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Análise histórico-sociológica da corrupção e de seu combate no Brasil: o direito fundamental à moralidade administrativa

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS – UFAL FACULDADE DE DIREITO DE ALAGOAS – FDA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – PPGD MESTRADO EM DIREITO PÚBLICO. CARLA PRISCILLA BARBOSA SANTOS CORDEIRO. ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIOLÓGICA DA CORRUPÇÃO E DE SEU COMBATE NO BRASIL: O DIREITO FUNDAMENTAL À MORALIDADE ADMINISTRATIVA. Maceió 2016.

(2) 1. CARLA PRISCILLA BARBOSA SANTOS CORDEIRO. ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIOLÓGICA DA CORRUPÇÃO E DE SEU COMBATE NO BRASIL: O DIREITO FUNDAMENTAL À MORALIDADE ADMINISTRATIVA. Dissertação apresentada para defesa final como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas. Orientador: Prof. Dr. George Sarmento Lins Júnior. Maceió 2016.

(3) 2. Catalogação na fonte Universidade Federal de Alagoas Biblioteca Central Divisão de Tratamento Técnico Bibliotecário Responsável: Valter dos Santos Andrade. C794a. Cordeiro, Carla Priscilla Barbosa Santos. Análise histórico-sociológica da corrupção e de seu combate no Brasil: o direito fundamental à moralidade administrativa / Carla Priscilla Barbosa Santos Cordeiro. – 2016. 271 f. Orientador: George Sarmento Lins Júnior. Dissertação (Mestrado em Direito Público) – Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Direito. Programa de Pós-Graduação em Direito. Maceió, 2016. Bibliografia: f. 236-271. 1. Corrupção - Controle. 2. Moralidade administrativa. 3. Direitos fundamentais. 4. Tutela jurídica. 5. Moralidade. I. Título. CDU: 343.352.

(4)  .

(5) 4. A Deus, por seu infinito amor e misericórdia. Aos meus pais, pelas lições de ética e honestidade. A meu companheiro Fernando, pela paciência e carinho diários..

(6) 5. AGRADECIMENTOS. Se há uma coisa que aprendi, durante estes meses de mestrado, foi a agradecer: todas as coisas que vivemos são oportunidades de crescimento, de aperfeiçoamento espiritual e moral. Todas as experiências, sejam boas ou ruins, invariavelmente nos permitem perceber o mundo de uma outra forma, sob um novo prisma, melhorando a cada dia nossas próprias percepções e conceitos. A construção deste trabalho só foi possível graças a este processo contínuo de aprendizagem, que permitiu o amadurecimento de ideias provenientes dos círculos de discussão da graduação. E foi graças à intervenção de pessoas que, bondosamente, dividiram (e ainda dividem) sua sabedoria, seu tempo e conhecimento comigo. Só me resta agradecer a cada um: Ao meu pai, o mais sincero agradecimento pelas lições de honestidade e probidade no serviço público. Professor, sempre exerceu sua profissão a duras provas, sendo mal remunerado, sofrendo represálias de seus alunos, mas dando sempre o melhor de si para contribuir para a construção de uma sociedade melhor e menos desigual. Quantas vezes não me surpreendi ao ver seus exemplos, lições verdadeiras de ética pública: garanto que nunca serão esquecidas, mas sim repassadas por meio da docência jurídica; A toda a minha família, cujo suporte e força foram indispensáveis a esta jornada; Ao meu orientador e professor, George Sarmento, pela iniciação na temática alvo desta pesquisa, pelas inumeráveis lições sobre improbidade administrativa, pelo acompanhamento constante, pela enorme paciência e generosidade. Mais que um orientador, considero-o um amigo querido que pretendo levar para toda vida; Aos professores que compõem o corpo docente do mestrado em direito público da FDA: suas disciplinas influenciaram os ideais defendidos neste trabalho, contribuindo para sua consolidação; Aos amigos que conquistei nesta jornada, em especial, Hilda Monte. A oportunidade que tive, de lhe conhecer e estreitar sinceros laços de amizade, fez este mestrado ter uma significação nova e especial. Nossas discussões alegraram os meus dias; Ao meu amado Fernando, companheiro de todas as horas e melhor amigo, que se debruçou em leituras diárias sobre o meu trabalho, sofreu comigo o processo de elaboração da dissertação, sentiu as mesmas ansiedades e medos, ajudando-me a chegar até aqui..

(7) 6. Dura é a luta contra o desejo, que compra o que quer à custa da alma. Heráclito..

(8) 7. RESUMO. Este trabalho realiza um estudo sobre a corrupção no Brasil a partir do viés históricosociológico, tendo como pano de fundo a problemática da moralidade administrativa. Parte-se da ideia de que tal princípio deve ser considerado como um direito fundamental impositivo de uma série de comportamentos na órbita da ética, da probidade, da honestidade e da boa-fé não apenas para o Estado, mas para cada cidadão. Para isto, foram analisados os fatores históricos, culturais, sociológicos e jurídicos que permitiram sua inclusão no texto da Constituição Federal de 1988, e foi realizada a análise de alguns posicionamentos históricos que explicam a corrupção sob o viés da cultura social. Realizou-se, também, sua análise a partir do prisma sociológico, tendo como pano de fundo a ideia de que a corrupção nasce das antinomias existentes entre as normas morais e práticas sociais. A partir desta ideia, a moralidade administrativa foi dissecada, estudando-se seus principais aspectos, bem como sua relação com os demais princípios insculpidos no caput do art. 37 da Carta Magna. Com a verificação de seu caráter de direito fundamental, analisaram-se alguns dos instrumentos jurídicos mais importantes para sua proteção, tal como a Ação de Improbidade e a Lei Anticorrupção Empresarial. Além disto, analisou-se o conteúdo das três convenções ratificadas pelo Brasil e incorporadas ao quadro da legislação anticorrupção brasileira. Desta forma, a proposta abraçada trouxe à tona uma série de questões imprescindíveis ao desenvolvimento do combate à corrupção, demonstrando a importância da temática e da questão da moralidade administrativa para o ordenamento jurídico.. Palavras-chave: Corrupção. Moralidade Administrativa. Direito Fundamental à Moralidade. Controle da Corrupção. Tutela Jurídica da Moralidade..

(9) 8. RESUMÉ. Cette recherche effectue une étude sur la corruption au Brésil sous le prisme historique et sociologique, ayant comme contexte la question de la moralité administrative. Cette analyse commence avec l'idée qui ce principe devrait être considéré comme un droit fondamental impositive de plusieurs comportements en orbite de l'éthique, de probité, l'honnêteté, et la bonne foi non seulement pour l'Etat, mais pour chaque citoyen. Pour ce faire, ont analysé les facteurs historiques, culturels, sociologiques et juridiques qui ont permis à leur inclusion dans le texte de la Constitution de 1988. En outre, a été fait l'analyse de certains positions historiques qui expliquent la corruption dans le biais de la culture sociale. On a été réalisée votre analyse du point de vue sociologique, dans le contexte de l'idée que la corruption est né d'antinomie qui existe entre les normes morales et pratiques sociales. De cette idée, la morale administrative a été disséqué, et ses principaux aspects ont été étudiés, au-delà de ce qui a été étudié sa relation avec les autres principes sculptés dans le caput de l'art. 37 de la Constitution. Avec la vérification de son caractère comme un droit fondamental, on ont été analysés certains des instruments juridiques plus important pour leur protection, tels que l'Action de Improbité et la Loi Contre la Corruption Enterprises. En outre, on a analysé le contenu des trois conventions ratifiée par le Brésil et incorporés dans le cadre de la législation brésilienne anti-corruption. Ainsi, la proposition embrassé mis en lumière une série de questions vitales le développement de la lutte contre la corruption au Brésil, démontrant l'importance de ce thème et la question de la morale administrative au système juridique.. Mots-clés: La Corruption. Moralité Administrative. Droit Dondamental à la Moralité Administrative. Lutte Contre la Corruption. Tutelle Juridique de la Moralité Administrative..

