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A constitucionalidade do direito à restituição dos valores recolhidos na

1 CAPÍTULO

3.7 A constitucionalidade do direito à restituição dos valores recolhidos na

em valor menor que o presumido (ADI nº 2.675 e ADI nº 2.777, pendentes de julgamento)

3.7.1. Breve resgate prévio

O sujeito passivo da obrigação tributária pode ser o contribuinte, que tem relação direta com a ocorrência do fato gerador, ou o responsável, o qual, embora sem relação pessoal, está vinculado de alguma maneira ao fato gerador, tendo a lei lhe atribuído a responsabilidade pelo cumprimento da obrigação tributária.

declaração de inconstitucionalidade. Repito: inconstitucionalidade. O preceito visa a minimizar eventuais efeitos perniciosos decorrentes da retroatividade dos efeitos de declaração de inconstitucionalidade. Declarações de inconstitucionalidade não geram efeitos perniciosos ao operarem retroativamente. Para tanto devem existir. Declarações judiciais de constitucionalidade confirmam, positivamente. Não se modulam declarações de constitucionalidade de leis ou atos normativos – toda a gente sabe disso.”

A responsabilidade tributária pode ser classificada como “por substituição” ou “por transferência”, conforme o momento em que surge o vínculo do responsável. No primeiro caso, contemporaneamente à ocorrência do fato gerador, e, no segundo, em momento posterior.

Para a compreensão da discussão nos termos propostos nesta subseção, importa entender os casos de responsabilidade por substituição, a qual pode ser regressiva (antecedente, para trás) ou progressiva (subsequente, para frente). A terminologia empregada na classificação refere-se ao substituído, conforme a sua posição atrás ou à frente do responsável pelo cumprimento da obrigação tributária.

Nos casos de substituição tributária regressiva, a lei atribui a responsabilidade pelo recolhimento dos tributos a ocupantes situados nas posições posteriores da cadeia produtiva, de modo a facilitar a administração tributária nas situações em que há concentração ao longo das etapas, com diversos fornecedores e um menor número de adquirentes, como, por exemplo, os produtores de leite e as indústrias de laticínios.

Na substituição regressiva, embora ocorra verdadeiro diferimento do pagamento do tributo, a Administração Tributária obtém a vantagem de ver seus esforços fiscalizatórios recaírem sobre uma quantidade menor de estabelecimentos. Quanto a essa modalidade, não existem controvérsias judiciais relevantes.

Já a substituição tributária progressiva ou para frente se cuida de técnica de arrecadação e fiscalização dos tributos por intermédio da qual se atribui a contribuinte situado nas posições iniciais da cadeia de produção a responsabilidade pelo recolhimento dos tributos devidos pelos que lhe sucederão na mesma cadeia, com a simples ocorrência do primeiro fato gerador, presumindo-se o valor final do produto427.

A constitucionalidade da referida técnica foi posta em dúvida428, tendo a EC nº 3/93 inserido o § 7º no art. 150 da CF/88, de modo a cessar a discussão quanto a tal

427 No caso do ICMS, conforme o art. 8º da LC nº 87/96: “Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será: I - em relação às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído; II - em relação às operações ou prestações subseqüentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes: a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário; b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço; c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subseqüentes. (...)”.

428 Os principais argumentos são a seguir relacionados: agressão ao princípio da tipicidade tributária, pela

exigência tributária tida como despida de fato gerador; violação do princípio da capacidade contributiva e do não confisco, em razão da transferência do encargo financeiro ao adquirente que paga o tributo antes de receber o montante referente à venda da mercadoria;

possibilidade429. No âmbito do STF, o julgamento do RE nº 213.396, da relatoria do Ministro Ilmar Galvão, em 02.08.1999, reconheceu a legitimidade da medida de política fiscal em questão, inclusive de forma independente da previsão constitucional inserida.

Com efeito, as situações de simples não realização já foram expressamente contempladas no texto constitucional: antecipado o pagamento do tributo e não ocorrendo o fato gerador, ocorre a restituição do valor integral. Persiste, no entanto, a dúvida referente ao direito de restituição em situação diferente, qual seja, nos casos de ocorrência do fato gerador em valores menores que os presumidos.

Considerando o silêncio constitucional para essa hipótese, foi celebrado no âmbito do CONFAZ o Convênio ICMS nº 13, de 1997, cuja cláusula segunda previu que não caberia a restituição ou cobrança complementar do ICMS quando a operação ou prestação subsequente à cobrança do imposto, sob a modalidade da substituição tributária, se realizar com valor inferior ou superior àquele estabelecido com base no artigo 8º da LC nº 87/96 (pauta fiscal)430.

