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3. A CONSTRUÇÃO DE SIGNIFICADOS NA LEITURA

3.2 A compreensão na leitura

Todas as pessoas envolvidas com atividades educacionais, que pleiteiam o desenvolvimento da leitura, parecem reconhecer o alto grau de importância da compreensão de textos. Sabem também que, se tais habilidades não forem desenvolvidas, a leitura não passa da simples fase de decifração por parte do leitor-aprendiz. OLMI (2005, p. 23) expõe a dificuldade de se pensar numa ruptura entre leitura e compreensão, “uma vez que cada ato de leitura parece supor e conter intrinsecamente uma finalidade de compreensão”.

O panorama recente dos estudos sobre a leitura aponta para um entendimento sobre a compreensão leitora que não mais se sustenta com o propósito da simples mecanização do ato de ler, ou mesmo reduzindo-o à mera extração de significados em um texto. Passa-se a entender o caráter ativo do leitor no qual exerce na leitura uma interação entre as suas vivências e os seus conhecimentos com as idéias do autor, de modo que possa compreender o texto e alcançar o sentido objetivado tanto pelo próprio leitor quanto pela leitura. Essas idéias são reforçadas por KATO (2004), que define o ato de compreender um texto como sendo um ato construtivo, o que não significa apenas decodificar os sinais lingüísticos; esses servem somente como dados contribuintes para a construção do significado.

KLEIMAN (2004a) argumenta que a leitura enquanto prática de decodificação não auxilia em nada no ponto de vista do leitor. Portanto, não colabora com mudanças na visão de mundo daqueles que praticam essa forma de leitura. A autora aponta os problemas e inadequações concernentes às metodologias empregadas na educação formal, as quais impera uma concepção autoritária no planejamento das atividades e avaliações de leitura. Nesse contraponto, a escola não viabiliza o desenvolvimento da compreensão leitora por somente aceitar uma única forma de se abordar o texto, bem como uma única maneira de interpretá-lo. Assim, restringe-se a leitura à capacidade de se aproximar da “interpretação autorizada” pelo professor.

Para que a leitura seja crítica, o ato de ler não pode ser confundido com a decodificação de sinais, com a reprodução mecânica do seu conteúdo, ou com respostas atribuídas a estímulos pré-formulados. O desenvolvimento da leitura que enfatiza esses três pressupostos promove a morte do leitor, transformando-o em mero consumidor de informações, em que a passividade diante do texto o impossibilita de contestar, refletir, transformar significados através da relação de diálogo-confronto que deve existir entre leitor e material escrito. Dessa forma, retira-se a “possibilidade de um ser sujeito de seus atos” (SILVA, 1997, p. 152, grifo do autor).

Nas etapas iniciais do aprendizado da leitura, a compreensão não ocorre, necessariamente, durante o ato de ler realizado pela criança, mas sim, na execução de atividades em que haja interação com o professor, e que a mesma possa retomar o texto.

Na promoção dessas atividades, em que são criadas situações onde o educando precisa retornar ao texto, é que ocorre a compreensão. Por meio desse processo de promoção de tarefas, as atividades de leitura devem ser elaboradas de forma que sejam, progressivamente, mais complexas e independentes. As atividades devem, cumulativamente, contribuir para um objetivo pedagógico que seja importante tanto para os professores quanto para os educandos. Dessa forma, a criança estará sendo formada como leitor, à medida que constrói o seu entendimento sobre texto e sobre leitura (KLEIMAN, 2004a).

Por essa razão, deve-se pensar em educar para a compreensão de textos entendendo que essa ação significa conduzir o aprendiz a atribuir sentido a essa habilidade. Assim, permite-se o avanço da criança auxiliando-a a usar sua potencialidade em direção à autodescoberta. A educação leitora deve ir muito além do reducionismo criado e imposto por uma postura educacional – seja de professores ou do próprio sistema –, que acaba ditando o discurso dos aprendizes durante as atividades de leitura, através das possíveis e limitadas respostas subjacentes a um texto. Essa proposta de ensino só atinge êxito na negação do direito do educando de alcançar o estágio da interpretação.

KLEIMAN (2004a; 2004b) declara que a aprendizagem da criança no meio escolar está fundamentada no ato de ler. Portanto, entendemos que a leitura, sendo um instrumento que fundamenta a aprendizagem nas diferentes áreas do conhecimento formal, passa a ser de todos os professores a responsabilidade de trabalhar para o seu uso proficiente. Mas, a proficiência no uso da leitura só é atingida mediante a construção de significados através de interações dialéticas realizadas com a possibilidade de os aprendizes poderem se expressar.

