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A asserção no cinema documentário musical brasileiro

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Academic year: 2021

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CYNTHIA LETÍCIA SCHNEIDER

A ASSERÇÃO NO CINEMA DOCUMENTÁRIO MUSICAL BRASILEIRO

UNICAMP 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES

CYNTHIA LETÍCIA SCHNEIDER

A ASSERÇÃO NO CINEMA DOCUMENTÁRIO MUSICAL BRASILEIRO

Tese apresentada ao Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Multimeios sob a orientação do Prof. Dr. Fernão Vitor Pessoa de Almeida Ramos.

ORIENTADOR: PROF. DR. FERNÃO VITOR PESSOA DE ALMEIDA RAMOS

Este exemplar corresponde à versão final da Tese Defendida pela aluna Cynthia Letícia Schneider e Orientada pelo prof. Dr. Fernão Vitor Pessoa de Almeida Ramos.

_________________________________

CAMPINAS 2015

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Artes

Eliane do Nascimento Chagas Mateus - CRB 8/1350

Schneider, Cynthia Leticia,

Sch57a SchA asserção no cinema documentário musical brasileiro / Cynthia Leticia Schneider. – Campinas, SP : [s.n.], 2015.

SchOrientador: Fernão Pessoa Ramos.

SchTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes.

Sch1. Documentario (Cinema). 2. Cinema - Apreciação. I. Ramos, Fernão Pessoa,1957-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: The assertion in the Brazilian music documentary film Palavras-chave em inglês:

Documentary moving-pictures Moving pictures - Appreciation Área de concentração: Multimeios Titulação: Doutora em Multimeios Banca examinadora:

Fernão Vitor Pessoa de Almeida Ramos Denize Correa Araújo

Marcius César Soares Freire Rosana Elisa Catelli

Luciano Vaz Ferreira Ramos Data de defesa: 31-08-2015

Programa de Pós-Graduação: Multimeios

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AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, Prof. Dr. Fernão Vítor Pessoa de Almeida Ramos, pela oportunidade e pelo compartilhamento de conhecimentos e experiências ao longo da pesquisa e durante as disciplinas do Curso;

Aos membros da Banca de Qualificação, Dra. Denize Correa Araújo, Dra. Lílian Fleury Dória e Dr. Fernão Ramos pelas observações precisas;

Aos membros da Banca de Defesa Dr. Fernão Ramos, Dra. Denize Araujo, Dra. Rosana Catelli, Dr. Luciano Vaz Ramos, Dr. Március Freire, Dra. Cristiane Wosniak, Dr. Alfredo Suppia e Dr. Nuno Abreu por aceitarem o convite à avaliação da pesquisa de tese; Aos professores do Programa de Doutorado em Multimeios Prof. Dr. Fernão Ramos, Profa. Dra. Rosana Catelli, Prof. Dr. Március Freire e Prof. Dr. Ernesto Boccara, pelas contribuições;

Aos cineastas Izabel Jaguaribe, Emílio Domingo, Thereza Jessouroun e Eduardo Escorel pela facilitação do acesso aos seus filmes para a pesquisa;

Aos funcionários do Programa em Multimeios, em especial à Leticia Machado, pela assistência sempre solícita;

Aos funcionários da Biblioteca do Instituto de Artes, Carlos Eduardo Gianetti e Francisco Genésio Mesquita pela cooperação;

Aos colegas Régis Rasia, Juliano Araújo, Álvaro Cruz Zeni e Letizia Nicoli pelo apoio e pelas conversas edificantes e em especial a Luciano Vaz Ramos, pelas discussões e parceria científica;

À amiga Dra. Denize Correa Araujo, pelas contribuições e presença eternamente apaixonada pelo cinema;

Aos amigos Fabiana Moro Van Abbema, Janaína Seguin, Lorrayne Toebe, Fernando de Oliveira Souza, Joice Brasileiro e Dra. Marilane Ton dos Santos pelo apoio;

Aos meus pais, Eliane e Sérgio Schneider, pelo incentivo incondicional; Ao meu noivo Joaquim De Almeida Brasileiro, por tudo.

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vii RESUMO

O objetivo geral desta tese é o estudo da asserção nos documentários musicais brasileiros de longa-metragem com duração superior a 70 minutos. A seleção de filmes intenta responder ao seguinte problema de pesquisa: como organizar em categorias conceituais os documentários musicais brasileiros de forma a contribuir para a compreensão de uma possível ordem cinematográfica que perpassa os filmes do subgênero, mas que ao mesmo tempo reconhece as especificidades de cada um? Os principais objetivos específicos da pesquisa são: a) compreender a asserção no documentário musical brasileiro; b) aplicar individualmente a cada filme do corpus da pesquisa um modelo analítico para determinação de sua asserção; c) nominar categorias que permitam o arranjo dos filmes de acordo com a sua asserção; d) responder ao problema da pesquisa de forma que as categorias criadas possam organizar os filmes ao mesmo tempo em que reconheçam suas especificidades assertivas; e) contribuir para o conhecimento e a pesquisa em cinema documentário e as características de subgênero. A hipótese é de que os documentários de um subgênero específico não podem ser meramente organizados por sua proximidade temática ou por sua plástica formal e que o conceito de asserção pode ser norteador para a compreensão do documentário musical.

Palavras-chave: documentários musicais, documentários musicais brasileiros, asserção no documentário.

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viii ABSTRACT

The overall aim of this thesis is the study of assertion in the Brazilian musical documentaries with more than 70 minutes long. The selection of films tries to answer the following research problem: how to organize in conceptual categories the selected Brazilian musical documentaries in a way to contribute to the comprehension of a feasible cinematic order that can permeate all subgenre films, but at the same time recognizes each film specificities? The main specific research objectives are: a) understand the concept of assertion in the selected Brazilian musical documentaries; b) apply individually to each film of the corpus an analytical process to determine its assertion; c) nominate categories that allow the arrangement of films according to their assertion; d) respond to the research problem in a way that the created categories can organize films and at the same time recognize their assertive specificities; e) contribute to the knowledge and research in documentary filmmaking and its subgenre features. The hypothesis is that the documentaries of a specific subgenre cannot simply be organized by its thematic proximity or formal plasticity and that the concept of assertion may help in a process of understanding musical documentary.

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ix SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 O DOCUMENTÁRIO MUSICAL ... 15

1.1 A problematização do documentário musical: sobre shows e outras vertentes. ... 15 1.2 Documentário musical e asserção ... 18