(10) 9. LISTA DE GRÁFICOS. Gráfico 1. Representação da participação cidadã no Brasil. 36. Gráfico 2. Representação da participação cidadã em todo o mundo. 37. Gráfico 3. Representação da participação cidadã na América Latina. 38. Gráfico 4. Principais fatores que contribuem para a corrupção (%). 42. Gráfico 5. Coeficiente de Gini. 44. Gráfico 6. Classificação dos presos a partir dos tipos legais. 184. Gráfico 7. Crimes contra a administração pública. 185.

(11) 10. LISTA DE QUADROS. Quadro 1. Concepções de interesse público. 90. Quadro 2. Instrumentos incorporados à CF/88 para combater a corrupção. 118. Quadro 3. Principal legislação ordinária de combate à corrupção no Brasil. 161. Quadro 4. Ações de Improbidade Julgadas em 2012 e 2013. 174. Quadro 5. Ações Penais relacionadas aos crimes contra a Administração. 183. Pública Quadro 6:. Convenções dos Sistemas Regional e Global de combate à. 196. corrupção Quadro 7. Principais disposições do Decreto 4.410/2002 – CICC. 203.

(12) 11. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS. AC ApC AgRg AL AMGI AID AREsp BIRD CICDI COE CJF CNJ CF/88 CGU CNUCC CICC CFI DJe DEPEN e-DJF1 DL EUA FATF FMI GAFI PEP GRECO ICP IBM LC LIA LEA LO MESICIC. Acre Apelação Cível Agravo Regimental em Recurso Especial Alagoas Agência Multilateral de Garantias de Investimento Associação Internacional de Desenvolvimento Agravo em Recurso Especial Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento Centro internacional para Conciliação de Divergências em Investimentos Conselho da Europa Conselho da Justiça Federal Conselho Nacional de Justiça Constituição Federal de 1988 Controladoria Geral da União Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção Convenção Interamericana contra a Corrupção Corporação Financeira Internacional Diário de Justiça Eletrônico do STJ Departamento Penitenciário Nacional Diário de Justiça Eletrônico do TRF1 Decreto Lei Estados Unidos da América Financial Action Task Force Fundo Monetário Internacional Grupo de Ação Financeira internacional Pessoas Expostas Politicamente Grupo de Estados Contra a Corrupção Índice de Percepção da Corrupção Instituto do Banco Mundial Lei Complementar Lei de Improbidade Administrativa Liga dos Estados Árabes Lei Ordinária Mecanismo de Acompanhamento de sua Implementação.

(13) 12. MPF MCCE ENCCLA OECE OGP ONU OUA OCDE OEA OIG INTERPOL OMC CONSOCIAL ONG ONGI OSCIP PE T1 PNLD REsp SC SP T2 SIAFE STF STJ T3 TJ TJ/AL TJ/SP TRF1 UFAL UFIR UFMG UFPR UNODC WGI. Ministério Público Federal Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral Núcleo de Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro Organização Europeia para a Cooperação Econômica Open Government Partnership Organização das Nações Unidas Organização da Unidade Africana Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico Organização dos Estados Americanos Organização Intergovernamental Internacional Organização Internacional de Polícia Criminal Organização Mundial do Comércio Organização Nacional sobre a Transparência Organização Não-Governamental Organização Não-Governamental Internacional Organização da Sociedade Civil de Interesse Público Pernambuco Primeira Turma Programa Nacional de Capacitação e Treinamento para Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro Recurso Especial Santa Catarina São Paulo Segunda Turma Sistema Integrado de Administração Financeira Supremo Tribunal Federal Superior Tribunal de Justiça Terceira Turma Tribunal de Justiça Tribunal de Justiça de Alagoas Tribunal de Justiça de São Paulo Tribunal Regional Federal da 1ª Região Universidade Federal de Alagoas Unidade Fiscal de Referência Universidade Federal de Minas Gerais Universidade Federal do Paraná United Nations Office on Drugs and Crime Worldwide Governance Indicators.

(14) 13. SUMÁRIO. 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 15. 2 A CORRUPÇÃO ............................................................................................................. 24 2.1 Análise do surgimento da corrupção na história da humanidade ........................... 24 2.2 As diversas concepções da corrupção .......................................................................... 28 2.3 As causas e efeitos da corrupção ................................................................................. 32 2.4 A construção da concepção jurídica da corrupção ................................................... 46 2.5 A necessidade de estudar a corrupção sob o viés multidisciplinar .......................... 52. 3 ANÁLISE HISTÓRICO-SOCIOLÓGICA DA CORRUPÇÃO NO BRASIL .......... 53 3.1 O senso comum sobre a corrupção no Brasil: alguns levantamentos históricos .... 53 3.1.1 As revoluções burguesas e a consolidação da burocracia legal-racional .................... 54 3.1.2 A corrupção como herança do mundo ibérico ............................................................ 62 3.1.2.1 A proteção da moralidade administrativa no direito brasileiro antes da Constituição Federal de 1988 .................................................................................................................... 71 3.1.3 A crise do final do Século XX e a consolidação da luta contra a corrupção .............. 73 3.2 Análise sociológica do estudo da corrupção no Brasil: a antinomia entre as normas morais e a prática social ..................................................................................................... 83 3.2.1 Uma educação para a ética e a moral públicas ............................................................ 97. 4 O DIREITO FUNDAMENTAL À MORALIDADE ADMINISTRATIVA ............... 98 4.1 A moralidade como um direito fundamental ............................................................ 99 4.1.1 Existe um direito fundamental à moralidade administrativa ou existe um direito fundamental à boa administração? ..................................................................................... 122 4.2 A moral social e a moralidade administrativa ......................................................... 126 4.2.1 O conteúdo do princípio constitucional da moralidade administrativa ..................... 136 4.3 A relação da moralidade com os princípios jurídico-administrativos previstos no caput do art. 37 ................................................................................................................. 145.

(15) 14. a) Legalidade ...................................................................................................................... 146 b) Impessoalidade ............................................................................................................... 151 c) Publicidade ..................................................................................................................... 153 d) Eficiência ........................................................................................................................ 155 4.4 A necessidade de proteção da moralidade administrativa no ordenamento pátrio: a disciplina jurídica do combate à corrupção no Brasil .................................................. 160 4.4.1 A Ação Popular ......................................................................................................... 162 4.4.2 A Lei de Improbidade Administrativa ...................................................................... 165 4.4.3 A Lei Anticorrupção Empresarial ............................................................................. 175 4.4.4 Alguns aspectos da persecução penal da corrupção .................................................. 181 4.4.5 Críticas ao controle jurídico da corrupção no Brasil ................................................. 187 4.4.6 A atuação combativa do Ministério Público e da Polícia Federal no combate à corrupção no Brasil ............................................................................................................................. 190 4.4.6.1 As propostas do Ministério Público para a melhoria do combate à corrupção no Brasil ............................................................................................................................................. 192. 5 OS TRATADOS INTERNACIONAIS ANTICORRUPÇÃO INCORPORADOS AO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ............................................................ 194 5.1 O combate à corrupção como objetivo central dos Estados na contemporaneidade ............................................................................................................................................. 195 5.1.1 O compromisso assumido pelo Brasil na órbita internacional: a ratificação das Convenções Anticorrupção ................................................................................................ 196 5.2. A Convenção Interamericana Contra a Corrupção da OEA ................................ 198 5.3 A Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE ................................................... 206 5.3.1 O combate aos paraísos fiscais e à lavagem de dinheiro ........................................... 211 5.4 A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção ........................................... 215 5.5 Organizações internacionais parceiras do Brasil no combate à corrupção .......... 220. 6 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 225. REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 236.

