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Interacções e Temperamento

A TEORIA SOCIOCULTURAL DO DESENVOLVIMENTO DE VYGOTSKY

2. Teorias do Temperamento

2.4. A concepção de ROTHBART

Rothbart (1987), define temperamento como diferenças individuais na reactividade (nível de excitabilidade; envolve parâmetros de tempo de latência, tempo de resposta, etc) e na auto-regulação (atenção, evitamento, etc, aspectos que modulam a reactividade) com base biológica primária, e relativamente estáveis (Derryberry & Rothbart, 1984; Rothbart & Derryberry, 1981, citados por Goldsmith et ai, 1987). A personalidade é, nesta abordagem, um conceito mais abrangente do que temperamento; o autor considera que têm domínios que se podem sobrepor; o temperamento é a base biológica primária para o desenvolvimento da personalidade. Em termos comportamentais, o temperamento observa-se em todas as idades como diferenças individuais nos padrões emocionalidade, actividade e atenção. Na dimensão fenomenológica, o temperamento é considerado, nesta perspectiva como energia, interesse e afecto. O autor vê o temperamento como existindo dentro da pessoa, dado que a sua definição de temperamento é baseada biologicamente, nas diferenças individuais. Mas a expressão comportamental e a experiência fenomenológica do temperamento serão também influenciadas pelo grau de estimulação e regulação dadas pelo ambiente.

Relativamente à definição da ligação entre o temperamento e o meio, o autor refere que o temperamento expresso irá afectar directamente os outros e as influências temperamentais nas estratégias sociais do indivíduo irão afectá- lo indirectamente. Portanto este é também um modelo interactivo. Postula que:

- Um estímulo não é o mesmo estímulo se tivermos em conta as diferenças individuais; isto é, o temperamento pode conduzir a diferenças nos efeitos da experiência ou de um comportamento. Ou seja, um mesmo estímulo pode ser diferente de acordo com a

Capitulo 3-O Temperamento

- O temperamento influencia as circunstâncias nas quais nos sentimos confortáveis e isto influenciará as situações que escolhemos ou que evitamos.

- Quando se consideram aspectos reactivos e auto-regulativos do temperamento num contexto desenvolvimental percebemos que a criança pode ser envolvida em diferentes graus de estimulação, dependendo do caregiver, e que durante os primeiros meses o

caregiver serve para fornecer regulação. O autor transmite a ideia de

que as crianças altamente reactivas, com baixo controlo auto- regulativo, possam ver nesse adulto uma fonte exterior de regulação até que o auto-controlo seja estabelecido. Para algumas crianças com nível de reactividade muito baixo, podem ser necessários níveis altos de estimulação do adulto de forma a promover respostas de aproximação e de exploração. Ou seja, o temperamento regula e é regulado pelas acções dos outros.

- Muito do que constitui a personalidade é um conjunto de estratégias que o indivíduo desenvolve ao considerar os outros como fonte de segurança emocional (ajuda e apoio) ou fonte de estimulação. O autor acredita que o temperamento contribui de forma importante nas estratégias que o indivíduo desenvolve.

Tal como no final da apresentação das duas perspectivas anteriores, elaboramos a síntese das abordagens de Goldsmith e Rothbart (quadro 3.2.).

Quadro 3.2 - Síntese de concepções de Goldsmith e de Rothbart sobre temperamento.

TEORIAS DO

TEMPERAMENTO GOLDSMITH ROTHBART

Definição do conceito

Diferenças individuais na probabilidade de experienciar e exprimir emoções primárias e excitabilidade.

Exclui: aspectos cognitivos e perceptivos.

Diferenças individuais na reactividade e na auto-regulação.

Base biológica. Estáveis no tempo.

Interacção com o meio

Conceito de cariz pessoal, mas que não exclui influências sociais interactivas.

Modelo interactivo pessoa/meio com influências directas e indirectas.

Capítulo3-0 Temperamento

Em síntese, como confirmam as diferentes abordagens, e como foi já referido, não há ainda consonância relativamente a todos os aspectos envolvidos no conceito de temperamento. Tendo como base estas quatro formas de abordagem do temperamento (Buss e Plomin, Thomas e Chess,

Goldsmith e Rothbart), Goldsmith (1987) apresenta pontos de consenso entre elas:

- A dimensão temperamental reflecte tendências comportamentais, mais do que reflexos directos em comportamentos descontínuos. Trata-se portanto de uma tendência e não algo directamente expresso num dado comportamento.

- É também comum a ênfase nas bases biológicas do temperamento. A este respeito Kochanska (1993) vinca que, no momento do seu aparecimento, as dimensões temperamentais serão independentes da socialização, embora mais tarde se vão tornando mais complexas e podendo ser modificadas pelas experiências da criança no seio da família ou outros contextos. Segundo esta autora as dimensões temperamentais contribuem para o comportamento da criança e para os padrões afectivos numa variedade de situações. Não são produto de experiência cognitiva ou de aprendizagem apesar da sua expressão poder ser modificada por factores cognitivos. Também Mcintosh e Cole-Love (1996) referem que muitos investigadores concordam que o temperamento é um constructo estável de base biológica, que emerge durante os dois primeiros anos de vida (Buss & Plomin, 1975, 1984; Martin, 1996; Plomin, 1983; citados por Kochanska, 1993).

- Este é outro aspecto de consenso, nestas abordagens: a sua focalização na infância. Os teóricos consideram que a ligação do temperamento e o comportamento se torna mais complexa com a maturação; existe a ideia de que só é relativamente directa nos primeiros tempos de vida. Tal como Thomas e Chess (1977) sugeriram, após essas idades, só em situações em que as mudanças do meio tornam as competências para lidar com ele ineficazes, é que

Capitulo 3 -O Temperamento

se manifesta a expressão pura do temperamento em termos comportamentais. Esta ideia é confirmada por Kochanska (1993) ao referir que as diferenças temperamentais aparecem nos primeiros tempos de vida, embora nem todas simultaneamente.

- Outro aspecto consensual é que o temperamento se refere a diferenças individuais, mais do que características gerais da espécie. Face à questão sobre se o temperamento é modificável, os teóricos respondem que apresenta continuidade; o que pode variar é a sua expressão.

Goldsmith (1987) reflecte também sobre os pontos de desacordo entre as diferentes perspectivas:

- O maior ponto de divergência relaciona-se com o facto de cada abordagem sugerir limites diferentes para o conceito de temperamento. Cada teórico estipula diferentes critérios de estilos comportamentais, de relação com o comportamento emocional, da relativa estabilidade e da componente hereditária. Estes critérios não definem domínios mutuamente exclusivos; diferem, no entanto, na definição da parcela do comportamento da criança que é designada como temperamento.

- Um outro ponto de divergência relaciona-se com as dimensões que devem ser consideradas como temperamento; o nível de actividade e a emocionalidade são as escolhas consensuais, mas nenhuma outra dimensão é suportada por todos os teóricos referidos. Todos concordam que o temperamento é uma componente da personalidade, mas divergem na definição das fronteiras entre os dois conceitos.