1.3 Documentário além da música: diretores e obras ... 22

1.4 O cenário econômico-político do filme documentário musical no Brasil ... 28

2 CORPUS DA PESQUISA: METODOLOGIA E FILMES ... 36

2.1 Procedimentos seletivos e filmes do corpus ... 36

2.2 Possibilidades de categorização ... 48

3 ASSERÇÃO NO DOCUMENTÁRIO E CATEGORIZAÇÃO ... 50

3.1 Filosofia Analítica e Documentário ... 56

3.2 Teoria da Informação e categorização: taxonomias, ontologias e tesauros ... 61

3.2.1 Teoria da Classificação Facetada de Ranganathan ... 71

3.2.2 Teoria do conceito de Dahlberg ... 73

3.2.3 Teorias e usos do argumento de Toulmin ... 74

3.3 Anotações sobre especificidades fílmicas: roteiro e argumento no documentário ... 79

3.4 Passos metodológicos da pesquisa para categorização dos filmes: mapa teórico ... 86

4. CATEGORIAS DO DOCUMENTÁRIO MUSICAL BRASILEIRO ... 89

4.1 Análise das características comuns aos documentários musicais ... 90

4.2 Aplicação do modelo analítico assertivo: Bananas is my Business, de Helena Solberg, 91 min., 1995 ... 94

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x

4.4 Categoria Storytelling ... 104

4.4.1 Faceta Ideologia reativa ... 104

4.4.2 Faceta Memória de vida e obra ... 120

4.4.2.1 Classe Fluxo laminar ... 120

4.4.2.2 Classe Turbulência (sublevação) ... 140

4.4.3 Faceta Revelação ... 156

4.5 Categoria Expressão Fotográfica ... 162

4.6 Categoria matriz prosaica ... 164

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 170

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 176

FILMOGRAFIA NACIONAL ... 181

FILMOGRAFIA INTERNACIONAL ... 184

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11 INTRODUÇÃO

Este documento apresenta a organização dos estudos realizados no Programa de Doutorado em Multimeios da Unicamp, na linha de pesquisa História, Estética e Domínios de Aplicação do Cinema e da Fotografia, como pesquisa de tese. O objeto sobre o qual se desenvolve esta proposta são os documentários do subgênero musical, com ênfase aos brasileiros. O interesse pelo tema surgiu da observação de um grande número de documentários musicais brasileiros realizados no País, especialmente a partir dos anos 2000. Este cenário pode ser comprovado pelo aspecto quantitativo de filmes com este perfil registrados na Ancine - Agência Nacional de Cinema - consolidando o subgênero como um dos que possui maior representatividade entre os documentários nacionais recentes.

A função deste texto é apresentar a organização dos conteúdos metodológicos e analíticos, como os dados sobre o mercado de filmes nacionais referentes aos documentários musicais, as observações sobre as obras que compõem o grande conjunto de filmes recentes caracterizados como documentários musicais e o escopo teórico que dá sustentação à proposta analítica.

A tese tem como objetivo geral analisar documentários musicais brasileiros de longa-metragem, de forma a compreender quais são as suas propostas assertivas. Nesta pesquisa, “asserção” refere-se aos conceitos da teoria contemporânea do cinema documentário, especialmente conforme apresentados pelo autor Noel Carroll (2005), que partilha seus estudos sob o viés da filosofia analítica e cognitivismo. Para este autor, as diferenças formais nos filmes documentários não são suficientes para assinalar as características do documentário. A asserção segundo este modelo de pensamento é possibilitar a identificação dos filmes como documentário, e foi estendida para a compreensão dos filmes que compõem o subgênero documentário musical. A asserção é entendida como uma afirmação decorrente do processo de argumentação deum filme, que se sobrepõe a uma sinopse genérica da obra, marcada pela intencionalidade de declaração sobre algum aspecto específico. Carroll desenvolveu o conceito de cinema da asserção pressuposta para o documentário assinalando-o a partir da orientação de que o documentário é uma obra onde “o realizador intenciona que

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o público entretenha como assertivo o conteúdo proposicional de seu filme em seu pensamento”. (Carroll, 2005, p. 88-89).

A investigação inicial abrangeu uma grande quantidade de filmes como os registrados na Ancine, obras que possuem distribuição independente e outros que somente foram exibidos em Festivais, embora muitos não possuam registro na agência. Entre estes filmes, foram localizados formatos de curta, média e longa-metragem, produtos audiovisuais realizados exclusivamente para a televisão, além da indisponibilidade de acesso a cópias das obras às quais fosse possível aplicar uma observação mais pormenorizada. Disto decorreu a necessidade de empreender uma seleção metodológica para análise. Para tanto, muitos filmes observados no decorrer desta etapa foram excluídos do conjunto final obras categorizadas, observando critérios estabelecidos e identificados no capítulo dois desta tese.

A pesquisa compilou 61 documentários de longa-metragem e foi realizada com a intenção de responder ao problema de pesquisa sintetizado pela seguinte pergunta: como organizar em categorias os documentários musicais brasileiros, de forma a contribuir para a compreensão de uma possível ordem cinematográfica que perpassa os filmes do subgênero, mas que ao mesmo tempo reconhece as especificidades assertivas de cada filme?

Os objetivos específicos desta pesquisa são: a) compreender a asserção no documentário musical brasileiro, conforme exposto por teóricos da filosofia analítica como Noel Carroll, Carl Plantinga e Trevor Ponech; b) aplicar individualmente, em cada filme do corpus da pesquisa, um modelo analítico para determinação de sua asserção; c) nominar categorias que permitam o arranjo dos filmes de acordo com a asserção; d)responder ao problema da pesquisa de forma que as categorias criadas possam organizar os filmes ao mesmo tempo em que reconheçam suas especificidades assertivas; e) contribuir para o conhecimento e a pesquisa em cinema documentário e as características de subgênero.

A hipótese contemplada é de que os documentários de um subgênero específico não podem ser meramente organizados por sua proximidade temática, pois o critério, apesar de ser válido, é apenas primário e muito genérico. Tampouco a plástica formal deve ser um critério prioritário, pois só identificaria valores muito específicos dos

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filmes, como a intenção autoral, não permitindo que se entre em contato com o sistema fílmico que permeia as obras e o subgênero. Além disso, uma análise meramente estruturalista não daria garantias das relações histórico-temporais do filme, pois as escolhas formais no documentário contemporâneo, onde está situada a maioria do corpus da pesquisa, dependem de variáveis incontroláveis e muito particulares, como preferências estilísticas, a dificuldade ou impossibilidade de liberação de direitos autorais e inclusive o fato de que o documentário lida com estruturas formais bastante típicas, reconhecíveis e repetitivas na maioria das vezes.

O capítulo inicial trata de aspectos do documentário musical como a sua problematização. O cenário econômico-político do subgênero no Brasil, com análise dos dados da Ancine sobre a circulação nacional de filmes ficcionais e documentários, compõe os resultados apresentados no capítulo. Esta parte da pesquisa indica também os períodos de maior concentração dos lançamentos dos documentários musicais e sua relação de público no mercado cinematográfico.

Para elaborar um modelo de análise e classificação das obras foi utilizada inicialmente uma base teórica que permitisse compreender o fenômeno da asserção no documentário. Como a premissa que caracteriza o gênero documentário, segundo Fernão Ramos (2008), é a asserção, o modelo analítico desenvolvido considerou que a categorização dos filmes deveria tomá-la como referência para o arranjo dentro do subgênero. A asserção é um conceito central ao juizo da filosofia analítica para estabelecer parâmetros de compreensão do documentário no universo dos filmes de não-ficção que, como sentencia Carroll (in Ramos, 2005b), seria mais apropriadamente compreendido se denominado de cinema da asserção pressuposta. Este é o tema do capítulo três que, para depreender a noção de asserção fílmica, também se fundamenta no marco teórico de Ponech (1999) e Plantinga (1999), que igualmente se detém sobre a preocupação assertiva do caráter do documentário.

O capítulo três explica também como foi desenhado o modelo analítico aplicado a cada filme, que articulou elementos da proposta de Liakopoulos (2002) adaptada da Teoria dos usos do argumento de Toulmin (2001) e moldada para a especificidade fílmica para esta tese.

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Esse modelo analítico dá características metodológicas à análise porque garante que “o argumento é tão válido quanto é o raciocínio existente por detrás dele, e existem determinadas regras universais que podem ser usadas na avaliação da lógica do argumento”. (Liakopoulos, 2002, p. 219). Assim foi possível fazer uma aproximação entre o conceito de argumento e a asserção, permitindo que a asserção de cada filme fosse levantada a partir das características do argumento. O modelo entende que um argumento assertivo torna-se uma proposição porque é precedida de dados, exige um qualificador de dados, e conta com uma garantia e possível apoio para a validade do argumento. A partir da consideração “dados-qualificador de dados-garantias-apoio” foi possível identificar a asserção do filme documentário musical.

