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2.1 A Condição Pós-Moderna e suas Características.

Ao iniciar este capítulo, é necessário realizar uma breve viagem pelo mundo pós- moderno. Este termo é aplicado às mudanças ocorridas na última metade do século passado. Alguns autores colocam o dia 6 de agosto de 1945, quando a bomba atômica explodiu sobre Hiroshima, o marco inicial da era pós-moderna. Outros autores não

admitem tal datação e muito menos a expressão “pós-moderno” ou a existência de uma “pós-modernidade”. Canclini observa que a expressão pós-modernidade pode ser equívoca

se quisermos que o pós designe uma superação do moderno. Pode-se falar criticamente da modernidade e buscá-la ao mesmo tempo que estamos passando por ela? Se não fosse tão incômodo, seria preciso dizer algo assim como pós-intra-moderno. (CANCLINI, 2008:256).

A compreensão do momento histórico atual não encontra um consenso nos termos pós-modernidade e pós-moderno e para alguns estudiosos estaríamos ainda num momento de transição.

Podemos observar que o chamado pós-modernismo está ligado a alguns eventos da segunda metade do século XX, como o aparecimento da computação na década de 1950, a arte Pop em 1960, a tecnociência, que cresce a partir da década de 1970 e influencia o pensamento e a cultura. A partir daí, a música, o cinema, a moda, a arquitetura, a literatura, a decoração, a medicina, o dia a dia de cada ser humano foi invadido pela chamada “tecnociência”, que é a ciência aplicada ao desempenho técnico e a produção de bens de consumo ou de curta duração. Grandes feitos foram registrados nas sociedades mais avançadas e alguns decidiram batizar essa época de “pós-moderna”, lembrando que este termo já havia sido usado em 1947 pelo historiador Toynbee. Em tempos mais recentes, o autor que foi em primeiro lugar responsável pela penetração da noção de pós- modernidade entre a intelectualidade foi Jean-Francois Lyotard, em seu livro La Condition

Post-Moderne, 1978, e foi traduzido no Brasil com o título O Pós-Moderno pela editora

José Olympio.

Anthony Giddens, em sua obra As Conseqüências da Modernidade, relata que, na visão de Lyotard:

A condição da pós-modernidade é caracterizada por uma evaporação da grand

narrative – o “enredo” dominante por meio do qual somos inseridos na história como

seres tendo um passado definitivo e um futuro predizível. A perspectiva pós-moderna vê uma pluralidade de reivindicações heterogêneas de conhecimento, na qual a ciência não tem um lugar privilegiado. (GIDDENS, 1991:12).

Giddens faz uma abordagem diferenciada e defende a posição de que ao invés de estarmos entrando numa pós-modernidade, na realidade estaríamos enfrentando um momento em que as conseqüências da modernidade estão se tornando mais universais do

que antes. Ele prefere a noção de modernidade tardia ou modernidade radicalizada, para falar sobre o momento atual. Giddens afirma ainda que “além da modernidade, devo argumentar, podemos perceber os contornos de uma ordem nova e diferente, que é “pós- moderna”, mas isto é bem diferente do que é atualmente chamado por muitos de “pós- modernidade”. ( GIDDENS, 1991:13). Esclarece ainda que:

A ruptura com as concepções providenciais da história, a dissolução da aceitação de fundamentos, junto com a emergência do fundamento contrafatual orientado para o futuro e o “esvaziamento” do progresso pela mudança contínua, são tão diferentes das perspectivas centrais do Iluminismo que chegam a justificar a concepção de que ocorreram transições de longo alcance. Referir-se a estas, no entanto, como pós- modernidade, é um equívoco que impede uma compreensão mais precisa de sua natureza e implicações. ... Nós não nos deslocamos para além da modernidade, porém estamos vivendo precisamente através de uma fase de sua radicalização. (GIDDENS, 1991:56).

O mundo chamado “pós-moderno” trouxe inúmeras mudanças para o ser humano gerando polêmicas e muito se tem discutido se ele representaria uma evolução ou uma decadência. Canclini afirma que ainda estamos no espaço da modernidade:

... a modernidade não é só um espaço ou um estado no qual se entre ou do qual de emigre. É uma condição que nos envolve, nas cidades e no campo, nas metrópoles e nos países subdesenvolvidos. Com todas as contradições que existem entre modernismo e modernização, e precisamente por elas, é uma situação de trânsito interminável na qual nunca se encerra a incerteza do que significa ser moderno. Radicalizar o projeto da modernidade é tornar aguda e renovar essa incerteza, criar novas possibilidades para que a modernidade possa ser sempre outra e outra coisa. (CANCLINI, 2008:356).

Com estes preliminares, podemos perceber a complexidade do tema. Giddens, Lyotard e Canclini defendem suas posições e a despeito de algumas diferenças percebe-se que esse processo da modernidade ou modernização circula entre nós todo o tempo e querer sobrepor o antes e o depois de forma radical é que acaba complicando a nossa visão do mundo. Sem fugir do tema, quero relatar uma experiência pessoal. Entre os anos de 1986 e 1989 tive a oportunidade de viver no Cairo/Egito e sempre que ia ao centro da cidade observava com surpresa e interesse as mulheres com suas longas roupas negras, o rosto totalmente coberto, com apenas uma pequena tela na frente dos olhos que é o seu ponto de contato com o mundo. Elas se colocavam frente as vitrines onde estavam expostos vários objetos eletrônicos, o que se podia obter de mais moderno para a época,

vindos na sua grande maioria da Europa. Aquela cena permanece em minha memória. O contraste entre a tradição e a modernidade lado a lado é algo que surpreende e, ás vezes, choca. É o antigo convivendo com o novo numa condição sócio-cultural complexa, que o paradigma unilinear da modernidade tem tanta dificuldade de assimilar. Como diz Canclini no texto acima, “é uma situação de trânsito interminável” e “com todas as contradições que existem entre modernismo e modernização”.

Muitos autores, como Canclini e Giddens, rejeitam a pós-modernidade. Embora a era moderna ainda persista sob os aspectos sociais e culturais, é possível afirmar com Queiroz (2006:4) que

o rosto do homem contemporâneo já não é o mesmo de 50 anos atrás. É plausível falar-se em pós-modernismo como um jeito novo de estar e ser no momento atual, que vai do social às ciências, da filosofia à literatura e demais humanidades, das artes ao folclore, da linguagem à comunicação, das teologias às ciências da religião. (QUEIROZ, 2006:4).