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Leitura cultural no ensino de literatura

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS. JAIRTON MENDONÇA DE JESUS. LEITURA CULTURAL NO ENSINO DE LITERATURA. SÃO CRISTÓVÃO JANEIRO DE 2011.

(2) JAIRTON MENDONÇA DE JESUS. LEITURA CULTURAL NO ENSINO DE LITERATURA. Orientador: Prof. Dr. Carlos Magno Santos Gomes. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Letras da Universidade Federal de Sergipe como requisito para término do Mestrado em Letras. SÃO CRISTÓVÃO JANEIRO DE 2011.

(3) FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA DO CAMPUS DE ITABAIANA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE. J58l. Jesus, Jairton Mendonça de Leitura cultural no ensino de literatura / Jairton Mendonça de Jesus. – São Cristóvão, 2011. 112 f. : il.. Dissertação (Mestrado em Letras) – Núcleo de PósGraduação em Letras, Pró-Reitoria de Pós-Graduação, Universidade Federal de Sergipe, 2011. Orientador: Prof. Dr. Carlos Magno Santos Gomes. 1. Ensino de literatura . 2. Leitor. 3. Leitura literária. 4. Negro na literatura I. Título. CDU 82:37.

(4) BANCA EXAMINADORA. ______________________________________________________ Prof. Dr. Carlos Magno Santos Gomes (DLI/UFS) Presidente. ______________________________________________________ Prof. Dr. Antonio de Pádua Dias da Silva (UEPB) Primeiro avaliador. ______________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Eduardo Oliveira (DLES/UFS) Segundo avaliador.

(5) AGRADECIMENTOS. A construção desta dissertação exigiu uma prática de trabalho que concilia família, pesquisa e vida profissional. Sem a colaboração das pessoas direta ou indiretamente envolvidas, o término desta etapa se tornaria bem mais difícil e mais pobre. Por isso, em reconhecimento a todos que me ajudaram deixo meus agradecimentos: À minha família, que sempre valorizou minha formação acadêmica. Em especial à minha esposa, Denise Michelle da Silva Oliveira, por compreender minha ausência em função de tantas horas dedicadas à pesquisa. Também à minha madrinha, Maria José dos Santos, que sempre me apoiou e acreditou em mim, e à minha sobrinha, Josilene de Jesus Mendonça, pela ajuda na aplicação dos questionários nas escolas de Itabaiana/SE. Às amigas de trabalho Andréa Reis Barbosa, Carmen de Almeida Santos e Elayne Cristina Menezes Silva pela parceria ao aceitarem um horário flexível que facilitasse minha vida profissional e estudantil e pelo apoio que sempre me deram. Ao colega e amigo Danilo Messias Nascimento e Santos pelo auxílio na tabulação dos dados coletados nas escolas de Itabaiana/SE. A todos os amigos, colegas e amigos de trabalho por estarem sempre me incentivando e torcendo por mim. Ao meu chefe imediato, Prof. Dr. Marcelo Alario Ennes, diretor do Campus Prof. Alberto Carvalho, por ter sido compreensivo na flexibilização do meu horário de trabalho. Aos professores do Mestrado em Letras, que colaboraram para a ampliação e o amadurecimento de minhas ideias, sem as quais não seria possível vencer esta etapa. À Profa. Dra. Ildney Cavalcanti pelas observações muito bem colocadas sobre a questão da flexibilização do cânone literário no ensino de literatura. Ao Prof. Dr. Luiz Eduardo Oliveira por ter colaborado na qualificação e nos ter dado a oportunidade do diálogo e amadurecimento dos pontos sobre ensino e por mais uma vez ter aceitado participar de maneira solícita da avaliação desta fase final. Ao Prof. Dr. Antonio de Pádua Dias da Silva por ter sido solidário em aceitar, de última hora, avaliar este trabalho. De maneira especial, ao meu orientador, Prof. Dr. Carlos Magno Santos Gomes, pela confiança que sempre depositou em mim. Há pessoas que passam em nossas vidas e vão. Há outras que passam, mas ficam. Ele é uma dessas pessoas que permanecem. Meus sinceros agradecimentos pela parceria, pelo diálogo, pelo incentivo e, principalmente, por me fazer acreditar que seria/é possível..

(6) As crianças nunca chegam à escola num estado de ignorância, mas podem chegar analfabetas. Elas talvez não saiam analfabetas, mas podem sair ignorantes... Tadeu Silva, 2005, p. 97.

(7) RESUMO Este trabalho traz uma reflexão sobre como as questões culturais podem permear o ensino de literatura. Tradicionalmente o ensino de literatura se pauta no estudo da historiografia literária, que, por vezes, não elege como prioridade a leitura do texto literário. Assim, nosso principal objetivo é refletir sobre a formação social do leitor de modo que busquemos novas saídas para as aulas de literatura a partir dos questionamentos propostos pela crítica cultural. Pelo viés dos Estudos Culturais, essa reflexão metodológica parte do princípio de que o pertencimento identitário e as questões ideológicas são fundamentais para as aulas de literatura, pois, na leitura e debate do texto literário, podemos incluir questões raciais, sexuais e de gênero. Dados coletados em escolas de Itabaiana/SE nos servem de base empírica para questionar o ensino historiográfico tradicional. A partir dessas reflexões, a proposta é sugerir que o texto literário seja tomado como meio indispensável no ensino de literatura. Metodologicamente, este trabalho incorpora questões sobre identidade, estudos culturais e questões raciais para abordar a representação do negro na literatura. Exploramos as reflexões de Tzvetan Todorov e Regina Zilberman sobre ensino de literatura, e as de Stuart Hall e Boaventua Santos sobre identidade e cultura. Portanto, a leitura literária é defendida como uma prática de interação entre herança cultural e uma visão crítica atual. Para aplicarmos uma proposta de leitura do texto literário, selecionamos alguns textos de Jorge de Lima a fim de comentar uma proposta de leitura cultural que valoriza o papel ativo do leitor ao questionar diferentes abordagens sobre a representação do negro na literatura. Palavras-chave: 1. Leitor 2. Leitura literária 3. Ensino de literatura 4. Negro na literatura..

(8) ABSTRACT This work brings a reflection about as the cultural questions may permeate the teaching of literature. Traditionally the teaching of literature gives directions for the study of literary historiography which, by times, it does not elect as a priority the reading of literary text. Thus, our main purpose is to think the social formation of reader over in the way we will search new way-outs for the literature classes as to the questionings purposed by the cultural criticism. By the vies of Cultural Studies, this methodological reflection comes out from the beginning that the identity belonging and the ideological questions are fundamental to the literature classes, then, in the reading and in the discussion on literary text, we may include racial and sexual and gender questions. Collected data at Itabaiana’s schools serve us from empirical base to question the traditional historiographic teaching. As to these reflections, the purpose is to suggest that the literary text is taken as an indispensable means in the teaching of literature. Methodologically, this work embodies in questions about identity, cultural studies and racial questions to approach the representation of Negro in literature. We exploited the reflections of Tzvetan Todorov and Regina Zilberman about identity and culture. Therefore, the literary reading is defended as a practice of interaction between cultural inheritance and current critical view. For us to apply a purpose of literary text reading, we chosen a few Jorge de Lima’s texts in order to comment on a purpose of cultural reading which assesses the reader’s active role when questioning different approaches about the representation of Negro in literature. Keywords: 1. Reader; 2. Literary Reading; 3. Teaching of Literature; 4. Negro in Literature..