Após o reconhecimento da asserção de cada um dos 61 filmes, a reflexão sobre a sua categorização ponderou a Ciência da Informação com seus conceitos e ferramentas tanto da área de biblioteconomia como do arquivismo. As referências aos métodos e conceitos sobre biblioteconomia foram adotados conforme os trabalhos de Campos (2006) e Carlan (2010). Do arquivismo, os conceitos de Schellenberg (2006) foram importantes para o entendimento dos processos de catalogação e classificação de obras. As considerações da Teoria Analítica do Conceito de Dahlberg (1978) foram adotadas por serem influenciadoras da teoria na ciência da informação, assim como aspectos sobre categorização conforme orientação da Classificação Facetada de Ranganathan (1967).

O capítulo final apresenta observações sobre características comuns ao documentário musical brasileiro e se propõe a apontar as três grandes categorias que organizam os filmes analisados, suas respectivas facetas e classes. O modelo de classificação de asserções identificou três tipos principais de documentários musicais: os que priorizam o ato de contar histórias, os que enfatizam a expressão fotográfica e os que derivam de uma matriz prosaica, ao valorizar conteúdos históricos com abordagens universalizantes e de observação em detrimento da promoção de questionamentos. Conforme indicado neste último capítulo, pode-se perceber, pela análise assertiva, que o documentário musical brasileiro exibe uma preferência generalizada por obras que contam histórias, seja de músicos, artistas performáticos, estilos e eventos musicais, corroborando com a proposta estilística da narrativa própria do filme ficcional.

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15 1 O DOCUMENTÁRIO MUSICAL

O capítulo destaca a importância que o documentário, e em especial o subgênero musical adquiriu em tempos recentes no cenário mundial e significativamente na produção brasileira. São exploradas a problematização do subgênero e em especial, o contexto econômico-político onde se colocam os filmes no cenário nacional.

1.1 A problematização da música no documentário: sobre shows e outras vertentes.

A teoria contemporânea do cinema dá conta de que há especificidades nos filmes de ficção, não ficção e documentário. Notadamente no recorte cognitivista, esta diferenciação é colocada no centro do debate. Por recorte analítico-cognitivista disseminado por teóricos como Noël Carroll, Carl Plantinga e Trevor Ponech1 que se atém à conceituação do gênero fílmico, pretendendo determinar um campo de estudos no qual a asserção dos filmes é um ponto de partida. Esta pesquisa parte dos estudos destes autores para investigar um tema ainda mais específico do que o documentário: o subgênero musical. Para efeito de entendimento do gênero documentário, os documentários que problematizam a música foram considerados como um subgênero.

A abordagem analítica citada considera que há uma confusão entre o que se considera não-ficção e documentário e entende que nem todo filme apreciado como não-ficcional pode ser tomado como um documentário. Da mesma forma, nem todo filme que trata do tema musical pode ser tomado com um documentário musical2. Como a intenção geral da pesquisa é promover uma classificação dos filmes documentários musicais, inicialmente alguns aspectos sobre este subgênero precisaram ser explorados,

1 Estes não são os únicos autores que promovem análises analítico-cognitivistas, apenas foram tomados com principais referências para esta tese por sua dedicação ao assunto da asserção. David Bordwell e Edward Branighan, por exemplo, também dedicam obras ao assunto, sendo que o primeiro se ocupa de uma extensa revisão histórica do cinema com ênfase no estilo e o segundo às questões dos jogos de linguagem e às narrativas face às teorias do cinema.

2 Para esclarecer o debate, os conceitos cognitivistas destes autores são abordados com maior profundidade no capítulo três desta tese.

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como a delimitação do que é o documentário musical e a atenção que realizadores tem lhe dedicado em tempos recentes. Conforme ressalta Ponech

Defendo que o núcleo da não-ficção não consiste em uma relação objetiva indicadora, mas da ação de indicação, ou seja, alguém de forma deliberada e abertamente indicando algo a alguém. Documentários adquirem esse estatuto, porque são concebidos, criados, mostrados, e usados com determinados propósitos comunicativos definitivos em mente. (...) eles são asserções cinematográficas, imagens naturalmente significativas que estão entre os elementos utilizados pelo comunicador para fins afirmativos3. (PONECH, 1997, p. 205)

Ao aceitar que existe este aspecto primordial de intencionalidade assertiva do documentarista, é possível estendê-lo para analisar os documentários do subgrupo musical. A proposta inferida por Ponech (1997) também compete ao que se tem de essencial no filme documentário musical: é possível identificar que este tipo de filme enquadra-se num lugar de fala em que há uma ação indicadora de alguém para evidenciar um aspecto inserido no universo musical. Isto é importante porque há muitos filmes que tangenciam o tema musical, mas não necessariamente se afirmam como documentário musical. E isto pode ser verificado a partir das efetivas propostas assertivas dos filmes. Por esta razão, a observação da asserção do filme decorrente de sua argumentação, na medida em que afirma problematizar a música e seus aspectos próprios – como músicos, estilos, eventos instrumentos e performances musicais - ficou estabelecida como uma fonte determinante para o entendimento de um filme como um documentário musical. Por esta razão uma cinebiografia, por exemplo, não é um documentário musical, na medida em que não tem uma proposição assertiva no sentido de sê-lo4.

3 “I argue that the core of non-ficction consists not of an objective indicator relation, but of the action of indication, i.e, somebody deliberately and openly indicating something to somebody else. Documentaries acquire their status as such because they are conceived, created, shown, and used with certain definitive communicative purposes in mind. As I say, they are cinematic assertions, naturally meaningful images being among the elements employed by the communicator toward assertive ends”. (PONECH, in ALLEN e SMITH, 1997, p. 205)

4Há vários filmes de ficção brasileiros lançados no período em que se concentra a maior parte dos títulos analisados nesta pesquisa que tematizam a música e se caracterizam por cinebiografias. Exemplos destes filmes são duas obras do diretor Breno Silveira: Dois filhos de Francisco, 2005 e Gonzaga, de pai para filho, de 2011. Estas obras são filmes ficcionais do subgênero drama que, por tematizarem a vida e obra de

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Carroll (2005) em sua conceituação que presume a diferenciação entre o cinema de não ficção e o cinema documentário diferencia “traço pressuposto” e “asserção pressuposta” sob o seguinte argumento:

O conceito de cinema do traço pressuposto é distinto do de cinema da asserção pressuposta. Este último é, em geral, mais amplo, pois se refere a obras cujo realizador tem as mais diversas espécies de intenção assertiva, ao passo que o cinema do traço pressuposto diz respeito apenas aos filmes cujos realizadores têm uma intenção assertiva muito particular, qual seja, a de que as imagens sejam entretidas como uma asserção de que são traços históricos. A noção de cinema do traço pressuposto compreende a dimensão “documental” que muitos associam ao chamado cinema documentário. (CARROLL, 2005, p.94)

Esta identificação do traço pressuposto contribuiu para delinear o perfil da investigação em curso, uma vez que o que procurou compreender nos documentários musicais brasileiros é muito próximo do que o autor declara, uma vez que boa parte de suas asserções pressupõem traços históricos. Outro ponto relevante é apontado por Plantinga (1999), quando procura definir o que realmente faz com que um filme seja caracterizado como ficção ou como não ficção:

Podemos não encontrar nada de intrínseco em um filme ou livro identificado claramente como ficção ou não ficção. A distinção entre ficção e não ficção não se baseia unicamente nas propriedades intrínsecas textuais, mas também no contexto extrínseco da produção , distribuição e recepção ... Quando um filme é indexado como não ficção, incentiva um tipo especial de atividade do espectador. A indexação ocorre através de créditos e títulos, menções explícitas do filme como não-ficção em publicidade, press

releases, entrevistas, boca a boca, e numerosos outros meios.5

(PLANTINGA, 1997, P. 16)

músicos, se apresentam como cinebiografias. Isto mostra que a própria indexação de um filme é um indicativo de sua asserção. Cinebiografias ficcionais não se declaram como documentários, muito menos como documentários musicais.

