• Nenhum resultado encontrado

Ação política: manifestações legítimas ou atos de violência?

3 CONSTRUINDO OBJETOS DE DISCURSO EM MEIO AO EMBATE DE IDEIAS:

5.2 Análise das cadeias referenciais no debate entre Josué Rocha e Arthur do Val

5.2.1 Ação política: manifestações legítimas ou atos de violência?

Na contextualização apresentada no primeiro capítulo deste trabalho mostramos que, após a votação no Senado pelo impeachment de Dilma Rousseff, uma série de atos políticos foi observada no país ao longo de vários dias. Vejamos como, no debate realizado no décimo dia após a consumação do processo, esses eventos são discursivamente construídos por meio das estratégias de referenciação. Vale lembrar que nosso foco é mapear as estratégias de refocalização e de alteração referencial, e que os casos de anáfora nominal por repetição

lexical e sinonímia serão considerados quando necessários para a compreensão da formação das cadeias referenciais.

Vejamos os seguintes trechos:

xviii. FC - Os convidados de hoje são o Josué Rocha que é coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto e o Arthur do Val que é representante do Movimento Brasil Livre... a ideia aqui é a gente falar um pouco sobre:: os desdobramentos aí do processo de impeachment né e agora... esse::s eventos aí (46) - as manifestações que vem tomando as ruas do Brasil (47) né - várias capitais PRINcipalmente aqui em São Paulo né - há dez dias tem manifestações aqui na capital paulista (...)

xix. JR - acho que - Canzian - é importante pra começar... até se me permite... não acredito que as manifestações de agora (48) são manifestações dos perdedores... né... são manifestações muito expressivas (49) em várias cidades do país... a gente tem até dificuldade de enumerar... porque todos os dias têm novas manifestações... e é de fato... éh... a população saindo as ruas (50) porque TÁ indignada com a maneira como foi conduzido o impeachment... né... e tá indignada também com esse governo temer que já chega com uma série de propostas muito impopulares... (...) e esse movimento (51) não vai parar... né a gente... sabe que a insatisfação é muito grande...

No trecho (xviii), o objeto de discurso manifestações é ativado primeiro por meio da descrição definida (47), formada por um núcleo nominal e uma oração relativa com função de modificador. O modificador avaliador corrobora a percepção de que as manifestações são numerosas e expressivas. Esse movimento também representa a instauração do tópico, que é, de acordo com FC, a ideia que deveria nortear a discussão no debate. Antes da ativação do objeto de discurso, há uma descrição definida com função catafórica (46) que denomina como

eventos essa série de manifestações.

Por meio do encadeamento referencial adotado por JR em seu primeiro turno de fala, vemos que ele acata inicialmente a proposta do debate e permite a continuidade tópica. Em (48), ocorre o emprego de uma descrição definida cujo adjunto modificador tem a função de selecionar um recorte temporal das manifestações. Há ainda no predicativo uma retomada por meio de nominalização do turno de fala de FC, que havia afirmado que o lado perdedor estava se organizando em manifestações. Em seguida, mais uma descrição definida (49) opera sobre o objeto de discurso ao direcionar a atenção para o aspecto de expressividade das manifestações que ocorriam após o afastamento de Dilma Rousseff.

Em (50), há um caso de anáfora indireta com forte orientação argumentativa. O objeto de discurso está ancorado na percepção de que manifestações são constituídas de

manifestantes, mas esses manifestantes emergem categorizados pela hipérbole população, que

busca desviar a atenção do caráter polarizado da sociedade e evidencia uma grande união em torno das ideias defendidas na manifestação. Essas ideias seriam a indignação contra o

retoma esse referente pelo sinônimo o povo, amplamente evocado no campo político de ambos os lados do espectro. Há também, mais a frente, o uso de uma retomada por meio da descrição definida (51) para atentar para o caráter espontâneo e contínuo das manifestações “de agora”.

