muito mal divididas. Fica uma coisa em cima da outra. A gente não consegue dar aquela acalmada, não tem o transporte para descansar na volta do trabalho. É tudo na mesma hora. As coisas são muito mais rápidas e frenéticas do que eu acredito que o presencial é. Acredito que até o tempo é melhor utilizado no presencial do que no virtual. Tudo é muito rápido. Você tem que falar muito rápido. Eu sinto essa pressão de que tudo está passando a 200 por hora.

Segundo suas narrativas, a adaptação ao ensino remoto se mostra como uma sobrecarrega na vida dos professores. Além das dificuldades de acesso à internet e do tempo de maior dedicação para o planejamento das aulas, os professores têm que lidar com o uso excessivo do computador que se torna mais que uma ferramenta de trabalho, mas o principal lugar em que permanece ao longo de seus dias - seja dando aulas, estudando, ou mesmo usando como passatempo.

Meu tempo de professor não é só aquele tempo de aula que eu dou. Na pandemia a gente está trabalhando até mais. Eu sinto que se fosse em outro momento, sem pandemia, as coisas seriam mais calmas e tranquilas (Professora C). De um modo

geral, os professores compreendem a pandemia como agravante na aprendizagem dos alunos e nas próprias dinâmicas de ensino. Por mais que se esforcem constantemente para sanar as dúvidas dos estudantes, o contato presencial se faz primordial.

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Considerações finais

Diferentemente de outros cursos pré-vestibulares populares do Rio de Janeiro, apesar das adversidades, o Oásis conseguiu manter as aulas desde o início da pandemia de COVID-19. Com a suspensão temporária das atividades presenciais, coordenadores, professores e professoras, planejaram um sistema de ensino que se adequasse ao cenário educacional atual. Ao utilizar o ensino remoto como meio fundamental de ensino-aprendizagem, as salas de aulas foram substituídas pelas videoconferências, os livros e apostilas foram trocados pelo formato PDF e os habituais corredores foram transformados em grupos de rede sociais.

Nesse processo de reinvenção das práticas pedagógicas, os professores de pré-vestibulares populares permanecem engajados na luta política de instruir os estudantes para as vagas no ensino superior, mesmo diante das dificuldades e barreiras encontradas tanto nas relações interpessoais prejudicadas pela distância, quanto pela exclusão digital de seus alunos. Por essa razão, os desafios dos pré-vestibulares populares são ainda maiores: se antes os estudantes enfrentavam as condições desiguais para o ingresso na educação universitária, com a pandemia essa lacuna se intensificou ainda mais, já que nem todos possuem os equipamentos necessários para acompanhar as aulas regularmente.

Assim, mesmo diante da necessidade de realizar adaptações e esforços para dar continuidade ao seu trabalho, os professores se mostram otimistas para lidar com tamanha atribuição: A gente tenta se reinventar no meio de toda essa

confusão que estamos vivendo de COVID-19, de tudo que está aí em meio a gente. Então é uma coisa nova, a gente vai vivendo um dia de cada vez tentando se reinventar no meio disso tudo (Professor B).

Referências bibliográficas

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Referências

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