• Nenhum resultado encontrado

1-2-13 Dom Jean-Marie Déchanet

Monge beneditino que pertencia a Abadia de Saint-André, em Bourges, na Bélgica. Como missionário, esteve na Índia onde conheceu o Yoga e a partir de então dedicou-se a sua prática. Lançou, em 195517, o livro La Voi du Silence, traduzido para o alemão, já

com algumas modificações do autor: uma introdução aos asanas (posturas) e pranayamas (técnicas de respiração) com o título Yoga für Christen (Lucerna, Räber/1961); para o inglês como Christian Yoga (London, Burns Oates); para o italiano Yoga, per il Cristiano (Roma, Ed. Saint-Paul,1960); e para o holandês Der Weg Naar de Stilte (Brüdgge, Desclée/1961). Para o português em 1962 com o título Ioga para Cristãos.

O autor relata que em seu livro, Ioga para Cristãos, se aprende “a união com Deus com posturas apropriadas”. O foco principal do autor é o yoga do físico, dando pouca ênfase para a questão do silêncio e da meditação. Esta obra mostra que religiosos que viveram na Índia foram influenciados por essas práticas, mais tarde, trazidas para a Europa e Estados Unidos. Ao aprender o Yoga na Índia alguns padres criaram o próprio estilo, o “Yoga cristão”18, criticando o método original e até mesmo acrescentando “algo mais”

como mostra Déchanet, ao citar o seu colega Padre Lambert, que viveu 20 anos na Índia e passou a considerar o Yoga “ uma contribuição notável para o desenvolvimento do homem moderno”.

Um padre carmelita de Bruxelas, Padre Lambert, responde a afirmação de que seria impossível desligar a Ioga cristã da estrutura não-cristã, do budismo, da visão indiana, etc. {A Ioga é humana pela sua essência e existe em função dos homens. Ela possui

17- Alguns sites indicam o ano de 1958 e outros ainda, 1960. Adotamos o ano de 1955 pois é aquele que está indicado na maioria dos livros.

18- Não creio que seja correto falar de um “Yoga Cristão”, a menos que o tratemos como um hibridismo entre o Cristianismo e o Hinduísmo.

seu valor intrínseco, apesar de compreensões e procedimentos errôneos e mesquinhos.} Esta Ioga eterna (isto é, liberta de superstições e de restrições esotéricas) encerra ricos elementos. Ela só pode, porém, oferecer algo quando se deixar penetrar e transfigurar por Cristo, quando se submete a influência e direção do eterno amor e da Verdade. .... Eles ( os indianos) necessitam da palavra divina, eles a esperam, temos o dever de leva-la a eles. Isto, porém, não poderá realizar-se na comodidade das paredes do nosso gabinete de trabalho, onde nos contentamos com o papel de críticos ou espectadores. Cristo exige alunos iogues! (DÉCHANET, 1967:88). (O grifo é meu).

Neste texto observamos um certo preconceito do religioso com relação ao Yoga e a incompreensão do seu verdadeiro objetivo. Considera a técnica cheia de “procedimentos errôneos e mesquinhos” além de conter “superstições e restrições esotéricas”. É evidente que, para ocidentais, religiosos ou não, naquela época, a Índia, além de ser considerado um país de cultura tão diferente, era considerado “um país atrasado”, mas alegar que eles “esperam pela palavra divina” soa estranho. Obras como esta ajudaram a divulgar, no mundo ocidental, preconceitos com relação à técnica e uma visão do Yoga de forma superficial. Não são menores as confusões quando as afirmações se dirigem ao campo da filosofia, metafísica ou teosofia. O autor demonstra também um conhecimento limitado da filosofia yogue ao dizer que “os indianos necessitam da palavra divina”, mas a sua afirmação de que “Cristo exige alunos yogues” é interessante. Existe uma hipótese, aceita por muitos orientais e por poucos ocidentais, de que Jesus teria vivido na Índia19 e lá teria

aprendido a meditação yogue, que praticava nos seus momentos de isolamento, e até mesmo a teria praticado no ato da sua crucificação. Rajneesh, conhecido como Osho, relata que o motivo da crucificação de Jesus seria:

Esse treinamento de Jesus - no Egito e na Índia – seu aprendizado nas escolas secretas egípcias, nas budistas e, depois, nas hindus vedanta tornaram-no estranho para os judeus. Por que ele se tornou tão estranho para os judeus? ... Ele trouxe alguma coisa alienígena, coisas estrangeiras, introduziu alguns segredos que não pertenciam à raça. Foi por causa disso que a crucificação aconteceu.... Jesus nasceu como um judeu, viveu como um judeu e morreu como um judeu, mas tudo isso apenas no que diz respeito ao seu corpo. Fora o corpo, Jesus era hindu puro (RAJNEESH, Vol.II, 1979 :87:88).