Pelas escolhas lexicais observadas nas expressões referenciais (49), (50) e (51), já é possível identificar que o projeto de dizer de JR busca legitimar esse objeto de discurso. AV, por sua vez, em seu turno de fala opera uma separação entre as manifestações de rua e outros tipos de ação política. Ambos estão cognitivamente associados (inferíveis devido ao conhecimento supostamente partilhado entre os interlocutores) e ancorados no referente

manifestações. Vejamos o trecho (xx):

xx. AV - então... é... a gente... primeiro eu queria agradecer a vocês a presença... poder / poder tá aqui conversando com vocês... a gente do MBL a gente acredita que é o seguinte... as manifestações de rua (52) elas são algo extremamente genuíno são coisas que / que devem ser levadas a sério... inclusive eu pessoalmente acredito que essa é uma forma de se manifestar MUIto mais válida do que invasões ou travamento de avenidas como o... o MTST faz (53)... então eu acredito que as manifestações de rua... como sempre têm aquele pessoal que fala 'não essa manifestação é minha não ESSA manifestação é minha'... e eu acredito que que as coisas não são bem assim... eu acho que as manifestações que tão acontecendo hoje(54)... elas não são exclusivas do MTST (...)

xxi. JR - [acho que... Artur... tem uma questão que a gente não pode negar... você citou números aí... a:: a popularidade do Temer reflete a insatisfação que tá nas ruas (55) né... as pesquisas demonstram que é um governo extremamente impopular...

Em (52), ocorre uma repetição lexical não cossignificativa, que tem a função de ampliar o foco das manifestações de rua para todos os eventos do tipo e não apenas para as que estão acontecendo no momento. Por meio dessa ampliação, AV parece ter interesse em iniciar seu projeto de dizer a partir de uma categorização ampla e neutra, em um caminho diferente do escolhido por JR para retomar o referente.

Os motivos dessa preferência começam a surgir em (53). Em nossa interpretação, o objeto que leva AV a evocar as manifestações de rua é a sua intenção em distingui-las, dentro da macrocategoria manifestações, de outros tipos “menos legítimos de manifestações”, as quais incluiriam os referentes introduzidos em (53). Parece se tratar de uma relação de associação do tipo classe/membro que se estabelece entre os referentes novos e o núcleo nominal do objeto de discurso em foco. Nesse caso, manifestações de rua, invasões ou travamentos seriam tipos de manifestação, mas a primeira se diferenciaria das demais pelo valor de legitimidade evidenciado pelo predicativo. O que veremos, na verdade, é que essa primeira estratégia de alteração referencial faz parte de um esforço para desmembrar certos

tipos de manifestações políticas do objeto de discurso em foco – manifestações – e realocá-las para uma nova categoria textualmente construída.

Ainda sobre (53), há duas escolhas de AV que devem ser levadas em consideração. A primeira é a opção lexical de forte carga semântica que introduz o primeiro referente (invasões). É difícil imaginar que um membro do MTST ou alguém simpático ao movimento introduzindo este objeto de discurso por meio do mesmo item, sendo muito mais provável o uso do termo mais utilizado pelo grupo para se referir a esse tipo de ato político – ocupações – ou de algum outro que não esteja associado a uma prática negativa. A segunda escolha relevante, por sua vez, é a expressão modificadora, que mostra o esforço de associar esses novos referentes às práticas correntes do MTST.

Em (54), há uma anáfora nominal que, de fato, retoma o objeto de discurso como focalizado anteriormente. Esse recurso mostra a complexidade cognitivo-discursiva da construção referencial, já que expressões referenciais classificadas pela mesma categoria - anáfora nominal – podem assumir funções textual-interativas bastante específicas e diferentes entre si. Nesse caso, há uma perspectivação conceptual que manipula a atenção sobre o evento por meio de uma mudança de foco. No caso de (54), é interessante notar que a retomada visa a apontar para perspectivas distintas das que foram apontadas por JR quanto ao impeachment e quanto ao pacote de reformas econômicas.

Já em (55), há o estabelecimento de uma relação indireta inferível a partir do conhecimento de mundo organizado: é sabido que manifestações são geralmente formadas por pessoas insatisfeitas com a conjuntura sócio-econômico-política de um país. Por meio dessa relação, JR evoca o elemento de insatisfação e assim trabalha para a construção desse objeto de discurso como um movimento popular que nasce das demandas e sentimentos da sociedade.

