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A confissão e o leitor

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 180-198)

8. A CONFISSÃO AUTOBIOGRÁFICA NO ENSAIO

8.2. A confissão e o leitor

María Zambrano sustenta que a confissão opera a função primordial de fazer com que o leitor revise a sua consciência tal como o empreende o confessor.

[...] la confesión, al ser leída, obliga al lector a verificarla, le obliga a leer dentro de sí mismo, cosa que el lector curioso no quiere por nada, pues él iba para

mirar por una puerta entreabierta, para sorprender secretos ajenos, por una falta de precaución, y se encuentra con algo que le lleva a mirar su propia conciencia. La confesión literariamente tiene muy pocas exigencias, pero sí tiene ésta de la que no sabríamos encontrar su receta y es: ser ejecutiva, llevarnos a hacer de la misma acción que ha hecho el que se confiesa: ponernos como a él a la luz. (ibid., p.45)

María Zambrano assinala que o fundamental na confissão não é ser visto, porém deixar-se ver com o objetivo de que nos sintamos unificados, identificados pelo mesmo olhar, pois todos os que fazem uma confissão expressam igual intuito de recobrar um paraíso perdido. María Zambrano, em seus ensaios, tem o intuito de problematizar certas questões de seu tempo e conquistar uma harmonia existencial impossível no presente. A confissão, como gênero literário presente nos ensaios da autora, é mais um reflexo das preocupações da escritora enquanto intelectual, visto que o seu papel na sociedade ultrapassa os limites da realidade, refluindo para o espaço de suas produções literárias, que se constituem a partir da articulação entre crítica e criação; a experiência humana inevitavelmente contamina a experiência literária, pois é muito enriquecedor que a experiência de um indivíduo, neste caso o autor, seja aproveitada pela experiência do outro, pela experiência de outros escritores literários e personagens emblemáticos que marcaram indelevelmente a tradição cultural do Ocidente e universal. É, dessa maneira, que a escritora adquire uma determinada identidade e fama dentro da história de seu tempo, é dessa forma que se revela e se destaca perante os demais.

Na representação autobiográfica, o fazer do texto é concomitante a um (des)fazer do sujeito que o cria, instaurando assim, uma trajetória dupla de auto- reflexão artística. A autobiografia confessional procura a coerência e a unidade, entretanto, esse objetivo é muito difícil de alcançar, na medida em que, desde o início, o autor contempla-se desdobrado entre sujeito e objeto do seu discurso; é duplamente personagem enquanto escritor e matéria da escritura. Escrever é indiscutivelmente obliterar o passado por meio de uma memória voluntariamente falha ou não. Esse conhecimento lacunar, fragmentário e incompleto, proporcionado pela memória é que articula escrita e leitura e é intermediando uma e outra que surge a imaginação. A confissão autobiográfica concentra-se na rememoração de fatos passados.

Escrever, segundo Roland Barthes e Rafael Argullol (1990), supõe uma renúncia de si mesmo levada a cabo pelo próprio autor. Essa desapropriação do

sujeito com a finalidade de construir um outro supedita a autobiografia confessional. Como Argullol e Barthes, também Paul De Man (1991, p.6) divulga que a negação da propriedade do eu, na medida em que exprime que o desdobramento do sujeito em eu narrador e em eu narrado, além da multiplicação do eu narrado observada no seu contar e até recontar, denota que o texto confessional autobiográfico é um artefato teórico e que o artifício da literatura, distante de reproduzir ou criar uma vida, antes de qualquer coisa, efetua a sua desapropriação. Michael Sprinker (1991) dedica-se ao estudo do texto para defender o pensamento de que, na autobiografia, de maneira similar ao processo confessional, o sujeito, muito longe de controlar o texto, encontra-se constituído por um discurso que nunca domina, produzido por uma inconsciência inapreensível, constantemente em mudança. Paul De Man, inclusive, chega a admitir que talvez devéssemos pensar que o projeto autobiográfico produz e determina a vida.