(9) SUMÁRIO RESUMO ................................................................................................. vii ABSTRACT ............................................................................................viii INTRODUÇÃO .........................................................................................10 1 – DA LEITURA AO LEITOR ................................................................. 18 1.1 – Por que insistir em leitura ........................................................................................ 19 1.2 – Abrangência da leitura ............................................................................................. 24 1.3 – Da passividade à atuação do leitor .......................................................................... 28 1.4 – De onde procede o sentido do texto literário?.......................................................... 32. 2 – O ENSINO DE LITERATURA ...........................................................35 2.1 – Historiografia literária: o texto fora do ensino de literatura ....................................... 36 2.2 – O livro didático......................................................................................................... 41 2.3 – Três em um: Português, Literatura e Redação ........................................................ 42 2.4 – Leitura e ensino de literatura em Itabaiana/SE ........................................................ 45. 3 – UMA PROPOSTA DE LEITURA CULTURAL ................................... 53 3.1 – Aspectos teóricos da abordagem cultural ................................................................ 54 3.2 – Representação do negro na literatura...................................................................... 63 3.3 – O estético como forma de revelar o conteúdo e a cultura ........................................ 67 3.4 – Cultura híbrida no poema “Bangüê”......................................................................... 71 3.5 – A identidade em movimento no poema “Foi mudando, mudando” ........................... 79. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... 83 BIBLIOGRFIA..........................................................................................87 APÊNDICE A – Questionário aplicado em turmas do ensino médio da cidade de Itabaiana/SE ............................................................................92 APÊNDICE B – Estatísticas sobre leitura e ensino de literatura em Itabaiana/SE.............................................................................................96.

(10) 10. INTRODUÇÃO Nas aulas de literatura, a seleção dos textos literários é fundamental para a formação de um leitor crítico. Da mesma forma, a literatura não se manifesta em sua completude sem que seu ensino esteja alicerçado na prática de leitura. Sendo assim, esta pesquisa toma como base a discussão a respeito do ensino de literatura e de leitura, e, para isso, tentamos discutir o assunto por uma perspectiva cultural. Nosso maior interesse é debater se o estímulo à leitura está sendo executado na sala de aula e, caso esteja, de que forma a prática de leitura tem se manifestado. Assim, perseguimos como principais objetivos refletir sobre qual tipo de leitor a escola deve formar e sobre as formas de ensino de literatura que se têm dado em sala de aula. Defendemos que o texto literário pode ser um importantíssimo instrumento de transformação e de formação dos alunos já na educação básica. Assim, tomar o texto literário por uma abordagem que leve o aluno a uma percepção crítica da realidade ajudá-lo-á em sua formação enquanto cidadão ativo, reflexivo e participativo socialmente. Os fatores que nos levaram a escolher tal objeto de pesquisa dizem respeito à nossa formação acadêmica e profissional, à inquietação em relação a determinados paradigmas que se estabelecem no ensino como norteadores de uma prática que deveria se fazer pedagógica e, principalmente, por estar inserido num programa de pós-graduação em que a língua, a cultura, a identidade e o ensino são focalizados em uma de suas vertentes de pesquisa. Por essa vertente, são travados diálogos entre cultura e linguagem por uma perspectiva que toma como centro, dentre outras possibilidades de temas, as questões de gênero, de raça e de cultura. No caso desta pesquisa, as atividades de leitura e recepção do texto literário ocupam um espaço privilegiado como forma de problematizar as variadas manifestações identitárias, a fim de que, considerando a alteridade como foco da formação dos leitores, o aluno da educação básica saia desse nível de ensino com uma visão menos determinista e mais crítica ao incorporar à leitura literária temas do seu cotidiano, como questões raciais e de gênero, ou temas que não saem da mídia pela reiteração das ocorrências, a exemplo da violência contra a mulher e de cenas de preconceito racial. Quanto à questão da leitura como prática escolar, apresentamos no apêndice dados coletados nas escolas de Itabaiana/SE que nos mostram uma prática ainda preocupada com o ensino historiográfico da literatura, uma metodologia tradicional que atualmente tem sido muito questionada em sua finalidade. Além disso, não podemos deixar de levar em conta nossa preocupação com resultados em programas que avaliam o desempenho em leitura de.

(11) 11. estudantes. Para citar um exemplo, de acordo com os resultados de 2006, o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) revela que os estudantes brasileiros têm um nível de entendimento textual dos piores do mundo. Em 2009, o resultado mostrou uma leve melhoria, embora distante do desejável. Tal desempenho passa inevitavelmente pela forma como se dá o ensino. O papel da escola parece não ser bem desempenhado. E isso não deve ser preocupação apenas do Estado, mas também de educadores e profissionais da educação em geral. O que mais nos inquieta nesta pesquisa, nesse sentido, não é o meio de acesso à leitura – que hoje pode ser digital ou impresso –, mas o próprio acesso. O grande questionamento que nos instiga é se o fazer pedagógico, o trato didático que se dá nas aulas de língua portuguesa e, especificamente, nas aulas de literatura, tem sido suficiente para transformar a escola num ambiente de formação de leitores. De acordo com Todorov (2009), a literatura está em perigo, pois, na escola, ensina-se muito mais sobre o que a teoria e a crítica falam a respeito dos textos literários do que sobre os próprios textos (cf. TODOROV, 2009, p. 27). Por uma visão similar, Regina Zilberman (2008) argumenta que a crise do ensino de literatura pode ser vista a partir de uma gradação de fatores que, de forma ampla, pode ser resumida em falta de leitura: de um lado, “recriminam-se os alunos por não gostarem de ler, preferirem outras formas de expressão ou satisfazerem-se com seu estágio de ignorância” (p. 50); de outro, os professores são o alvo das críticas por sua falta de eficiência. Vejamos que leitura e ensino são postos em questão quando se fala em crise da literatura. Quanto à metodologia, devemos considerar que não existe apenas um paradigma que resolva todos os questionamentos e problemáticas de uma determinada questão. O melhor disso é a possibilidade de aproveitamento e utilização de várias metodologias, práticas e técnicas que tentem dar um desfecho, embora sempre provisório, para tais questionamentos e problemáticas. Assim, a possibilidade de análise por paradigmas distintos, em vez de dificultar a prática docente, pode ajudar a conduzir o ensino, uma vez que, não estando preso a amarras teóricas definitivas, o professor pode desenvolver, em sala de aula, muito mais a habilidade de pesquisa dos alunos do que incutir conhecimentos inquestionáveis na memória deles. Não é por acaso que tais ideias são hoje muito recorrentes. A ciência já se convenceu de que nada radicalmente defendido pode ser “bom” para a sociedade. Uma vez que a própria ciência muda – inclusive os pensamentos aparentemente indiscutíveis –, não há motivo para prender-se a ideias fixas como inquestionáveis. Por meio de uma educação que proporcione o debate lógico e participativo e defenda a não existência de apenas uma verdade, mas a ideia.

