A Personagem
A Personagem
de Ficção
de Ficção
Antonio Candido, Anatol Rosenfeld,
Antonio Candido, Anatol Rosenfeld,
Decio de Almeida Prado e Paulo Emílio S
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A Personagem de Ficção
A Personagem de Ficção
Debates Debates por ! Guinsburg por ! GuinsburgConsel"o Editorial# Anatol Rosenfeld, Anita Consel"o Editorial# Anatol Rosenfeld, Anita
$o%ins&', Arac' Amaral, (ons Sc"naiderman, Celso $o%ins&', Arac' Amaral, (ons Sc"naiderman, Celso
)afer, Gita *! G"in+berg,
)afer, Gita *! G"in+berg, aroldo de Campos, Rosaaroldo de Campos, Rosa *raus+, S-bato .agaldi, /ulmira Ribeiro
*raus+, S-bato .agaldi, /ulmira Ribeiro 0a%ares!0a%ares! Antonio Candido Anatol Rosenfeld
Antonio Candido Anatol Rosenfeld
Decio de Almeida Prado Paulo Emílio Sales Gomes Decio de Almeida Prado Paulo Emílio Sales Gomes
A Personagem de Ficção A Personagem de Ficção
2
2 aaedição edição
E1uipe de reali+ação# Geraldo Gerson de Sou+a, re%isão2 .o's3s E1uipe de reali+ação# Geraldo Gerson de Sou+a, re%isão2 .o's3s
(aumstein, capa e trabal"os t3cnicos! (aumstein, capa e trabal"os t3cnicos!
Editora Perspecti%a Editora Perspecti%a São Paulo São Paulo 4 4 1 1
Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source co a i!te!"#o de Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source co a i!te!"#o de facilitar o acesso ao co!$ecie!to a que !#o pode pagar e tab% proporcio!ar aos Deficie!tes facilitar o acesso ao co!$ecie!to a que !#o pode pagar e tab% proporcio!ar aos Deficie!tes &isuais a oportu!idade de
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A Personagem de Ficção
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PREFÁCIO
PREFÁCIO
5pag! 67 5pag! 67
8 li%ro seguinte reprodu+, com o
8 li%ro seguinte reprodu+, com o mesmo título, o (oletim n!9 :;<mesmo título, o (oletim n!9 :;< da Faculdade de Filosofia, Ci=ncias e )etras da! >ni%ersidade de São da Faculdade de Filosofia, Ci=ncias e )etras da! >ni%ersidade de São Paulo, publicado em
Paulo, publicado em 4?@<! $asc4?@<! $ascido de uma eido de uma eperi=ncia de eperi=ncia de ensino, Bulgonsino, Bulgo oportuno reprodu+ir a parte d
oportuno reprodu+ir a parte do Pref-cio 1ue eplica%a a so Pref-cio 1ue eplica%a a sua elaboração!ua elaboração!
sstte e ((oolleettiim m rreessuulltta a ddaas s aattii%%iiddaaddees s ddo o SSeemmiinn--rriioo nterdisciplinar, iniciati%a pela 1ual procuro dar aos cursos a
nterdisciplinar, iniciati%a pela 1ual procuro dar aos cursos a meu cargomeu cargo o car-ter de interrelação com outros pontos de %ista, indispens-%eis ao o car-ter de interrelação com outros pontos de %ista, indispens-%eis ao estudo da 0eoria )iter-ria! Esta mat3ria toca não apenas em outros estudo da 0eoria )iter-ria! Esta mat3ria toca não apenas em outros domín
domínios do sabeios do saber,comr,como a Filosofia e a )ingísto a Filosofia e a )ingística, mas ica, mas na realidna realidadeade %i%a das di%ersas artes! Daí se encontrarem nesta publicação, como se %i%a das di%ersas artes! Daí se encontrarem nesta publicação, como se encontraram nas ati%idades do Semin-rio, estudiosos da Filosofia, da encontraram nas ati%idades do Semin-rio, estudiosos da Filosofia, da )it
)iteraeraturtura, a, do do 0e0eatratro e o e do do CinCinemaema!!
8 curs
8 curso de 4?@o de 4?@4 para o <!9 ano %e4 para o <!9 ano %ersorsou u 00eoreoria e An-liia e An-lise dose do Ro
Romamancncee2 2 dedentntre re os os sseueus s tHtHpipicocos, s, fofoi i seseleleciciononadado o o o rerefefererentnte e II P
Perersosonanagegem m 5e5epplalananado do no no m=m=s s de de ababriril7, l7, papara ra os os trtrababal"al"os os dodo Se
Semimin-n-riorio! ! ElEles es se se esestetendndereram am de de ouoututubrbro o a a nono%e%embmbroro, , dedepopois is dede terminadas as aulas, constando de eposiçJes sKbre o problema geral terminadas as aulas, constando de eposiçJes sKbre o problema geral
Se quiser outros títulos !os procure $ttp())groups'google'co)group)&iciados*e*+ivros, ser- u prazer Se quiser outros títulos !os procure $ttp())groups'google'co)group)&iciados*e*+ivros, ser- u prazer receb./lo e !osso grupo'
da ficção pelo Professor Anatol Rosenfeld2 sKbre a personagem de teatro, pelo Professor D3cio de Almeida Prado2 sKbre a personagem de cinema, pelo Professor Paulo Emílio Sales Gomes! A seguir, %ieram outras ati%idades, como uma .esa Redonda, com participação dos alunos e dos 1uatro Ldocentes, para balanço e esclarecimento de problemas2 a proBeção do filme
La Dolce Vita
, de Federico Fellini, comentado peloProfessor Paulo Emilio Sales Gomes do Mngulo das t3cnicas de caracteri+ação psicolHgica2 a representação da peça
A Escada
, de orgeAndrade, seguida de debate sKbre a caracteri+ação c=nica, orientado pelo Professor D3cio de Almeida Prado, com a participação central do encenador, Fl-%io Rangel, e a colaboração da crítica de teatro (-rbara eliodora Carneiro de .endonça! Dessa maneira, procurouNse pKr os estudantes em contato com %-rias faces de um problema compleo, a fim de 1ue a teoria e a an-lise, do ponto de %ista liter-rio, ficassem o mais esclarecidas possí%el pela incid=ncia de outros focos!
$este (oletim, recol"emNse as aulas sKbre personagem do professor do curso e as contribuiçJes do Semin-rio, redigidas especialmente para o caso! Como se %er-, as eposiçJes críticas sKbre o problema no romance, no teatro e no cinema giram estruturalmente em tKrno da eposição b-sica sKbre o problema geral da ficção, embora cada autor ten"a escrito a sua contribuição independentemente e com tKda a liberdade!
$a presente edição, suprimiuNse a pe1uena bibliografia final, de inter=sse meramente indicati%o, e corrigiramNse alguns erros tipogr-ficos!
São Paulo, O4 de Baneiro de 4?@;
Literatura e Personagem
(Pag. 9)
Conceito de Literatura
Geralmente, 1uando nos referimos I literatura, pensamos no 1ue tradicionalmente se costuma c"amar belas letras ou beletrística! 0rataNse, e%identemente, sH de uma parcela da literatura! $a acepção lata, literatura 3 tudo o 1ue aparece fiado por meio de letras obras científicas, reportagens, notícias, tetos de Lpropaganda, li%ros did-ticos, receitas de co+in"a etc! Dentro d=ste %asto campo das letras, as
belas
letras representam um setor restrito! Seu traço distinti%o parece ser menos a bele+a das letras do 1ue seu car-ter fictício ou imagin-rio1. A delimitação do campo da beletrística pelo car-ter ficcional ou imagin-rio tem a %antagem de basearNse em momentos de lHgica liter-ria 1ue, na maioria dos casos, podem ser %erificados com certo rigor, sem 1ue seBa necess-rio recorrer a %alori+açJes est3ticas! Contudo o crit3rio do car-ter ficcional ou imagin-rio não satifa+ inteiramenente o propHsito de delimitar o campo da literatura no sentido restrito! A literatura de cordel tem car-ter ficcional, mas não se pode di+er o mesmo dosSermões
do Padre Qieira, nem dos escritos de Pascal, nem pro%I%elmente dos di-rios de Gide ou *af&a! Ser- ficção o poema did-ticoDe rerum natura
, de )ucr3cio $o entanto, nen"um1
O significado dêste têrmo, no sentido usado neste trabalho, se esclarecerá mais adiante, sem que haja qualquer pretensão de uma abordagem ampla e profunda dêste conceito tradicional, desde a antiguidade objeto de muitas discussões. Contribuições recentes para a sua análise encontramse nas obras de !.". #artre, L’Imaginatione L’Imaginaire , $oman %ngsrden, Das literarische Kunstwerk (A obra-de-arte literária) eUntersuchungen zur Ontol,ogle der Kunst (Investigações acêrca da ontologia da arte) &. 'ufreune, Phénoménologje de l’exérlence esthéti!ue ( t)das baseadas nos m*todos de +. usseri.
"istoriador da literatura "esitar- em eliminar das suas obras os romances tri%iais de baio entretenimento e em nelas acol"er os escritos mencionados! Parece portanto impossí%el renunciar por inteiro a crit3rios de %alori+ação, principalmente est3tica, 1ue como tais não atingem obBeti%idade científica embora se possa ao menos postular certo consenso uni%ersal!