(16) 15. 1 INTRODUÇÃO. Em todo o mundo, tornou-se temática comum o aperfeiçoamento da democracia e das instituições públicas, momento ímpar na história da humanidade, que reflete uma preocupação especial com as instituições públicas. Busca-se, para muito além do desenvolvimento econômico, a melhoria real da sociabilidade humana, do espírito coletivo, o resgate das virtudes morais que circunscrevem à vida em sociedade. Dentre as diversas lutas que surgem como bandeiras neste novo momento da humanidade, ergue-se com todo ímpeto a ideologia de combate à corrupção. Consolida-se a premissa de que governos corruptos são a maior ameaça à concretização dos valores em que se baseiam as ideias de bem comum e felicidade pública, minando de várias formas a manutenção do espírito coletivo e a efetividade das normas jurídicas. Mais que isto, é preciso reconhecer que a corrupção é uma chaga ao ambiente social, na medida em que os interesses de uns poucos que estão no comando do aparelho burocrático do Estado se sobrepõem à vontade e ao interesse da maioria. A corrupção, assim, é um problema que precisa ser combatido com toda força pela sociedade, pois na medida em que é tolerada dentro do ambiente social, multiplicam-se as distorções na concretização dos mais variados tipos de direitos, tais como os direitos sociais e democráticos. No Brasil, a temática da corrupção tem sido objeto de discussões já há algum tempo, em face dos variados escândalos que surgem no meio político e administrativo. Diariamente, desvios milionários de verbas públicas são noticiados nos meios de comunicação nacionais, de modo que a opinião pública acaba por colocar o problema da corrupção no país no epicentro da crise institucional que assola a administração pública brasileira. Tanto que, pela primeira vez na história, a população admitiu que a corrupção é o maior problema da sociedade, superando, inclusive, os problemas relacionados à educação, saúde, violência e desemprego; pelo menos, de acordo com uma pesquisa realizada no final de 2015 pelo instituto Datafolha, constatou-se que, em 34% do eleitorado, há a percepção da corrupção como o grande mal nacional, seguido pelo problema da saúde (16%), do desemprego (10%), da educação e da violência (8% cada).1. 1. MENDONÇA, Ricardo. Pela 1ª vez, corrupção é vista como o maior problema do país, diz Datafolha. Folha de São Paulo, São Paulo, 29/11/2015. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/11/1712475-pela1-vez-corrupcao-e-vista-como-maior-problema-do-pais.shtml>. Acesso em 15/12/2015..

(17) 16. Estes são dados muito significativos que revelam uma grande preocupação social em face da corrupção no país. Isto porque em vários aspectos diferentes a corrupção causa prejuízos ao ambiente social, à economia e à estabilidade das instituições públicas, corroendo a confiança dos cidadãos no Estado e minando a efetividade do sistema democrático. Neste sentido, uma pesquisa realizada em 2008 pela FIESP (Federação da Indústria do Estado de São Paulo) apontou que entre 41,5 e 69,1 bilhões do PIB brasileiro de 2008 foram desviados pela corrupção, afetando de maneira direta a qualidade de vida da sociedade. Sem a corrupção haveria um aumento de 15,5% no PIB (Produto Interno Bruto) per capita do país.2 A mesma pesquisa foi repetida em 2012, apontado que neste ano a corrupção consumiu, em média, entre 1,38% e 2,3% do PIB nacional, o que significa, de maneira ilustrativa, que os valores desviados foram superiores às verbas destinadas à educação pela União em 2012.3 Mais recentemente, entre 2014 e 2015, em meio a uma série de escândalos envolvendo a mais importante sociedade de economia mista do Brasil, a Petrobrás S/A, foram descobertos vários esquemas de corrupção que envolviam o pagamento de propinas que chegaram ao montante de 6,4 bilhões de reais.4 Outros escândalos, como o do “mensalão” por exemplo, desviaram, igualmente, grandes quantias provenientes dos recursos públicos, com o objetivo de alimentar uma extensa rede de corrupção dentro do aparelho do Estado. No total, estima-se que nestes últimos anos foram desviados, em média, 200 bilhões de reais por ano em casos de corrupção dentro das instâncias do Poder Público, valores que poderiam triplicar os investimentos públicos em educação, segurança e saúde. Mais que isto: sem tais desvios, os brasileiros seriam até 27% mais ricos,5 além do que poderiam exercer melhor seus direitos constitucionais e participar de forma mais ativa da democracia nacional. Todos estes dados demonstram, de maneira incontestável, a gravidade do problema da corrupção no Brasil 6 e a necessidade do aperfeiçoamento dos mecanismos de controle.. 2. AGÊNCIA INDUSNET FIESP. Custo da corrupção no Brasil chega a 69 bi por ano. FIESP, 13/06/2010. Disponível em: <http://www.fiesp.com.br/noticias/custo-da-corrupcao-no-brasil-chega-a-r-69-bi-por-ano/>. Acesso em 15/12/2015. 3 JIMÉNEZ, Carla. Corrupção rouba até 2,3% do PIB brasileiro. El Pais, 28/01/2014. Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2014/01/28/politica/1390946330_078051.html>. Acesso em 15/12/2015. 4 CONGRESSO EM FOCO. Os últimos números da operação Lava Jato. Disponível em: <http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/os-ultimos-numeros-da-operacao-lava-jato/>. Acesso em 15/12/2015. 5 FOLHA POLÍTICA. Sem corrupção, o brasileiro seria pelo menos 27% mais rico. Disponível em: <http://www.folhapolitica.org/2013/08/sem-corrupcao-o-brasileiro-seria-pelo.html>. Acesso em 15/12/2015. 6 UOL NOTÍCIAS. Corrupção tira R$ 200 bilhões ao ano dos cofres públicos, diz procurador da Lava Jato. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2015/09/15/corrupcao-tira-r-200-biao-ano-dos-cofres-publicos-diz-procurador-da-lava-jato.htm>. Acesso em 15/12/2015..