(12) 12. de que a verdade é relativa, pode haver uma formação mais tolerante em relação ao desconhecido, ao novo e ao diferente. A sala de aula, embora não proporcione totalmente a experiência empírica de tais vivências, é o local onde se pode originar uma formação desse tipo. Por isso, ao optarmos por uma metodologia de leitura do texto literário que leve em conta as conceituações e ideias dos estudos culturais, entendemos que estamos mais próximos de uma educação politizada. Os estudos de cultura podem ser vistos também como “extensão do campo dos estudos literários” (CEVASCO, 2003, p. 138) e, mesmo antagonicamente, podem trazer uma nova forma de pensar o literário e a cultura, pois ora são vistos como forma de destruir o valor da literatura, ora como coadjuvantes da crítica literária. Pelo primeiro ponto de vista, a exclusão da “alta” literatura traria uma nova forma de pensar os estudos literários que jamais poderia ser aceita pelos que defendem a literatura canonizada. Pelo segundo, os conceitos de literatura e de cultura são repensados. Por essa abordagem, leva-se em consideração uma construção coletiva da cultura. Portanto, os significados e os valores são construídos por todos os membros de uma determinada comunidade e não por apenas alguns privilegiados que os constroem para serem vividos pela maioria. Na escola, naturalizou-se estudar a literatura pelo primeiro viés, em que a “alta” cultura é vista como “apanágio de uma minoria que vigiaria o campo do humano e preservaria os valores essenciais da humanidade como estruturados em obras literárias” (CEVASCO, 2003, p. 139). Quebrar a dicotomia cultura erudita/cultura popular não é objetivo deste trabalho, mas poderíamos repensar tais conceitos a partir do questionamento dos valores que são estabelecidos não por todos, mas por uma minoria que os impõe à maioria. Sendo assim, não podemos radicalizar afirmando que a cultura elitista é a “alta” cultura, a “boa” cultura, e a cultura de massa é um lixo cultural. Ao contrário, as dicotomias devem ser reproblematizadas e repensadas de forma a permitir o diálogo, pois aquilo que é valioso para um não o é para outro; aquilo que é valioso numa época, numa outra não o é. Na mesma direção poderíamos discutir os conceitos de “literatura boa” e “literatura ruim”. Sendo assim, utilizar os postulados dos estudos culturais como um suporte teóricometodológico de leitura do texto literário pode ser um modo de formar leitores ativos que leiam o texto não apenas esteticamente, mas também culturalmente. Avaliar o texto literário dessa maneira possibilita uma dupla habilidade aos estudantes de literatura: além de aprender sobre a literatura, ao examiná-la esteticamente, lhe dá uma formação politizada, ao tratar de assuntos que fazem parte de sua formação cultural e de questionar o próprio conceito de.

(13) 13. literatura. Ao se falar em ensino de literatura, não podemos deixar de fora os aspectos sociais que o texto literário traz em seu arcabouço. A partir da estrutura do texto, o leitor crítico deve desenvolver a habilidade de articular o dentro e o fora do texto, de modo que não se prenda às construções abstratas da crítica literária como verdades inquestionáveis. Como afirmamos, tal forma de estudar o texto literário traz como característica a politização do leitor. Valores hegemônicos, portanto, em vez de serem tratados como absolutos, são questionados. Em decorrência disso, o debate se abre para outras possibilidades de análise que não as tradicionalmente institucionalizadas. “Na perspectiva dos estudos culturais, o enfoque mudou, a diferença foi para o centro do debate, deixando de lado o colonialismo cultural. Assim, questões de gênero, de raça, de orientação sexual e das minorias passaram a fazer parte de uma agenda política” (GOMES, 2010, p. 330). Na leitura do texto literário, o leitor crítico deve estar atento não somente às vozes explícitas, mas principalmente às negadas. Sua tarefa é trazer à tona o projeto político que cada texto carrega consigo, mesmo que implicitamente. Aqui, sua atuação é indispensável, pois é a partir de sua leitura cultural que a hibridez entre o estético e o político se manifestará (cf. GOMES, 2010, p. 331). As especificidades do texto literário devem ser percebidas pelo leitor de modo que o “como” os elementos culturais são representados no texto possam aparecer, ficando visível, assim, a relação entre literatura e aspectos culturais, entre literatura e aspectos sociais. Por essa proposta de leitura, não há espaço para ideias inquestionáveis, ao contrário, é preciso que haja uma abertura discursiva que possibilite o diálogo até entre posturas antagônicas. Por isso, se formar o aluno leitor levando em consideração verdades absolutas é difícil, mais difícil ainda se torna quando precisamos questionar paradigmas já sedimentados na escola sem ter outros para substituí-los. E mesmo que os tivéssemos, esse não seria o caminho mais adequado, já que, quando falamos em educação, estamos falando do próprio ser humano, e, ao fazer isso, não podemos nos esquecer da mutabilidade que o caracteriza. O que pretendemos fazer não é trocar um modelo teórico-metodológico por outro, mas levantar discussões a respeito de como o ensino de literatura atrelado à prática de leitura tem-se manifestado na sala de aula, por acreditarmos que essa disciplina, trabalhada dessa forma, pode ajudar a melhorar não só o nível de compreensão textual dos alunos, como também sua formação enquanto cidadãos politizados e leitores críticos. Discussões e mais discussões são levantadas a respeito da importância da leitura para a formação do ser humano enquanto sujeito. Não temos dúvida da ação transformadora que a leitura pode proporcionar ao ser humano. Além de estar relacionada ao cognoscitivo e ao.

(14) 14. afetivo, a leitura exerce uma função social. Pessoas que não leem tendem a ser mais rígidas em suas ideias e ações. Assim, podemos dizer que há uma correlação entre os hábitos de leitura de uma determinada sociedade e seu desenvolvimento material e social. Sem contar com “a dimensão estética e a criativa que a leitura das obras literárias e a criação poética proporcionam” (ALLIENDE; CONDEMARIN, 1987, p. 17). Sendo assim, não é difícil levantar argumentos a favor da literatura como meio para atingir a formação de leitores críticos e de cidadãos participativos. Basta citar o poder que ela pode exercer sobre o individual e o coletivo. Compagnon (2009) enumera os seguintes: a) Pela concepção clássica, “é graças à mimesis (...) que o homem aprende”; b) “A literatura deleita e instrui”; c) “A própria catharsis, purificação ou apuração das paixões pela representação, tem por resultado a melhora da vida ao mesmo tempo privada e pública”; d) “A literatura (...) detém um poder moral”; e) Do ponto de vista do Iluminismo e aprofundado pelo Romantismo, “ela liberta o indivíduo de sua sujeição às autoridades”; f) “Ela o cura, em particular, do obscurantismo religioso; g) A literatura, instrumento de justiça e de tolerância, e a leitura, experiência de autonomia, contribuem para a liberdade e para a responsabilidade do indivíduo; h) “A literatura é de oposição: ela tem o poder de contestar a submissão ao poder” (COMPAGNON, 2009, p. 30-34). É por isso que defendemos que a literatura pode ser um meio de mudança pessoal e social. Ela é instrumento que tem um enorme poder de levar o aluno a experiências que ensinam sem mesmo tê-las vivenciado no dia-a-dia. Nesse sentido, o objetivo de todo professor, principalmente o de literatura, deve ser proporcionar tais experiências ao aluno por meio da leitura, de maneira que tenha uma formação melhor enquanto ser humano. Se considerarmos que a palavra “experiência” deve ser entendida como o conhecimento adquirido pelo indivíduo em suas relações com o mundo, por meio de percepções e vivências específicas, podemos dizer que a leitura também é fonte de conhecimento. Sendo assim, é tarefa da escola, enquanto formadora de cidadãos, buscar desenvolver no aluno seu potencial crítico, sua percepção das múltiplas possibilidades de expressão linguística e sua capacitação como leitor efetivo dos mais diversos textos representativos de nossa cultura. E a leitura tem o papel de tornar possível um leitor que atue no momento da compreensão textual. Fazendo referência aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), concordamos com a ideia de que a leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que se sabe sobre a língua: características do.