A Estrutura da Obra Literária
A estrutura de um teto 1ual1uer, ficcional ou não, de %alor est3tico ou não, compJeNse de uma s3rie de planos, dos 1uais o nico real, sensi%elmente dado, 3 o dos sinais tipogr-ficos impressos no papel! .as =ste plano, embora essencial I fiação da obra liter-ria, não tem função específica na sua constituição, a não ser 1ue se trate de um teto concretista! $o neo d=ste trabal"o, =ste plano de%e ser pKsto de lado, assim como tKdas as consideraçJes sKbre tend=ncias liter-rias recentíssimas, cuBa conceituação ainda se encontra em plena elaboração!
Como camadas B- irreais por não terem autonomia Kntica, necessitando da ati%idade concreti+adora e atuali+adora do apreciador ade1uado encontramos as seguintes# a dos fonemas e das configuraçJes sonoras 5oraçJes7, percebidas apenas pelo ou%inte interior, 1uando se l= o teto, mas diretamente dadas 1uando o teto 3 recitado2 a das unidades significati%as de %-rios graus, constituídas pelas oraçJes2 graças a estas unidades, são 5proBetadas atra%3s de determinadas operaçJes lHgicas, contetos obBectuais
(Sachverhalte)
, isto 3, certas relaçJes atribuídasaos obBetos e suas 1ualidades 5a rosa 3 %ermel"a2 da flor emana um perfume2 a roda gira7! stes contetos obBectuais determinam as obBectualidades, por eemplo, as teses de uma obra científica ou o mundo imagin-rio de um poema ou romance!
certos aspectos es1uemati+ados 1ue, 1uando especialmente preparados, determinam concreti+açJes especificas do leitor! Tuando %emos uma bola de bil"ar desli+ando sKbre o pano %erde, %i%enciamos um fluo continuo de aspectos %ari-%eis de um disco eliptHide, de uma cKr clara etremamente mati+ada2 atra%3s d=sses aspectos %ari-%eis 3N nos dada e se mant3m inalterada a percepção da esfera branca da bola! Em geral, os tetos apresentamNnos tais aspectos mediante os 1uais se constitui o obBeto! Contudo, a preparação especial de selecionados aspectos es1uem-ticos 3 de importMncia fundamental na obra ficcional particularmente 1uando de certo ní%el est3tico B-1ue desta forma 3 solicitada a imaginação concreti+adora do apreciador! 0ais aspectos es1uem-ticos, ligados I seleção cuidadosa e precisa da pala%ra certa com suas conotaçJes peculiares, podem referirNse I apar=ncia física ou aos processos psí1uicos de um obBeto ou personagem 5ou de ambientes ou pessoas "istHricas etc!7, podem salientar momentos %isuais, t-teis, auditi%os etc!
Em poemas ou romances tradicionais, a preparação especial dos aspectos 3 bem mais discursi%a do 1ue, por eemplo, em certos poemas elípticos de E+ra Pound ou do ltimo (rec"t, em 1ue a Bustaposição ou montagem de pala%ras ou oraçJes, sem neo lHgico, de%e, como num ideograma, resultar na síntese intuiti%a de uma imagem, graças I participação intensa do leitor no prHprio processo da criação 5a teoria da montagem fílmica de Eisenstein baseiaNse nos mesmos princípios7! $um 1uadro figurati%o "- sH
um
aspecto para mediar os obBetos, mas =ste 3 de uma concreção sensí%el nunca alcançada numa obra liter-ria! Esta, em compensação, apresenta grande nmero de aspectos, embora etremamente es1uem-ticos! 8 cinema e o teatro apresentam muitos aspectos concretos, mas não podem, como a obra liter-ria, apresentar diretamente aspectos psí1uicos, sem recurso I mediação física do corpo, da fisionomia ou da %o+!Us camadas mencionadas de%em ser acrescentadas, numa obra ficcional de ele%ado %alor, %-rias outras as dos significados espirituais mais profundos 1ue transparecem atra%3s dos planos
anteriores, principalmente o das obBectualidades imagin-rias, constituídas, em ltima -n-lise, pelas oraçJes 2! Vste mundo fictício ou mim3tico 1ue fre1entemente reflete momentos selecionados e transfigurados da realidade empírica eterior I obra, tornaNse, portanto, representati%o para algo al3m d=le, principalmente al3m da realidade empírica, mas imanente I obra!
A Obra Literária iccional
47
O !roblema ontol"gico
: A %erificação do car-ter ficcional deum escrito independe de crit3rios de %alor! 0rataNse de problemas ontolHgicos, lHgicos e epistemolHgicos!
Como foi eposto antes uma das funçJes essenciais da oração 3 a de proBetar, como correlato,um conteto obBectual 1ue 3 transcendente ao mero contedo significati%o, embora ten"a n=le seu fundamento Kntico! Assim, a oração .-rio esta%a de piBama proBeta um correlato obBectual 1ue constitui certo ser fora da oração! .as o .-rio assim proBetado de%e ser rigorosamente distinguido de certo .-rio real, possi%elmente %isado pela oração! Como tal, o correlato da oração pode referirNse tanto a um rapa+ 1ue eiste independentemente da oração, numa esfera Kntica autKnoma 5no caso, a da realidade7, como permanecer sem refer=ncia a nen"um mKço real! 0odo teto, artístico ou não, ficcional ou não, proBeta tais contetos obBectuais puramente intencionais 1ue podem referirNse ou não a obBetos Knticamente autKnomos!
maginemos 1ue eu esteBa %endo diante de mim o .-rio real2 3 e%idente 1ue na min"a consci=ncia "- sH uma imagem d=le, ali-s não notada por mim, B- 1ue me refiro diretamente ao .-rio real! Posso c"amar =ste obBeto o .-rio real de tamb3m intencional, %isto o mesmo eistir não por graça do meu ato, mas ter plena autonomia, mesmo 1uando %isado por mim num ato intencional, como agora! 0oda%ia, a imagem d=le, a 1ual o representa na min"a consci=ncia 5embora não a note7, 3 puramente intencional, %isto não possuir autonomia Kntica e eistir
por graça do meu ato! Posso reprodu+iNla at3 certo ponto na min"a mente, mesmo sem %er o rapa+ autKnomo2 posso tamb3m transform-Nla merc= de certas operaçJes espontMneas! V Hb%io 1ue as oraçJes sH podem proBetar tais correlatos puramente intencionais, B- 1ue não l"es 3 dado tampouco como I min"a consci=ncia encerrar os obBetos tamb3m intencionais!
Ainda assim, as obBectualidades puramente intencionais proBetadas por interm3dio de oraçJes t=m certa tend=ncia a se constituírem como realidade! Se a oração .-rio esta%a de piBama apresenta o mKço pela primeira %e+, =ste tornaNse portador do traBe a ele atribuído2 portador graças I função específica de suBeito da oração2 e portador de algo, em
%irtude da função significati%a da cHpula! 8 pret3rito, apesar de em certos casos ter o cun"o fictício do era uma %e+, tem em geral mais fKrça reali+adora e indi%iduali+adora do 1ue a %o+ do presente 58
elefante
!esa
no mínimo uma tonelada pode ser o enunciado de um+oHlogo sKbre os elefantes em geral2 mas o elefante
!esava
no mínimo uma tonelada refereNse a um elefante indi%idual, eistente em determinado momento7! De 1ual1uer modo, a oração proBeta o obBeto .-rio como um ser independente! Com efeito, ela sugere 1ue .-rio B- eistia e B- esta%a de piBama antes de a oração assinalar =ste fato! Ao seguir a prHima oração# le batia uma carta na m-1uina de escre%er, .-rio B- se emancipou de tal modo das oraçJes,! 1ue os contetos obBectuais, embora esteBam pouco a pouco constituindo eprodu+indo o mKço, parecem ao contr-rio apenas
revelar
pormenoresde um ser autKnomo! E isso ao ponto de o mundo obBectual assim constituído pelas oraçJes 5mas 1ue se insinua como independente, apenas
descrito
pelas oraçJes7 se apresentar como um contínuo, apesar de as oraçJes serem naturalmente descontínuas como os fotogramas de uma fita de cinema! U base das oraçJes, o leitor atribui a .-rio uma %ida anterior I sua criação pelas oraçJes2 coloca a m-1uina sKbre uma mesa 5não mencionada7 e o rapa+ sKbre uma cadeira2 o conBunto num 1uarto, =ste numa casa, esta numa cidade embora nada disso ten"a sido mencionado!>ma das diferenças entre o teto ficcional e outros tetos reside no fato de, no primeiro, as oraçJes proBetarem contetos obBectuais e, atra%3s d=stes, s=res e mundos puramente intencionais, 1ue não se referem, a não ser de modo indireto, a s=res tamb3m intencionais 5Knticamente autKnonios7, ou seBa, a obBetos determinados 1ue independem do teto! $a obra de ficção, o raio da intenção det3mNse nestes s=res puramente intenciJnais, sImente se teferindo de um modo indireto e isso nem em todos os casos a 1ual1uer tipo de realidade etraliter-ria! - nas oraçJes de outros escritos, por eemplo, de um "istoriador, 1uímico, repHrter etc!, as obBectualidades puramente intencionais não costumam ter por si sH nen"um 5ou pouco7 p=so ou densidade, uma %e+ 1ue, na sua abstração ou es1uemati+ação maior ou menor, não tendem a conter em geral es1uemas especialmente preparados de aspectos 1ue solicitam o preenc"imento concreti+ador! 8 raio de intenção passa atra%3s delas diretamente aos obBetos tamb3m intencionais, I semel"ança do 1ue se %erifica no caso de eu %er diante de mim o mKço acima citado, 1uando nem se1uer noto a presença de uma imagem interposta!