O motivo é simples, ao evidenciar a leitura de outrem como padrão, que nem sempre conhece a realidade do leitor-aprendiz, a experimentação do ler sentindo,

percebendo, criando e recriando, fica reduzida a um dever preso no significado contido nas palavras desse padrão, suscitando apenas o olhar do leitor maduro e proficiente. O resultado dessa ação pedagógica pode ser comparado ao que VIGOTSKI (2003b) chamou de “verbalismos vazios”, em que a criança repete como um “papagaio” tudo que ouve do adulto, mesmo sem representar sentido para a sua capacidade interpretativa.

Nessa ação pedagógica arbitrária, o sentido da leitura passa a ser direcionado pelo professor, o que se perde, no significado dessa outra leitura, a essência maior de se postular respostas condizentes e advindas da integração do texto com a realidade própria do leitor-aprendiz. Assim, ocorre a ruptura entre a bagagem de conhecimentos adquiridos nas práticas cotidianas do aprendiz com os conteúdos apresentados pela escola, o que torna as formas de aprendizado repleta, aparentemente, de conhecimentos díspares.

TERZI (2002), citando LEMOS25, relata que a ruptura entre o que a criança já sabe e a desconsideração desses saberes para a construção de novos conhecimentos nas práticas escolares representa o fator determinante do insucesso na alfabetização. O mesmo ocorre no desenvolvimento da leitura.

A leitura se torna envolvente quando desperta no leitor a consciência de sua capacidade leitora. Ao sentir que é capaz de ler, seja de forma autônoma, seja com o auxílio de uma pessoa mais experiente, a leitura passa a ser um desafio interessante. Em situação contrária, em que a leitura não esteja coerente com a capacidade do leitor e o mesmo não consiga realizar uma interpretação adequada, essa atividade pode “se transformar em um sério ônus e provocar o desânimo, o abandono, a desmotivação”.

Assim, a expectativa de fracasso gerado no leitor iniciante, quando esse não consegue acompanhar o nível dos colegas, pode representar uma situação que dificulta o progresso na leitura (SOLÉ, 1998, p. 42-43).

SILVA (2005) defende que é preciso que se mostre o valor da leitura ao educando, e se esse processo segue uma linha de experiências bem-sucedidas para o aprendiz, cria-se uma possibilidade de se repensar a realidade pela compreensão mais profunda dos aspectos que a compõem. O autor ainda declara que, “em termos de ensino, não basta teorizar ou discursar sobre o valor da leitura. É preciso construir e levar à prática situações a serem concretamente vivenciadas de modo que o valor da leitura venha a ser paulatinamente sedimentado na vida dos educandos” (p.85).

SOLÉ (1998, p. 70 - 71), citando PALINCSAR e BROWN26, afirma que em uma perspectiva cognitivista/construtivista da leitura, há uma aceitação por parte dos autores de que, quando se tem desenvolvida a habilidade de decodificação, a compreensão do texto se torna produto de três condições: 1º. “da clareza e coerência do conteúdo dos

25 LEMOS, (1984),

26 PALINCSAR, A. S.; BROWN, A. L. (1984) Reciprocal teaching of comprehension-fostering and

textos, da familiaridade ou conhecimento da sua estrutura e do nível aceitável do seu léxico, sintaxe e coesão interna”; 2º. “do grau em que o conhecimento prévio do leitor seja relevante para o conteúdo do texto”, ou seja, “da possibilidade de o leitor possuir os conhecimentos necessários que vão lhe permitir a atribuição de significado aos conteúdos do texto”; 3º. “das estratégias que o leitor utiliza para intensificar a compreensão e a lembrança do que lê, assim como para detectar os possíveis erros ou falhas de compreensão”.

Dessa forma, entendemos que a atividade de leitura não se finda no simples ato de decifrar palavras e não se sustenta apenas em atos mecânicos provenientes de capacidades simples da cognição humana. Mas, sim, do uso de habilidades que se entrelaçam através de complexas relações entre as mesmas. A compreensão é realizada a partir da formulação de um entendimento produzido sob as condições estabelecidas pelos conhecimentos prévios dos conteúdos apresentados no texto e dos conceitos que os representam e que já foram internalizados pelo leitor. A interpretação passa a ser entendida como a elaboração e a emissão de um raciocínio sobre essa compreensão, dotada de juízo de valor, e que é formulada a partir do pensamento crítico e reflexivo do leitor. Concluímos também que a atividade de leitura proficiente exige do leitor o uso adequado de diferentes estratégias cognitivas e metacognitivas, possibilitando-lhe a condição de usar suas habilidades de forma flexível para adequar-se às exigências do texto, como veremos a seguir.

3.3 Estratégias cognitivas e estratégias metacognitivas envolvidas no processo

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