(18) 17. O problema da corrupção no Brasil não é um fenômeno recente. Ao contrário, percebese que uma série de fatores políticos, sociais, econômicos e culturais desencadearam o desenvolvimento deste fenômeno no país, gerando, como mais drástica consequência, um alto grau de tolerância social à corrupção dentro do ambiente social e a institucionalização de várias de suas práticas dentro do espaço público. Embora a sociedade reconheça, nos dias atuais, a necessidade de combater à corrupção, a defesa da moralidade administrativa como princípio reitor da atuação pública é relativamente recente. Desde a colonização, várias práticas sociais herdadas do reino ibérico estimulavam as práticas de corrupção na Administração Pública brasileira, como o nepotismo, clientelismo, a patronagem, o coronelismo, etc. Tais práticas nascem e se reproduzem em um contexto em que prevalecia o patrimonialismo, tão típico dos Estados absolutistas e que acaba sendo incorporado à Administração Pública brasileira, ditando os contornos do desenvolvimento social e dando origem a uma cultura de vícios. Justamente em face deste contexto, a sociedade passa a encarar a corrupção de forma passiva, reconhecendo, de um lado, a necessidade de moralização do Estado, da Administração Pública. De maneira contraditória, tolera-se a corrupção no contexto das práticas sociais, uma vez que no âmbito da cultura a moralidade se desenvolve de maneira diferente do âmbito normativo. No Direito são inseridos, através de consensos sociais, conteúdos considerados relevantes, tal como a probidade, honestidade, ética, decoro, boa-fé. Mas, no caso da sociedade brasileira, há uma grande discrepância entre as normas jurídicas que prescrevem comportamentos adequados aos agentes públicos e as práticas sociais, o que denota a importância de um estudo específico sobre a inserção da moralidade administrativa nas práticas sociais cotidianas. Isto significa, em outras palavras, que ainda não se consolidou um sentimento comum de busca pela efetivação da moralidade administrativa que, embora seja encarada como princípio basilar de toda e qualquer atuação pública, não é encarada como um verdadeiro direito social a ser efetivado pelo Estado e buscado pelos cidadãos. Diante destes fatos, surge uma questão imprescindível: a moralidade administrativa, princípio regente da Administração Pública, baseada nos ideais de ética e probidade dentro do ambiente institucional do Estado, embora não prevista no catálogo dos direitos fundamentais do Título II da Constituição Federal, é um direito fundamental dos cidadãos?.

(19) 18. O princípio da moralidade administrativa, em sua roupagem atual, é o resultado de uma construção da dogmática jurídica que tem início no Século XX. Dentro da esfera do Direito Administrativo, desenvolveu-se, inicialmente, o princípio da legalidade sem referência à moralidade, que pertencia à dimensão axiológica. Havia uma total separação entre a moral e o direito, o que restringia a validade dos atos administrativos às disposições legais vigentes, excluindo-se qualquer análise das intenções do agente público na realização de suas funções. Com a inserção da moralidade no texto da Constituição de 1988, este princípio ganha autonomia normativa frente à legalidade, recebendo, no texto constitucional, uma série de instrumentos para lhe dar efetividade, a exemplo da Lei de Improbidade Administrativa. Assim, houve uma verdadeira mudança na forma como o Estado passou a enxergar a corrupção, ao menos no âmbito jurídico, elencando-se uma série de princípios regentes da atuação estatal no art. 37, que preleciona que “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (...)”.7 Este foi um grande passo rumo à total superação das antigas práticas patrimonialistas que ainda persistem no ambiente social brasileiro. Por isso, a CF/88 deu imperatividade ao princípio da moralidade ao instrumentalizar mecanismos jurídicos específicos para lhe dar efetividade. Reconheceu-se, assim, que o combate aos antigos problemas que assolavam a nação brasileira passava, invariavelmente, por um maior controle da corrupção e pela proteção da moralidade, desenvolvendo-se, a partir deste contexto, um quadro normativo geral voltado exclusivamente para a isto. Desta maneira, enquanto princípio jurídico, a moralidade administrativa impõe uma série de condutas éticas aos agentes públicos, pautadas nas regras sociais sobre probidade e honestidade do Estado para com os indivíduos e destes para com a sociedade. Mais que um princípio orientador da atuação pública, a moralidade se erige, dentro do nosso ordenamento, como um verdadeiro direito fundamental dos cidadãos contra a atuação pública descompromissada com a ética pública, pois a sociedade possui o direito a um ambiente institucional livre da corrupção, em que prevaleça o respeito às normas de conduta eleitas socialmente.. 7. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988..

(20) 19. Assim, para possuir plena efetividade, a moralidade administrativa precisa ser reconhecida, também, como um verdadeiro direito fundamental de cada cidadão. A noção de direito fundamental vai muito além do âmbito de ação do Estado, que deve realizar uma determinada conduta ou seguir um padrão de comportamento pré-definido para lhe concretizar. Isto porque os direitos fundamentais também impõem deveres aos cidadãos, que precisam, tanto quanto o Estado, desenvolver uma conduta ativa para a sua concretização. A moralidade administrativa precisa ser reconhecida dentro do ambiente social como uma necessidade irremediável da sociedade, que necessita, urgentemente, repensar algumas práticas sociais que ainda prevalecem no presente. A corrupção é vista como prática condenável sob o prisma dos valores sociais, mas é tolerada por grande parte da população, algo que precisa ser trabalhado tanto sob o prisma da cultura política quanto sobre o prisma jurídico. Isto significa dizer que, embora exista um alto grau de tolerância social à corrupção no Brasil, a sociedade possui consciência do papel negativo exercido pela mesma no desenvolvimento nacional, ao menos de acordo com a pesquisa organizada por Filgueiras em 2008. Nela se extrai, justamente, dados que comprovam que a sociedade tem imenso desprezo pelos atos de corrupção, ao mesmo tempo em que há um alto grau de conformismo perante as práticas corruptas, consideradas, por muitas pessoas, como algo “natural” à atividade política.8 Romper com este padrão de inação de fato não é uma tarefa simples. Mas deve-se começar através da incorporação da moralidade como direito fundamental, reconhecendo-se que a partir de uma atuação ética, proba, honesta e justa da Administração Pública, os serviços públicos serão realizados de maneira eficiente, os recursos de todos, recolhidos por meio dos tributos, serão de fato aplicados nas finalidades públicas para o qual se prestam, permitindo, assim, a completa concretização dos demais direitos fundamentais. A moralidade administrativa não pode ser encarada, apenas, como um princípio reitor da forma de atuação dos agentes públicos, dos políticos e das instituições do Estado, mas também como verdadeiro direito fundamental social, que precisa ser exigido pelos cidadãos tanto como qualquer outro direito. Deve haver, por conseguinte, o resgate deste ideal de moralidade administrativa dentro do ambiente social de modo que as pessoas sintam a necessidade de exigir dos órgãos públicos atuações probas, justas e éticas tanto quanto a própria prestação estatal em si. Colocar a moralidade dentro do quadro dos direitos fundamentais é. 8. FILGUEIRAS, Fernando. A tolerância à corrupção no Brasil: uma antinomia entre normas morais e prática social. Revista Opinião Pública. Campinas, SP, v. 15, n. 2, p. 386-421, nov. 2009. p. 414..