- um processo semel"ante no caso de um Bornal cinematogr-fico ou de uma foto de identificação! 0rataNse de imagens puramente intencionais 1ue, no entanto, procuram omitirNse para fran1uear a %isão da prHpria realidade! - num retrato artístico a imagem puramente intencional ad1uire %alor prHprio, certa densidade 1ue fIcilmente ofusca a pessoa retratada! Ali-s, mesmo diante de um fotHgrafo despretensioso a pessoa tende a comporNse, tomar uma pose, tornarNse personagem2 de certa forma passa a ser cHpia antecipada da sua prHpria cHpia! C"ega a fingir a alegria 1ue de%eras sente! :7
O !roblema l"gico
. 8s enunciados de uma obra científica e, namaioria dos casos, de notícias, reportagens, cartas, di-rios etc!, constituem Buí+os, isto 3, as obBectualidades puramente intencionais
!retendem
corresponder, ade1uarNse eatamente aos s=res reais 5ou ideais, 1uando se trata de obBetos matem-ticos, %alores, ess=ncias, leis etc!7 referidos! FalaNse então deade#uatio orationis ad rem
.-nestes enunciados a intenção s3ria de %erdade! Precisamente por isso podeNse falar, nestes casos, de enunciados errados ou falsos e mesmo de mentira e fraude, 1uando se trata de uma notícia ou reportagem em 1ue se pressupJe intenção s3ria!
8 t=rmo %erdade, 1uando usado com refer=ncia a obras de arte ou de ficção, tem significado di%erso! Designa com fre1=ncia 1ual1uer coisa como a genuinidade, sinceridade ou autenticidade 5t=rmos 1ue em geral %isam I atitude subBeti%a do autor72 ou a %erossimil"ança, isto 3, na epressão de AristHteles, não a ade1uação I1uilo 1ue aconteceu, mas I1uilo 1ue poderia ter acontecido2 ou a coer=ncia interna no 1ue tange ao mundo imagin-rio das personagens e situaçJes mim3ticas2 ou mesmo a %isão profunda de ordem filosHfica, psicolHgica ou sociolHgica da realidade!
At3 neste ltimo caso, por3m, não se pode falar de Buí+os no sentido preciso! Seria incorreto aplicar aos enunciados fictícios crit3rios de %eracidade cognosciti%a! Sentimos 1ue a obra de *af&a nos apresenta certa %isão profunda da realidade "umana, sem 1ue, contudo, seBa possí%el %erificar a maioria dos enunciados indi%iduais ou todos =les em conBunto, 1uer em t=rmos empíricos, 1uer puramente lHgicos! $a obra de *nut amsun "- uma %isão profunda inteiramente di%ersa da realidade, mas seria impossí%el c"amar a maioria dos enunciados ou o conBunto d=les de falsos! Tuando c"amamos falsos um romance tri%ial ou uma fita medíocre, fa+emoNlo, por eemplo, por1ue percebemos 1ue n=les se aplicam padrJes do conto de caroc"in"a a situaçJes 1ue pretendem representar a realidade cotidiana! 8s mesmos padrJes 1ue funcionam muito bem no mundo m-gicoNdemoníaco do conto de fadas re%elamNse falsos e caricatos 1uando aplicados I representação do uni%erso profano da nossa sociedade atual 5a não ser 1ue esta prHpria aplicação se torne tem-tica7! Falso seria tamb3m um pr3dio com portal e -trio de m-rmore 1ue encobrissem apartamentos miser-%eis! V esta incoer=ncia 1ue 3 falsa! .as ningu3m pensaria em c"amar de falso um aut=ntico conto de
fadas, apesar de o seu mundo imagin-rio corresponder muito menos I realidade empírica do 1ue o de 1ual1uer romance de entretenimento! Ainda assim a estrutura das oraçJes ficcionais parece ser em geral a mesma da1uela de outros tetos! Parece tratarNse de Buí+os! 8 1ue os diferencia dos %erdadeiros 3 a intenção di%ersa isto 3, a intenção 1ue se d3t3m nas obBectualidades puramente intencionais 5e nos significados mais profundos por elas sugeridos7, sem atra%ess-Nlas, diretamente, em direção a 1uais1uer obBetos autKnomos, como ocorre, no nosso eemplo, na %isão do mKço real! V essa intenção di%ersa não necessIriamente %isí%el na estrutura dos enunciados 1ue transforma as oraçJes de uma obra ficcional em 1uaseNBuí+os3! A sua intenção não 3 s3ria4!
8 autor con%ida o leitor a deter o raio de intenção na
imagem
de .-rio, sem buscar correspond=ncias eatas com 1ual1uer pessoa real d=ste mesmo nome5!0oda%ia, os tetos ficcionais, apesar de seus enunciados costumarem ostentar o "-bito eterior de Buí+os, re%elam nitidamente a intenção ficcional, mesmo 1uando esta intenção não 3 obBeti%ada na capa do li%ro, atra%3s da indicação romance, no%ela etc! Ainda 1ue a obra não se distinga pela energia epressi%a da linguagem ou por 1ual1uer %alor específico, notarNseN- o esfKrço de particulari+ar, concreti+ar e indi%iduali+ar os contetos obBectuais, mediante a preparação de aspectos es1uemati+ados e uma multiplicidade de pormenores circunstanciais, 1ue %isam a dar apar=ncia real I situação imagin-ria! V paradoalmente esta intensa apar=ncia de realidade 1ue re%ela a intenção ficcional ou mim3tica! Graças ao %igor dos detal"es, I %eracidade de dados insignificantes, I coer=ncia interna, I lHgica das moti%açJes, I causalidade dos e%entos etc!,
3. A epressão 3 usada por Roman ngarden em Das literarische
$unst%er& . !NP! Sartre, em L'magination , formula# l ' a l- un t'pe dWaffirmation, un t'pe dWeistence interm3diaire entre les assertions fausses du r=%e et les certitudes de la %eille# et ce t'pe dWeistence est 3%idemment celui des cr3ations imaginaires!
Faire de cellesNci des actes Budicatifs, cWest leur donner trop 5p!4OX7!
4 Tuando da publicação de seus *uddenbroo&s+ 0"! .ann foi %iolentamente atacado de%ido ao retratamenso de pessoas e aspectos da cidade de )bec&! 0ais incidentes são fre1entes na "istHria da literatura! $um ensaio sKbre o caso 5(ilse und ic"7, 0"! .ann declarou# Tuando faço de uma coisa uma oração 1ue tem 1ue %er esta coisa com a oração 8 fato 3 1ue mesmo uma cidade realmente eistente tornaNse ficção no conteto fictício, B- 1ue representa determinado papel no mundo imagin-rio! sso se refere tamb3m Is imagens de filmes tomadas no ambiente real correspondente ao enr=do# o ambiente, embora em si real, situaNse agora num espaço fictício e tornaNse igualmente fictício! >m enunciado como dois e dois são 1uatro 3 sempre %erídico2 mas 1uando preferido por uma personagem, com intenção s3ria, esta intenção s3ria 3, por sua %e+, fictícia2 e 1uando ocorre na prHpria narração, a intenção fictícia
transforma o enunciado em 1uaseNBuí+o, embora em si certo! Tuando, em , Li-.o ,de
onesco, o professor e a aluna se debatem com multiplicaçJes astronKmicas, ningu3m pensaria em %erificar os resultados! A função dos Buí+os aritm3ticos, no conteto fictício, não 3 esta!
/ A consci=ncia do car-ter ficcional não tem sido sempre nítida! Yolfgang
*a'ser (em: Die 0ahrheit der Dlchter — A verdade dos Poetas) demonstra 1ue no
s3culo ZQ os leitores de romance não tin"am a noção nítida de 1ue os enunciados respecti%os eram fictícios!
tende a constituirNse a %erossimil"ança do mundo imagin-rio! .esmo sem alguns d=stes elementos o teto pode alcançar taman"a fKrça de con%icção 1ue at3 estHrias fant-sticas se impJem como 1uaseN reais! 0oda%ia, a apar=ncia da realidade não renega o seu car-ter de apar=ncia! $ão se produ+ir-, na %erdadeira ficção, a decepção da mentira ou da fraude! 0rataNse de um %erdadeiro ser aparencial 5ulian .atias7, baseado na coni%=ncia entre autor e leitor! 8 leitor, parceiro da empr=sa ldica, entra no BKgo e participa da não Nseriedade dos 1uaseNBuí+os e do fa+er de conta!