Até então, o que observamos no debate é uma exposição introdutória dos projetos de dizer de cada participante. A partir dos trechos (xxii), (xxiii) e (xiv), contudo, a polarização se evidencia com a imposição de AV sobre o que seria – ou não seria – uma manifestação legítima. Vejamos:

xxii. JR - [... com relação a essa citação do MTST eu só importante colocar... éh... a gente defende a organização dos trabalhadores... a gente é o movimento que organiza os trabalhadores que moram nas periferias das grandes cidades... né... isso que tá aí entre os nossos objetivos... mas a gente defende a luta dos trabalhadores pelos seus direitos (56)... e uma das maneiras dos trabalhadores se organizarem é lutando pra que seus direitos sejam assegurados inclusive pelo estado...

xxiii. AV - Olha eu acho muito / muito complicado essa palavra luta cara... mesmo porque ela pode ser interpretada de diversas maneiras... uma das maneiras que eu discordo totalmente é o jeito

como vocês interpretam luta... que é barrando rodovia... é barrando marginal é queimando pneu na marginal... é invadindo prédio privado(57) pra falar 'não... olha como a gente tá aqui chamando atenção'... eu não acho que você fazer de tudo pra chamar atenção seja válido... cê quer chamar atenção beleza você tem OUtros jeitos de chamar atenção... mesmo porque a gente vê nas ruas tantas pessoas se manifestando de maneira pacífica de maneira... até bonita (58)... falando pro / gritando pro governo o que é que a gente quer... o que acontece é o seguinte (...)

xxiv. [JR - Eu acho interessante essa discussão... eu queria voltar num ponto que você colocou que é em relação as opções de manifestação... que... que o movimento utiliza (59)... né... eu acho muito interessante colocar... isso... éh... porque o movimento ele se organiza a partir das suas próprias forças... das suas próprias articulações... e... a gente comparar por exemplo com as manifestações que foram chamadas no processo de impeachment (60) quando você tem convocação da mídia...

xxv. JR – [ ... nesse sentido é fácil e muito tranquilo fazer manifestações com apoio e a cobertura vinte e quatro horas por dia e a convocação da mídia (61)... né...

Após AV citar um trecho do site do MTST em seu turno de fala, JR dá continuidade ao tópico e fala dos objetivos do movimento em questão. Nesse contexto, ocorre a expressão referencial (56), que entendemos como mais um caso complexo de estratégia referencial. Isoladamente, essa expressão poderia indicar a introdução de um novo objeto de discurso, cujo núcleo nominal (luta) encapsularia toda a ação política organizada do grupo. Entretanto, analisando a estratégia (56) pelas necessidades argumentativas e pragmáticas da interação e pelo cotexto, que inclui a associação do MTST a certos tipos de manifestação (como ocorre na expressão referencial (53)), interpretamos que um caso como este pode assumir a função, neste texto, de descrição definida com o intuito de chamar a atenção do público para a necessidade dessas formas de ação política, na visão de JR. Nesse sentido, o núcleo nominal permanece encapsulando os tipos de ação política, mas está ancorado principalmente nos tipos já introduzidos no texto (manifestações de rua, invasões e travamentos de avenida), o que garante a manutenção referencial por meio de uma estratégia de refocalização que atribui o sentido de legitimidade aos referentes.

A escolha operada em (56), contudo, não é bem recebida por AV. Em (57), uma série de predicativos10 se apoiam no núcleo nominal luta para refocalizar aspectos dos tipos de ação política englobados por ele. As opções lexicais feitas em (57) formam uma anáfora nominal

10 É sabido que, de um modo geral, a literatura comumente aborda os processos de referenciação como expressões nominais que aparecem principalmente na posição sintática de sujeito das orações. Entretanto, neste debate, é comum que expressões com caráter referencial – que alocam novos ou modificam espaços na memória como objetos discursivos – se apresentem no predicado, e nem sempre por meio de expressões nominais. É o caso de (57), em que no nosso entender o predicado visivelmente retoma as expressões referenciais (53) e (56) por meio de um sintagma verbal, garantindo a manutenção do foco nesses eventos e a continuidade referencial. Reforçamos o nosso posicionamento pelas palavras de Alves Filho (2010, p. 221), que afirma ser necessário “rever o pressuposto, tácito em muitos trabalhos, de que a referência ocorre somente com expressões nominais na função sintática sujeito”.