(15) 15. gênero, do portador, do sistema de escrita etc. Não se trata simplesmente de extrair informação da escrita, (...). Trata-se de uma atividade que implica, necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam a ser constituídos antes da leitura propriamente dita (BRASIL, 2000, p. 53).. Nossa tarefa nesta pesquisa é levantar discussões em relação a como se têm desenvolvido as práticas de leitura na sala de aula e se tais práticas estão atingindo seus objetivos, principalmente no que se refere à formação social e cultural do leitor. Como percebemos, de acordo com os PCN, conceber um leitor passivo na sociedade atual não mais se coaduna com concepções de participação social, pois seu papel se torna cada vez mais importante na construção do texto e da crítica aos fatos que se lhe apresentam e o envolvem. O leitor é tão importante quanto o texto e o autor, sendo a leitura o resultado de uma interação entre esses elementos. Trata-se de um diálogo entre autor e leitor mediado pelo texto, que é construído por ambos nesse processo interativo. Nesse sentido, o ato de ler, mesmo realizado individualmente, torna-se uma atividade social. É necessário que o aluno desenvolva meios para ampliar e articular conhecimentos e competências que possam ser utilizadas nas inúmeras situações de uso da língua com que se depara na família, entre amigos, na escola, no mundo do trabalho etc. Entretanto, formar um leitor ativo se incompatibiliza com um ensino voltado para a memorização mecânica de regras gramaticais ou de características de determinado movimento literário. E essa tem sido uma prática constante nas escolas, conforme demonstra pesquisa realizada por William Roberto Cereja analisada no livro Ensino de Literatura: uma proposta dialógica para o trabalho com Literatura (2005). Nessa pesquisa, além de apontar essa prática de ensino, Cereja também propõe uma metodologia que toma o texto literário como força motriz inicial do ensino de literatura. Influenciado pelo dialogismo de Mikhail Bakhtin, ele sugere que o texto literário seja trabalhado levando em conta a intertextualidade que lhe é própria. Em sua metodologia, a concepção de que “toda literatura é ‘intertextual’” (EAGLETON, 1997, p. 190) é considerada pelo viés estético. Assim, como forma exemplificativa, Cereja toma os textos “As meninas da gare”, de Oswald de Andrade, e um trecho da Carta de Pero Vaz de Caminha, procurando mostrar as relações dialógicas existentes entre um e outro. Vejamos que são textos de épocas diferentes, mas ele procura buscar as relações que os aproximam e prossegue por caminhos apontados pelos próprios textos em suas relações intertextuais com outros textos (cf. CEREJA, 2005). Nesse sentido, o propósito é mostrar a contradição de como a literatura pode ser paródica e ao mesmo tempo original. Em nossa proposta, no final deste trabalho, com o objetivo de também mostrar as.

(16) 16. diversas possibilidades de como o texto literário pode ser lido, tentamos fazer uma leitura dos poemas de Jorge de Lima “Retreta do Vinte” “Banguê” e “Foi, mudando, mudando”, de forma a exemplificar como a leitura literária, além de poder ser feita pelo viés estético, pode ser analisada pelo viés crítico-cultural. A escolha dos poemas decorreu da intertextualidade temática que apresentam principalmente no que se refere à representação do negro. Assim, nossa proposta de leitura cultural valoriza as abordagens sociais para a formação crítica do leitor a partir de uma recepção crítica do texto literário. Nos textos selecionados sobre a representação do negro, verificamos como a estética pode estar relacionada a estigmas atribuídos à cultura afro-brasileira, a exemplo da visão reducionista de sua cultura, comumente associada ao ritmo, musicalidade e linguagem peculiares; ainda assim, pode-se, desta abordagem, inferir noções não apenas de intertextualidade estética, mas também de interculturalidade, pois exige reflexões sociais de como os negros são representados no texto literário. Nesse sentido, ao se formar o leitor crítico por um ponto de vista cultural, opta-se por desenvolver a criticidade que se caracteriza pela participação ativa do leitor no processo de construção do sentido da obra literária. O leitor cultural não se prende, portanto, à compreensão do significado pretendido pelo autor (emissor), mas vai além, pois reage, questiona, problematiza, aprecia com criticidade. Sendo assim, partindo da concepção de que a literatura – pautada num ensino que priorize a leitura do texto – é um dos caminhos mais viáveis para se despertar no aluno uma consciência crítica do mundo em que vive, e, portanto, para formar um leitor apto a interagir com o outro e com outras leituras, investigamos, em escolas públicas de ensino médio localizadas na cidade de Itabaiana/SE 1, como se dão as práticas de leitura e de ensino de literatura. A ideia foi investigar por meio de questionário aplicado a alunos do ensino médio se, nesse município, o ensino de literatura é orientado tão somente pela historiografia literária, conforme as pesquisas de Cereja (2005), Rildo Cosson (2006) e Lígia Chiappini (2005) apontam, ou se já há uma inovação no sentido de que a leitura do texto literário seja pauta de ensino. Como corpus de amostragem, escolhemos quatro escolas, dentre as quais duas são da rede estadual de ensino e duas da rede particular. Como no município há mais que o dobro das escolas onde foram aplicados os questionários, o critério de seleção fora o de maior e menor tempo de prestação dos serviços educacionais, de modo que foram selecionadas a primeira e a última escola a implantar o ensino médio tanto da rede pública como da rede privada.. 1. O critério de escolha do município foi a proximidade, já que o autor da pesquisa mora nesse município..

(17) 17. Os questionários foram aplicados em turmas de 1ª e 3ª séries do ensino médio de cada escola, perfazendo um total de 329 questionários distribuídos em 8 turmas. De cada escola escolhemos uma turma de 1ª série e uma de 3ª. O questionário foi dividido em duas partes. A primeira versou sobre questões relacionadas à prática de leitura dos alunos e a segunda, sobre o ensino de literatura praticado em suas classes. Este trabalho é estruturado da seguinte forma: No primeiro capítulo, levantamos, de forma teórica, algumas concepções de leitura, de leitura literária e de leitor. Como veremos, a pesquisa bibliográfica foi de fundamental importância para investigar, na literatura sobre leitura, concepções de leitor e de leitura e como essas concepções têm-se apresentado enquanto modelos a serem seguidos quando se analisam textos literários, por exemplo. Os pontos fundamentais que discutimos são: a importância que a leitura exerce na vida escolar e social do aluno, a plurissignificação do texto literário e, por correlação, a atuação do leitor no ato da leitura. Nesse sentido, os postulados da estética da recepção foram de extrema importância para discutirmos o papel ativo que o leitor pode exercer. O segundo capítulo é dedicado a investigar sobre o que têm dito os teóricos a respeito do ensino de literatura. De forma geral, podemos antecipar que o ensino de literatura, de acordo com os estudiosos dessa área, tem-se pautado na historiografia literária. Os dados que obtivemos2 nas escolas onde aplicamos os questionários também confirmam essa conclusão, contudo, com a ressalva de que, de acordo com o percentual de respostas dadas às questões que versam sobre o assunto, o texto também já está presente nas aulas, mas ainda de forma incipiente e não satisfatória. O último capítulo terá como objetivo aplicar uma proposta de leitura de poemas de Jorge de Lima para debatermos as questões relacionadas à representação do negro na literatura. Pelo tipo de abordagem que adotamos, defendemos a ideia de que a leitura de textos literários pode flexibilizar as “verdades” levadas para o convívio social pelos alunos que saem da educação básica e pode tornar possível novos horizontes em sua visão de mundo. Para tanto, os poemas “Retreta do Vinte”, “Banguê” e “Foi mudando, mudando” servirão como objeto de análise e suas leituras serão feitas levando em conta os aspectos estéticos e culturais neles presentes. Como já dissemos, para essas análises, tomaremos os postulados dos estudos culturais por acreditarmos serem os que mais nos proporcionam uma flexibilidade de discussão, sem precisarmos nos prender a algum paradigma como verdade única. Afinal, em educação, não podemos nos prender a algo fixo, pois o ser humano sempre pode mudar.. 2. A análise das respostas dadas aos questionários estão no apêndice B..