Em suas últimas obras, Paul De Man procura inserir-se profundamente na estrutura retórica dos textos autobiográficos para demonstrar de que maneira a estrutura da mimesis engendra a ilusão de referencialidade na autobiografia. Sendo assim, a autobiografia não se destaca por nos fazer conhecer um sujeito, que realiza a empresa de contar a sua vida por escrito, mas oferece-nos outro tipo de conhecimento, que é o de que, através de uma estrutura artística bastante especial, dois ou mais sujeitos se olham reciprocamente, reconstituindo-se e repensando-se igualmente. A necessidade que revela a autobiografia de uma dupla construção do eu reflete curiosamente, segundo Ángel G. Loureiro (1991), a mesma estrutura tropológica da de todo conhecimento, a qual conta evidentemente com o conhecimento do próprio sujeito. A denominação ‘tropo’ para Paul De Man e a de ‘pacto autobiográfico’ de Philippe Lejeune (1991) consistem justamente em compreender a autobiografia como essa linguagem figurada, alegórica, ilusória em que o eu narrado cambiante preenche e determina o eu incompleto que se desnuda em confissão e vice-versa. Esse refluxo de estrutura tropológica verificado no processo da escritura autobiográfica e no cerne de toda a captação de conhecimento também se observa na leitura. Dessa maneira, podemos inferir com Paul De Man que a autobiografia apresenta-se

como uma forma de textualidade, que possui a estrutura reflexa, ou seja, recíproca de influência do conhecimento e da leitura, a qual afeta o autor, o leitor e a própria escritura.

Paul De Man ensina-nos que o tropo principal na autobiografia é a prosopopéia, que consiste em colocar o escritor palavras ou discursos na boca de pessoas verdadeiras ou fingidas; na verdade, a prosopopéia dá rosto e voz aos vivos, aos ausentes e aos mortos, conferindo-lhes o status de criação literária, em última instância, de personagens. Completando o pensamento de Paul De Man, Ángel G. Loureiro sustenta que apesar de os dois sujeitos presentes na autobiografia determinarem-se reflexivamente por meio desse tropo, a figura que reside no centro dessa determinação desfigura-os simultaneamente, visto que a linguagem dos tropos é sempre despojadora. Essa linguagem alienante caracterizadora da escritura autobiográfica torna possível ao escritor construir deliberadamente um sujeito ficcional que encubra o seu próprio eu, desfigurando- o perante o leitor em virtude do vigor e da presença literária que adquire o personagem do eu autor dentro da obra de arte.

Dessa maneira, portanto, é instigante observar como o ensaio zambraniano tendo reflexos autobiográficos e confessionais, coloca o sujeito como um palimpsesto, no qual a exatidão e a veracidade do passado, do presente e do futuro são completamente duvidosas e ambíguas. Esse fato reitera a opinião de Paul De Man sobre a autobiografia como desfiguração, conforme podemos ler na citação seguinte:

En cuanto entendemos que la función retórica de la prosopopeya consiste en dar voz o rostro por medio del lenguaje comprendemos también que de lo que estamos privados no es de vida sino de la forma y el sentido de un mundo que sólo nos es accesible a través de la vía despojadora del entendimiento. La muerte es un nombre que damos a un apuro lingüístico y la restauración de la vida mortal por medio de la autobiografía (la prosopopeya del nombre y de la voz) desposee y desfigura en la misma medida en que restaura. La autobiografía vela una

desfiguración de la mente por ella misma causada. (DE MAN, P.,1991, p.6)

Ángel G. Loureiro adverte que a linguagem despojadora e a natureza tropológica da linguagem autobiográfica afastam-se, em grande medida, das teorias de Starobinski (1970), que defende a verdade auto-referencial do estilo como descobridor e não como encobridor da interioridade do escritor autobiográfico. Para um teórico como Starobinski, a autobiografia apresenta-se

como um contrato assinado com a verdade do sujeito descrito na obra de arte, no sentido de que esta nos conduziria à revelação do interior do autobiógrafo- confessor. Paul De Man, por sua parte, insistimos, propugna a autobiografia como a desfiguração prosopopéica da verdade do escritor no tocante ao rosto e à voz. A personalidade desfigurada ou restaurada, segundo Paul De Man, pode desdobrar- se incessantemente na escrita de outras personalidades diversas ou semelhantes, pois, embora muito presente, já não se encontra, em primeiro plano, a marca pessoal que as identifica e individualiza.