5 We may find nothing intrinsic in a film or book that clearly marks it as fiction or nonfiction. The distinction between fiction and nonfiction is not based solely on intrinsic textual properties, but also on the extrinsic context of production, distribution, and reception… When a film is indexed as nonfiction, it encourages a special type of spectator activity. Indexing occurs through credits and titles, explicit mentions of the film as nonfiction in advertising, press releases, interviews, word of mouth, and numerous other means. (PLANTINGA, 1997, P. 16)

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Plantinga (1999) argumenta que não há nada intrínseco ao filme que possa marcar claramente se é ficção ou não-ficção. Contudo, se o filme é indexado como não ficção, muitas vezes a expectativa do espectador em encontrar no filme algo que se relacione ao campo extradiegético é bem mais acentuada do que se o filme fosse anunciado como ficção. O autor complementa que “(...) não ficção afirma uma crença de que os objetos dados, entidades, estados de coisas, eventos ou situações realmente ocorrem (ocorreram) ou existem (existiram) no mundo real como retratado”.Embora nem sempre documentários sejam representativos de uma certa “verdade” e nem sempre filmes ficcionais sejam afastados completamente de certos eventos, o rótulo de documentário confere à obra um status de possibilidade de plausibilidade e de acentuada verossimilhança.

1.2. Documentário Musical e Asserção

É precisamente no momento em que o documentário se acerca da música promovendo asserções prioritárias sobre seu universo que se encontra o subgênero musical. Mais do que meramente promover um registro de temática musical, estes filmes problematizam um aspecto deste domínio. É comum encontrar no universo não-ficcional várias tipologias fílmicas que tematizam a música, como shows, filmes de bastidores, ou rockmentaries. A proliferação de nomenclaturas tem surgido conforme mais autores de dedicam à pesquisa dos documentários musicais e isso é parte do processo em trânsito para compreender o documentário musical.

Um dos questionamentos diz respeito à diferença entre registro e documentário. O registro é informativo, pontual. O show é um registro, não é um documentário musical. É o caso do DVD Maria Rita (2003), que é a gravação de um show realizado no Bourbon Street, em São Paulo. Esta obra não pretende se afirmar como um documentário musical porque é um registro de performance. Com direção de Marcus Vinícius Baldini e Homero Oliveto, sua função é musical e integra a vasta gama do que pode ser chamado de filme não ficcional. Mas não é um documentário, pois não se associa à definição do cinema da asserção pressuposta. E também não problematiza a música, apresenta-a, demonstra-a, executa-a.

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Há várias nuances entre o registro e o documentário musical. Jards, de Eryk Rocha, 2013, é um documentário que opera nos limites entre o registro e o documentário. Ao atuar como um diário de bastidores da gravação de um álbum de Jards Macalé, a asserção do filme caminha no sentido de revelar o processo criativo do artista por meio de suas parcerias com outros músicos enquanto resgata referências à história pessoal e da carreira do artista. Apoiando-se numa cinematografia6 detalhista e performances de estúdio, o filme afirma uma visão particular do diretor sobre uma obra musical, ancorado numa matriz prosaica que atribui à trivialidade do cotidiano o tom da obra.

Por outro lado, como cita Marcius Freire, uma das razões para o crescente interesse pelo documentário é que em geral são filmes de baixo custo e são o caminho preferido por muitos cineastas iniciantes para realizar suas primeiras obras, credenciando-os a partir da participação em Festivais e iniciando um portfólio pessoal de filmes de longa-metragem. Asserções centradas em personagens do universo musical funcionam também como uma espécie de credenciamento do cineasta a um universo específico, que constitui um nicho de fãs e amantes da música em geral.

Outra característica que marca a recepção é a emoção. Na obra Minerva´s Night out – universo Pop (2015, cap. 5, p1), Carroll comenta:

Filmes são bem sucedidos, quando efetivamente fazem sucesso, em grande medida, ao abordar as emoções dos espectadores. As emoções são capazes de desempenhar essa função tão bem, porque as emoções, ou, pelo menos, as emoções normalmente provocadas pelo cinema, são amplamente convergentes através de vastas populações, de fato, que geralmente gostam de ser empurradas para os estados emocionais relevantes, de modo que desde que eles não tenham que pagar o preço que esses estados exatamente padronizados (como tristeza, por exemplo, correlaciona-se com a perda pessoal). Essa é uma das razões pelas quais os espectadores se reunem para ver filmes. As emoções não só contribuem para a compreensão das narrativas cinematográficas, como o fazem de forma a promover o prazer.7 (CARROLL, 2015, cap 5, §2)

6 Referência ao termo cinematography, comumente traduzido no Brasil como direção de fotografia.

7 Movies succeed, when they do succeed, in large measure, by addressing the emotions of spectators. The emotions are able to perform this function so well, because the emotions, or, at least, the emotions usually stirred up by the movies, are broadly convergent across vast populations, indeed, that generally enjoy being thrust into the relevant emotional states, so long as they do not have to pay the price that those states

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Este parece ser um caminho interessante na tentativa de uma conversa do cineasta com um público de certa forma já desenhado, para o qual se pode considerar certas expectativas de interação. O documentário musical Raul – o início, o fim e o meio, de Walter Carvalho, 2012, não é um filme amador. Seu diretor tem múltiplas experiências no cinema, tanto como diretor quanto como diretor de fotografia, e sua asserção visa resgatar a memória de vida e obra do músico Raul Seixas. No ano de lançamento, o filme obteve a maior bilheteria do cinema brasileiro, um fato até então impensável para um filme documentário nacional. Isto reitera a ideia de ascensão do subgênero, possivelmente devido aos apelos emotivos da evocação do nome do artista, da amplitude de conhecimento alusivo prévio do público sobre a trajetória e as canções do artista e, evidentemente, das possibilidades de distribuição que não são comuns ao documentário musical.

O fato é que em meio à ascensão do subgênero, certos filmes ganharam demasiado destaque não somente no cenário nacional. Searching for sugar man, de Malik Bendjelloul, 2012, competiu na categoria de documentário de longa-metragem no Oscar 2013 e venceu8. O filme anglo-sueco conta a trajetória do bluesman Sixto Rodrigues, que lançou dois discos na Detroit dos anos 70, onde fracassou. O contraponto se dá com o grande sucesso que o músico fez na África do Sul onde é considerado um mito cercado de versões populares sobre sua morte. A asserção do filme abre a oportunidade para um filme investigativo, novamente com grande apelo fotográfico, construções argumentativas que encaminham para a emoção e centralidade no imaginário arquetípico do artista exposto à idolatria e à decadência.

Uma vez que o subgênero também tem se caracterizado como um nicho de mercado, os autores Edgar, Fairclough-Isaacs e Halligan (2012, p. 3) apontam que este mesmo fato colocou o subgênero em crise. Para os autores que pesquisaram as lojas de música nos Estados Unidos, há uma saturação em termos de aposta em consumo comercial destes filmes, que precisam “explorar as subjacências ideológicas, sociais,

standardly exact (as sadness, for example, correlates with personal loss). That is one of the reasons that viewers flock to the movies. The emotions not only contribute to the intelligibility of motion-picture narratives, but they do so in a way that promotes pleasure. (CARROLL, 2015, cap 5, §2)

8Searching for Sugar Man já havia recebido, duas semanas antes, o prêmio BAFTA da 66ª edição do British Academy Awards na categoria documentário.