(18) 18. 1 – DA LEITURA AO LEITOR Acostumado com a linguagem verbal apenas na forma oral, ao entrar na escola, o aluno se depara com uma comunicação diferente e passa a enfrentar uma nova realidade: a partir de então, desenvolver as habilidades de ler e escrever será prioridade. Afinal, a atividade da leitura estará presente em toda sua vida estudantil nos mais diversos níveis educacionais. A própria escola por vezes negligencia a expressão oral para trabalhar tão somente a comunicação em sua forma representativa por meio da leitura e da escrita. A leitura é tão imprescindível para a educação que seria impossível conceber uma escola onde essa atividade não estivesse presente. Isso porque o patrimônio histórico, cultural e científico da humanidade está registrado em livros, e a escola, como sua transmissora, precisa se utilizar de ferramentas que tornem possível o acesso, visando ao conhecimento e à utilização desse patrimônio por parte das novas gerações. Entendida como instrumento de acesso à cultura e de aquisição de novas experiências, a leitura pode também ser considerada como fonte de conhecimento e instrumento da ação educativa. Já que, na escola, não concebemos uma transmissão oral do conhecimento, como acontecia nas sociedades primitivas, é por meio dos livros e, portanto, da leitura, que temos acesso a ele. Apesar de sua importância ser patente no cenário educacional e social, o ensino da leitura “parece ser realizado ao acaso, fazendo com que os professores ajam através do ensaio-e-erro quando da abordagem de materiais escritos junto a seus alunos” (SILVA, 2005, p. 33). Vale dizer que os materiais de apoio ao professor, no que se refere à leitura, quase sempre são superficiais e pouco ilustrativos. Como a leitura está ou deveria estar presente em todas as disciplinas da escola, o professor, de qualquer uma delas, torna-se ou deveria tornar-se um orientador de leitura, com a ressalva de que, a depender da disciplina, é claro, a abordagem de leitura passa a ser diferente para se chegar ao significado e atingir os objetivos pretendidos. Contudo, a responsabilidade pela orientação da leitura e pela formação do aluno leitor geralmente não recai sobre todo o corpo docente da escola, como se devia esperar, mas apenas nos alfabetizadores e nos chamados professores de Português. Assim, se o aluno não aprende a ler e se existe uma crise de leitura3, como demonstram os resultados de programas 3. Como foi afirmado na introdução, em 2006, os resultados do PISA demonstraram que o nível de compreensão textual dos alunos brasileiros está entre os piores do mundo. Em 2009, o resultado apontou para uma leve melhoria, mas ainda é muito deficiente..

(19) 19. que avaliam o nível de compreensão textual dos alunos brasileiros, quem leva a culpa é o professor de Língua Portuguesa que não preparou seu aluno no que é básico do ensino: a leitura. 1.1 – Por que insistir em leitura É evidente que sem a leitura, a literatura ou qualquer outra disciplina não pode ir bem. A falta de preparo dos professores em lidar com um tipo de formação que prepare o aluno em leitura tem sido uma das principais dificuldades no ensino. E esse despreparo vai além de limitações conteudistas dos educadores. De acordo com Silva (2005), “são raras as faculdades ou universidades brasileiras que oferecem cursos na área de Psicologia e/ou Metodologia da leitura” (p. 34). Essa temática se resume aos métodos de alfabetização em que são preparados os futuros professores das séries iniciais da educação básica. Diante dessas circunstâncias, fica parecendo que, para ler, é necessário apenas o processo de decodificação do texto escrito. Os processos referenciais e de produção de sentido por parte do leitor ficam esquecidos durante sua formação. Tal competência seria uma habilidade individual e por isso a instigação desses processos seria desnecessária. Nesse sentido, se considerarmos que a leitura é apenas a decifração do código, bastaria, então, o processo inicial de alfabetização e tudo estaria resolvido. É evidente, pois, que, para haver desenvolvimento na leitura, o aluno deve passar pelo processo de alfabetização, todavia a aprendizagem da leitura não deve parar aí. Para haver continuidade à iniciação em leitura, é preciso uma orientação no momento pósalfabetização. É surpreendente como, mesmo nas faculdades de Letras, a problemática da leitura é esquecida. Na maior parte do tempo, a preocupação com as diversas teorias, que devem ser passadas aos futuros professores, deixa pouco espaço para a leitura de obras literárias, por exemplo. Para se somar a essa falta de incentivo e instigação à leitura, contemporaneamente, o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos meios de comunicação de massa baseados na imagem e na linguagem oral tem contribuído significativamente para uma mudança na situação e função da leitura. De acordo com Alliende e Condemarin (1987), a reprodução mecânica da imagem (...) tira da leitura o privilégio de ser o meio cultural preponderante e quase exclusivo da informação e da difusão cultural. Esta mudança tem efeitos curiosos: nos países desenvolvidos, os novos meios incrementam a leitura; nos países menos desenvolvidos esta entra em crise (p. 14).. E a crise se manifesta tanto na escola como fora dela, pois o hábito de leitura de.

(20) 20. livros, especialmente literários e científicos, decresce visivelmente. Entretanto, as razões dessa crise são muitas e nem todas podem ser atribuídas ao aparecimento dos meios de comunicação de massa. Influi, por exemplo, a complexidade da vida econômica dos países, que exige grandes mercados para tornar rentável a indústria editorial. Assim, para defendermos a leitura como meio fundamental de transmissão do saber, precisamos nos apegar às suas vantagens sobre os outros meios de comunicação. Ao comparar a outros meios de comunicação baseados na imagem ou na linguagem oral, Alliende e Condemarin (1987, p. 15-16) enumeram algumas características que se sobrepõem aos outros meios de comunicação: a) Na leitura prevalece a liberdade, isto é, o leitor é livre para escolher o tipo de leitura que lhe interessa, o tempo e o lugar para a leitura, enquanto nos outros meios de comunicação prevalece a imposição, uma vez que o rádio e a televisão, por exemplo, oferecem programação limitada e muitas vezes atendem a critérios comerciais e com horários pré-estabelecidos, além de seu material ser apresentado de forma simplificada, próprio do consumo de massas, e não permitir a satisfação das necessidades pessoais; b) Na leitura, cada leitor segue seu próprio ritmo, sendo possível uma maior flexibilidade para se atingirem os objetivos pretendidos, enquanto na TV ou no rádio, por exemplo, a programação segue ininterruptamente sem dar a chance de o receptor parar para pensar, voltar atrás, saltar pedaços que considere óbvios ou insignificantes; c) A leitura, ao estimular o pensamento e a criatividade, permite ao leitor adotar uma posição crítica perante a informação recebida, uma vez que há a opção de participar ativamente para compreender o texto, o que é menos provável nos outros meios de comunicação. Além disso, a leitura possibilita uma maior assimilação de informações de forma organizada, já que o texto está disponível para ser relido. No mesmo direcionamento, Lisboa (1977) expõe que os chamados audiovisuais comunicam num tempo limitado, enquanto a letra impressa está sempre disponível. Além disso, esta dispõe de uma credibilidade de documento, podendo ser consultada, exibida e guardada. Depois o escrito é procurado pelos que o consomem, enquanto a comunicação audiovisual nos chega como uma visita (LISBOA, 1977, p. 41).. Além de tornar possível o acesso a experiências diversificadas, a leitura coloca o ser humano num lugar privilegiado, uma vez que pode usufruir os mais diversos bens culturais cujo meio de transmissão é a escrita. Não que outros meios, como rádio, televisão, cinema, não possam transmitir tais bens, ao contrário, “se forem repensados e reformulados seus processos e conteúdos, de modo a facilitar a conscientização das massas, esses meios podem contribuir para a evolução da sociedade” (SILVA, 2005, p. 39). A grande problemática de tais.