Derrida (1982), em L’oreille de l’autre, por meio do estudo de Ecce Homo (1888), obra autobiográfica de Nietzsche, esclarece que não é possível distinguir radicalmente vida e obra, contudo também não podemos pretender explicar uma pela outra como teoriza Starobinski. Necessitamos refletir sobre o autobiográfico a partir de uma premissa que pressuponha paradoxalmente a união, a separação e o refluxo simultâneos entre vida e obra. Quando tomamos em consideração essa concomitante miscelânea e separação entre a essencialidade de uma obra e a vida empírica de um autor, sobrevêm-nos novos horizontes na interpretação do sentido do ensaio, da autobiografia e da confissão. A identidade do escritor recebe novas configurações, as quais dependem de uma revisão da criação autobiográfica no referente ao nome do personagem ficcional, autor inspirador do texto, e à assinatura do nome do escritor. Derrida esclarece, ainda, que o texto autobiográfico não é assinado por um autor que se compromete com uma identidade comum histórica em relação ao personagem sobre o qual escreve, mas que a estrutura da assinatura faz com que quem firme, na realidade, seja o destinatário do texto autobiográfico. A assinatura, em outras palavras, não se concretiza no momento da escritura, porém no momento em que o outro lê ou escuta o escritor. Em definitivo, o destinatário da autobiografia escreve no lugar do autobiografado. A ‘orelha do outro’ assina pelo escritor e, enfim, constitui o seu eu autobiográfico. Na proporção em que temos conhecimento de que o eu passa sempre pelo outro, torna-se claro que o empreendimento autobiográfico, paradoxalmente longe de ser auto-suficiente, percebe-se comprometido com o aval e a legitimação realizados pelo leitor do nome e da assinatura do escritor. Conforme faz-nos compreender Derrida, essa passagem da assinatura e a escritura

do eu através da orelha do outro converte, na verdade, o autobiográfico em heteroautobiográfico.

Junto à modernidade, a época contemporânea despontou também impiedosamente com avanços materiais e preços altos a pagar, como se o tormento dos antigos povos em relação à premonição trágica do futuro estivesse sendo atualizado em um momento presente. Como já abordamos, María Zambrano, com o propósito de compreender e se liberar da perseguição trágica do seu tempo em crise, resolve ensaiar a sua vida, o seu país, o seu povo e a sua filosofia, que simbolizam e representam as suas atribulações.

É vital não deixar no esquecimento que a modernidade criou, por meios dos adiantamentos científicos, uma imagem arquetípica de herói e, ao fazê-lo, ob- teve enorme atenção e adeptos. María Zambrano, por sua vez, ao revisitar o pas- sado, demonstra que, na literatura, possuímos exemplares heróicos mais fortes, justos e humanos do que a ideia de herói promovida pela indústria, pela mecani- zação e pelo capital moderno, notabilizado pela pujança econômica e pelo interes- se exclusivamente individual.

As relações que se identificam entre María Zambrano e a autobiografia são facilmente percebidas em suas obras ensaísticas, cujo principal tema é abor- dar as possibilidades de uma filosofia da existência em contraposição a uma épo- ca racionalista e positivista. A autobiografia, como uma forma de confissão, apa- rece como um método de mediação, a fim de decifrar os enigmas da vida. O en- saio a serviço do romance, da poesia, da autobiografia e da confissão demonstra que as manifestações literárias são formas complementares e transformadoras do conhecimento do homem e de suas contingências. Dada essa importância que Ma- ría Zambrano concede à autobiografia como expressão confessional, é que a auto- ra publica, em 1943 (reedições em 1988 e 1995 e também em 1989 na obra Notas de un método), La confesión: género literario y método, que trata da necessi- dade do homem de viajar para dentro de um saber da alma, quando a cultura pas- sa por momentos de questionamento e reforma e o ser humano, mergulhando nas profundezas infernais de si, busca uma saída por se sentir órfão de sustentação es- piritual. De acordo com María Zambrano, a confissão, manifesta pela palavra ge- ralmente em 1ª pessoa, pode salvar o homem da grande distância surgida na civi-

