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Foto 28 Exemplo de instalação de banheiro seco na residência de um dos moradores da

4. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

4.2 Histórico de Ocupação da Região

4.2.1 A Capitania dos Campos de São Paulo do Piratininga

Segundo Bueno, as terras concedidas, em 1532, aos irmãos Martim Afonso e Pero Lopes de Souza, as quais, respectivamente, compreendiam as capitanias de São Vicente e Santo Amaro7 e que originaram a Capitania dos Campos de São Paulo do Piratininga foram ampliadas em todos os sentidos durante os três séculos seguidos, através da interiorização e expansão territorial de seus habitantes (Figura 11). Em 1709, essas terras foram incorporadas por compra, aos bens da Coroa, durante o reinado de D. João V e denominadas Capitania de São Paulo e Minas de Ouro tendo por sede administrativa a vila de mesmo nome, elevada em 1711 à categoria de Cidade.

Em fins do século XVIII, a Capitania diminuiu sua extensão territorial e englobava o atual estado do Paraná, parte de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, apresentando um conjunto de 34 núcleos elevados à categoria de vila e uma cidade. A maioria passou por estágios anteriores, como aldeamento ou povoado e freguesia, antes de ser elevada a categoria de vila.

É importante ter claro esse movimento de expansão e retração do território da capitania de São Paulo para compreender a dinâmica da formação dos núcleos urbanos e rurais que tinham sua ascensão e decadência atreladas ao ciclo econômico correspondente a determinado período da história

Ademais, é o retrato de como o uso e ocupação do território e as suas redefinições estão vinculadas à usurpação dos povos nativos e da população não detentora do poder econômico e político.

7 Os limites geográficos da Capitania de S. Vicente estendiam-se desde a barra do rio São Francisco do Sul à ilha de Santo

Marca também, a disputa desse poder político e econômico entre a Igreja, sobretudo, na figura dos jesuítas e das famílias proprietárias de grandes extensões de terra vinculadas também à exploração dos recursos naturais, ao comércio de mão-de-obra escrava através das empresas e do tráfico negreiro, e que vai se metamorfoseando conforme os meios de acumulação de capital se alteram: ora mercantil, ora oligárquico, industrial e/ou financeiro.

Situação em 1534. A Capitania de São Paulo formou-se a partir da fusão da capitania de São Vicente e Santo Amaro, expandindo-se no século XVI-XVIII.

Auge territorial da Capitania de São Paulo no século XVIII (1709)

Divisão territorial do Brasil no fim do século XVIII (1789) e primeira metade do século XIX

O estado de São Paulo na divisão territorial do Brasil. Desde 1853 quando o estado perdeu o território do Paraná São Paulo apresenta a mesma divisão física.

Figura 11 - Situação Territorial da Capitania de São Paulo em diferentes períodos da história, desde o século

XVI à formação do Estado de São Paulo, propriamente, nos dias atuais. Organização: CATARUCCI, A. – mar/2013

Inicialmente, a expansão do povoamento na capitania foi realizada por atuação dos jesuítas, através da criação dos aldeamentos (Figura 12). De acordo com Verazani (2009), os aldeamentos foram fundamentais para o povoamento do planalto, principalmente da região em torno da vila de São Paulo. Conforme apresenta a autora, entre os séculos XVI e XVII, foram fundados, na região, os seguintes aldeamentos: Pinheiros, Barueri, São Miguel, Guarulhos, Escada e Peruíbe (aldeamentos do Padroado Real)9, Itaquaquecetuba, Embu, Carapicuíba e Itapecerica (Fazendas jesuíticas).

Os aldeamentos surgiram em meados do século XVI e perduraram até as primeiras décadas do século XIX. Ao ser fundado cada aldeamento era contemplado com uma faixa considerável de terras, as sesmarias10. A sesmaria tinha a finalidade de garantir aos índios pleno domínio sobre seu território11. Entretanto, segundo Monteiro (2000), essas concessões objetivavam restringir os indígenas a áreas determinadas pelos colonizadores e liberar ao colono regiões anteriormente ocupada por esses povos.