(21) 21. meios de comunicação de massa, principalmente quando falamos do caso brasileiro, é a subserviência às elites dominantes, as quais impõem e reforçam a ideologia que melhor lhes convém. Vale ressaltar que a mensagem passada por esses meios de comunicação chega unidirecionalmente e o telespectador ou ouvinte não colabora com as informações transmitidas. Sua percepção segue a percepção de quem a produziu ou editou aquilo que achou mais importante. Nesse caso, a participação do receptor, na maioria das vezes, significa mera deglutição, mera recepção passiva. No questionário aplicado em escolas públicas e particulares da cidade de Itabaiana/SE, solicitamos que os alunos respondessem, em uma de suas questões, se costumam acompanhar ou usufruir histórias ficcionais que não usam diretamente a escrita como meio de transmissão, tais como novela, filme, cinema, teatro etc.. Do total de 329 alunos entrevistados, 85,45% responderam afirmativamente. Desse montante, a maior parte ficou reservada para filmes e novelas, já que são meios mais acessíveis. As opções cinema e teatro são as menos indicadas, não porque não gostem, como afirmam alguns alunos, mas pela dificuldade de acesso. Vale ressaltar que na cidade não há cinema nem teatro. Se alguém quiser usufruir esses meios tem que se deslocar para a capital do Estado, que fica a 56 quilômetros do município. Mesmo assim, a opção teatro é muito limitada. Ao nos depararmos com esses resultados, não vemos problema algum no fato de a comunidade escolar estar ou não assistindo a novelas e filmes. Entretanto, essa se torna uma prática indesejável na medida em que não haja um “filtro” que separe informações e condutas que podem ser úteis ou não socialmente ou afaste o jovem aprendiz dos livros, da leitura. A recepção crítica das informações veiculadas por esses meios de comunicação deve fazer o diferencial. Se isso não acontece, caímos no risco da “imitação barata” de condutas que tendem para a homogeneização dos gostos sociais e culturais, um risco, portanto, para uma boa convivência com as diferenças. Para uma sociedade que tem em sua constituição o estatuto da democracia e o respeito às diferenças, em nada contribui a homogeneização, o nivelamento cultural, a padronização de experiências, ao contrário, torna-se um entrave ao surgimento de comunicações propulsoras de novos significados. Nesse sentido, a aquisição de conhecimento e de novas informações por meio de leituras variadas instiga o diálogo e o surgimento de comunicações mais autênticas, tornando-se assim a leitura uma forma de participação mais crítica e ativa da comunicação humana (cf. SILVA, 2005, p. 41). O que torna a leitura um instrumento de trabalho muito eficiente na educação é a sua capacidade de desenvolver no aluno uma participação ativa no processo de comunicação. A.

(22) 22. expressão “lê as entrelinhas” quer significar justamente que a leitura não se resume a aquilo que mais objetivamente podemos entender a partir do escrito, mas que, como produção humana, reflete o que é humano e por isso direciona para o que está implícito, para o que se pode depreender a partir da leitura do texto. O leitor aqui assume um papel importantíssimo, uma vez que não se fecha em sua casa para recepcionar tão somente a informação, mas constrói um significado junto com o autor do texto. Na educação, a leitura é uma atividade sem a qual não se pode ter acesso aos mais diversos conhecimentos acadêmicos, tornando-se, assim, essencial à própria vida do ser humano, já que o patrimônio simbólico da humanidade está registrado na forma escrita. Nesse sentido, além de estar ligada ao sucesso escolar do aprendiz, serve como instrumento que permite ao ser humano dialogar com os outros para chegar a uma práxis. Como recurso de que o professor pode se utilizar, a leitura contribui para questionar e discutir sobre os processos de massificação cultural executados por outros meios de comunicação. O livro – não importa se impresso ou eletrônico – ainda continua sendo o meio mais importante para a criação, transmissão e transformação culturais. É por meio dele e, portanto, da leitura, que se adquirem diferentes pontos de vista, alargam-se as experiências e se desenvolvem a originalidade e a autenticidade do ser aprendiz (cf. SILVA, 2005, p. 42-43). Mesmo que reconheçamos a importância das teorias que relacionam os mecanismos de funcionamento do cérebro ao processo de leitura, como a neurociência, a psicolinguística etc., ao se falar de educação, não devemos fugir nunca às suas características estritamente humanas. Muitas vezes tais ciências apresentam a leitura mais caracterizada como um fenômeno físico que pode ser observado com aparelhos em laboratório do que como um evento ligado à esfera humana. Ao executar o ato de ler, o leitor põe em ação a atividade de compreensão do mundo, afinal ler é antes de tudo compreender o mundo, ler o mundo, como afirmava Paulo Freire. Sendo assim, não basta ao leitor decodificar os signos escritos, pois a leitura não deve ser confundida com decodificação de signos ou símbolos linguísticos, com respostas mecânicas a estímulos escritos tão somente. Ao contrário, a ato de ler deve sempre envolver apreensão, apropriação e transformação de significados4. Por isso, o leitor, diante do texto, pode transformá-lo e transformar a si mesmo por meio do texto. Na verdade, o propósito inicial de 4. De acordo com os conceitos de Silva (2005), podemos considerar a apreensão como a primeira fase da leitura, que consiste em apreender os “significados mediatizados ou fixados pelo discurso escrito, ou seja, a compreensão dos horizontes inscritos por um determinado autor, numa determinada obra” (p. 44). Tendo vencido essa etapa, o leitor passa a apropriar-se do discurso a fim de transformá-lo. Vejamos que o intuito não é reproduzir o discurso, mas, de posse dele, atribuir-lhe novo significado a partir da participação ativa do leitor..