>ma oração como esta# En1uanto fala%a, a mul"er+in"a deita%a sKbre o marec"al os grande ol"os 1ue despediam c"ispas! Floriano parecia incomodado com a1u=le c"ameBar2 era como se temesse derreterNse ao calor da1uele ol"ar! ! ! (Lima Barreto,
1riste im de Policar!o
2uaresma)
re%ela de imediato, apesar do conteto "istHrico, a intençãoficcional! 8 autor parece con%idar o leitor a permanecer na camada imagin-ria 1ue se sobrepJe e encobre a realidade "istHrica! O7
O !roblema e!istemol"gico (a !ersonagem)
V por3m a personagem 1ue com mais nitide+ torna patente a ficção, e atra%3s dela a camada imagin-ria se adensa e se cristali+a! sto 3 pouco e%idente na poesia lírica, em 1ue não parece "a%er personagem! 0oda%ia, epresso ou não, costuma manifestarNse no poema um Eu lírico 1ue não de%e ser confundido com o Eu empírico do autor! Sem d%ida, "ou%e no decurso da "istHria grandes %ariaçJes neste campo! $ão se de%em aplicar os mesmos padrJes e conceitos a poemas da Gr3cia antiga, a poemas romMnticos e a poemas atuais! Parece, contudo, 1ue se pode negar em geral a opinião de 1ue nas oraçJes de poemas líricos se trata de Buí+os, de enunciados eistenciais ac=rca de determinada realidade psí1uica do poeta ou 1ual1uer realidade eterior a =le! V precisamente no poema 1ue são mobili+adas tKdas as %irtualidades epressi%as da língua e toda a energia imaginati%a!$o caso de %ersos como =stes# A c"u%a de outono mol"a 8 p=so da min"a altura E tal rosa 1ue desfol"a 0en"o p3talas na figura 6
seria absurdo falar de Buí+os, mesmo subBeti%os, referentes, passo a passo, a estados psí1uicos reais da poetisa 7! V perfeitamente possí%el 1ue "aBa refer=ncia indireta a %i%=ncias reais2 estas, por3m, foram transfiguradas pela energia da imaginação e da linguagem po3tica 1ue %isam a uma epressão mais %erdadeira, mais definiti%a e mais absoluta do 1ue outros tetos!
8 poema não 3 uma foto e nem se1uer um retrato artístico de estados psí1uicos2 eprime uma %isão estili+ada, altamente simbHlica, de certas eperi=ncias!
lua se pKs e as Pl=iades, pelo meio
anda a noite, es%aiNse a Bu%entude, mas eu estou deitada, s[+in"a não se de%e confundir o Eu lírico dentro do poema com o Eu empírico fora d=le! ste ltimo se desdobra e obBeti%a, atra%3s das categorias est3ticas, constituindoNse na personagem uni%ersal da mul"er ansiosa por amor! At3 um poeta como Goet"e 1ue, na sua fase romMntica, considera%a a poesia a mais poderosa epressão da %erdade, como re%elação da intimidade, c"egou, B- aos %inte anos, I conclusão de Fernando Pessoa 5o poeta finge mesmo a dor 1ue de%eras sente7, por1ue o poema 3, antes de tudo, Gestalt, forma %i%a, bele+a! Qariando
concepçJes de Platão, declara 1ue a bele+a não 3 lu+ e não 3 noite2 3 creN
3 )upe Cotrlm Garaude, 4ai5 Comum
6 0al 3, contudo, a opinião de *aet"e amburger em Die Logi& der Dichrung 5A L"gica da ic-.o)7 segundo a autora, os enunciados de um poema lírico seriam Buí+os eistenciais, Buí+os subBeti%os, mas Buí+os!
psculo2 3 resultado da %erdade e nãoN%erdade! Coisa intermedi-ria! São 1uase os t=rmos com 1ue Sartre descre%e a ficção! Contudo, a personagem do poema lírico não se define nitidamente! Antes de tudo pelo fato de o Eu lírico manifestarNse apenas no monHlogo, fundido com o mundo 5A c"u%a de outono mol"a \ 8 p=so da min"a altura7, de modo 1ue não ad1uire contornos marcantes2 depois, por1ue eprime em geral apenas estados en1uanto a personagem se define com nitide+ sJmente na distensão temporal do e%ento ou da ação!
Como indicadora mais manifesta da ficção 3 por isso bem mais marcante a função da personagem na literatura narrati%a 53pica7! -numerosos romances 1ue se iniciam com a descrição de um ambiente ou paisagem! Como tal poderiam possi%elmente constar de uma carta, um di-rio, uma obra "istHrica! V geralmente com o surgir de um ser "umano 1ue se declara o car-ter fictício 5ou nãoNfictício7 do teto, por
acr3scimo de 1ual1uer detal"e pode re%elar a elaboração imagin-ria! $o nosso eemplo de .-rio seria possí%el 1ue as oraçJes .-rio esta%a de piBama! ele batia uma carta na m-1uina de escre%er constassem de um relato policial 1ue prosseguisse assim# ! ! ! 1uando entrou o ladrão! ! ! Se o teto, por3m, prosseguir assim# Sem d%ida ainda iria alcanç-Nla! Afinal, )cia decerto não podia partir depoisNdeNaman"ã, sabemos 1ue se trata de ficção! $otamos, tal%e+ sem recon"ecer as causas, 1ue .-rio não 3 urna pessoa e sim uma personagem! Certas pala%ras sem importMncia aparente nos colocam dentro da consci=ncia de .-rio, fa+emNnos participar de sua intimidade# sem d%ida, afinal, decerto, depoisNdeNaman"ã! 0ais pala%ras indicam 1ue se %erificou uma esp3cie de identificação com .-rio, de modo 1ue o leitor 3 le%ado, sutilmente, a %i%er a eperi=ncia d=le! .ais e%identes seriam %erbos definidores de processos psí1uicos, como pensa%a, Ldu%ida%a, recea%a, os 1uais, 1uando referidos I eperi=ncia temporalmente determinada de uma pessoa, não podem, por ra+Jes epistemolHgicas, surgir num escrito "istHrico ou psicolHgico! $uma obra "istHrica pode constar 1ue $apoleão acredita%a poder con1uistar a Rssia2 mas não 1ue,
na#uele momento
, cogita%a desta possibilidade! SH com o surgirda personagem tornamNse possí%eis oraçJes categorialmente di%ersas de 1ual1uer enunciado em situaçJes reais ou em tetos nãoNfictícios# (em cedo ela começa%a a enfeitar a -r%ore! Aman"ã era $atal 5Alice (erend,
Os 8oivos de *abette *omberling
); !!! and of course "e ]as coming to"er part' toNnig"t 5Qirgínia Yoolf,
9rs Dallo%cr:
); A re%olta %eioacabar daí a dias 5)ima (arreto,
1riste im de Policar!o 2uaresma
);Daí a pouco %ieram c"egando da direita muitas caleças! ! ! 5.ac"ado de Assis,
2uincas *arba
).V altamente impro%-%el 1ue um "istoriador recorra Bamais a tais oraçJes! Ad%3rbios de tempo 5e em menor grau de lugar7 como aman"ã, "oBe, ontem, daí a pouco, daí a dias, La1ui, ali, t=m sentido s[mente a partir do ponto +ero do sistema de coordenadas esp-cioNtemporal de 1uem est- falando ou pensando! Se surgem num escrito, são possí%eis s[mente a partir do narrador fictício, ou do foco
narrati%o colocado dentro da personagem, ou onisciente, ou de algum modo identificado com ela! 8 aman"ã do primeiro eemplo citado pJe o foco dentro da personagem, cuBo pensamento 3 epresso atra%3s do estilo indireto li%re#
no caso, os pensamentos são reprodu+idos a partir da perspecti%a da prHpria personagem, mas a manutenção da terceira pessoa e do imperfeito finge o relato impessoal do narrador! Seriam possí%eis outros recursos#
Ela pensa%a# Aman"ã
será
$atal2 Ela pensa%a 1ue no dia seguinteseria