que distorce o sentido de legitimidade pretendido por JR e evidencia o caráter violento dos tipos de manifestação “praticados pelo MTST”. Enquanto a estratégia (56), ao operar uma retomada da expressão referencial (53) por meio de uma rotulação com carga semântica positiva, defende as ações do MTST contra o ataque realizado, a estratégia (57) desfaz a rotulação ao evocar as mesmas ações por meio de expressões referenciais ainda mais negativas. AV parece projetar uma audiência que endosse essa percepção agressiva das formas de ação política e busca reforçar o alinhamento entre ele mesmo e essa audiência.

Defendemos que o objetivo de AV neste debate é a instauração de uma subcategoria que inclua traços do objeto manifestações que ele associa ao MTST e exclua os demais traços do objeto manifestações. Essa separação ocorre de maneira processual e pode ser observada na comparação entre as estratégias (57) e (58). Elas são divididas pela expressão “outros jeitos de chamar atenção”. A partícula “outros” pressupõe a inclusão dos tipos de ação política citados em (57). Ela pressupõe também a inclusão de outra forma de chamar atenção em comparação à primeira. Esta outra forma vem por meio da estratégia (58), que se trata de uma anáfora indireta ancorada no referente manifestações de rua. Apesar de (58) alterar o foco referencial, o alvo permanece sendo a construção do referente ancorado como legítimo. Os itens lexicais evocados (pacífica e bonita) fazem uma forte oposição semântica aos termos “invadindo”, “barrando”, “travando” e “queimando” utilizados para construir os objetos anteriores.

No trecho (xxiv), o caso (59) mostra uma estratégia que pode ser interpretada como um caso híbrido que funciona tanto como uma descrição definida, pois retoma e refocaliza objetos de discurso em foco, tanto como uma nominalização, já que também retoma elementos predicativos. A sua função, de todo jeito, é a de tentar, mais uma vez, rotular, em uma única expressão referencial, os tipos de manifestações políticas anteriormente introduzidos. Diferentemente de (56), na qual a retomada se deu por meio de um termo de forte carga semântica, o núcleo nominal em (59) parece mais neutro. Pode ter um valor pragmático positivo, contudo, quando comparado às escolhas lexicais negativas de AV. A oração relativa modificadora confirma que todos os tipos citados são de fato praticados pelo MTST, mas a cadeia referencial construída até aqui aponta que essas práticas são formas legítimas de ação política.

Por fim, os casos de (60) e (61) mostram o emprego de expressões referenciais que emerge com a função de justificar a legitimidade das ações. Primeiramente, em (60), há o emprego de uma relação indireta. Este referente, disponível a partir da ativação de conhecimentos compartilhados, se ancora no objeto de discurso manifestações para opor as

manifestações pró-impeachment e as opções de manifestações do MTST que seriam reduzidas de recursos e de convocação midiática. Sem uma forma de divulgação ampla, o MTST tinha de utilizar outras maneiras de divulgar suas pautas. O referente (60), portanto, coloca em foco um evento para expor a diferença entre os movimentos MBL e MTST, o primeiro cuja agenda tem forte adesão da imprensa e o segundo que sofre, historicamente, resistência por parte dos grandes meios de comunicação. O caso (61) reforça esse entendimento, ao retomar o referente em (60) por meio de uma expressão definida que busca evidenciar o suposto apoio irrestrito da mídia às manifestações convocadas pelo MBL.

A cadeia referencial formada até aqui mostra que o projeto de dizer de JR, que inicialmente parecia tender à defesa do objeto manifestações que ocorriam após a aprovação do impeachment, precisou ser interrompido a partir das intervenções de AV. Houve a necessidade de defender, inclusive para a audiência, a legitimidade das opções de atuação política do seu movimento. No nosso entendimento, esse caminho levou a um dos objetos de discurso construídos no texto: manifestações. Esse objeto discursivo está associado ao evento

ação política, e parece englobar os elementos da categoria de mesmo nome e que é também

construída na emergência textual.