lização ocidental entre vida e pensamento: “El género literario que en nuestros ti- empos se ha atrevido a llenar el hueco, el abismo ya terrible abierto por la ene- mistad entre razón y vida.” (ZAMBRANO, M., 1995, p.13) O interesse da autora espanhola por esse gênero literário abre os nossos horizontes para o posterior es- tudo de El hombre y lo divino, pois, ao procurar descobrir as principais caracte- rísticas da confissão voltando às suas origens, a resitua como elemento subsidiá- rio de análise para compreender um mundo dominado pela crença racional positi- vista. Essa conduta propicia, ainda, acompanhar a evolução do homem ocidental, segundo as concepções filosóficas modernas vigentes naquele período.

No ensaio intitulado “Hacia un saber sobre el alma” (ano XII, nº CXXXVIII, dezembro 1934) publicado novamente, em 1950, em uma obra com o mesmo título, Zambrano propõe que se aceite a história dentro de uma visão poética, na qual o sujeito literário testemunha, à sua maneira, as experiências que tem com o mundo tomando uma postura, que leva em consideração o confessional estimulado pela expressão única dos sentimentos anímicos pessoais. Nesse texto, a escritora espanhola expõe suas ideias sobre a razão poética, ‘razón de amor reintegradora de la rica sustancia del mundo’, onde poesia e povo possuem laços íntimos. Em seu ensaio, María Zambrano recupera a tão conhecida frase de Pascal tantas vezes repetida até os dias de hoje: “hay razones del corazón que la razón no conoce” (ZAMBRANO, M., 1934, p.264) para deixar claro que é necessário um saber da alma, que permita a descoberta e a revelação de uma maneira de organizar o interior do sujeito. Excetuando-se as críticas que se possam estabelecer a respeito, o homem vem buscando esse ‘conhecimento da verdade’ ou esse ‘conhecimento verdadeiro’ ao longo do tempo a partir das diversas formas de manifestação que criou e que lhe possibilitaram ver mais longe do que imaginava. Entre essas manifestações, está evidentemente a literatura. A ensaísta ainda menciona vários outros intelectuais como Max Scheler, Espinosa e Nietzsche que abordam o ser humano em uma esfera não somente da lógica do pensamento, mas também da alogicidade do emocional, na qual reside historicamente, desde os princípios do cristianismo, a salvação da alma pelo amor ao próximo e a si mesmo. Empreender esforços para conseguir esclarecer a verdade, encarando o pensamento como fragmento de outros pensamentos é o

passo fundamental para que esta verdade se revele diante de seu interlocutor e faça com que o homem se descortine frente à sua vida. Esse é um dos propósitos pilares da Filosofia, a qual apregoa que ao tentar revelar, o homem acaba revelando-se a si mesmo em suas lucubrações. Zambrano cita Platão e diz que “es la Filosofia, [...] camino de vida” (ibidem, p.262), pois na busca da verdade comum e particular o ser humano sente-se reconfortado para lidar com a angústia do correr do tempo que vive e com o seu próprio esgotamento na passagem de tudo, no esvair da vida. Em lugar do sofrimento da paulatina anulação, o homem regozija-se no prazer da caminhada do mesmo modo que o rio não é igual sem o seu leito. Tal atitude simboliza renovação e novas oportunidades de fazer diferente o percurso pessoal no tempo cósmico ilimitado da existência para vencer os desafios ou obstáculos que vão aparecendo. A filosofia surge, assim, como esse caminho de vida que ordena o entorno e admite deslocar-se a inusitados rumos, consentindo, dessa maneira, à razão novas possibilidades. Ante a necessidade de revisar a condição de ser do homem, María Zambrano anuncia que:

