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3. ATUAÇÃO PROFISSIONAL NO “SOCIAL”: MATRIZES TEÓRICAS E PROFISSÕES

3.2 AÇÃO SOCIAL MOTIVADA POR VALORES

Para Max Weber, em “contraposição” ao pensamento positivista de Durkheim, a ordem social não se opõe como exterior aos indivíduos. Ao contrário, as regras e normas sociais só possuem sentido quando manifestas em cada indivíduo sob a forma de motivação.

Os indivíduos dão sentido à ação social, processando a relação entre motivo da ação, a ação propriamente dita e seus efeitos. Tal entendimento particulariza a contribuição weberiana na compreensão da ação humana como conduta social dotada de sentido. Portanto, é o indivíduo, por meio de valores sociais e de suas motivações, que produz o sentido da ação social e efeitos na realidade, na vida. Esta última, segundo Weber, “se manifesta dentro e fora de nós, sob uma quase infinita diversidade de acontecimentos sucessivos e simultâneos que aparecem e desaparecem” (WEBER, 1974, p. 47).

A motivação manifesta na ação social concreta atribui um determinado caráter, seja ele econômico, político, cultural, religioso, entre outros, direcionado e

orientado pela tradição, razão, emoção. Assim, o caráter social da ação revela uma resposta individual a uma motivação de outros indivíduos, e por meio dos indivíduos.56

Capturar o sentido da ação social exige compreender suas implicações, expressas pelos agentes da ação ou por suas condutas. Desse modo, os fatos sociais não são “coisas”, mas acontecimentos percebidos pelo “cientista social” e desvelados em seus significados, cabendo à compreensão dos nexos causais que atribuem sentido a cada ação social.57

A Teoria Social faculta que os acontecimentos possuem origem nos indivíduos, sendo a subjetividade um elemento central das ações que só possuem o caráter de uma relação social na medida em que o compartilhamento do sentido se efetiva. Assim, a regularidade das ações permite evidenciar tendências gerais em uma determinada sociedade, o que, evidentemente influenciará as ações dos indivíduos. Sendo que, somente com “relação a valores específicos particulares de uma época, uma nação ou uma fé religiosa, que se pode selecionar, no caos infinito dos fenômenos sociais, o que nos parece importante” (LÖWY, 1994, p. 35).58

Em Weber a sociedade moderna possui a particularidade dos mercados, dos interesses organizados e opostos, o que explicita, na medida da sua proposta teórica, a evidência de conflitos, que não se colocam como patologias que geram desequilíbrios prejudiciais à evolução da sociedade. Ao contrário, permite a

56 Uma das produções de referência em Weber que exemplifica sua proposta metodológica de compreensão das sociedades é a obra “Ética protestante e o espírito capitalista” (1904), na qual é relacionado o papel do protestantismo na formação do comportamento típico do capitalismo ocidental moderno. Em Weber a relação entre religião e sociedade, por exemplo, se dá pela incorporação de valores transformados em motivos da ação. Identifica, na análise da especificidade desta relação causal, o trabalho enquanto dever e vocação.

57 Embora Weber atribua centralidade aos valores e motivações humanas, o mesmo não examina e aprofunda a gênese social dos pontos de vista e visões de mundo (LÖWY, 1994).

58 Para Weber o cientista é guiado por motivações, sendo impossível eliminar as pré-noções, particularmente na seleção dos aspectos a serem estudados. Iniciado o estudo, é preciso, entretanto, buscar a neutralidade. Assim, a objetividade não está nos fatos em si, mas no modo de reflexão. Tal postura teórico-metodológica o aproxima da razão positivista. Para a explicação dos fatos sociais Weber desenvolveu o tipo ideal. Um recurso metodológico que oferece conceitos sociológicos que permitem interpretar a realidade social. Para tanto, o tipo ideal é previamente construído e testado, considerando casos particulares. Tal modelagem auxiliaria a construção de comparações para a identificação de especificidades e semelhanças. Seu método interpretativo ressaltou a importância da análise histórica, da comparação e da compreensão qualitativa dos processos sociais. Weber não é um autêntico positivista, porém, postulou, de modo sistemático, a neutralidade axiológica das Ciências Sociais (LÖWY, 1994).

existência de um “ordenamento social”, uma estrutura institucional capaz de regulá- los socialmente.

Weber identifica o conflito e a luta de classes em várias dimensões, relativamente autônomas, como a política, a religião e o direito, manifestando, ainda, uma racionalidade peculiar, a exemplo do sentido da acumulação da riqueza presente na razão capitalista. Entretanto, “os valores dos quais fala Max Weber não estão, no essencial, ligados às classes sociais (como na abordagem marxista), mas às culturas, nações ou religiões distintas e/ou opostas” (Idem, p. 34).

O elemento fundamental da interpretação weberiana da sociedade reside na racionalidade como princípio organizativo. Desse modo, a ação é racional, considerando finalidades e valores. No entanto, é a razão que impulsiona os indivíduos à ação, num processo complexo de encadeamentos e de motivações.

Na proposta weberiana o trabalho social requer, especialmente, a interpretação dos valores e das possibilidades de novas motivações racionalizadas nas ações sociais. Prevalecem, aqui, nos limites da aplicação teórico-prática, elementos como a racionalidade nas ações sociais; a conexão entre valores sociais internalizados, ações sociais e suas implicações; as análises de traços característicos de uma formação histórica, como a cultura patrimonialista e meritocrática; descrição de tipologias de política sociais; a interpretação de valores sociais internalizados no processo de socialização; o peso das motivações humanas em detrimento das estruturas; e o papel dos indivíduos livres para modificar a realidade.

O desenvolvimento do trabalho social pretensamente neutro e a compreensão do indivíduo como uma relação de intersubjetividade encontra similaridade na experiência fenomenológica, especialmente pela postura de “afastamento” de preconceitos, como pressuposto básico, e o conhecimento do sujeito como “ser no mundo” e ser “sobre o mundo”, visando uma “transformação social” (CBCISS, 1986, p. 184; ALMEIDA, 1978), que é individualizada e, por consequência “psicologizada”.59

59 A fenomenologia no serviço social não se mantém voltada à compreensão do social, assimila o projeto conservador no marco da renovação, resultando na reatualização do conservadorismo, recuperando conceitos como pessoa e ajuda. Transformação social restringe-se ao plano do individual por meio da superação da situação-social-problematizada (Netto, 1998).

Perspectivas weberianas centralizam a compreensão de traços particulares de uma sociedade, conformando tipologias, além da explicitação da burocracia, de atributos culturais, econômicos, políticos e sociais, assim como das legislações como aspectos determinantes das sociedades modernas.