Essa mudança de direção de JR é necessária no momento em que AV não dá continuidade ao tópico discursivo (manifestações atuais). AV prefere ampliar o foco do tópico “manifestações” para uma visão mais ampla e se recusa, dentro da categoria que ele mesmo evoca, a aceitar como legítimo alguns tipos de manifestação. Falta então entender como AV parte desse posicionamento para construir um objeto de discurso divergente e instaurar uma subcategoria no texto. Vejamos os trechos (xxvi), (xxvii), (xxviii) e (xxix) para entender como essa contraposição - advinda da polarização - acirra a disputa nesta interação:

xxvi. AV - [Deixa eu só ver se eu entendi... se a mídia não te apoia... então bora queimar pneu na marginal (62) que é pra chamar atenção... isso pra você é uma coisa positiva?...

xxvii. AV - [... cara foto cara foto num diz nada... foto não diz nada... eu posso tirar foto com quem for o que importa é o que eu aprovo o que importa é pelo que que eu tô lutando... eu nunca vi ninguém na rua lá com camiseta do Eduardo Cunha falando 'não o Eduardo Cunha é honesto eu sou Eduardo Cunha até morrer'... muito muito contrário muito contrário ((JR diz que vê pessoas gritando "Viva Cunha")) do que eu vejo por exemplo na manifestação de vocês (63)... vocês chegam pro cara e falam assim 'meu você é contra político corrupto - sou' mas e contra o Lula que tem triplex e num sei o que lá... 'não o LUla é meu deus o lula é maravilhoso o lula é isso a (Dilma)'... então fica claro que as manifestações vermelhas (64) não estão lá contra a corrupção... vocês estão lá militando por um discurso já vencido...

xxviii. AV - Fala uma coisa pra mim... nós vamos mudar a máquina de dentro pra fora... como é que você entra na política sem estar dentro de algum partido? não tem como

cara... eu acho muito mais válido você pegar... e entrar por um partido e entrar na máquina... e tentar mudar o negócio de dentro pra fora do que cometer atos violentos (65)... por exemplo... quando o MBL caminhou até o congresso... e foi lá fazer manifestação... o MTST foi um dos movimentos que foi agredir o pessoal lá... então... você fala tanto disso cara... mas eu acho muito mais válido / muito mais válido você entrar na máquina pública e mudar ela de dentro pra fora... do que você ficar... éh... com ataquezinho violento (66‟)... com ataquezinho bobo... ataquezinho infantil (66‟‟)... eu acho que tá na hora da gente discutir o brasil de maneira adulta... de maneira concreta... vamo falar de proposta...

Em (62), há mais um caso de sintagma verbal com função anafórica que reintroduz um dos tipos de manifestação praticados pelo MTST. Esse caso, que é contextualmente integrado aos demais, é em seguida encapsulado por meio do demonstrativo “isso”, o qual vem inserido em uma pergunta que sugere a discordância de AV quanto a esse tipo de manifestação. A cadeia referencial formada por meio dessas inserções permanece associada ao evento ação

política, mas continua seguindo um percurso rumo a uma categorização específica que os

distingue dos demais tipos de manifestações.

Já nos casos (63) e (64), há dois empregos de descrição definida que retomam o objeto de discurso ainda em foco – manifestações. Da mesma forma que JR, que fez uso de descrições definidas para salientar aspectos das manifestações organizadas pelo MBL, AV evoca as manifestações realizadas pelos grupos de esquerda (dentre os quais está o MTST) para associá-las à conivência com a corrupção. Em (63), o modificador tem a função de direcionar a atenção para a autoria dos protestos. Essa opção evidencia que, dentre uma rede de sentidos disponíveis a partir da ativação de um objeto de discurso, é possível usar as estratégias de referenciação para focalizar os mais específicos elementos que estejam semanticamente, pragmaticamente e contextualmente associados a ele. Assim, mesmo que estejam evocando eventos de mundo distintos (manifestações com pautas divergentes), essas