De fato, os aldeamentos atendiam a diferentes interesses que como destaca Verazani (2010) correspondiam a: (1) aos missionários que buscavam a fé e o atendimento aos interresses da Igreja; (2) aos colonos que viam os índios como mão-de-obra disponível e aproveitável; (3) à metrópole que via-os como povoadores para as extensas áreas da colônia.

Contudo, para Câmara (1995), os aldeamentos tinham a finalidade imperativa de desobstruir terras para a expansão da colonização e se realizavam em três etapas: (1) nas expedições de escravização dos indígenas (chamados “descimentos”) e missões jesuíticas (chamadas “reduções”), através dos quais se retiravam os índios dos seus territórios originais, a fim de disponibilizar espaços para o avanço da ocupação; (2) concessão de sesmarias aos aldeamentos, restringindo os índios aos limites da doação; (3) ocupação das terras concedidas aos índios pelos colonos, momento em que ocorriam os aforamentos para os colonos de terras dentro das sesmarias concedidas aos indígenas.

Verazani (2009) destaca que por volta de 1630, os jesuítas eram os principais proprietários de terra em meio a zona de produção de trigo, no distrito de Paranaíba. Devido

9 Os aldeamentos de Padroado Real eram de administração dos Capitães, contavam com o poder temporal regulado pelas

Câmaras. Possuíam procuradores, juízes e administradores gerais. Apenas o poder espiritual estava nas mãos dos jesuítas. Já nas Fazendas jesuítas, a administração concentrava o poder temporal e espiritual nas mãos dos jesuítas. Tinham a designação de fazendas por serem originadas de doações de propriedades particulares, ficando fora de qualquer padronização com outros núcleos.

10 As sesmarias dos aldeamentos variavam de tamanho, as maiores eram de seis léguas em quadra, sendo seis de testada e seis

de fundo. (Fonte: Verazani, 2010). De acordo com Costa (1994), 1 légua, no período colonial brasileiro, equivaleria a 6.600 metros ou 6,6 Km. (COSTA 1994).

11 Segundo Câmara: “(...) havia a perspectiva de que os aldeamentos conciliassem ao mesmo tempo, o ideal de liberdade dos

índios com o objetivo de desenvolver a colônia. O aldemaento era o símbolo da missão eclesiástica, responsável pela catequese, que consagra a ruptura do universo mítico dos indígenas. Representa, no plano cultural, a completa destruição de suas concepções de mundo, lendas, hábitos e costumes” (CÂMARA, 1995, P. 107).

ao controle exercido sobre o aldeamento de Barueri, os padres tinham também, em suas mãos, o acesso preferencial aos índios do aldeamento. Sendo assim, os padres estavam presentes na economia local como produtores e proprietários. Isso gerava grande incômodo aos colonos.

Figura 12 - Aldeamentos Paulistas (PETRONE, 1995)

Por essa razão apelaram à Câmara Municipal paulista, pedindo a remoção dos jesuítas do aldeamento, pois não podiam competir com a produção alcançada por esses religiosos em suas unidades. Sem obter a resposta esperada, os colonos vizinhos, mais exaltados, inclusive

Antonio Raposo Tavares, em 1633, invadiram o aldeamento de Barueri e expulsaram os jesuítas, alegando que os padres impediam o acesso à mão-de-obra índigena congregada no aldeamento, contrariando sua original fidelidade: a de fornecer mão-de-obra aos colonos. A invasão de Barueri desestruturou o sistema de funcionamento dos aldeamentos e contribuiu para a expulsão dos jesuítas da capitania, em 1640.

A partir de 1640, após a expulsão dos jesuítas da capitania por um período de treze anos, os aldeamentos entraram em declínio. Segundo IBGE (s/d)12 foi no inicio do século XVII, mas principalmente após a expulsão dos jesuítas que os paulistas lançaram-se a interiorização do povoamento, na faina de escravização dos índios dos sertões ao mesmo tempo que, incentivados pela Metrópole, buscavam as riquezas minerais. Nessa fase, inúmeros povoados foram iniciados não só no atual território do Estado como em outros.

De acordo com Silva et al. (1955) em 1748, a Coroa exigiu que a capitania de São Paulo fosse submetida ao governo do Rio de Janeiro. Entretanto, como destaca Derntl (2010), devido às tensões do processo de demarcação de fronteiras com os espanhóis, a necessidade de reafirmar a soberania da Coroa portuguesa levou a um esforço amplo no sentido de defender, povoar e mapear novas áreas. Dessa forma, a capitania de São Paulo, em decadência e abatida pelo despovoamento e pela miséria, foi restaurada em 1765.