(21) 20. exigir que esta seja a própria finalidade da ação estatal e não somente uma forma de atuação, uma norma comportamental a ser seguida pelos agentes públicos. Corroborando esta ideia, averígua-se que existe uma série de garantias constitucionais, a exemplo da Ação Popular e da Ação de Improbidade Administrativa, que servem para dar suporte à proteção da moralidade. Além disto, existem uma série de normas de caráter penal que objetivam garantir a proteção do bem jurídico da moralidade (Título XI do Código Penal), o que denota uma preocupação elevada da ordem jurídica com o controle da corrupção. Outrossim, é preciso frisar, desde já, que embora existam inúmeras normas que objetivam, unicamente, punir uma série de delitos relacionados à corrupção, várias falhas no sistema jurídico têm deixado como legado uma proteção deficitária da moralidade administrativa enquanto direito fundamental dos cidadãos no ambiente jurídico brasileiro. Por isto, cabe ao Estado o dever primordial de cumprir dignamente a proteção da moralidade, aplicando de fato as normas jurídicas que têm o objetivo de controlar a corrupção e, sempre que necessário, aprimorar o sistema punitivo dos atos de corrupção, pois, da forma como está organizado o sistema de controle da mesma, há um alto grau de impunidade no ambiente social. A impunidade decorrente das punições contra os crimes de corrupção gera ainda mais distorções na sociedade. Para se ter uma ideia, em um levantamento realizado em 2013, dos 548 mil encarcerados no Brasil, apenas 722 estavam presos por cometerem delitos de corrupção, que são em tese bem mais prejudiciais à sociedade do que os delitos contra o patrimônio privado como roubo e furto, responsáveis por 49% dos presos no Brasil. Do total destes indivíduos encarcerados, 0,5% foram efetivamente condenados por crimes contra a Administração Pública, sendo apenas 0,12% punidos pelo crime de corrupção ativa, enquanto praticamente nenhum indivíduo (0,01%) foi punido por corrupção passiva.9 O sistema jurídico, assim, não tem contribuído de maneira efetiva para o desenvolvimento de uma cultura de responsabilidade e respeito à moralidade administrativa dentro do próprio espaço social, na medida em que a corrupção não é punida de fato no Brasil. Desta forma, esta dissertação parte da premissa de que a corrupção é, na atualidade, um dos maiores problemas da sociedade; logo, não há dúvidas de que é preciso combatê-la, reduzir ao máximo esta chaga aberta, desenvolvendo de maneira permanente e contínua, dentro do 9. CONGRESSO EM FOCO. Por quais crimes as pessoas estão presas aqui no Brasil. Disponível em: <http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/por-quais-crimes-as-pessoas-estao-presas-no-brasil/>. Acesso em: 15/12/2015..

(22) 21. ambiente social, a moralidade administrativa enquanto direito fundamental de cada cidadão, direito este que precisa ser respeitado pelos líderes políticos, pelas instituições públicas e que precisa ter sua concretização buscada pela sociedade brasileira tanto quanto qualquer outro direito social. Como hipótese secundária, considera-se que o desenvolvimento da moralidade administrativa, enquanto direito fundamental da sociedade, pode alterar a maneira como o cidadão encara o Estado, melhorando seu relacionamento com as instituições públicas. Assim, o desenvolvimento da democracia pressupõe uma série de ações que consigam garantir à incorporação da moralidade administrativa como direito fundamental dos cidadãos, o que de fato poderia contribuir, para além do plano jurídico, com o controle social da corrupção. Com o objetivo de conseguir respostas ao problema inicialmente lançado, esta dissertação se dividiu em quatro capítulos. O primeiro se dedicou a explicar algumas noções gerais acerca do fenômeno da corrupção. Assim, analisaram-se questões basilares relacionadas à temática, tal como seu surgimento na história da humanidade, uma vez que se trata de um fenômeno que acompanha o homem em todos os lugares desde os tempos mais remotos. Foram averiguadas suas principais concepções no contexto global, suas causas e efeitos. Além disto, este capítulo realizou a construção do conceito jurídico da corrupção. Identificando a necessidade de estudar a corrupção no Brasil sob o viés histórico, o segundo capítulo tratou do desenvolvimento deste fenômeno no contexto brasileiro. Foram analisadas algumas das interpretações históricas mais comuns acerca da problemática da corrupção no Brasil, e em seguida foi realizada uma análise de cunho sociológico com base na teoria desenvolvida pelo cientista político Fernando Filgueiras, que parte da teoria do habitus de Pierre Bourdieu para explica a questão da corrupção no Brasil. Assim, foram estudadas as normas morais impositivas de condutas e as práticas sociais, identificando-se a causa da corrupção a partir das antinomias entre as duas esferas. A fim de dar continuidade ao estudo, o terceiro capítulo foi dedicado à análise do direito fundamental à moralidade administrativa. Foram enfrentadas, aqui, questões relacionadas ao caráter de fundamentalidade deste direito, as diferenças entre a moral social e a moralidade administrativa. Além disto, foi realizada uma análise do conteúdo do princípio constitucional da moralidade administrativa e sua relação com os princípios jurídicos que são inseridos no corpo da Constituição, mais especificamente no caput do art. 37, tal como a legalidade, a impessoalidade, a publicidade e a eficiência..

(23) 22. Reconhecendo que um direito de tamanha complexidade possui um alto grau de proteção jurídica dentro do ordenamento, no terceiro capítulo também foi realizada a análise da disciplina jurídica do controle da corrupção no Brasil, através da verificação dos principais instrumentos disponíveis neste sentido. Foram analisados, sob o prisma da proteção da moralidade, a Ação Popular, a Ação de Improbidade Administrativa, a Lei Anticorrupção Empresarial, e as disposições contidas no Código Penal que criminalizam os crimes contra a Administração Pública. Além disto, ao final do capítulo foi realizada uma análise sobre o protagonismo do Ministério Público, ao lado da Polícia Federal, em ações de combate à corrupção no país. Por fim, e de maneira complementar ao capítulo anterior, no quarto capítulo foi realizada uma análise das três convenções de combate à corrupção incorporadas ao ordenamento pátrio nos últimos anos, e das parcerias realizadas pelo Brasil com organizações internacionais neste sentido. Tais instrumentos têm colaborado de maneira muito intensa para o aprimoramento da proteção da moralidade administrativa no ordenamento jurídico pátrio, motivo pelo qual não escaparam à analise proposta neste trabalho. Para embasar as pretensões aqui objetivadas, serão utilizados diversos autores da esfera jurídica nacional. Neste sentido, foram utilizados os estudos de constitucionalistas consagrados na esfera do direito nacional e internacional, como Ingo Wolfgang Sarlet e José Carlos Vieira de Andrade. Além destes, foram utilizados vários autores da atualidade na esfera do Direito Administrativo, como é o caso de Egon Bockmann Moreira, José Guilherme Giacomuzzi, Weida Zancaner, dentre tantos outros. Foram utilizados, também, vários estudos realizados nas esferas da história, da sociologia e até das ciências políticas, como aqueles realizados por Fernando Filgueiras, Leonardo Avritzer, Bresser Pereira, etc.. Assim, busca-se dar um panorama geral do problema da corrupção no Brasil, contribuindo para a construção do conceito do direito fundamental à moralidade administrativa. A metodologia adotada para a operacionalização desta pesquisa baseou-se nos métodos de investigação qualitativos empregados nas ciências humanas. Parte-se do pressuposto de que todo conhecimento é fruto de uma construção coletiva que não pode se desprender de sua perspectiva histórica, muito menos da relação existente entre o objeto investigado e o próprio investigador. Assim, toda investigação qualitativa segue um ciclo organizado de construção do conhecimento, dividindo-se em diversas etapas. A primeira fase desta pesquisa foi busca pela bibliografia pré-selecionada na doutrina nacional e internacional. Em um segundo momento todo o material passou por uma análise prévia, onde foram separados os textos relevantes. Na.

(24) 23. terceira fase desse processo houve uma minuciosa análise do material e seu respectivo fichamento, em um processo reflexivo e relacional. Esta fase deu início à produção escrita e de concatenação lógica dos vários materiais colhidos desde o início do processo, possibilitando como resultado final o referido trabalho. Por fim, é preciso destacar que esta dissertação é continuação de uma pesquisa que teve início no Laboratório de Direitos Humanos da UFAL/FDA, sob orientação do Professor Dr. George Sarmento Lins Júnior, em 2012. Por meio deste trabalho, busca-se aprimorar as pesquisas iniciadas no âmbito do Laboratório de Direitos Humanos, contribuindo para a melhoria do ambiente institucional brasileiro através da proposição de soluções para os problemas da corrupção e da má-gestão pública..