La cultura moderna fue arrojando de sí al ser total del hombre, cuidándose sólo de su pensamiento. […] En realidad, quedaba el alma como un residuo. Por una parte, la Razón del hombre alumbraba la naturaleza; por otra, la razón fundaba el carácter transcendente del hombre, su ser y su libertad. Pero entre la naturaleza y el yo del idealismo, quedaba ese trozo del cosmos en el hombre que se ha llamado alma. (ibid., pp.265, 266)

A pensadora espanhola comenta, em seu texto, sobre a existência de um duplo saber do homem, que aparece como revelação de sua essência dual e conflitiva: o da razão que ele pensa dominar e o do poético, do cosmo e da natureza, que compõem um universo do não dominado. É interessante a análise de María Zambrano acerca do século XIX, onde lhe desperta a curiosidade o paradoxo do avanço ou do domínio do homem sobre a natureza e da vivência romântica consciente do homem em relação à atração irresistível pela natureza.

La naturaleza para el romántico es inmensa, inabarcable, infinita, y la ve en sus máximos momentos de furia esplendorosa: en la tempestad, en el rayo, en «montaña abrupta», en «el mar insondable», en «los abismos sin fin», en «las profundas simas de la tierra y el cielo». (ibid., p.266)

A ensaísta espanhola explica que ao mesmo tempo em que o homem romântico do século XIX submete as forças da natureza pelo pensamento racional, disserta poeticamente sobre essa natureza com terror e espanto ou admiração divina, onde ele vislumbrava refletida a sua alma, a sua verdadeira essência, repleta de tempestades, abismos e simas, dificilmente visível na esfera racional e por ela, nesse momento, abandonada por completo. A natureza como a poesia eram o lugar onde o homem buscava a sua alma ou onde a alma do homem se buscava a si mesma. Na verdade, na arte romântica conjugaram-se natureza e alma. O homem não está constituído simplesmente de razão, tampouco de alma; a vida oscila entre paixões e pensamentos, intermediados por silêncios que esperam outras respostas. Na medida em que ninguém ousa afirmar um saber radical, o conhecimento proveniente das paixões era interpretado como confissão ou confidência. O enlace entre a natureza e a alma traduz um saber originário que buscava o autoconhecimento presente, conforme assevera Zambrano, nos ritos órficos e no culto a Dionísio. Entretanto, o processo opera-se de modo distinto do processo levado a cabo pelo romantismo no século XIX. Ao passo que o romântico humaniza a natureza e nela empreende a busca pelo plástico e pela figura, no culto a Dionísio, a alma procura na natureza o que ela tem de musical, em uma reconciliação cósmica da alma com a vida, a fim de enfrentar suas incomodidades internas.

Porque toda soledad ha sido sentida en un principio como un pecado, como algo de lo que se siente remordimientos. Cada distancia que el hombre conquista con respecto al resto del universo, le crea una soledad que al principio le da terror y remordimientos. Y de la soledad recién conquistada, retrocede a abrazarse con lo que acaba de dejar. (ibid., p.273)

Diferentemente da história moderna, nas culturas originárias como a helênica a normalidade estava na harmonia entre alma e cosmos, como uma forma de escapar às dores da solidão e da dúvida sobre si mesmo, para que se pudesse seguir adiante a partir das descobertas de si, em uma antecipação da famosa frase ‘conhece-te a ti mesmo’ socrática. De fato, no decorrer de toda a história, a alma vem buscando-se a si mesma por meio da natureza tanto nas religiões gregas, como também na arte romântica, como uma maneira de tentar organizar a

realidade a partir da ação de perguntar do homem, que tem a intenção de se livrar do desconhecimento, que surpreende em si mesmo. Somente assim, o homem pode ter uma consciência mais clara do que é e do que não é, revelação importante para o seu autodescobrimento em uma dimensão concreta ou real. É fato que a razão pós-cartesiana mostra a importância de abordar o humano no que possui de intransferível, irracional, situacional e subjetivo. Para María José Clavo Sebastián,

El hombre comienza a ordenar su mundo cuando puede inventar dioses, es decir, a conferir algún tipo de entidad a aquello por lo que se siente mirado y perseguido. De modo que cuando en el universo del ser humano aparecen los dioses con figura y nombre aparecen también, las cosas y los seres. Este

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 180-198)