$atal2 mas nen"um como o indicado 5ali-s B- usado na literatura latina, na literatura francesa desde o s3culo Z e com bem mais fre1=ncia no romance do s3culo ZZ, desde ane Austen e Flaubert7 re%ela o car-ter categorialmente singular do discurso fictício! Em nen"uma situação real o aman"ã poderia ser ligado ao era2 e o "istoriador teria de di+er no dia seguinte B- 1ue não pode identificarNse com a perspecti%a de uma pessoa, sob pena de transform-Nla em personagem!Embora tais formas não surBam nem na poesia lírica, nem na dramaturgia, e não necessIriamente na literatura narrati%a, o fenKmeno como tal 3 etremamente re%elador para todos os tipos de ficção, B- 1ue a an-lise d=ste sintoma da ficção indica, ao 1ue parece, estruturas inerentes a todos os tetos fictícios, mesmo nos casos em 1ue o sintoma não se manifesta! 8 sintoma lingístico e%identemente sH pode surgir no g=nero 3pico 5narrati%o7, por1ue 3 n=le 1ue o narrador em geral finge distinguirNse das personagens, ao passo 1ue no g=nero lírico e dram-tico, ou est- identificado com o Eu do monHlogo ou, aparentemente, ausente do mundo dram-tico das personagens! Assim, sImente no! g=nero narrati%o podem surgir formas de discurso ambíguas, proBetadas ao mesmo tempo de duas perspecti%as# a da personagem e a do narrador fictício! .as a estrutura b-sica do discurso fictício parece ser a mesma tamb3m nos outros g=neros! 8 sintoma lingístico, Hb%io nos eemplos apresentados, re%ela, precisamente atra%3s da personagem, 1ue o narrar 3pico 3
estruturalmente de outra ordem 1ue o enunciar do "istoriador, do correspondente de um Bornal ou de outros autores de enunciados reais! A diferença fundamental 3 1ue o "istoriador se situa, como enunciador real das oraçJes, no ponto +ero do sistema de coordenadas esp-cioN temporal, por eemplo, no ano de 4?@O 5e na cidade de São Paulo7, proBetando a partir d=ste ponto +ero, atra%3s do pret3rito plenamente real, o mundo do passado "istHrico igualmente real de 1ue =le, naturalmente, não fa+ parte! Ao suBeito real 5empírico7 dos enunciados corresponde a realidade dos obBetos proBetados pelos enunciados 5e sH neste conteto 3 possí%el falar de mentira, fraude, =rro etc!7! $a ficção narrati%a desaparece o enunciador real! ConstituiNse um narrador fictício 1ue passa a fa+er parte do mundo narrado, identificandoNse por %=+es 5ou sempre7 com uma ou outra das personagens, ou tornandoNse onisciente etc! $otaNse tamb3m 1ue o pret3rito perde a sua função real 5"istHrica7 de pret3rito, B- 1ue o leitor, Bunto com o narrador fictício, presencia os e%entos! 8 pret3rito 3 mantido com a função do era uma %e+, mero substrato fictício da narração, o 1ual, contudo, preser%a a sua função de posição eistencial, de grande %igor indi%iduali+ador, e continua fingindo a distMncia 3pica de 1uem narra coisas "- muito acontecidas! A modificação do discurso indica 1ue na ficção 5e isso se refere tamb3m I poesia e dramaturgia7 não "- um narrador real em face de um campo de s=res autKnomos! ste campo eiste s[mente graças ao ato narrati%o 5ou ao enunciar lírico, dram-tico7! 8 narrador fictício não 3 suBeito real de oraçJes, como o "istoriador ou o 1uímico2 desdobraNse imaginIriamente e tornaNse manipulador da função narrati%a 5dram-tica, lírica7, como o pintor manipula o pincel e a cKr2 não narra de pessoas, e%entos ou estados2 narra pessoas 5personagens7, e%entos e estados! E isso 3 %erdade mesmo no caso de um romance "istHrico 8. As pessoas 5"istHricas7, ao se tornarem ponto +ero de orientação, ou ao serem focali+adas pelo narrador onisciente, passam a ser personagens2 deiam de ser obBetos e transformamNse em suBeitos, s=res 1ue sabem di+er eu!
8. aet!e "am#$r%er, &a o#ra 'itaa, e)t$a a%$ame&te o) *+rio) ro#-ema) e&*o-*io).
A rain"a se lembra%a neste momento das pala%ras 1ue dissera ao rei tal oração não pode ocorrer no, escrito de um "istoriador, B-1ue =ste, nos seus Buí+os, s[mente pode referirrNse a obBetos, apreendendoNos eclusi%amente de fora, mesmo nos casos da mais sutil compreensão psicolHgica, baseada em documentos e infer=ncias! S[mente o criador de $apoleão, isto 3, o romancista 1ue o narra, em %e+ de narrar d=le, l"e con"ece a intimidade de dentro!
A !ersonagem nos vários g;neros literários e no es!etáculo
teatral e cinematográ<ico
Em t=rmos lHgicos e ontolHgicos, a ficção defineNse nitidamente como tal, independentemente das personagens! 0oda%ia, o crit3rio re%elador mais Hb%io 3 o epistemolHgico, atra%3s da personagem, merc= da 1ual se patenteia Is %=+es mesmo por meio de um discurso especificamente fictício a estrutura peculiar da literatura imagin-ria! Ra+Jes mais intimamente poetolHgicas mostram 1ue a personagem realmente constitui a ficção!
A descrição de uma paisagem, de um animal ou de obBetos 1uais1uer pode resultar, tal%e+, em ecelente prosa de arte! .as esta ecel=ncia resulta em ficção s[mente 1uando a paisagem ou o animal 5como no poema A pantera, de Ril&e7 se Lanimam e se "umani+am atra%3s da imaginação pessoal! $o caso da poesia lírica, atra%3s da fusão do Eu, do foco lírico, com o obBeto! $o fundo, 3 isso 1ue )essing pretende di+er no seu Laocoonte ao criticar um poema descriti%o por l"e faltar o 1ue
c"ama segundo a terminologia do s3culo ZQ a ilusão
Lilusão s[mente 3 possí%el pela colocação do leitor dentro do mundo imagin-rio, merc= do foco personal 1ue de%e animar o poema e 1ue l"e d- o car-ter fictício! $o poema isto 3 conseguido, antes de tudo, atra%3s da fKrça epressi%a da linguagem, 1ue transforma a mera descrição em %i%=ncia duma personagem 1ue erradamente se costuma confundir com o autor empírico! .as, en1uanto a poesia, na sua forma mais pura, se at3m I %i%=ncia de um estado, o g=nero narrati%o 5e dram-tico7 transforma o estado em processo, em distensão temporal! S[mente assim se define a personagem com nitide+, na duração de estados sucessi%os! A narração mesmo a nãoNfictícia , para não se tornar em mera descrição ou em relato, eige, portanto, 1ue não "aBa aus=ncias demasiado prolongadas do elemento "umano 5=ste, naturalmente, pode ser substituído por outros s=res, 1uando antropomorfi+ados7 por1ue o "omem 3 o nico ente 1ue não se situa sKmente no tempo, mas 1ue 3 essencialmente tempo !
Se )essing recomenda, no ensaio acima citado, a dissolução da descrição em narração por1ue a pala%ra, recurso sucessi%o, não pode
apreender ade1uad Lamente a simultaneidade de um obBeto,
ambiente ou paisagem 51ue a nossa %isão apreende de um sH relance7, o 1ue no fundo eige 3 a presença de personagens 1ue atuam! omero, em %e+ de descre%er o traBe de Agamenon, narra como o rei se %este, e em %e+ de descre%er o seu cetro, narraNl"e a "istHria desde o momento em 1ue Qulcano o f=+! Assim, o leitor participa dos e%entos em %e+ de se perder numa descrição fria 1ue nunca l"e dar- a imagem da coisa! Antes de abordar, mesmo marginalmente, a ficção dram-tica, con%3m ressaltar 1ue %erbos como di+er, responder etc!, desempen"am na ficção em geral função semel"ante aos 1ue re%elam processos psí1uicos 5recear, pensar, du%idar7, particularmente 1uando
! PodeNse escre%er e B- se escre%eram contos sKbre baratas! .as "- de se tratar, ao menos, de uma baratin"a! 8 diminuti%o afetuoso desde logo "umani+a o bic"o! 8 mais terrí%el na 9etamor<ose de *af&a 3 a lenta desumani+ação do inseto! As f-bulas e os desen"os cinematogr-ficos baseiamNse nesta "umani+ação! 8
"omem, afinal, LsH pelo "omem se interessa e sH com ele pode identificarNse realmente!
acompan"am uma fala em %o+ direta, referida a momentos temporais determinados 5determinados no tempo irreal da ficção7! 0ais %erbos indicam em geral a presença do foco narrati%o no campo fictício! Ademais, personagens, ao falarem, re%elamNse de um modo mais completo do 1ue as pessoas reais, mesmo 1uando mentem ou procuram disfarçar a sua opinião %erdadeira! 8 prHprio disfarce costuma patentear o cun"o de disfarce! Esta fran1ue+a 1uase total da fala e essa transpar=ncia do prHprio disfarce 5penseNse no aparte teatral7 são índices e%identes da onisci=ncia ficcional!