(25) 24. 2 A CORRUPÇÃO. 2.1 Análise do surgimento da corrupção na história da humanidade. A corrupção é um fenômeno social muito antigo e, como tal, acompanha a evolução da humanidade desde os primeiros agrupamentos sociais. Sua natureza é altamente tóxica e destrutiva, pois fere as bases do Estado Democrático de Direito, minando sua efetividade. Além disso, a corrupção agride diretamente a ordem e a estrutura social onde se materializa, corroendo a eficiência na prestação dos serviços estatais e fazendo com que a sociedade perca a confiança nos agentes públicos.10 Abordá-la sob o viés histórico possibilita uma análise mais realista do problema, uma vez que assim é possível entender o fato de que a corrupção não é um sintoma típico da modernidade: ao contrário, desenvolve-se junto com a humanidade e pode ser considerada, portanto, como um dos fenômenos mais recorrentes e típicos das organizações políticas. Isto porque a luta pelo poder, pelas formas de dominação do homem sobre o próprio homem, dificilmente se desenvolve sem a existência, por trás do cenário decisório, de atos de corrupção. Até mesmo nas sociedades que hoje são consideradas exemplos de combate à corrupção é possível verificá-la com considerável incidência, o que permite desmistificar ideais errôneos que envolvem a noção de que apenas algumas das nações sofreriam com os males da corrupção, como é o caso do Brasil, considerado pela mídia e pela opinião pública como o “país da corrupção”.11 Desta maneira, é possível afirmar que já se fazia referência ao fenômeno desde a Antiguidade, no Código de Hamurabi, no Egito, na Bíblia Sagrada, no Código de Manú e em leis asiáticas. A ética na Administração Pública foi tratada, pela primeira vez, em um livro chamado Arthashastra, datado entre 321 e 300 a.C., em que o filósofo indiano Kautilya codifica. 10. VIEIRA, Judivan J. Perspectiva Histórica da Corrupção: Livro I. Brasília: Thesauros, 2014. p. 34. OLIVÉ, Juan Carlos Ferré, et al. Blanqueo de dinero y corrupción en el sistema bancário: delitos financeiros, fraude y corrupción em Europa. Espanha: Universidade de Salamanca, 2002. p. 228. CAVALLI, Eduardo. El poder judicial frente a la corrupción. Montevideo: Liventa papelex, 1998. p. 17. 11 GNT. Brasil, o país da corrupção. GNT News, 23 de fevereiro de 2015. Programa de TV. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=LEdDvQF9xCM>. Acesso em: 15/12/2015..

(26) 25. uma série de normas sobre o bom governo, deveres da autoridade suprema e princípios que devem reger à atuação pública.12 Os filósofos da Antiguidade Clássica se referiam à corrupção como um fenômeno que desencadeava mudanças no estado natural das coisas para pior, ou seja, para destruir uma determinada ordem natural. Não é à toa que a etimologia do termo está ligada à noção de degeneração, putrefação, destruição.13 Desta maneira, o vocábulo “corrupção” representava uma forma de transformação da natureza em face da mudança que ocorre nos seres corrompidos. Conforme destacado por Filgueiras, o seu uso não advém, unicamente, do latim corrumpere, uma vez que o cerne do conceito era discutido pelos gregos, a exemplo de Platão. Os gregos estudavam a natureza e a cosmologia partindo da análise de dois mundos – o mundo perfeito dos deuses, marcado pela ausência de corrupção, e o mundo imperfeito dos homens, predominantemente corrupto.14 Aristóteles chegou a desenvolver, acerca da responsabilidade do cidadão na construção do Estado, um tratado sobre a ética social (Ethica Nicomachea). Para o estagirita, o ser humano já nasce inserido em instituições ético-políticas e isto contribui para a manutenção dos costumes e tradições da comunidade a qual se insere. A manutenção e aperfeiçoamento da vida em comunidade pressupõe a comunhão dos homens com os seus. Aristóteles afirma que, se para todas as coisas existe um fim que é desejado como um fim em si mesmo pelo homem, esse fim deve ser o “sumo bem”. Isto significa, em outras palavras, que o homem possui seu sentido ligado à ideia de vida em sociedade, e sua “finalidade natural” consiste, justamente, em viver na cidade e contribuir com as mais variadas necessidades da coletividade, participar da política e, quando as leis forem editadas de forma justa, viver através das virtudes éticas que se prolongam nas virtudes políticas. O homem deve contribuir, enquanto cidadão, para a vida na pólis. 15. VIEIRA, Judivan J. Op. cit., p. 16-17. FIGUEIREDO, Marcelo. A “corrupção” e a improbidade – Uma reflexão. In PIRES, Luis Manoel Fonseca et al. Corrupção, ética e moralidade administrativa. Belo Horizonte: Fórum, 2008. p. 251. NUNES, Antonio Carlos Ozório. Corrupção: o combate através da prevenção. In PIRES, Luis Manoel Fonseca et al. Corrupção, ética e moralidade administrativa. Belo Horizonte: Fórum, 2008. p. 16-17. 13 Neste sentido, Platão afirmava que “toda mudança social é corrupção, ou decadência, ou degeneração”, e acreditava que as mudanças pelo qual a Grécia passava naquele período histórico tinham suas bases na corrupção dos homens. E depois que a humanidade chegasse ao nível mais baixo de corrupção (da mais profunda depravação, segundo acreditava), surgiria novamente o bem e as coisas passariam a se aperfeiçoar. POPPER, Karl R. A sociedade aberta e seus inimigos. Tradução: Milton Amado. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Universidade de São Paulo, 1994. p. 33. FILGUEIRAS, Fernando. Corrupção, democracia e legitimidade. Belo Horizonte: UFMG, 2008. p. 26. 14 Ibid., p. 26. 15 STÖRING, Hans Joachim. História geral da filosofia. Tradutores: Volney J. Berkenbrock et al. Petrópolis: Vozes, 2009. p. 154. SARTIN, Gustavo H. S.S. O surgimento do conceito de “Antiguidade Tardia” e a 12.