(23) 23. qualquer leitura é a apreensão dos significados apresentados pelo discurso escrito, porém, para os inquietos, a leitura não para aí. O leitor cuidadoso e interessado sempre se posicionará em constante conflito com o texto. Tal conflito vem representado pelo anseio incontido de compreender, de concordar, de discordar, enfim, pela necessidade de não somente captar o objeto da leitura, como também de transmitir ao texto lido as marcas de sua experiência humana e intelectual. Para resumir, Silva (2005) coloca que os objetivos primordiais da leitura são “compreender a mensagem, compreender-se na mensagem, compreender-se pela mensagem” (p. 45). Tais propósitos, diz ele, ultrapassam quaisquer aspectos utilitaristas, ou meramente “livrescos”, da comunicação leitor-texto. Ler é, em última instância, não só uma ponte para a tomada de consciência, mas também um modo de existir no qual o indivíduo compreende e interpreta a expressão registrada pela escrita e passa a compreender-se no mundo (SILVA, 2005, p. 45).. Assim sendo, ao escrever, impõe-se no escrito um valor expressivo que documenta a vida. E, através de seu corolário – a recepção – procura-se compreender e dar sentido ao que foi documentado. Ao simbolizar, no ato de escrever, permite-se ao autor compartilhar com os outros as experiências percebidas, sentidas, vividas ou criadas; ao interpretar, no ato da leitura, degusta-se aquilo que o outro viu, sentiu, viveu ou imaginou. Afinal, a mensagem, enquanto manifestação expressiva de um sujeito, traz consigo um significado gerado pelo diálogo desse sujeito com o mundo e, por que não dizer, com o leitor. A escola tem um papel fundamental no processo de assimilação de tais experiências por parte do aluno leitor. Por isso, ao proporcionar diferentes formas de compreender o discurso escrito, deveria ensinar novas formas de ler os horizontes da cultura. Por meio do texto literário, por exemplo, em qualquer de suas formas de manifestação, a escola aumentaria as possibilidades de o aluno conhecer o outro e de conhecer a si mesmo, ampliaria suas alternativas de ver o mundo e lhe permitiria a entrada e participação no mundo da escrita. (cf. SILVA, 2005, p. 66-67). A leitura tornar-se-ia assim um instrumento de participação e renovação cultural. Ao apresentar tais discussões teóricas, deparamo-nos com outras bem mais problemáticas, mas agora de cunho prático. O grande questionamento é se a escola está cumprindo seu papel de transmitir aos alunos o patrimônio simbólico da humanidade e, mais especificamente, a herança cultural chamada leitura, entendida em seu sentido mais amplo possível; ou até que ponto o aluno que sai da educação básica se torna um estudante independente com a autonomia de pelo menos perceber e questionar as informações que lhe.

(24) 24. chegam e tentam manipulá-lo para a homogeneização intelectual e cultural. Como já foi afirmado na introdução, tentamos, nesta pesquisa, obter algumas respostas para tais questionamentos. Se a escola já cumpre esse papel, a grande dificuldade é entender porque a maior parte dos jovens em idade escolar não se sai bem em provas que avaliam o desempenho em leitura.. 1.2 – Abrangência da leitura Sempre tendo em vista a prática de ensino de literatura e, por correlação, a de leitura, defendemos que essa pode ser uma das possíveis formas mais eficientes de aprendizagem da língua materna e, além disso, meio pelo qual o aluno tem acesso à educação, ao saber e à cultura. Sendo assim, a leitura é indispensável à sociedade. Indissociável da leitura está a escrita, que nem sempre foi tão valorizada como na modernidade. Segundo Zilberman (2005), Platão defendia que, se difundida, poderia acarretar a preguiça intelectual e a perda da memória. É claro que aqueles tempos eram outros e não estamos aptos a pensar daquela forma, seja pela necessidade que temos dela, seja pela imersão de nossos comportamentos em uma cultura voltada para o registro de tudo que construímos. Tal prática nos leva a encarar que sua função não termina em si mesma, tendo em vista que, sem a leitura, nada se transmite para as gerações futuras. Essas duas práticas – leitura e escrita – estão intrinsecamente ligadas, não podendo a escrita subsistir sem a leitura e vice versa. Enquanto prática, a leitura associa-se desde seu aparecimento à difusão da escrita. Escrever e ler são atos que se complementam: é impossível um existir na ausência do outro. De acordo com Silva (2005), “o ato de ler envolve uma direção da consciência para a expressão referencial escrita, capaz de gerar pensamento e doação de significado” (p. 64). Nesse sentido, ainda de acordo com ele, a leitura, ao permitir a entrada e a participação no mundo da escrita, torna-se um meio de participação do ser humano nas sociedades letradas; a experiência dos produtos culturais manifestados por meio da escrita só é possível pela existência da leitura e, portanto, de leitores. Daí sua importância na escola, já que essa é, ou pelo menos deve ser, o ambiente de desenvolvimento e transmissão do saber. Colocada na base da educação, a leitura se tornou o componente de democratização da mesma. Entretanto, muitas vezes seu valor se resume como prática indispensável à ascensão social cujo ponto de chegada é a realização pessoal e econômica. Outras vezes como forma de lazer e de prazer, de aquisição de conhecimentos e de enriquecimento cultural, de.

(25) 25. ampliação das condições de convívio social e de interação. A forma de conceber o valor da leitura se diferencia a depender da classe social. Segundo Soares (2005), as classes dominantes veem a leitura como fruição, lazer, ampliação de horizontes, de conhecimentos e de experiências, já as classes dominadas a veem como instrumento necessário à sobrevivência, ao acesso ao mundo do trabalho, à luta contra suas condições de vida, em suma, é avaliada em função de interesses utilitários. Dada sua importância, a leitura é uma prática indispensável à educação, pois é por meio dos textos que o conhecimento é passado para as gerações mais novas. Entretanto, dependendo da forma como é aplicada, pode não trazer resultados eficientes, capazes de tornar o leitor independente em sua vida estudantil e intelectual. Por isso tentaremos entendêla de uma forma mais ampla e depois passaremos a analisar como se dá a leitura literária, interesse maior de nosso estudo. Compreendemos que ler não significa apenas ver as letras do alfabeto e juntá-las em palavras, mas estudar a escrita, decifrar e interpretar o sentido, reconhecer e perceber as relações semânticas existentes, inclusive dialogando com outros textos. A aprendizagem da leitura sempre se apresenta intencionalmente como algo mágico, senão enquanto ato, enquanto processo da descoberta de um universo desconhecido e maravilhoso. O aprendizado da leitura, aparentemente um ato solitário, só se desenvolve na convivência com os outros e com o mundo. Sendo assim, a leitura é, acima de tudo, um ato social que se constitui numa forma de interação entre as pessoas. Segundo Soares (2005), a leitura não é esse ato solitário; é interação verbal entre indivíduos, e indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; entre os dois: enunciação; diálogo? Enunciação é, portanto, processo de natureza social, não individual, vinculado às condições de comunicação que, por sua vez, vinculam-se às estruturas sociais – o social determinando a leitura e constituindo seu significado (p. 18).. Para Nunes (1994), a leitura é ao mesmo tempo uma atividade individual e social. Individual porque nela se manifestam características intelectuais, memória e história do leitor, e social porque está sujeita às convenções linguísticas, ao contexto social e à política. Enquanto atividade individual ou cognitiva, em que se focaliza a atividade intelectual do leitor, o leitor se esforça para criar o sentido de um texto. Do outro ponto de vista, a leitura é um ato social entre dois sujeitos – leitor e autor – que interagem entre si obedecendo a objetivos e necessidades socialmente determinados. Para isso, o leitor terá de utilizar seu conhecimento prévio – conhecimento linguístico, textual, enciclopédico, enfim, o conjunto de.

