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1.2 O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY

1.2.2 A aquisição da Linguagem em Vygotsky

No processo de aprendizagem e desenvolvimento a aquisição da Linguagem, desempenha um papel decisivo na organização dos processos psicológicos superiores.

Vygotsky (1988, p.52), explica que:

A história do desenvolvimento das funções psicológicas superiores seria impossível sem um estudo de sua pré-história, de suas raízes biológicas, e de seu arranjo orgânico. As raízes do desenvolvimento de duas formas fundamentais, culturais, de comportamento, surge durante a infância: o uso dos instrumentos e a fala humana.

Desde o seu nascimento a criança interage com os adultos e a fala é um dos sistemas simbólicos que regulamentam esta interação. De acordo com Palangana (2015, p. 105), “a linguagem intervém no processo de desenvolvimento da criança desde o seu nascimento”. Ao conversar com a criança a mãe e outros familiares apresentam diferentes significados, ao nomearem objetos, por exemplo, e ao apontá-los o adulto atribui significado a estes. À medida que a criança vai internalizando estes significados a fala passa a ser utilizada para indicar o que ele precisa. De acordo com Bock (2008, p. 108):

Após algum tempo a criança fazendo distinção para os outros com o auxilio da fala, começa a fazer distinção para si mesma. E a fala vai deixando de ser um meio para dirigir o comportamento dos outros e vai adquirindo a função de autodireção.

desenvolvimento intelectual, sobre isso Vygotsky (1988, p. 27), afirma que, “O momento de maior significado no curso do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente humanas de inteligência prática e abstrata, acontece quando a fala e a atividade prática, então duas linhas completamente independentes de desenvolvimento convergem.”

Palangana (2015), explica que em suas pesquisas Vigotsky definiram a relação entre a fala e a ação em diferentes momentos ao longo do desenvolvimento, e assim explica que aos três anos de idade a criança está na fase da fala social – denominada também de externa, na qual as ações e a fala acontecem mutualmente de forma desorganizada; de três aos seis anos inicia-se a fase da fala egocêntrica, nela a fala antecede a ação, pois nesse momento a criança passa a falar para si mesmo, sobre isso, Vygotsky (1989, p.306), afirma que “O discurso egocêntrico é um fenômeno de transição entre o funcionamento inter-físico e o funcionamento intra-físico, quer dizer, da atividade social e coletiva das crianças, para sua atividade mais individualizada.”. Ainda de acordo com Palangana (2015), por volta dos seis anos de idade a fala que antes era externa, vai desaparecendo, transformando-se em sussurros para si mesma, chegando assim à fase do discurso interno.

Vygotsky (1989), diz que:

O declínio da vocalização do discurso egocêntrico é sinal de que a criança se vai progressivamente abstraindo do som, e vai adquirindo uma nova capacidade, a faculdade de “pensar as palavras” em vez de pronunciar...uma evolução em direção ao discurso interior. (Vygotsky 1989, p. 311).

Palangana (2015, p.106-107) complementa que nesta fase a criança desenvolve a autorregulação, controlando assim, “suas atividades mentais e seu comportamento. Nessa fase, a fala determina e domina a ação, adquirindo função planejadora, além da função já existente de refletir o mundo exterior”.

Outra área de conhecimento estudada por Vygotsky para compreender a relação entre o pensamento e a linguagem, refere-se à formação de conceitos, isso porque a linguagem humana desempenha duas funções:

...a de intercâmbio social e a de pensamento generalizante. Isto é, além de servir ao propósito de comunicação entre os indivíduos, a linguagem simplifica e generaliza a experiência, ordenando as instâncias do mundo real em categorias conceituais cujo significado é compartilhado pelos usuários dessa linguagem (Oliveira, 2016, p. 27).

construções culturais, internalizados pelos indivíduos ao longo de seu processo de desenvolvimento”. Ivic (2010), explica que ao analisar as obras de Vygotsky, encontrou a construção de conceitos subdividas em: conceitos espontâneos e conceitos científicos. O primeiro refere-se às ações da criança e suas interações diretas, já os conceitos científicos, Ivic, (2010, p. 23-24), esclarece que “o processo de aquisição dos sistemas de conceitos científicos torna-se possível no quadro da educação sistemática de tipo escolar. A contribuição da educação organizada e sistemática é aqui essencial...”.

Neste processo de formação de conceitos, surge o signo, já explicado anteriormente como a representação simbólica dos objetos e, neste caso das palavras, conforme nos explica Vygotsky (1989, p.48), “Na formação de conceitos esse signo é a palavra, que em princípio tem o papel de meio na formação de um conceito e, posteriormente, torna-se o seu símbolo”.

Ainda com relação ao processo de aquisição dos conceitos, os mesmos desencadeiam no individuo, através da linguagem, habilidades de abstração e generalização. Contudo, Luria e Leontiev (1988, p. 51-52), explicam que estes processos “não são imutáveis, em todos os estágios do desenvolvimento sócio-econômico e cultural. Pelo contrário, tais processos são produtos do ambiente cultural.” E ainda complementam, afirmando que, “a função primária da linguagem muda à medida que aumenta a experiência educacional da pessoa”. Ao direcionarmos tais afirmações para o campo da aquisição da leitura e escrita, Oliveira (2010), apresenta um exemplo que elucida com clareza, tais afirmações, nos explicando que:

Podemos pensar, por exemplo, num individuo que vive num grupo cultural isolado que não dispõe de um sistema de escrita. Se continuar isolado nesse meio cultural que desconhece a escrita, este indivíduo jamais será alfabetizado. Isto é, só o processo de aprendizado da leitura e da escrita (desencadeado num determinado ambiente sociocultural onde isso seja possível) é que poderia despertar os processos de desenvolvimento interno do indivíduo. (Oliveira, 2010, p. 58-59).

Sobre a aquisição da Linguagem escrita da criança, Vygotsky não aprofundou seus estudos, devido sua morte prematura, contudo suas contribuições sobre a aquisição da linguagem e do pensamento nortearam os estudos de muitos pesquisadores sobre a Linguagem escrita, seu seguidor Alexander Luria, deu continuidade as pesquisas de

Vygotsky, aprofundando seus estudos no campo na linguagem escrita13.

Oliveira (2010) ressalta que, os estudos de Vygotsky sobre a escrita têm muito em comum com a teoria de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, desenvolvida a partir de 1970. Ela explica que,

O aspecto mais importante dessa semelhança é a consideração da escrita como um sistema de representação da realidade e do processo de alfabetização como o domínio progressivo desse sistema (que começa muito antes do processo escolar de alfabetização) e não como a aquisição de uma habilidade mecânica de correspondência letra/som. (Oliveira, 2010, p. 70). Neste cerne, a linguagem em Vygotsky inicia-se desde os primeiros dias de vida da criança, acontece a partir das relações sociais com o outro, visto que ela é uma construção histórica-social da humanidade, é apreendida pelo individuo diante das relações simbólicas e instrumentais com os objetos e com o outro. Incorporadas as funções psicológicas superiores através da construção dos conceitos espontâneos e científicos, por meio do uso dos signos. Considerando por fim que os adultos, assim como a escola têm um papel fundamental na construção destes conceitos científicos.