A função narrati%a, 1ue no
te=to
dram-tico se mant3m "umildemente nas rubricas 53 nelas 1ue se locali+a o foco7, etingueNse totalmente no palco, o 1ual, com os atKres e cen-rios, inter%3m para assumiNla! Desaparece o suBeito fictício dos enunciados pelo menos na apar=ncia , %isto as prHprias personagens se manifestarem diretamente atra%3s do di-logo, de modo 1ue mesmo o mais ocasional disse =le, respondeu ela do narrador se torna sup3rfluo! Agora, por3m, estamos no domínio de uma outra arte! $ão são mais as pala%ras 1ue constituem as personagens e seu ambiente! São as personagens 5e o mundo fictício da cena7 1ue absor%eram as pala%ras do teto e passa a constituíNlas, tornandoNse a fonte delas eatamente como ocorre na realidade! Contudo, o mundo mediado no palco pelos atKres e cen-rios 3 de obBectualidade puramente intencionais! Estas não t=m refer=ncia eata a 1ual1uer realidade, determinada e ad1uirem taman"a densidade 1ue encobrem por inteiro a realidade "istHrica a 1ue, possi%elmente, di+em respeito! A ficção oumimesis
re%esteNse de tal fKrça 1ue se substi tu ou superpJe I realidade! V tal%e+ de%ido I %el"a teoria da ilusão da realidade supostamente criada pela cena, de%ido, portanto, ao altíssimo %igor da ficção c=nica, 1uen.o
se atribui ao teatro o 1ualificati%o de ficção!Contudo, o di-logo tem na dramaturgia a mesma função do aman"ã era $atal!CompJeNse, para o pblico, de 1uaseNBuí+os, embora os atKres se comportem como se se tratasse de Buí+os, B- 1ue as personagens le%am os enunciados a s3rio! Embora seBa apresentado ao pblico em forma semel"ante Is condiçJes reais, o di-logo 3 concebido
de dentro
das personagens, tornandoNas transparentes em alto grau! V %erdade 1ue, no teatro moderno, esta con%enção da fran1ue+a dialHgica ficou abalada ao ponto de se tornar tem-tica 50c"eco%, Pirandello, 0"!Yilder, onesco, (ec&ett etc!7! 0emos a1ui uma das ra+Jes para a mobili+ação de recursos 3picos, narrati%os! Tuando (rec"t pede ao ator 1uen.o
se identifi1ue com a personagem, para poder critic-Nla, pJe um foco narrati%o fora dela, representado pelo ator 1ue assume o papel de narrador fictício! sso indica claramente 1ue a identificação do ator com a personagem significa 1ue o foco se encontra dentro dela# a aparente aus=ncia do narrador fictício, no palco cl-ssico, eplicaNse pelo simples fato de 1ue ele se solidari+ou ou identificou totalmente com uma ou %-rias personagens, de tal modo 1ue B- não pode ser discernido como foco distinto! V por isso tamb3m 1ue, o palco d-ssico depende inteiramente do atorNpersonagem, por1ue não pode "a%er foco fora d=le! 8 prHprio cen-rio permanece papelão pintado at3 surgir o foco fictício da personagem 1ue, de imediato, proBeta em tKrno de si o espaço e tempo irreais e transforma, como por um golpe de magia, o papelão em paisagem, templo ou salão!$o 1ue se refere ao cinema, de%e ser concebido como de car-ter 3picoN dram-tico2 ao 1ue parece, mais 3pico do 1ue dram-tico! V %erdade 1ue o mundo das obBectualidades puramente intencionais se apresenta neste caso, I semel"ança do teatro, atra%3s de imagens, como espet-culo percebido 5espet-culo %isto e ou%ido2 na %erdade 1uaseN %isto e 1uaseNou%ido2 pois o mundo imagin-rio não 3 eatamente obBeto de percepção7! .as a cMmara, atra%3s de seu mo%imento, eerce no cinema uma função nitidamente narrati%a, ineistente no teatro! Focali+a, comenta, recorta, aproima, epJe, descre%e! 8
close u!
, oEm tKdas as artes liter-rias e nas 1ue eprimem, narram ou representam um estado ou estHria, a personagem realmente constitui a ficção! Contudo, no teatro a personagem não sH constitui a ficção mas funda, Knticamente, o prHprio espet-culo 5atra%3s do ator7! V 1ue o teatro 3 integralmente ficção, ao passo 1ue o cinema e a literatura podem ser%ir, atra%3s das imagens e pala%ras, a outros fins 5documento, ci=ncia, Bornal7! sso 3 possí%el por1ue no cinema e na literatura são as imagens e as pala%ras 1ue fundam as obBectualidades puramente intencionais, não as personagens! V precisamente por isso 1ue no prHprio cinema e literatura ficcionais as personagens, embora realmente constituam a ficção, e a e%idenciem de forma marcante, podem ser dispensadas por certo tempo, o 1ue não 3 possí%el no teatro! 8 palco não pode permanecer %a+io!
stes momentos realçam o cun"o narrati%o do cinema! A imagem 5como a pala%ra7 tem a possibili dad de descre%er e animar ambientes, paisagens, obBetos! Estes sem personagem podem mesmo representar fatKres de grande importMncia! A fita e o romance podem fa+er %i%er uma cidade como tal! Ademais, no teatro uma sH personagem presente no palco não pode manterNse calada2 tem de proferir um monHlogo!
>ma personagem muda não pode permanecer s[+in"a no palco! - no cinema ou romance, a personagem pode permanecer calada durante bastante tempo, por1ue as pala%ras ou imagens do narrador ou da cMmara narradora se encarregam de comunicarNnos os seus pensamentos, ou, simplesmente, os seus afa+eres, o seu passeio solit-rio etc! o "omem 3 centro do uni%erso! 8 uso de recursos 3picos o cKro, o palco simultMneo etc!, são recursos 3picos indica 1ue o "omem não se concebe em posição tão eclusi%a!
A !essoa e a !ersonagem
A diferença profunda entre a realidade e as obBectualidades puramente intencionais imagin-rias ou não, de um escrito, 1uadro, foto, apresentação teatral etc! reside no fato de 1ue as ltimas nunca alcançam a determinação completa da primeira! As pessoas reais, assim como todos os obBetos reais, são totalmente determinados apresentandoNse como unidades concretas, integradas de uma infinidade de predicados, dos 1uais s[mente alguns podem ser col"idos e retirados por meio de operaçJes cognosciti%as especiais! 0ais operaçJes são sempre finitas, não podendo por isso nunca esgotar
a multiplicidade infinita das determinaçJes do ser real, indi%idual, 1ue 3 inef-%el! sso se refere naturalmente em particular a s=res "umanos, s=res psicofísicos, s=res espirituais, 1ue se desen%ol%em e atuam! A nossa %isão da realidade em geral, e em particular dos s=res "umanos indi%iduais, 3 etremamente fragment-ria e limitada!
De certa forma, as oraçJes de um teto proBetam um mundo bem mais fragment-rio do 1ue a nossa %isão B- fragment-ria da realidade! >ma epressão nominal como mesa proBeta o obBeto na sua unidade concreta, mas isso apenas
<ormaliter
, como es1uema 1ue cont3mapenas potencialmente uma infinidade de determinaçJes! Atra%3s das funçJes significati%as da oração posso atribuir (ou retirar7 a essa unidade uma ou outra determinação 5a mesa 3 a+ul, alta, redonda, bem lustrada72 mas por mais 1ue a descre%a ou lance mão de aspectos especialmente preparados, capa+es de suscitar o preenc"imento imagin-rio do leitor 5a mesa era um da1ueles mH%eis tradicionais em tKrno do 1ual, antes do surgir da tele%isão, a famflia costuma%a reunirN se para o Bantar7, as obBectualidades puramente intencionais constituídas por oraçJes sempre apresentarão %astas regiJes indeterminadas, por1ue o nmero das oraçJes 3 finito! Assim psmiagemde um romance 5e ainda mais de um poema ou de uma peça teatral7 eum configuração es1uem-tica, !tanto no sentido físico como
psí1uico, embora
<ormaliter
seBa proBetada como um indi%íduo real, totalmente determinado!ste fato das +onas indeterminadas do teto possibilita at3 certo ponto a %ida da obra liter-ria, a %ariedade das concreti+açJes, assim como a função do diretor de teatro, c"amado a preenc"er as mltiplas indeterminaçJes de um teto dram-tico! sso, por3m, se de%e %ariedade dos leitores, atra%3s dos tempos, não I %ariabilidade da obra, cuBas personagens não rnutabilidade e a infinitude das de de seres "umanos reais! As concreti+açJes podem %ariar, mas a obra como tal não muda! Comparada ao teto, a personagem c=nica tem a grande %antagem de mostrar os aspectos es1uemati+ados pelas oraçJes em plena concreção e, nas fases proBetadas pelo discurso liter-rio descontínuo, em plena continuidade! sso comunica I representação a sua fKrça de presença eistencial! A eist=ncia se d- sKmente I percepção 5o fato de 1ue o mundo imagin-rio tamb3m neste caso não 3 prJpriamente percebido 3 1uase negligenci-%el7! sso naturalmente não 1uer di+er 1ue a representação não ten"a +onas mdeterminadas características de tKdas as obBectualidades puramente intencionais! 8s atKres, =stes sim, são reais e totalmente determinados, mas não os s=res imagin-rios de 1ue apresentam apenas alguns aspectos %isuais e auditi%os e, atra%3s d=les, aspectos psí1uicos e espirituais, 8 fato 3 1ue a peça e sua representação mostram em geral muito menos aspectos das personagens do 1ue os romances, mas =stes poucos aspectos aparecem de modo sensí%el e contínuo, dando Is personagens teatrais um poder etraordin-rio! ste poder não 3 diminuído pelo fato de no teatro cl-ssico 5por eemplo, Racine7 as personagens terem o car-ter 1uase de sil"uetas, por1ue se confrontam com poucas personagens, aparecem em poucas situaçJes e se esgotam 1uase totalmente nos aspectos proporcionados pela ação específica da peça, de modo 1ue seria difícil imagin-Nlas fora do conteto desta ação peculiar! - nas peças de cun"o mais aberto 3pico penseNse em di%ersas obras de S"a&espeare as figuras ad1uirem maior plasticidade, podendo ser
imaginadas fora da peça! 0ais diferenças, por3m, não implicam um Buí+o de %alor! 0rataNse de outros estilos!