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performáticas, históricas e estéticas do formato”. No prefácio de sua obra os autores questionam a convergência de interesses artísticos e comerciais na realização de documentários musicais:

O documentário musical adquiriu destaque - a partir de um simples complemento "adequado" a um componente fundamental para a música popular contemporânea, e um gênero de filme em seu próprio direito - sem nunca ser sujeito a perspectivas críticas e acadêmicas substanciais. E, no entanto, mesmo no ponto de embarcar esse estudo, descobrimos que o gênero em si está em crise. Foi a detecção da institucionalização do documentário musical e as formas pelas quais, de quase todas as categorias de documentário, esse gênero tornou-se tão completamente entregue às preocupações comerciais, que levaram à necessidade de identificar e explorar o ideológico, o social, o performativo, as bases históricas, estéticas e formais. Para colocar em termos mais simples: quase qualquer loja de música comercial agora irá conter uma seção de "documentários de música". O gênero está claramente bem estabelecido. E ainda comprova que uma pequena seleção desses documentários pede uma pergunta inevitável: como é possível que o documentário, que opera no campo da música popular, tenha estado tão longe das ideias de objetividade e de reportagem - ideias que representam os fundamentos da forma documental - e tornou-se pura publicidade?9 (EDGAR,

FAIRCLOUGH-ISAACS E HALLIGAN, 2013, p. 11)

A citação é instigante no sentido de evitar o simplismo de pensar que só o conteúdo, ou só o rótulo de documentário, ou só a música, podem fazer do filme um sucesso. Há muitos outros fatores, como a atuação da mídia, que podem favorecer uma aceitação de um público ávido por novidades.

9 The music documentary has risen in prominence – from a mere adjunct to music “proper” to a component fundamental to contemporary popular music, and a film genre in its own right – without ever being subject to substantial critical and academic perspectives. And yet, even at the point of embarking such an examination, we find that the genre itself is in crisis. It was the detection of the institutionalization of the music documentary and the ways in which, of almost all categories of documentary, this genre has become so fully given over commercial concerns, that prompted the need to identify and explore the ideological, social, performative, historical, and aesthetic underpinnings of the form. To put this is more straightforward terms: almost any commercial music store will now contain a “music documentaries” section. The genre is clearly well established. And yet to sample even a small selection of these documentaries prompts an unavoidable question: how can it be that documentary, operating in the field of popular music, has strayed so far from ideas of objectivity and reportage - idea– that represent the fundamentals of the documentary form – and has become pure promotion? (EDGAR, FAIRCLOUGH-ISAACS E HALLIGAN, 2013, p. 11)

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1.3. O documentário muito além da música: diretores e obras

Listas de filmes internacionais com títulos de documentários musicais são difundidas por instituições dedicadas ao cinema e à música, como acontece com o IMDB e a revista Rolling Stone. O interesse pelo filme documentário musical se dá exatamente pelas possibilidades paradigmáticas de seus temas, com especial apelo às imagens de arquivo inéditas em geral pertencentes ao acervo pessoal de artistas ou seus herdeiros, como acontece no filme Kurt Cobain – Montage de Heck, de Brett Morgen, 2014, que traz imagens do cotidiano prosaico do músico e vocalista da extinta banda norte-americana Nirvana. O filme revela, entre aspectos da relação familiar do artista na infância e na adolescência, a rotina de sexo, drogas e álcool devidamente registrado por câmeras caseiras por ele mesmo e sua ex-esposa, Kurtney Love, que também dá seu depoimento no filme revelando intimidades e seu ponto de vista sobre o músico que se suicidou em 1994.

No cenário brasileiro, o documentário Uma noite em 67, de Renato Terra e Ricardo Calil, traz um legado importante para corroborar com o debate sobre direitos autorais do uso de imagens. As imagens e depoimentos dos músicos durante o III Festival da Música Popular Brasileira, realizado pela TV Record em outubro de 1967, não são imagens às quais se tem acesso facilmente, já tendo sido requisitadas por cineastas que tiveram sua reprodução em outros filmes inviabilizada pelos valores incrivelmente altos cobrados10. Este aspecto da presença de imagens populares, mas poucas vezes reproduzidas, também é uma característica que demarca o documentário musical.

10 O crítico Lucas Salgado, do site especializado Adoro Cinema cita o fato de que “Quando Monique Gardenberg dirigiu Benjamin, adaptação de romance homônimo de Chico Buarque de Hollanda, ela pretendia utilizar cenas de um Festival da Música Popular Brasileira da TV Record em que o cantor se apresentava. Assustada com os valores pedidos para a liberação dos direitos de imagem, a diretora pediu ao próprio Chico que tentasse sensibilizar os executivos da Record. E mesmo assim não conseguiu a liberação e a cena foi excluída do roteiro. Esta história é importante no sentido de se reforçar o grande mérito do filme, que é justamente resgatar uma das noites mais importantes da MPB através de imagens de arquivo preciosas e muitas vezes perdidas pela vontade mercadológica de corporações (não só a Record, diga-se de passagem). Este último fator ainda permanece, mas felizmente os produtores do filme conseguiram contorná-lo ao convencer a recém-criada Record Entretenimento a aderir a produção”. Disponível em: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-187074/criticas-adorocinema/

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É certo que se a literatura sobre cinema documentário ainda é escassa se comparada aos estudos publicados sobre cinema ficcional, sobre documentários musicais a situação é ainda mais complicada. Contudo, o tema tem gerado interesse no mundo acadêmico nos últimos anos e alguns pesquisadores tem se dedicado ao tema por meio de estudos pontuais, apesar de, especialmente em língua portuguesa, ainda serem poucas as obras dedicadas ao tema.

Como exemplo de obra estrangeira que dedica artigos ao documentário musical, está a de Edgar, Fairclough-Isaacs e Halligan (2013), cuja seleção de artigos se debruça, ora sobre o rádio-documentário e projetos televisivos norte-americanos ou estudos de caso isolados sobre filmes considerados clássicos, ora tenta compor uma retrospectiva compilativa ou de definição do subgênero. Rogers (2015) edita coletânea de artigos que se debruçam sobre o universo musical no documentário, onde apesar do documentário musical não ser a prioridade, a busca pela autenticidade no documentário de Indie-rock analisado por Sexton (2015) traz uma contribuição para os estudos do tema. A história do documentário musical no mundo é ampla. Grandes diretores internacionais se dedicaram ao documentário musical, como o premiado norte-americano Ken Burns, que em 2000 realizou Jazz, uma minissérie de dez episódios com duração de 1.140 minutos que foi exibida pela PBS11 em 2001. Jazz documenta os músicos e compositores norte-americanos inovadores e se popularizou após o lançamento em DVD. O filme tem bem marcadas as características estilísticas do diretor na articulação das imagens com as trilhas sonoras e a movimentação lenta de câmera sobre fotografias, o que acabou por influenciar a criação de Ken Burns effect12. Outro documentarista norte-americano, Les Blank, tornou-se conhecido por seu trabalho à frente de documentários de curta-metragem sobre músicos tradicionais norte-americanos como Dizzie Gillespie (1965) e o compositor experimental Christopher Tree (1967). Dirigiu dois filmes em 1968 sobre o bluesman texano Lightnin’ Hopkins: The Blues Accordin’ to Lightnin’ Hopkins e The Sun’s Gonna Shine e em 2008 Ry Cooder and the Moula Banda Rythm Aces, só para citar alguns dos títulos de sua filmografia. Les Blank teve grande colaboração para

11 PBS – Public Broadcasting Service, emissora norte-americana

12 Ken Burns Effecct: recurso conhecido no mundo do design gráfico, criado pela Apple para seus software de edição de imagens I-Photo, I-movie e Final Cut Pro X. Les Blank é outro diretor destacado no capítulo inicial.

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a consolidação do subgênero de documentários musicais e em 2013 recebeu do Hot Docs – Festival Internacional de Documentários do Canadá uma homenagem póstuma retrospectiva de sua obra.

Murray Lerner, outro documentarista e produtor estado-unidense, dedicou boa parte de sua obra a documentários musicais. É o que se vê em obras como From Mao do Mozart: Isaac Stern in China, de 1980, onde visita a trajetória do violinista polonês; Message to love: Isle of Wright Festival, de 1995, que trata da edição Isle of Wright Festival de 1970 e Amazing Journey: The story of the show (2007), para citar alguns.