Jesus é respeitado na Índia como um “Maha-Yogue” (Grande Yogue) e pode-se encontrar em algumas residências ou locais, na Índia, a sua imagem ao lado de deuses indianos. Encontramos ainda uma linha de Yoga chamada “Naga-Yoga” onde Jesus é reconhecido como o “Supremo Yogue”. Está claro que a igreja e muitos cristãos não 19- Indica-se a obra do alemão Holger Kersten, Jesus viveu na Índia, Editora Best Seller/São Paulo/1988.

aceitam esta idéia pois isto significaria aceitar a supremacia do Oriente no que diz respeito a algumas técnicas espirituais. Podemos lembrar que alguns filósofos e historiadores dividiram as religiões em duas categorias: mística e profética. As religiões proféticas seriam o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo e as místicas seriam as religiões da Ásia como o Hinduísmo, o Budismo e o Taoísmo. O Yoga (embora não seja uma religião) costuma ser incluído entre as “religiões” místicas. Logo como poderiam os cristãos praticar Yoga? Na atualidade podemos encontrar alguns padres que proíbem abertamente os seus fiéis de praticarem o Yoga. Entre alguns grupos religiosos, o Yoga ou a prática da meditação, são consideradas “praticas da Nova Era” e por isso também são condenadas.

O mérito de Déchanet é que, como monge beneditino, quando lançou o seu livro em 1955 na Bélgica e logo em seguida com tantas traduções que foram feitas, como na Inglaterra, Alemanha, Itália, Holanda e até mesmo Brasil (1962), ele chamou a atenção, da sua comunidade religiosa, principalmente, para o Yoga do físico, mas também, muitos devem ter se interessado pelo Yoga como técnica meditativa ou mesmo sua filosofia. Sabe-se que a prática da meditação nos mosteiros é muito antiga e não vamos agora nos aprofundar na sua origem, mas, lendo o livro de Leloup Escritos sobre o Hesicasmo20 não

se pode deixar de identificar tantas semelhanças com o Yoga da Meditação: a postura, o uso do mantra, o valor da experiencia o Divino, a busca do silêncio. Em Eliade vamos encontrar uma interessante citação do Rev. Pe Hausherr, especialista nos estudos sobre o hesicasmo.

Assim, senta-te em uma cela tranqüila, afastado em um canto e aplica-te a fazer o que digo: fecha a porta, ergue teu espírito acima de todo objeto vão ou passageiro. Depois, apoiando a barba contra o peito, dirige o olho do corpo, ao mesmo tempo que todo teu espírito, para o centro de teu ventre, isto é, para teu umbigo; comprime a aspiração do ar que passa pelo nariz de modo a não respirar à vontade e perscruta mentalmente o interior de tuas entranhas à procura do lugar do coração, que todas as potências da alma amam freqüentar. No princípio encontrarás trevas e uma opacidade persistente, mas se perseveras, se dia e noite praticas o exercício, acharás, oh! maravilha! uma felicidade sem limites. (ELIADE, 1997:67)

A descrição do texto tem uma profunda analogia com a técnica yóguica da meditação, havendo apenas uma diferença nos objetivos a que se propõe: entre os hesicastas a postura e a respiração preparam para a oração, que é uma atividade mental, 20- Leloup define Hesicasmo como o método de oração dos hesicastas – os observantes do silêncio – em busca de hesychia – a quietude. (LELOUP, Jean-Yves, Escritos sobre o Hesicasmo, Uma tradição

mas entre os yogues esta prática tem como objetivo ir além da mente, uma meditação que deve levar o praticante á “união” com o Si Mesmo, ao estado de Yoga.

Mas, voltando a nossa análise retrospectiva, um outro nome, de origem indiana que merece ser citado pelo estímulo que deu ao início das pesquisas relacionadas ao Hatha- Yoga na Índia é Swami Kuvalayananda.