8 curioso 3 1ue o leitor ou espectador não nota as +onas indeterminadas 51ue tamb3m no filme são mltiplas7! Antes de tudo por1ue se at3m ao 1ue 3 positi%amente dado e 1ue, precisamente por isso, encobre as +onas indeterminadas2 depois, por1ue tende a atuali+ar certos es1uemas preparados2 finalmente, por1ue costuma ultrapassar o 1ue 3 dado no teto, embora geralmente guiado por =le! De 1ual1uer modo, o 1ue resulta 3 1ue precisamente a limitação da obra ficcional 3 a sua maior con1uista! Precisamente por1ue o nmero das oraçJes 3 necessIriamente limitado 5en1uanto as +onas indeterminadas passam 1uase despercebidas7, as personagens ad1uirem um cun"o definido e definiti%o 1ue a obser%ação das pessoas reais, e mesmo o con%í%io com elas, dificilmente nos pode proporcionar a tal ponto! Precisamente por1ue se trata de oraçJes e não de realidades, o autor pode realçar aspectos essenciais pela seleção dos aspectos 1ue apresenta, dando Is personagens um car-ter mais nítido do 1ue a obser%ação da realidade costuma a sugerir le%andoNas, ademais, atra%3s de situaçJes mais decisi%as e significati%as do 1ue costuma ocorrer na %ida! Precisamente pela limitação das oraçJes, as personagens t=m maior coer=ncia do 1ue as pessoas reais 5e mesmo 1uando incoerentes mostram pelo menos nisso coer=ncia72 maior eemplaridade 5mesmo 1uando banais2 penseNse na banalidade eemplar de certas personagens de 0c"eco% ou onesco72 maior significação2 e, paradoalmente, tamb3m maior ri1ue+a não por serem mais ricas do 1ue as pessoas reais, e sim em %irtude da concentração, seleção, densidade e estili+ação do conteto imagin-rio,
1ue rene
os fios dispersos e esfarrapados da realidade num padrão firme e consistente! Antes de tudo, por3m, a ficção 3 nico lugar em t=rmos epistemolHgicos em 1ue os s=res "umanos se tornam transparentes I nossa %isão, por se tratar de seres puramente intencionais a s=res autKnomos2 de s=res totalmente proBetados por oraçJes! E isso a tal
ponto 1ue os grandes autores, le%ando a ficção fict^ciamente Is suas ltimas conse1=ncias, refa+em o mist3rio do ser "umano, atra%3s da apresentação de aspectos 1ue produ+em certa opali+ação e iridesc=ncia, e reconstituem, em certa medida, a opacidade da pessoa real! V precisamente o modo pelo 1ai p autor dirige o nosso ol"ar, atra%3s de aspectos selecionados de certas situaçJes de apar=ncia física e do comportamento sintom-ticos de certos estados ou processos psí1uicos ou diretamente atra%3s de aspectos da intimidade das personagens tudo isso de tal modo 1ue tamb3m as +onas indeterminadas começam a funcionar 3 precisamente atra%3s de todos =sses e outros recursos 1ue o autor torna a personagem at3 certo ponto de nK%o inesgot-%el e insond-%el.
A valori5a-.o est>tica
A eposição do problema da ficção foi numerosas %=+es ultrapassada por descriçJes 1ue de fato B- introdu+iam certas %alori+açJes est3ticas! Tuando, por eemplo, foi afirmado 1ue os
grandes
autores tendem a refa+er o mist3rio "umano, o campo da lHgica ficcional, assim como os aspectos puramente epistemolHgicos e ontolHgicos, foram abandonados em fa%or de consideraçJes est3ticas2 a mesma falta de rigor se %erificou na abordagem da %ibração %erbal da poesia do problema da %erdade ficcional 51ue no fundo 3 de ordem est3tica7 e da 1uestão dos aspectos es1uem-ticos especialmente preparados para suscitar preenc"imentos determinados do leitor! A preparação de tais aspectos depende em alto grau da escol"a da pala%ra Busta, insubstituí%el da sonoridade específica dos fonemas, dasconotaçJes das pala%ras, da carga de suas +onas semMnticas marginais, do BKgo metafHrico, do estilo ou seBa, da organi+ação dos contetos de unidades significati%as e de muitos outros elementos de car-ter est3tico! stes momentos inerentes Is camsdsas eteriores da obra liter-ria estão, naturalmente, relacionados com a necessidade de
concreti+ar e enri1ueçe a camada das obBectualidades puramente intencionais, e de dar a =ste piano imagin-rio certa transpar=ncia ou iridesc=ncia em direção a significados mais profundos, em 1ue se re%ela o sentido, a id3ia da obra! $o pocesso da criação =stes planos mais profundos certamente condicionaram, de modo consciente ou inconsciente, o rigor seleti%o aplicado Is camadas mais eternas 5embora num poema todo o processo cria%o possa iniciarNse a partir de uma se1u=ncia rítmica de pala%ras7!
A dificuldade de abordar o fenKmeno da ficção sem recorrer a %alori+açJes est3ticas indica 1ue =ste problema e o do ní%el est3tico não mant=m relaçJes de indiferença! Sem d%ida, "- ficção de baio ní%el est3tico, de grande pobre+a imaginati%a 5clic"=s7, com personagens sem %ida e situaçJes sem significado profundo, tudo isso relacionado com a inepressi%idade completa dos contetos %erbais 51ue por %=+es, contudo, são afetados e pretensiosos, sem economia e sem função no todo, sem 1ue I sua eagerada ri1ue+a corresponda 1ual1uer coisa na camada imagin-ria e nos planos mais profundos7! 0oda%ia a criação de um %igoroso mundo imagin-rio, de personagens %i%as situaçJes %erdadeiras, B- em si de alto %alor est3tico, eige em geral a mobili+ação de todos os recursos da língua, assim como de muito outros elementos da composição liter-ria, tanto no plano "ori+ontal da organi+açã das partes sucessi%as, como no %ertical das camadas2 enfim, de todos os rneios tendem a constituir a obraNdeNarte liter-ria! De outro lado, a mobili+ação plena d=sses recursos dar- I obra, mesmo a despeito da intenção possi%elmente científica ou filosHfica, um car-ter senão imagin-rio, ao menos imaginati%o, 1ue a aproimar- at3 certo ponto da ficção! Eemplos característicos seriam os di-logos de Platão 51ue, em parte, podem ser lidos como com3dias7, certos escritos de *ier&egaard, Pascal, $iet+sc"e, a obra de Sc"open"auer 5cuBa %ontade metafísica se torna 1uase personagem de uma epop3ia7 etc! De%eNse admitir, na delimitação do 1ue seBa literatura no sentido restrito, amplas +onas de transição em 1ue se situariam obras de grande poder e
precisão %erbais, na medida em 1ue se ligam I agude+a da obser%ação, perspic-cia psicolHgica e ri1ue+a de id3ias!
$a descrição da estrutura da obra liter-ria em sentido lato 5pp! :NO7 %erificouNse 1ue, em ess=ncia, se trata da associação de camadas mais sensí%eis 5das 1uais a nica realmente foi posta de lado7 e de planos mais profundos proBetados por a1uelas! Esta estrutura 3 fundamentalmente a de tKdas as obBeti%açJes espirituais 5todos os produtos "umanos7 e, em especial, de tKdas as obras de arte! Em tKdas as obBeti%açJes espirituais associamNse a uma camada material, sensí%el, real, uma ou %-rias camadas irreais, não apreendidas diretamente pelos sentidos, mas mediadas pelos eteriores!
Entretanto, graças ao material em BKgo no caso de uma sinfonia, de um 1uadro ou de uma apresentação teatral, e%idenciaNse a sua intenção est3tica, mesmo 1ue não se ten"a cristali+ado em rele%ante obra de arte! $o! caso da literatura, bem ao contr-rio, o material em BKgo a língua tanto pode ser%ir para fins teHricos ou pr-ticos como para fins est3ticos! V a isso 1ue egel se refere 1uando c"ama a literatura 5as belas letras7 a1uela arte peculiar em 1ue a arte!!! dissol%erNse!!!, passando a ser ponto de transição para a prosa do pensamento científico! Principalmente neste campo, portanto, surge o problema de diferenciar entre prosa comum e arte!
A diferença entre um documento liter-rio 1ual1uer e a obraNdeNarte liter-ria reside, antes de tudo, no %alor di%erso da camada 1uaseN sensí%el das pala%ras 5sensí%el 1uando o teto 3 lido a %i%a %o+7! ste plano 1uaseNsensí%el das pala%ras e de seus contetos maiores tem na literatura em sentido lato função puramente instrumental# a de proBetar, como %imos, obBectualidades puramente intencionais 1ue, por sua %e+, sem serem notadas como tais, se referem aos obBetos %isados! 8 1ue importa são os significados 1ue se identificam com os obBetos %isados, não os significantes! stes ltimos ai pala%ras se omitem por completo 5da mesma Forma 1ue as obBectualidades puramente intencionais72 podem ser substituídos por, 1uais1uer outros 1ue constituam os mesmos significados! A relação entre a camada 1uaseN
sensí%el e a camada espiritual 3, portanto, inteiramente con%encional! A intenção do leitor passa diretamente ao sentido e aos obBetos %isados!