(27) 26. Ménissier preleciona que a noção de corrupção, ainda hoje, divide os antigos e os modernos. O autor identifica algumas concepções principais da corrupção ao longo da história da humanidade, especificamente no período que antecedeu à Modernidade. Entre elas, a corrupção “física” dos gregos, associada ao movimento de mudança e alteração da natureza, assunto amplamente debatido nos tratados aristotélicos.16 Mecanismos foram instituídos na Grécia Clássica com o objetivo de combater à corrupção, conforme destacado por Sarmento: “em Atenas, três crimes justificavam a abertura de processo contra um magistrado eleito pelo povo: a conspiração contra a democracia, a traição em favor de um inimigo da cidade e a corrupção, ou seja, a utilização do mandato popular para a satisfação dos interesses pessoais”17. Em Roma, a corrupção também era prevista como um crime grave contra a ordem social, o que motivou Cícero a combater de maneira ferrenha a improbidade no exercício das funções públicas. Ressalte-se, inclusive, que os cidadãos possuíam uma forma de poder de polícia jurisdicional, exercido mediante ações populares, em que podiam processar e julgar os políticos que ferissem a moralidade administrativa e o patrimônio do Estado.18 Outra acepção do termo poderia ser extraída do período medieval, em que a corrupção era tida como uma prática reprovável, impura, relacionada a uma série de pecados, como a ganância, sendo que sua repressão ocorria por meio de práticas religiosas purgativas. Cabe ressalvar que, neste período, ainda havia uma outra maneira de compreender a corrupção, de. encruzilhada da historiografia atual. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. Curitiba, PR, v. 9, n. 2, p. 15-40, 2009. BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Curso de filosofia aristotélica: leitura e interpretação do pensamento aristotélico. Barueri: Manoel, 2003. p. XXIX. BARNES, Jonathan. Introdução. In BARNES, Jonathan (Org.). Aristóteles. Tradutor: Ricardo Hermann Ploch Machado. Aparecida: Ideias & Letras, 2009. p. 16. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2012. p. 9 (Livro I, 1094 a). HÖFFE, Otfried. Aristóteles – Introdução. Tradução: Roberto Hofmeister Pich. Porto Alegre: Artmed, 2008. p. 176. SILVEIRA, Denis Coitinho. Os sentidos da justiça em Aristóteles. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001. p. 129. Id. As virtudes em Aristóteles. Revista de Ciências humanas, Frederico Westphalen, RS, v. 1, n. 1, p. 41-71, 2000. p. 65-66. CAILLÉ, Alain; LAZZERI, Christian; SENELLART, Michel. História Argumentada da filosofia moral e política: A felicidade e o útil. Tradução: Alessandro Zir. São Leopoldo: Unisinos, 2006. p. 52. BOUTROUX, Émile. Aristóteles. Tradução: Carlos Nougué. 3. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2002. p. 113. KAUFMANN, Arthur. Filosofia do direito, teoria do direito, dogmática jurídica. In KAUFMANN, Arthur; HASSEMER, Winfried (Org.). Introdução à filosofia do Direito e à teoria do direito contemporâneas. Tradução: Marcos Keel e Manuel Seca de Oliveira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 2002. p. 26-27. HUTCHINSON, D. S. Ética. In BARNES, Jonathan (Org.). Aristóteles. Tradutor: Ricardo Hermann Ploch Machado. Aparecida: Ideias & Letras, 2009. p. 259. 16 MÉNISSIER, Thierry. La corruption, un concept philosophique et politique chez les Anciens et les Modernes. Anabases. Université de Toulouse-II Le Mirail, FR, n. 6, p. 11-16, 2007. Disponível em: <https://anabases.revues.org/3284>. Acesso em: 12/08/2015. 17 SARMENTO, George. Improbidade Administrativa. Porto Alegre: Síntese, 2002. p. 28. 18 Ibid., p. 28. CÍCERO, Marco Túlio. Da República. Brasília: Kiron, 2011. p. 33. FIGUEIREDO, Marcelo. A “corrupção” e a improbidade: uma reflexão. Op. cit., p. 256..

(28) 27. acordo com Ménissier: esta era tida como uma característica natural do homem, que já nasceria “contaminado” por uma tendência à prática de atos de corrupção.19 Na modernidade Ménissier destaca que, de um lado, pensadores políticos compreendiam a corrupção como uma forma de perversão ou patologia do regime governativo. Neste sentido, Maquiavel defende que a corrupção nada mais é do que “a exclusão do povo dos ‘negócios de governo’ que se faz através do controle político de um grupo oligarca”. 20 A corrupção surgiria, de acordo com o florentino, com a inaptidão para a vida em liberdade, que nasce, justamente, da desigualdade que foi inserida no seio do Estado. Observe-se que, neste momento, a corrupção era compreendida como um processo natural e atemporal, pelo qual deveriam passar todas as repúblicas, e o ciclo de decadência dos sistemas políticos só poderia ser retardado, o que ocorreria através de uma forma mista de governo republicano, misturando elementos monárquicos e aristocráticos, mas deixando prevalecer, ao final, o sistema republicano.21 Já Montesquieu compreendia a corrupção como uma forma de perversão ou patologia do regime governativo. Em verdade, ele “inaugura uma ideia de corrupção sui generis em seu tempo, provocada pela ação humana e que está ligada aos princípios de cada governo que se degeneraram historicamente”. Naquele momento, a corrupção era vista como uma das causas primeiras da degeneração dos governos e da política. O autor usa, inclusive, o termo “decadência” para se referir aos fatos que levaram à queda da vida pública dos romanos.22 Por algum tempo, a corrupção foi definida com base na moralidade social, conforme ensina Dubey. De acordo com o autor, definia-se como todo e qualquer ato que ferisse os valores inerentes à convivência social. Assim, os atos egoístas de um indivíduo em desfavor da coletividade eram considerados atos de corrupção. O problema desta definição é que, a partir deste prisma, poder-se-ia enquadrar a corrupção como qualquer ação humana que envolve alguma espécie de desonestidade, o que alargava demasiadamente o conceito. Esta primeira forma de tratar a corrupção foi sendo superada paulatinamente, na medida em que foi se. 19. MÉNISSIER, Thierry. Op. cit., p. 12. Ibid., p. 29. 21 Ibid., p. 29 et seq. Cf. MACHIAVELLI, Niccolò. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio. Tradução: Sérgio Bath. Brasília: UNB, 1994. p. 74. Cf. CARVALHO FILHO, José dos Santos. A sobrevivente ética de Maquiavel. In PIRES, Luis Manoel Fonseca et al. Corrupção, ética e moralidade administrativa. Belo Horizonte: Fórum, 2008. p. 129. 22 Ibid., p. 12. SANTOS, Antônio Carlos. A política negada: poder e corrupção em Montesquieu. São Cristóvão: UFS; Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 2002. p. 28. 20.

(29) 28. consolidando a necessidade de vincular os atos de corrupção à atividade do Estado23 e de seus governantes.. 2.2 As diversas concepções da corrupção. Os estudos sistemáticos sobre a corrupção, que passam a analisar sua origem e até sua função dentro do Estado, só têm início realmente na década de 1950, como preleciona Filgueiras. A partir deste período, vários tipos de interpretação sobre a corrupção surgem em todo o mundo. Segundo o autor, este período marca o início de três tipos de análises que se destacam no contexto global: a funcionalista, a análise sob o viés da cultura política e a econômica.24 A abordagem funcionalista emerge em 1950 e a partir daí se desenvolve, centrada na ideia de que a corrupção é a razão pelo qual as sociedades “tradicionais”, ou simplesmente “subdesenvolvidas”, não conseguem alcançar um determinado patamar de desenvolvimento político e econômico. Trata-se de uma ideia que nasce no ápice do Welfare State que defende que a corrupção atingiria níveis sistêmicos em sociedades subdesenvolvidas. De um lado, ela impediria os processos de modernização, já que se consubstanciaria em norma socialmente aceita que impederia o desenvolvimento. Assim, “para a sociologia da modernização, há uma relação necessária entre corrupção e modernização, uma vez que cenários de larga corrupção definem uma baixa institucionalização política e, por sua vez, uma ordem fraca para a mediação e a adjudicação de conflitos”25. Sua lógica está balizada na ideia de que sociedades subdesenvolvidas são, invariavelmente, pouco afeitas a institucionalização da política. Como resultado, a corrupção reinaria em tais ambientes, tornando-se mais presente do que o comum no cenário político. Assim, ela possuiria uma função específica dentro do espaço político:26. A corrupção é explicada, portanto, como desfuncionalidade inerente de uma estrutura social de tipo tradicional, que, no contexto da modernidade, gera instabilidade no plano político e econômico. A corrupção, dessa forma, pode 23. DUBEY, A. P. Applied Ethics. New Delhi: Northern Book Centre, 2004. p. 9. BEARE, Margaret E. (editor). Encyclopedia of Transnational Crime and Justice. London: Sage Publications Ltd., 2012. p. 74. 24 FILGUEIRAS, Fernando. A tolerância à corrupção no Brasil. Op. cit., p. 394. 25 Ibid. 26 Ibid., p. 395..