As culturas locais no século XX foram muito marcadas pela difusão de sua produção musical. Alguns documentários musicais acabaram por ganhar lugar de destaque entre fãs, críticos e músicos. São filmes com impacto e condições de distribuição completamente diversas como Gimme Shelter (1970), sobre famoso show da banda Rolling Stones em 1969 e documentários mais periféricos como Mahaleo (2005) sobre os músicos da maior banda de blues de Madagascar, onde a trajetória musical e pessoal dos artistas se confunde com as condições sócio-econômicas do país.

Grandes nomes da música continuam liderando o destaque midiático dado ao documentário musical. Amy, de Asif Kapadia, 2015, assere que a trajetória da cantora Amy Winehouse é um resultado do meio em que viveu, tendo a cantora sido consumida por ele. What happened, Miss Simone?, de Liz Garbus, lançado no mesmo ano, assere que a personalidade forte da cantora foi o aspecto principal da sua trajetória musical. Como se pode perceber, a escolha de personagens midiáticos no documentário musical não se dá apenas por uma seleção de elementos formais. Estes filmes tem uma intenção clara de emitir uma afirmação sobre o mundo, com a qual os elementos formais corroboram.

Martin Scorsese também incursionou no cinema documentário musical, à frente de filmes como No Direction home: Bob Dylan (2005) e Living in a material world: George Harrison (2011). No subgênero musical, os títulos The last Walts (1978) e Shine a light (2008) contribuem para o debate sobre as fronteiras entre o show - o simples registro de uma performance musical - e o documentário musical, cuja articulação de conteúdos gerada asserções sobre o tema em questão. Esta é a razão pela qual este

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último filme foi tomado como exemplo para uma análise mais atenta, procurando ressaltar os argumentos de diferenciação entre o documentário e o show.

Shine a Light13(2007) é um longa-metragem de um diretor mais popularmente conhecido por suas obras ficcionais, o que por si só já chama atenção para a prévia categorização do filme como documentário. O óbvio seria que fosse um filme de ficção. Mas não é, e tampouco tem pretensões modestas de ser meramente um show. O curioso é que as informações que cercaram o lançamento do filme - seu paratexto - e os conteúdos publicitários elaborados sobre ele pelos distribuidores levam-no ao status de documentário. O filme chegou ao espectador referendado como um registro de dois shows da banda Rolling Stones no Beacon Theater de Nova York em 2006, prometendo revelar os bastidores e a própria filmagem dos eventos em película 35 mm. Mas o que ele assere, como faz isso do ponto de vista das estruturas internas de som e imagem em movimento selecionadas e ao que se propõe, qual o seu lugar de fala? Shine a light é um documentário ou um show?

Ponech14 (1999) chama a atenção para um conceito pragmático do que seria realmente a causa de um filme não ficcional. Um filme, para ele, é um documentário porque foi realizado com a intenção de sê-lo. O autor crê que padrões generalizantes sobre o que é um documentário não correspondem a um embasamento consistente para compreensão do filme de não ficção. Para Ponech, um filme deste gênero não precisa ser totalmente factual, nem conter um objetivo puro e único. Tampouco o filme não ficcional prima pela representação não manipulada ou adota um assunto ou forma padrão. A realidade do filme, conforme o autor, não precisa coincidir com a realidade lá fora, nem pertencer a convenções normativas como forma, estilo, conteúdo, verdade ou objetividade.

Dadas estas referências, é possível entender que o documentário não é um modelo com formato prévio e engessado e que para ser assim categorizado não precisa seguir algum rigor formal, seja em termos de conteúdo, plástica narrativa ou abordagem. Estes argumentos são justos para um ponto inicial de análise do filme Shine a Light: Não se está aqui procurando encontrar no filme o que ele tem de verdade ou objetividade para que possa ser reconhecido como documentário, mas os elementos argumentativos que

13 Rolling Stones - Shine a light, dir. Martin Scorsese, EUA, 2007.

14Trevor Ponech é um pesquisador canadense e um dos principais autores das teorias contemporâneas do cinema. Sua obra é influenciada pela filosofia e ele não aceita a descontextualização dos filmes analisados, considerando que a estética não é radicalmente autônoma da política, da ideologia, da moral ou da economia. O autor compreende que links para essas esferas são imperativos e seus conceitos não se ancoram exclusivamente nas teorias do cinema.

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revelam a acuidade assertiva do diretor que compôs um filme-show-documentário teoricamente sustentável.

Ramos (2008) aponta para o mesmo conceito de Ponech. Para Ramos, o documentário faz asserções sobre o objeto que pretende evidenciar, e para sabê-lo é preciso compreender a questão ética que está em jogo, investigar quais as formulações válidas que o filme faz sobre o “real”. O autor igualmente desvincula qualquer compreensão do filme documentário das relações de objetividade e verdade. Se todo documentário organiza e reconstrói a representação do mundo e emite postulados sobre o mundo - como demonstra o autor - é preciso, para a análise, decompor o filme e perceber como ele expõe assertivamente através de imagens e sons.

Quantitativamente, Shine a light é um show. O filme é muito mais as apresentações dos músicos do grupo Rolling Stones, sua banda complementar e os convidados - bons ou ruins - do que asserções sobre um universo específico. Deste lugar de fala, o longa-metragem seria meramente um show, com tanto valor de documento como qualquer outro dos muitos shows da banda que estão disponíveis em mídias eletrônicas, digitais, ou acessíveis na internet. Mas isto imediatamente transformaria, a partir de um argumento raso, qualquer show gravado em cinema ou vídeo em documentário.

Um olhar qualitativo revela uma intenção assertiva norteadora neste filme, que tende a direcionar a percepção do espectador para algo além do show. Há algo mais acontecendo no filme capaz de criar tensão, jogar com expectativas, estimular uma percepção extra do que se vê no palco e costurar o que está na tela com todo o espaço fora dela. E é nesse aspecto do filme que repousa o seu caráter documental. Intencionalmente, Scorsese cria uma espécie de narrativa que conduz o espectador a partir do seu primeiro contato com o filme: é um documentário dele sobre os Rolling Stones, tendo como ponto central uma performance – o que é a banda em sua essência. Shine a Light entremeia o show com depoimentos: o diretor é mostrado com sua equipe em ação na pré-produção do show e durante as filmagens, e aposta tudo em entrevistas, muitas garimpadas em acervos de emissoras internacionais que tiveram circulação restrita em seus países. Mas isso tem uma clara intenção de referenciar um estilo de cinema direto, como se a câmera pudesse ser uma mosquinha na parede. Por exemplo, a câmera flagra uma reunião restrita onde consta que Mick Jagger e Scorsese se desentenderam durante as filmagens, que o aparato de iluminação do show será tão intenso que poderia “fritar” Mick Jagger e que o diretor do filme não tem a menor ideia de qual será a ordem das músicas do show e só fica sabendo disso segundos antes do início do evento.

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Como revelam as entrevistas retiradas de arquivos, são resgatadas situações hilárias nas quais os integrantes da banda dão entrevistas para programas de TV, possivelmente os mais esquisitos de sua carreira, e respondem a perguntas quase inacreditáveis como “- Quem você seria se não fosse Mick Jagger?”. A seleção das entrevistas indica uma intenção em mostrar o lado vítima dos integrantes da banda, que por conta do sucesso precisam responder quase sempre às mesmas perguntas e são obrigados a rir de piadas completamente sem graça muitas vezes. O filme de Scorsese desenha um grupo de músicos com um lado muito empresarial, sério e voltado para resultados mercadológicos, mas que só queria mesmo era levar a vida de forma menos engajada, como comprovam as entrevistas onde os músicos estão visivelmente sob efeito de psicotrópicos, ou recém saindo da cadeia por questões vinculadas ao consumo de drogas.