Frente à situação de penúria que se encontravam os aldeamentos, o Morgado de Mateus adotou uma política de povoamento que se iniciou com a emancipação dos aldeamentos, agregando-lhes moradores brancos que viviam em sesmarias pertencentes a essas unidades ou em suas redondezas, transformando-os em freguesias ou vilas. Conforme pesquisa de Giesbrecht (2009), durante a administração do governador e capitão-general D. Luís Antônio de Sousa Botelho Mourão, quarto Morgado de Mateus (1765-1775), a malha administrativa foi estendida com a elevação de dez vilas e a fundação de cerca de quinze freguesias.

Giesbrecht (2009) afirma, ainda, que a região do Vale do Rio Juqueri e da Serra da Cantareira caracterizava-se por ser uma zona de passagem de tropas militares e importante entreposto de abastecimento durante o período colonial e sob a vigência do Império, fato que ficou materializado em vias que fazem a ligação entre Perus e os bairros de Parada de Taipas e Jaraguá, como as atuais Av. Raimundo Pereira de Magalhães, ou Estrada Velha de Campinas, e Estrada São Paulo-Jundiaí.

De acordo com Lancman (1995), a região do Juqueri destacava-se mais pela criação, voltada para o comércio de gado, cavalos e mulas. Ela servia de passagem, parada e local de abastecimento dos tropeiros que iam às Minas Gerais utilizando a Estrada de Bragança que tinha uma ramificação passando pela Freguesia do Juqueri e a Estrada de Goyas, mais importante e que passava por Jundiaí.

A mesma autora descreve que o aldeamento do Juqueri, datado do início do século XVII, tinha parte de seu território pertencente ao município de Santana de Parnaíba. Sua sede corresponde, hoje, ao município de Mairiporã e compreendia parte das terras de Franco da Rocha, Caieiras – antiga Criciúma – e Francisco Morato, conhecida, pelos ingleses, na época, como Belém da Serra (Figura 13). A maior parte dos habitantes residia em área rural e se dedicava à lavoura, o que fazia com que a sede da freguesia fosse pouco povoada, pequena, com poucas casas e pouco importante.

Figura 13 - Povoado, Freguesias e Vilas – Capitania de São Paulo (1530-1889), em relação à área atual da Região Metropolitana de São Paulo* (Org.: Catarucci, 2013).

Segundo Giesbrecht (2009), Parnaíba era sede de uma vila13 desde 1625 e que englobava então os municípios de São Roque, Araçariguama, Cajamar, Pirapora do Bom Jesus, pelo menos metade de Barueri, de Franco da Rocha e de Caieiras, além do município atual de Santana de Parnaíba (Figura 13). A escassa população concentrava-se na sede da vila, e também em São Roque, Araçariguama e Pirapora. O resto espalhava-se por vasta área rural. Sua produção apenas sustentava o próprio município; as estradas eram precárias. Havia plantação de café em 1836, cultura que, anos depois, não existia mais.

Os municípios de Araçariguama e São Roque não fazem parte da RMSP, mas estão presentes para representar a área aproximada da antiga Vila de Santana de Parnaíba.

Verazani (2010) destaca que em decorrência da mineração, no século XVIII, os descimentos de indígenas do sertão foram interrompidos e os índios que anteriormente habitavam os aldeamentos foram distribuídos pelas casas e paragens da capitania. Com a saída contínua dos índios dos aldeamentos, suas terras tornaram-se alvo de aforamentos feitos aos moradores das proximidades sob alegação de estarem desocupadas ou não estarem sendo devidamente utilizadas pelos indígenas. Tais aforamentos, por diversas vezes, concretizavam- se a preços simbólicos.

Embora a Metrópole tentasse, desde o século XVII, estabelecer normas que contribuíssem para a manutenção das terras pertencentes aos aldeamentos, no caso da vila de São Paulo as incursões sobre as terras indígenas eram legitimadas pela Câmara Municipal, que a partir de 1650, passou a aforar terras indígenas aos moradores nela instalados, apesar dos protestos dos índios.