(30) 29. cumprir uma função de desenvolvimento, uma vez que ela força a modernização. Porém, sua função de desenvolvimento é cumprida desde que ela esteja sob o controle das instituições políticas, de tipo moderno. Do ponto de vista dos benefícios, a corrupção pode agilizar a burocracia, ao tornar mais rápida a emissão de documentos e autorizações formais por parte do Estado.27. Nesta forma de estudo da corrupção, esta possui uma espécie de função caraterística nas sociedades em desenvolvimento.28 Procura-se “formular uma perspectiva sistêmica da corrupção em relação aos seus custos e benefícios para a construção da modernidade capitalista”.29 Torna-se comum seu estudo em países subdesenvolvidos (periféricos), comparando-os com aqueles compreendidos como desenvolvidos (capitalismo central).30 Só que o problema desta forma de abordagem é que se forma uma interpretação da corrupção focada unicamente no viés político e econômico, sem atinar para as reais causas da corrupção e de sua tolerância dentro das sociedades. Como bem esclarece Filgueiras,. O problema com essa lógica é que ela se centra demasiadamente em um conceito de institucionalização que é deficiente do ponto de vista político. Supõe-se que a modernização seja um processo paulatino de imitação institucional capaz de, ao final de um processo temporal, ter no mundo em desenvolvimento as mesmas instituições presentes no mundo desenvolvido. Na verdade, o problema é justamente o contrário, qual seja o de entender a especificidade do processo de invenção institucional que passa tanto pela organização de ações no espaço público quanto pelo arranjo organizacional das instituições.31. Já na década de 1970, desenvolve-se um outro tipo de análise da corrupção, que passa a influenciar a sua interpretação em todo o mundo. Trata-se da interpretação da corrupção sob o viés da cultura política. Assim, a corrupção é estudada a partir das interações entre os atores sociais que definem a ocorrência ou não da corrupção. São considerados por este tipo de análise, para além do sistema institucional e legal, o próprio sistema de valores da sociedade. Aqui a corrupção é analisada sob o viés de uma determinada cultura política (e.g. Brasil), comparandoa a uma “cultura universal moderna”32. Um bom exemplo deste tipo de análise é o caso dos. 27. Ibid., p. 394. Ibid. 29 AVRITZER, Leonardo; FILGUEIRAS, Fernando. Corrupção e controles democráticos no Brasil. Brasília: CEPAL/IPEA, 2011. p. 10. 30 Ibid. 31 Ibid. 32 FILGUEIRAS, Fernando. A tolerância à corrupção no Brasil. Op. cit., p. 394-396. 28.

(31) 30. inúmeros autores que realizam o contraponto entre o desenvolvimento político local e o desenvolvimento nos países que passaram pelo processo das “Revoluções Burguesas”. Assim,. A partir dos anos 1970, a literatura sobre o tema da corrupção deu uma guinada metodológica, direcionando-se para o tema da cultura e o tema do desenvolvimento passou a ser considerado na dimensão da cultura política, partindo da premissa de que a cultura é proeminente em relação ao político e ao econômico, ao definir os valores dentro da estrutura social. Apesar de essa vertente ter rompido com a questão dos benefícios da corrupção, ao incorporar o problema dos valores, ela não rompeu com a estrutura metodológica do funcionalismo.33. Por fim, o terceiro tipo de análise da corrupção, e prevalecente até nossos dias, começa a se consolidar na década de 1980. Trata-se da análise econômica da corrupção, que já nasce inspirada pelo contexto histórico-econômico que se desenvolve com a crise do Welfare State em todo o mundo. Desta forma, “o problema da corrupção é explicado de acordo com conceitos derivados de pressupostos econômicos como o rent-seeking e a ação estratégica de atores políticos no contexto de instituições que procuram equilibrar esses interesses com noções amplas de democracia”.34 Em resumo, trata-se de uma forma de análise que parte de pressupostos majoritariamente econômicos. Busca-se compreender uma série de configurações institucionais que permitem a “maximização dos lucros” dos agentes públicos e de mercado que buscam o enriquecimento em detrimento das normas coletivas de proteção ao patrimônio e à moralidade pública.35 Evidentemente, este tipo de análise é limitada por si só, na medida em que se analisa a corrupção a partir de uma temática totalmente econômica36. Assim,. A literatura especializada sobre o tema da corrupção, dos anos 1980 para cá, tem sido dominada pela economia, de maneira a compreendê-la como o resultado de configurações institucionais e o modo como elas permitem que agentes egoístas autointeressados maximizem seus ganhos burlando as regras do sistema político (...). A corrupção é explicada por uma teoria da ação informada pelo cálculo que agentes racionais fazem dos custos e dos benefícios de burlar uma regra. 33. Ibid., p. 395. AVRITZER, Leonardo; FILGUEIRAS, Fernando. Op. cit., p. 11-12. 35 Ibid. 36 FILGUEIRAS, Fernando. A tolerância à corrupção no Brasil. Op. cit., p. 396. 34.

(32) 31. institucional do sistema político, tendo em vista uma natural busca por vantagens.37. Esta forma de interpretação econômica da corrupção é a que prevalece em todo o mundo até hoje. Não por outro motivo, cria-se uma forma de senso comum para as modernas interpretações da corrupção em todo o mundo, que passam a enxergar o problema através da análise dos custos da corrupção para a sociedade, dos seus efeitos para a economia, como se a corrupção se resumisse ou mesmo fosse sinônimo de seus efeitos, sem atentar para suas diversas causas. É correto afirmar, portanto, que existe uma série de informações que compõem uma forma de discurso dominante sobre a corrupção nas nações. Ainda sob a influência de alguns dos conceitos funcionalistas, os organismos internacionais como Banco Mundial defendem que a crise vivida por países como o Brasil possui suas raízes na corrupção disseminada e institucionalizada na esfera governativa.38 Com isto, mesclam-se os conceitos da vertente economicista com alguns dos aspectos do funcionalismo nas atuais análises realizadas pelas nações e organismos econômicos no contexto global, quando nenhuma destas formas de interpretação da corrupção é realmente adequada para dar conta de um problema de tamanha complexidade. Em verdade, o estudo da corrupção precisa partir da análise das normas regulatórias da moralidade política e das práticas sociais, como defende Filgueiras e será visto mais à frente. 39 A análise das causas da corrupção não pode ser relegada a segundo plano, pois somente a partir da descoberta de suas origens é que a corrupção poderá compreendida corretamente para, assim, ser diminuída ou contida em uma dada conjuntura social. Em contextos de um desenvolvimento sui generis como é o caso brasileiro, esta premissa se torna ainda mais forte. Isto porque é impossível compreender a corrupção brasileira sem delinear alguns aspectos históricos que contribuíram para sua tolerância social na contemporaneidade. Embora neste trabalho seja adotada a visão de que a ocorrência da corrupção no Brasil se dá em um contexto específico e diferenciado do que se observa no contexto global, não se nega o fato de que são múltiplas as suas causas, que precisam ser observadas quando se trata de. 37. Ibid. WORLD BANK. Efforts to Combat Error, Fraud & Corruption in SP Systems: Country Examples. Disponível em: <http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/TOPICS/EXTSOCIALPR(...)>. Acesso em: 07.05.2014. 39 FILGUEIRAS, Fernando. A tolerância à corrupção no Brasil. Op. cit., p. 397. 38.

Referências

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