(26) 26. normas sociais, históricas, culturais – que é ativado na leitura. Por não ser apenas um ato solitário e individual, a leitura coloca-se como um meio de aproximação entre os indivíduos e a produção cultural, podendo significar a possibilidade concreta de acesso ao conhecimento e desenvolvimento do poder de crítica por parte do leitor. Ressaltamos ainda que não podemos analisar um texto como uma sequência linguística fechada sobre si mesma, é preciso referi-lo ao conjunto de discursos possíveis a partir de um estado definido das condições de produção desse texto. Orlandi (1988) coloca que é preciso que se atente para as condições de produção de um texto, tendo em vista que a leitura é produzida pelo leitor e não dada pelo autor. Assim, na leitura de um texto pode haver muitos pontos de entrada, correspondendo a múltiplas posições do sujeito-leitor no percurso da atribuição de sentidos, pois a leitura se faz em espaços discursivos em que estão em jogo a historicidade do texto e a do sujeito-leitor. Por isso a progressão da leitura não se efetiva de forma linear, ao contrário, caminha dispersa e em diversas direções. Quando se trata de leitura literária, precisamos ter maior atenção, tendo em vista que o texto literário é aberto a diversas possibilidades de leituras. De acordo com Turchi e Silva (2006), a obra literária é portadora de informações, ideias, sentimentos e, acima de tudo, de questões sobre o homem e o mundo, que provocam o leitor, e esse, por sua vez, no ato de ler, responde, à sua maneira, às indagações que recebe e formula novas questões, em um movimento de diálogo constante. Assim, para que a literatura se realize, o leitor é tão importante quanto o texto e o autor. O texto, em si, realmente não passa de uma série de dicas para o leitor, convites para que ele dê sentido a um trecho de linguagem. Na terminologia da teoria da recepção, o leitor “concretiza” a obra literária, que em si mesma não passa de uma cadeia de marcas negras organizadas numa página (EAGLETON, 1997, p. 105).. E por mais sólida que seja, a obra literária é cheia de indeterminações, elementos que, para terem efeitos, dependem da interpretação do leitor, e que podem ser interpretados de várias maneiras, podendo ser até conflitantes entre si. Aqui cabem algumas perguntas: Num texto literário vale toda e qualquer interpretação feita pelo leitor? E de que instância procede o sentido que um texto literário pode oferecer: do autor, do leitor, do próprio texto ou de todos eles? Para Jauss (2001), diante do texto ficcional, o leitor é forçosamente convidado a se comportar como um estrangeiro, que a todo instante se pergunta se a formação de sentido que está fazendo é adequada à leitura que está cumprindo. Isso ocorre porque a obra literária é.

(27) 27. simbólica e permite leituras plurais, dando-se a interpretação sempre de um modo novo, pelas possibilidades de combinações de signos. Por essas vias, o leitor pode ter suas expectativas atendidas ou contrariadas em maior ou menor grau. Mas o certo é que ele não continuará o mesmo depois da leitura, uma vez que seu horizonte estará modificado pela interação com o texto. Nesse sentido, o receptor precisa ser um elemento ativo no processo de leitura, solidarizando-se com o autor e completando seu trabalho de criação. Assim, o livro adquire sentido e interfere nas relações humanas em todas as situações. Se o texto ficcional possibilita uma multiplicidade de comunicações, como, então, declarar que algumas interpretações são “corretas” e outras meros produtos da projeção do leitor? Sobre isso, Jauss comenta os argumentos de outro teórico: Iser enfatiza a necessidade de o texto ficcional conter “complexos de controle” que orientem o processo da comunicação. O próprio destes complexos é tanto orientar a leitura quanto exigir do leitor sair de sua “casa” e se prestar a uma vivência no estrangeiro (2001, p. 24).. A estrutura do texto tem, portanto, um papel de regulação da leitura implicitamente oferecendo os critérios de distinção entre a pura recepção projetiva, a leitura condenada, e a leitura constitutiva de um sentido apropriado. A obra existe apenas como direções gerais, que o leitor deve tornar realidade. Por isso, ele abordará a obra com certos pré-entendimentos, um vago contexto de crenças e expectativas dentro do qual as várias características da obra serão avaliadas. Entretanto, no ato da leitura, o leitor deve estar aberto, preparado para questionar as próprias crenças e deixar que sejam modificadas, pois “um leitor com fortes compromissos ideológicos provavelmente será um leitor inadequado, já que tem menos probabilidade de estar aberto aos poderes transformativos das obras literárias” (EAGLETON, 1997, p. 95). As indeterminações textuais, que aparecem no texto literário, estimulam o leitor a aboli-las, substituí-las por um significado estável. Contudo, o leitor se empenha tanto em lutar com o texto quanto em interpretá-lo, esforçando-se para fixar o seu potencial polissêmico, anárquico em sua estrutura controlável. Sendo assim, permite-se ao leitor uma boa margem de liberdade, entretanto não é livre para interpretar como quiser. Para que uma interpretação tenha relação com o texto que está sendo lido e não com outro, deve ser logicamente limitada pelo próprio texto, que exerce um certo grau de determinação sobre as reações do leitor, característica sem a qual a crítica cairia numa anarquia total. Não temos dúvida, portanto, de que é preciso uma atuação do leitor no momento da leitura literária, mas, considerando a característica da literatura de possibilitar a polissemia, podemos nos perguntar novamente se o sentido que atribuímos a um texto literário decorre da.

(28) 28. intenção do autor que o imprimiu no texto, do próprio texto, que diz por si mesmo, ou do leitor, que pode interpretar o texto de acordo com suas condições emocionais, intelectuais, sociais e culturais. Essa discussão será feita no item 1.4. No próximo tópico contextualizamos a saída do anonimato do leitor para uma posição de destaque no que se refere à sua atuação no ato da leitura e da produção de sentido do texto literário.. 1.3 – Da passividade à atuação do leitor Muito se tem estudado sobre os elementos que envolvem a leitura, tais como o autor, o texto e o leitor. Ora destacando-se o valor do autor (historicismo), ora do texto (formalismo), o leitor vinha ficando fora dessa discussão e sua exclusão foi mais clara e expressamente formulada pelos New Critics americanos do entreguerras. Tal formulação defendia a obra literária como unidade autossuficiente, da qual convinha praticar uma leitura fechada, ou seja, “uma leitura idealmente objetiva, descritiva, atenta aos paradoxos, às ambigüidades, às tensões, fazendo do poema um sistema fechado e estável” (COMPAGNON, 2001, p. 140-141). O leitor vem a ser reconhecido pela teoria literária (marcada pelo estruturalismo), mas ainda como um leitor empírico, abstrato, perfeito, cuja função é apenas descrever as imposições textuais objetivas que regulam o desempenho do leitor concreto, conformando-se com o que o texto espera dele e cujo objetivo é fazer uma leitura ideal, isto é, uma leitura que tenha como função decodificar a estrutura textual e sua relação com o significado da obra literária. Seu valor passa a ser reconhecido pela estética da recepção como elemento indispensável no ato da leitura. A partir daí, ele passa a ser passivo e ativo ao mesmo tempo. O objeto da leitura é a própria interação do texto com o leitor e o sentido deve ser o produto da interação entre os sinais textuais e os atos de compreensão do leitor. O leitor passou a ser, para alguns teóricos, aquele que cria o texto e, sendo assim, o autor teria sua importância tão somente enquanto autor, mas seria banido, por sua irrelevância, na construção do sentido da obra. Partindo desses pressupostos, tentaremos descrever como se efetivou a passagem do anonimato do leitor de textos literários para a importância reconhecida atualmente. De início, devemos considerar em que consiste a corrente teórica denominada estruturalismo, de onde partimos, para só então verificarmos os avanços da atuação do leitor ou pelo menos sua.

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