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Compreendidos todos os pressupostos, conceitos e períodos do desenvolvimento humano, que sustentam a teoria de Piaget, vamos agora lançar mão dos estudos deste teórico sobre a aquisição da Linguagem pelo sujeito, descritos a partir da Epistemologia Genética.

Neste momento, podemos descrever como já visto no subtítulo anterior que a aquisição da Linguagem surge, por volta de um ano e meio e dois anos de idade, com o desenvolvimento da função semiótica, ou seja, ao final do período sensório-motor, e inicio do período pré-operatório. É a partir da função semiótica ou simbólica que o indivíduo consegue representar mentalmente a realidade, assim,

Por volta de um ano e meio/dois anos a criança adquiri a capacidade de distinguir o significado do significando, ou seja, de representar, através de uma imagem mental (visual), eventos ou coisas fora do seu campo visual[...].Tudo isso ocorre antes da aquisição da linguagem e Piaget diz que essa capacidade de representar é condição necessária para a própria aquisição da linguagem. (Ramozzi-Chiarrotino,1998, p. 29).

O desenvolvimento da função semiótica ou das representações mentais é explicado em função da evolução dos esquemas cognitivos sensório-motor, a ampliação destes esquemas através da coordenação e dos processos de assimilação e acomodação, vão explicar a aquisição do pensamento e da inteligência o que possibilitara a aquisição da Linguagem. De acordo com Montoya (2006, p.123),

A linguagem, enquanto sistema de signos, implica significantes (gestos ou palavras articuladas) que se reportam a objetos mediados por conceitos ou “pré-conceitos”, os quais se apóiam, sobretudo nas fases inicias, nas imagens mentais. A aquisição da linguagem encontra-se, portanto, atrelada à constituição da capacidade humana de representar, isto é, de diferenciar significantes e significados, e por isso, ao exercício da função simbólica. Sobre os conceitos Ramozzi-Chiarriotino (1988), explica que é a sociedade que permite a construção dos conceitos, mas é somente a partir das condições endógenas do sujeito de construir representações conceituais que ele vai poder ser influenciado pelo meio

para adquirir a linguagem. Sobre isso recorremos a Montoya (2006, p.124), “nessa evolução a ideia de socialização se encontra intimamente relacionada com a cooperação: socializar significa compartilhar noções e signos com uma comunidade de falantes e ao mesmo tempo distingui-los das próprias idiossincrasias e dos pontos de vista particulares”.

A linguagem surge então da necessidade de o individuo exteriorizar seu pensamento, pois o pensamento egocêntrico evolui para o pensamento dirigido, resultado das interações entre os sujeitos e da evolução dos esquemas sensório-motor. Vale ressaltar, que Piaget (1967), afirmou que a linguagem não é suficiente para explicar o pensamento, sobre isso ele destaca que,

[...] não é menos evidente que quanto mais refinadas as estruturas do pensamento, mais a linguagem será necessária para complementar a elaboração delas. A linguagem, portanto, é condição necessária, mas não suficiente para a construção de operações lógicas. Ela é necessária, pois sem o sistema de expressão simbólica que constitui a linguagem, as operações permaneceriam no estado de ações sucessivas, sem jamais se integrar em sistemas simultâneos ou que contivessem, ao mesmo tempo, um conjunto de transformações solidárias. Por outro lado, sem a linguagem as operações permaneceriam individuais e ignorariam, em consequência, esta regularização que resulta da troca individual e da cooperação (Piaget, 1967, p. 92).

Neste cerne, o oposto torna-se verdadeiro, pois Piaget em seus estudos defendeu que o desenvolvimento linguístico depende do desenvolvimento da inteligência. Assim quando a criança passa a utilizar o símbolo para representar objetos ausentes do campo visual ela passa a utilizar a inteligência conceitual.

Outro esquema que surge a partir da evolução progressiva dos esquemas sensório- motor e da função semiótica é o esquema verbal, estes esquemas também evoluem de níveis elementares aos mais complexos, por exemplo, a criança nomeia um determinado objeto a partir dos esquemas já internalizados e assim tudo o que se assimila a este objeto receberá o mesmo nome. Assim, nos esclarece Ramozzi-Chiarottino (1998, p. 64), que “depois dos esquemas sensório-motores, constata-se a presença dos esquemas verbais, que seriam os intermediários entre os primeiros e os conceitos”.

A partir da evolução dos esquemas verbais e da inteligência conceitual a criança passa a desenvolver seus primeiros discursos, sendo capaz de jogar com as palavras, ou seja, utiliza-se do discurso para satisfazer seus desejos. Nesse contexto a criança passa a

utilizar das construções espaço-temporais e causais na elaboração do seu discurso. Quanto a isso, Ramozzi-Chiarrottino (1988, p. 71), apresenta um exemplo que esclarece o uso da inteligência conceitual e do discurso para manipular as ações a partir da linguagem, “por exemplo, quando a mãe sai de casa com sua filha, e esta diz: “estou cansada, cansada!”, a mãe responde: “que pena, não podemos mais passear!”; a menina, logo responde: “não estou cansada mais!”

A linguagem assim como os períodos cognitivos do desenvolvimento, descritos por Piaget, não obedecem a uma ordem cronológica em idade igual para todos os sujeitos, pesquisas em indivíduos com alguma deficiência física, como surdez ou cegueira demonstram que a evolução dos esquemas sensórios motores e da função semiótica podem tardar em anos de diferença, se comparados a indivíduos sem essas deficiências.11

Outro ponto a ser considerado é que os desequilíbrios, causados pelos estímulos externos e os processos de assimilação e acomodação que ocorrem nas estruturas mentais, possibilitam o equilíbrio, que no período operatório concreto com a capacidade de reversibilidade, gera o equilíbrio permanente e a conservação dos conceitos, o que possibilita a evolução do pensamento individual egocêntrico para o pensamento conceitual e dirigido, e consequentemente o desenvolvimento da linguagem.