Scorsese deixa sua marca evidente: um documentário assinado por ele não deixaria de lado uma certa encenação, aliada a uma condição narrativa muito fronteiriça com o filme ficcional. O espectador acompanha a saga de um diretor famoso – Scorsese – tentando fazer um documentário sobre um show, mostrando uma parte dos problemas que o levam a acompanhar o evento com a mesma ansiedade do realizador de que tudo dê certo. Este é um documentário com fortes aportes do documentário direto, busca ancoragens históricas em imagens de arquivo e flerta com a narrativa ficcional para compor sua asserção sobre os shows em questão. Evita a voz over típica do documentário clássico e convoca a casualidade das conversas cotidianas em sua substituição. Sua asserção é a de que um show da banda Rolling Stones é uma performance que requer uma complexidade imensa e que merece ter sua história registrada junto com a sua performance, o que leva o filme a afirmar-se enquanto documentário.

O interesse sobre este perfil de filmes ocorre devido ao que se pode considerar uma ascensão do gênero, com uma identificação quantitativa crescente de títulos lançados em tempos recentes, especialmente os realizados por documentaristas brasileiros. Desde o surgimento do que se convencionou chamar de Cinema da Retomada15 na historiografia do cinema nacional, nota-se não apenas o interesse pela produção de documentários musicais, mas a proximidade de muitos títulos com a música.

15 Cinema da retomada é o período do cinema brasileiro que congrega as produções realizadas a partir de 1995. Nagib (2002) reforça o filme Carlota Joaquina, princesa do Brazil, de Carla Camuratti, 2005 como marco desta fase que, com o apoio de políticas de fomento, viabiliza um recomeço da produção cinematográfica após um período de escassez de filmes decorrente da ditadura militar e do fechamento da

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1.4. O cenário econômico-político do filme documentário musical no Brasil

Não é propriamente uma novidade que o cinema documentário está em ascensão. Bill Nichols é bastante direto ao expor que “o debate sobre o documentário cresceu exponencialmente desde o início da década de 1990” (2005, p.220). Seu ponto de referência para esta afirmação é a quantidade de obras literárias recentes lançadas sobre o filme de não ficção. Consuelo Lins destaca que o fenômeno tem igualmente ecoado no Brasil, mas desta vez com aporte na realização fílmica: “a produção está em franco crescimento, alguns títulos chegam à tela grande, a atenção do público e da crítica é cada vez maior” (2011, p. 10). Mas, apesar do otimismo da autora ao citar que “o quadro é sem dúvida rico e promissor” (LINS, 2011, p. 10), faz-se necessária uma observação sobre o que realmente está acontecendo no mercado cinematográfico com o filme de longa-metragem do gênero documentário, especialmente atentando para os dados disponíveis.

É certo que a produção de filmes documentários brasileiros vem aumentando desde meados dos anos 90. Uma breve comparação dos dados da Ancine - Agência Nacional do Cinema16 - mostra este crescimento de produção no gênero não-ficcional entre os anos de 1995 e 2014 no País. Exemplo disso é o ano de 1995, quando dos dez filmes registrados como produção nacional, apenas três eram documentários. Este número cresceu e em 2009, dos 84 longas-metragens registrados pela Agência, 38 eram documentários. Em 2011, dos 99 filmes registrados, o número de documentários subiu para 40. Já em 2012 o número se manteve alto, com 36 documentários registrados. Para o ano de 2013 houve uma evolução em relação ao ano anterior com 50 documentários e no ano de 2014, com um total de 114 filmes lançados, 36 foram documentários. Os números referem-se à oferta de filmes, ou seja, essa evolução possibilita apenas uma análise quantitativa no mercado de filmes no Brasil.

Embrafilme. O termo Pós-Retomada é apontado por Oricchio (2003) para denominar as produções após o filme Cidade de Deus (2002).

16 Disponível em: <www.ancine.gov.br>. Acesso em: 10.01.2015. Os dados mercadológicos são disponibilizados pela Ancine no site do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual. Disponível em: http://oca.ancine.gov.br/anuario_estatistico.html . Acesso em: 10.01.2015.

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Gráfico 1 – Filmes lançados no Brasil de 1995 a 2014

Disponível em: <oca.ancine.org.br>. Acesso em 10.01.2013

Em sintonia com o que parece uma tendência que vem se acentuando na produção mundial, há também que se considerar que o É Tudo Verdade - Festival Internacional do Filme Documentário17 - constata igualmente um maior número de filmes inscritos. Lins (2009) compara o número de filmes brasileiros inscritos em 1996 neste Festival, que foi de 45, com os 400 inscritos em 2007. Em 2012, a 17a. edição do Festival contou com 80 títulos de 27 países e 25 lançamentos mundiais de filmes. Na Mostra Competitiva, sete filmes brasileiros participaram. Mas um olhar superficial a estes números pode indicar erroneamente que há um aquecimento do mercado de filmes não ficcionais, com mais público e, precipitadamente arriscar, que há mais espectadores interessados em filmes documentários nacionais, ou mais salas exibindo este gênero de filmes.

A informação oficial fornecida pelo órgão do governo registra um fato mercadológico interessante no que diz respeito à quantidade de produções documentais. No período de 1995 a 2011 foram lançados 797 filmes brasileiros, contabilizando os gêneros de animação, ficção, documentário e outros18. Destes, 255 são documentários,

17 É Tudo Verdade – Festival Internacional do Filme Documentário é um evento realizado no Brasil e é o maior festival do gênero na América Latina, e realizou em 2013 a sua 18a. edição. Disponível em: <www.itsalltrue.com.br/2013>. Acesso em 7.11.2013.

18 Para elaboração da Tabela 1 com os números referentes aos filmes entre 2005 e 2011, a Ancine informa que há apenas um filme na categoria “outros”, que é o filme Palavra (En)Cantada, de 2011. Disponível em: <www.ancine.gov.br>. Acesso em 20.10.2012. Esta categorização foi corrigida nas tabelas recentes da ANCINE e em 2014 o filme é indicado como documentário.

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contra 532 filmes de ficção e nove animações. Destes, 255 são documentários, contra 532 filmes de ficção e nove animações. Nota-se que a produção em geral, incluindo filmes de ficção e documentário, cresceu especialmente entre 2006 e 2011, atingiu uma média de 70 filmes por ano e revelou uma média de 81 filmes lançados anualmente só nestes seis anos (Tabela 1). Apesar do pico de filmes não ficcionais em 2001 e 2002, com oito e dez filmes respectivamente, é a partir de 2004 que a presença dos documentários afirma-se. Portanto, na produção recente, é visível o aumento de títulos do gênero documentário, embora o cenário, nos relatórios dos dados de bilheteria, público e salas de exibição, não pareça tão animador.

TABELA 1 – Filmes Brasileiros por Gênero registrados na ANCINE entre 1995 e 2011

Disponível em: <oca.ancine.org.br>. Acesso em 10.01.2013

A tabela 1 mostra que, em 2011, a produção de filmes de não ficção atingiu 40% do número total de longas-metragens lançados e registrados na ANCINE, um recorde para o período. Em 1995, quando começou a retomada da produção de filmes no país após período histórico que incluiu um governo ditatorial, procedimentos institucionalizados de censura e fechamento da Embrafilme, dos primeiros onze longas-metragens gerados na nova era dos mecanismos legais de incentivo, apenas três documentários foram lançados. Bananas is my Business de Helena Solberg, Yndio do Brasil de Silvio Back e Cinema de Lágrimas de Nelson Pereira dos Santos iniciaram uma perspectiva que, dezoito anos depois, estaria se configurando como uma séria opção para os realizadores.