$a obraNdeNarte liter-ria, esta relação deia de ser con%encional, apresenta necessidade e grande firme+a e consist=ncia! Em casos etremos 5particularmente na poesia7, a mais ligeira modificação da camada eterior 5e na poesia concretista, mesmo da distribuição dos sinais tipogr-ficos7 destrHi o sentido de tKda a obra, de%ido ao %alor epressi%o das pala%ras, agora usadas como se fKssem relaçJes de cKres ou sons na pintura ou msica! A camada %erbal ad1uire, pois, %alor prHprio e passa a fa+er parte integral da obra! sso %ale particularmente para contetos maiores, 1ue passam a constituir o ritmo, o estilo, o BKgo das repetiçJes e associaçJes e 1ue se tornam momentos insepar-%eis do todo, de modo 1ue a modificação da estrutura das oraçJes e da maneira como se organi+am os significados afeta profundamente o sentido total da obra 5imagineNse uma edição de Proust com as oraçJes simplificadas_7 ao passo 1ue num teto científico ou filosHfico as mesmas teses podem ser mediadas por conteto di%ersos de oraçJes 5isso não se refere a filHsofos como eidegger2 mas Lneste caso a prosa comum do pensamento científico 3 abandonada em fa%or de especulaçJes teosHficas 1ue re1uerem o uso da ar1uipala%ra adMmica7! V isso 1ue )essing tem em mente 1uando c"ama o poema um discurso totalmente sensí%el ou 1uando egel, num sentido mais geral, define a bele+a como o aparecer 5lu+ir7 sensí%el da id3ia!
8 significado disso 3 1ue os planos de fundo 5os mais espirituais7 se ligam na obra de arte 5liter-ria ou não7
de um modo indissol%el ao seu modo de aparecer, concreto,
indi%idual, singular! V a isso 1ue Croce c"ama de intuição! 8 sentimento do %alor est3tico, o pra+er específico em 1ue se anuncia a presença do %alor est3tico, refereNse precisamente I
totalidade
da obra liter-ria ou, mais de perto, ao modo de aparecer sensí%el 51uaseN sensí%el7 dos obBetos mediados! As camadas eteriores impJem a suapresença em %irtude da organi+ação e %ibração peculiares de seus elementos! 8 raio de intenção, ao atra%essar estas camadas eteriores, conotaNas, assimilaNas no mesmo ato de apreensão das camadas mais profundas! sso, em parte, se %erifica tamb3m em %irtude de uma atitude di%ersa em face de escritos de %alor est3tico!
$a %ida cotidiana ou na leitura de tetos nãoNest3ticos, a nossa intenção geralmente atra%essa a superfície sensí%el de%ido I imposição de %alores pr-ticos, %itais, teHricos etc! 8 raio da intenção, sem deterNse nas eterioridades sensí%eis, dirigeNse diretamente ao 1ue interessa, por eemplo, Is atitudes e pala%ras, I amabilidade, cHlera, disposição geral do interlocutor 5a não ser 1ue se trate de pessoa de grande encanto físico, dificilmente nos lembramos de seus traços e BKgo fisionKmico7 ou I topografia de um bos1ue 51uando o obser%ador 3 um engen"eiro de estradas de ferro7 ou ao %alor til das -r%ores 51uando se trata de um negociante de madeiras7 ou I teoria dos genes 5eposta num tratado de gen3tica7! A eperi=ncia est3tica, bem ao contr-rio, 3 desinteressada, isto 3, o obBeto B- não 3 meio para outros fins, nada nos interessa senão o prHprio obBeto como tal 1ue, em certa medida, se emancipa do tecido de relaçJes %itais 1ue costumam solicitar a nossa %ontade! V o fenKmeno da moldura 1ue, nas %-rias artes, de modo di%erso, isola o obBeto est3tico, como -rea ldica, de situaçJes reais 5Is 1uais, contudo, pode referirNse indiretamente7! Esta atitude desinteressada B- condicionou a elaboração do obBeto e a configuração altamente seleti%a das camadas eteriores! A eperi=ncia do apreciador ade1uado, atendendo Is %irtualidades específicas do obBeto, se caracteri+ar- por uma esp3cie de repouso na totalidade d=le! le não se ater- apenas I id3ia epressa, nem s[mente I configuração sensí%el em 1ue ela aparece, mas ao aparecer como tal, ao modo como aparece2 ao todo, portanto! $o primeiro caso, um ateísta seria incapa+ de apreciar Dante ou um antimarista, (rec"t! $o segundo caso, tratarN seN- pro%I%elmente de um crítico 1ue sH eamina fenKmenos t3cnicos, sem referiNlos ao todo! $em a1u=les, nem =ste apreenderão o obBeto com a1uela peculiar emoção %alori+adora do pra+er est3tico, 1ue se liga a
atos de apreensão referidos ao obBeto total!
ste tipo de apreciação, facilitado pelo isolamento em face de situaçJes %itais, permite uma eperi=ncia intensa, 1uase arcaica, das obBectualidades mediadas 5particularmente 1uando se trata de obBectualidades imagin-rias7, 1ue se apresentam com grande concreção, graças aos aspectos especialmente preparados e I forte coNapreensão dos momentos mais sensí%eis! A apreensão do mundo fictício 3 acompan"ada de intensas tonalidades emocionais, tudo se carrega de
mood
, atmosfera, disposiçJes anímicas! Em obras de intenção filosHficaou científica, =ste cun"o est3tico pode representar fator de perturbação, B- 1ue des%ia o raio de intenção da passagem reta aos obBetos %isados! Contudo, mesmo na obra fictícia, =ste retrocesso a tipor mais puros e intensos de percepção e emocionalidade não 3 realmente, uma %olta a fases mais primiti%as não pro%oca tiros contra o palco ou a tela! As prHprias l-grimas t=m, por assim di+er, menos teor salino! Ao forte en%ol%imento emocional ligaNse, no apreciador ade1uado, a consci=ncia do Conteto ldico, da moldura! .ant=mNse intata a distMncia contemplati%a! 8 pra+er est3tico no modo de aparecer do mundo mediado integra e suspende em si a participação nas dores e m-goas do "erHi! ste pra+er 3 possí%el sKmente por1ue o apreciador sabe encontrarNse em face de 1uaseNBuí+os, em face de obBectualidades puramente intencionais, sem refer=ncia direta a obBetos tamb3m intencionais!
A obra?de?arte liter"ria <iccional
8s momentos descritos são de importMncia na %alori+ação est3tica da obra liter-ria fictícia! $a ficção! em geral, tamb3m na de cun"o tri%ial, o raio de intenção se dirige I camada imagin-ria, sem
passar diretamente Is realidades empíricas possi%elmente
representadas! Det3mNse, por assim di+er, neste plano de personagens, situaçJes ou estados 5líricos7, fa+endo %i%er o leitor, imaginIriamente, os
destinos e a%enturas dos "erHis! (oa parte dos leitores, por3m, pJe o mundo imagin-rio 1uase imediatamente refer=ncia coma realidade eterior I obra, B- 1ue as obBectualidades puramente intencionais, embora tendam a prender a intenção, são tomadas na sua função mim3tica, como refleo do mundo empírico! sto 3, em muitos casos, perfeitamente legítimo2 mas esta apreciação, 1uando muito unilateral, tende a deformar e empobrecer a apreensão da totalidade liter-ria, assim como o pleno pra+er est3tico no modo de aparecer do 1ue aparece!
$a medida em 1ue se acentua o %alor est3tico da obra ficcional o mundo imagin-rio se enri1uece e se aprofunda, prendendo o raio de intenção dentro da obra e tornandoNse, por sua %e+, transparente a planos mais profundos, imanentes I prHpria obra! SH agora a obra manifesta tKdas as %irtualidades de re%elação re%elação 1ue não se de%e confundir com 1ual1uer ato cognosciti%o eplícito, B- 1ue 3 em plena imediate+ concreta 1ue o mediado se re%ela, na indi%idualidade 1uaseNsensí%el das camadas eteriores e na singularidade das personagens e situaçJes! $este sentido, a
cogitatio
pode de certa forma ser contida na apreensão est3tica, mas ela 3 ultrapassada por uma esp3cie devisio
, ou%isão intuiti%a, 1ue 3 ao mesmo tempo superior e inferior ao con"ecimento científico preciso! 0ampouco de%eNse comparar o pra+er desta re%elação ao pra+er do con"ecimento! est3tico integra e suspende a distMncia da contemplação, o intenso en%ol%imento emocional e a re%elação profunda2 pode manifestarNse mesmo nos casos em 1ue o contedo desta re%elação se opJe a tKdas as nossas concepçJes 5bem tarde 0! S! Eliot recon"eceu isso com refer=ncia a Goet"e e S"a&espeare, %isceralmente contr-rios I sua concepção do mundo7! Seria tautolHgico di+er 1ue essa ri1ue+a e profundidade da camada imagin-ria e dos planos por ela re%elados pressupJem uma imaginação 1ue o autor de romances tri%iais não possui, assim como capacidades especiais de obser%ação, intuição psicolHgica etc! 0udo isso, por3m, ad1uire rele%Mncia est3tica sKmente na medida em 1ue o autor consegue proBetar =ste mundo imagin-rio I base de oraçJes, isto 3,