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TABELA 2 – Filmes Brasileiros Documentários registrados na ANCINE em 1995

Filme de 1995 Bilheteria Público

Bananas is my Business 90.000 15.470

Yndio do Brasil 15.000 3.000

Cinema de lágrimas 7.500 1.575

Disponível em: <oca.ancine.gov.br>. Acesso em 10.01.2013

Na tabela 2 é possível identificar os dados referentes aos filmes documentários de 1995. Bananas is my business, documentário sobre a carreira e a vida pessoal de Carmem Miranda, rendeu R$ 90.000,00 e teve público de 15.470 ingressos pagos. Cinema de lágrimas teve a menor bilheteria, com R$ 7.500,00 e foi assistido por 1575 pessoas. Yndio do Brasil foi assistido por um público também pequeno, de 3.000 pessoas e sua bilheteria movimentou o valor de R$ 15.000. Mas o que interessa para estas anotações sobre o tema é que durante o período, os três filmes de ficção com melhor bilheteria do gênero ficção (ver tabela 3) demonstram o quanto é extrema a diferença entre público e renda entre ambos os gêneros.

TABELA 3 - Filmes Brasileiros de ficção com maior bilheteria registrados na Ancine em 1995

Filme de 1995 Salas Bilheteria Público

Carlota Joaquina, a princesa do Brasil 33 6.430.000,00 1.286.000

O quatrilho 64 4.513.302,00 1.117.154

Menino Maluquinho 31 1.532.509,00 397.023

Disponível em: <oca.ancine.gov.br>. Acesso em 10.01.2013

A tabela 3 revela que, ao comparar a inserção mercadológica dos documentários com as maiores bilheterias de ficção, já em 1995 as diferenças de circulação e consumo entre os gêneros começava a se consolidar. O filme de ficção com maior renda em vendas de ingresso, Carlota Joaquina, a princesa do Brasil, de Carla Camurati, arrecadou 71,4 vezes mais do que o documentário com maior público no mesmo ano. O público do terceiro colocado no ranking dos filmes bem sucedidos do gênero ficção, O Menino Maluquinho, de Helvécio Ratton, teve público superior ao documentário mais bem sucedido em 25,6 vezes. Isto indica que, mesmo no início da

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fase documentada pela Ancine, o filme de ficção liderava a preferência do esquema mercadológico nacional.

A tabela 4 registra os dados oficiais sobre os filmes documentários com maior bilheteria e público em 2011. Percebe-se que, em 17 anos, houve um aumento de público e renda considerável. Em 2011 já se pode vislumbrar para o documentário mais visto um número de 74.857 espectadores, contra os 15.470 do documentário mais visto em 1995, num aumento de quase cinco vezes na quantidade de espectadores das telas para o gênero.

TABELA 4 – Ranking de filmes brasileiros documentários com maior bilheteria em 2011

Documentário Salas Bilheteria Público

Bahêa minha vida 15 597.579,00 74.857

Lixo extraordinário 29 389.896,09 49.581

Rock Brasília – Era de ouro 60 336.514,72 34.183

Quebrando o tabu 15 252.535,99 24.687

Mamonas para sempre 34 162.100,25 20.344

Filhos de João 21 152.736,40 19.421

As canções 10 142.198,12 13.281

Disponível em: <www.ancine.gov.br>. Acesso em 10.01.2013

No entanto, é a comparação da tabela 4 com a tabela 5 que realmente justifica este estudo comparado sobre a ascensão do cinema documentário no Brasil. É bastante singular que o documentário com maior bilheteria em 2011, Bahêa minha vida, de Marcio Cavalcante, tenha faturado R$ 597.579,00 e, mais ainda, que um documentário do subgênero musical tenha alcançado 60 salas de exibição como aconteceu com Rock Brasília – Era de Ouro, de Vladimir Carvalho. Comparando os dados das tabelas 4 e 5, fica evidente que o documentário ainda está muito longe de conseguir maior êxito em todo o seu ciclo industrial, o que compreende a exibição em grande número de salas, retorno de bilheteria que justifique minimamente o investimento na realização e quantidade de público similar ao filme de ficção nacional.

Com pouco mais de meio milhão de reais em bilheteria, o documentário mais visto em 2011 tem performance avançadíssima na comparação com os filmes do

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mesmo gênero em 1995. Em termos de retorno financeiro, porém, na comparação com o filme de ficção nacional que lidera o ranking do mesmo ano, Cilada.com, de José Alvarenga Jr., que rendeu R$ 28.293.851,66, o documentário conseguiu atingir apenas 2,11% deste valor de bilheteria.

TABELA 5 – Ranking de filmes brasileiros de ficção com maior bilheteria em 2011

Filme de Ficção Salas Bilheteria Público

Cilada.com 389 28.293.851,66 2.998.560

De pernas para o ar 346 27.528.799,59 3.095.894

Bruna Surfistinha 347 19.965.570,51 2.166.461

Assalto ao banco central 307 18.648.246,14 1.964.893

O Palhaço 267 13.314.064,40 1.388.202

O homem do futuro 291 11.551.776,00 1.215.600

Qualquer gato 206 10.719.147,00 1.190.855

Disponível em: <www.ancine.gov.br>. Acesso em 10.01.2013

A tabela 5 ilustra o quanto ainda se distanciam os filmes de ficção nacionais em suas condições de inserção mercadológica. A média entre o número de salas que exibiram os sete filmes de ficção com maior bilheteria em 2011 resulta em 307 salas para cada filme. Da mesma forma, na média, os sete filmes documentários com maior bilheteria em 2011 (tabela 4) foram exibidos em apenas 26 salas cada um. Numa diferença bem marcada para os sete filmes do topo do ranking de ambos os gêneros, pode-se notar que o filme de ficção leva uma vantagem visível, estimada em 91,54% no mercado exibidor reservado ao filme nacional.

As estatísticas preliminares presentes neste estudo indicam a urgência em observar mais atentamente os dados sobre o cinema brasileiro recente para evitar generalizações sobre a ascensão do cinema documentário. É indispensável observar que, mesmo dominando 40% dos títulos nacionais lançados em 2011, o documentário ainda tem um público muito pequeno, e é exibido em pouquíssimas salas, se comparado ao cinema de ficção. Pela observação dos valores que movimentam o mercado exibidor, mal conseguem arrecadar o valor que foi investido em sua realização. Ou seja, mesmo em 2011, os documentários brasileiros dificilmente se pagaram com o retorno da exibição

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em salas comerciais. Ao mesmo tempo, é preciso lembrar que o cinema nacional não domina as salas de cinema no Brasil, que em 2011 eram apenas 2.352, especialmente concentradas na região sudeste, e que o cinema brasileiro, somando-se as produções de ficção e documentário, não chega a programar nem 10% do circuito exibidor, que praticamente é dominado pelos filmes distribuídos pelas majors internacionais (ANCINE, 2012).

Mesmo com todas as dificuldades da ordem da economia política, um fenômeno sem precedentes ocorre na produção brasileira de filmes documentários musicais. A partir do ano 2000, tem sido realizada uma grande quantidade de filmes em torno do tema musical, fato responsável pela configuração de um cenário que consolida um subgênero. O documentário musical aparece neste trabalho caracterizado por tematizar a música brasileira - na sua maioria a música popular, mas igualmente outros estilos que vão do funk ao pop rock estão presentes. A pesquisa considera os documentários musicais brasileiros recentes, mas também a sua incidência histórica no cinema nacional.

Sobre shows, a Ancine considera o filme Palavra (en)cantada, que é um show, como uma quarta categoria de filmes além do documentário, ficção e animação. As normativas da agência tem sido cada vez mais objetivas ao identificar filmes publicitários, tendendo a considerar cada vez mais categoricamente a divisão de gêneros entre filmes ficcionais e não publicitários, em lugar de utilizar a terminologia não ficcional. Para efeito desta pesquisa, o show filmado também não foi considerado documentário, por ser considerado um mero registro de uma performance. Ao contrário, quando um filme possui elementos que permitem sua argumentação por meio de dados, qualificadores de dados, garantias e apoios e consequente identificação de intenção assertiva, como é o caso do filme Certas palavras com Chico Buarque (1980), do diretor Maurício Beru, que intercala as cenas de show com depoimentos, é categorizado como documentário.

Referências

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