A constitucionalidade da referida cláusula segunda foi declarada pelo STF no bojo da ADI nº 1.851. O fundamento da decisão do STF consiste na interpretação literal da CF/88 e na argumentação de que a celebração do Convênio ICMS nº 13, de 1997, objetivou prevenir guerra fiscal resultante de eventual concessão de benefício tributário representado pela restituição do ICMS cobrado a maior quando a operação final for de valor inferior ao do fato gerador presumido. Na ADI nº 1.851, ficou consignado, ainda, que o fato gerador presumido na substituição tributária não é provisório, mas definitivo, não dando ensejo à restituição ou complementação do imposto pago, exceto para o caso de inocorrência do fato gerador.

Com efeito, não signatários do Convênio ICMS nº 13, de 1997, os Estados de São Paulo e Pernambuco editaram leis prevendo a restituição do valor que eventualmente viesse ser recolhido a maior. Considerou-se que o STF, no julgamento da ADI nº 1.851, simplesmente teria alcançado o entendimento de que “não seria inconstitucional a inexistência do direito à restituição”, o que representa sutil diferença

429“Art. 150. (...) § 7.º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993).”.

430 A cláusula primeira do Convênio ICMS nº 13, de 1997, seguindo as regras constitucionais, estabeleceu

que “A restituição do ICMS, quando cobrado sob a modalidade da substituição tributária, se efetivará quando não ocorrer operação ou prestação subsequentes à cobrança do mencionado imposto, ou forem as mesmas não tributadas ou não alcançadas pela substituição tributária.”.

em relação à afirmação no sentido de que “é inconstitucional o direito à restituição” nessas hipóteses.

Pretendendo ver consagrado o mesmo entendimento da ADI nº 1.851, o Governador do Estado de São Paulo ajuizou a ADI nº 2.777, que pretende a declaração de inconstitucionalidade do art. 66-B, inc. II, da Lei nº 6.374/89, com a redação dada pela Lei nº 9.176/95431, ambas leis do Estado de São Paulo, que garante aos contribuintes submetidos ao regime da substituição tributária para frente o direito à restituição do imposto sobre circulação de mercadorias e serviços – ICMS pago em excesso.

Por seu turno, a ADI nº 2.675, ajuizada pelo Governador do Estado de Pernambuco contra o art. 19, inciso II, da Lei Estadual nº 11.408/96432, que assegura a restituição na situação em referência de ocorrência do fato gerador em valor a menor, discute a mesma questão.

3.7.2. Resumo da questão discutida

Em síntese, nas ADI’s nº 2.675 e nº 2.777, debate-se se o art. 150, § 7º, da CF/88, apresenta uma única interpretação possível – qual seja, inexiste direito à restituição na hipótese de ocorrência do fato gerador a menor, na linha do julgamento da ADI nº 1.851 –, ou se o dispositivo constitucional comporta igualmente a possibilidade de restituição, já que as legislações impugnadas são oriundas de Estados não signatários do Convênio ICMS nº 13, de 1997.

3.7.3. Fundamentos decisórios elencados

O julgamento das ADI’s nº 2.675 e nº 2.777, iniciado em 27.11.2003, encontra- se pendente.

O Ministro Carlos Velloso, relator da ADI nº 2.675, votou pelo julgamento improcedente da ação, para declarar a constitucionalidade da norma impugnada, por

431 “Art. 66-B: "Fica assegurada a restituição do imposto pago antecipadamente em razão da substituição tributária... II - caso se comprove que na operação final com mercadoria ou serviço ficou configurada obrigação tributária de valor inferior à presumida.”.

432“Art. 19. É assegurado ao contribuinte-substituto o direito à restituição: (...) II - do valor parcial do imposto pago por força da substituição tributária, proporcionalmente à parcela que tenha sido retida a maior, quando a base de cálculo da operação ou prestação promovida pelo contribuinte-substituído for inferior àquela prevista na antecipação.”.

considerar que o caso da lei pernambucana seria diferente da questão debatida na ADI nº 1.851.

Seguindo o mesmo caminho, o Ministro Cezar Peluso, relator da ADI nº 2.777, considerou que o regime de substituição tributária previsto no Convênio ICMS nº 13, de 1997, seria de adesão opcional por parte do Estado membro e que nesse sistema igualmente estaria previsto um benefício fiscal ao contribuinte consistente na redução da base de cálculo. Considerando o Ministro Cezar Peluso que a legislação do Estado de São Paulo tinha como único objetivo promover a máxima arrecadação, sem qualquer contrapartida, entendeu constitucional a previsão de devolução pelo Estado do montante pago a maior, por faltar-lhe competência constitucional para a retenção de tal diferença, sob pena de violação ao princípio constitucional que veda o confisco.

Na sessão de 17.08.2005, o Ministro Nelson Jobim antecipou seu voto na ADI nº 2.777, abrindo divergência, para declarar a inconstitucionalidade do art. 66-B, II, da Lei paulista nº 6.374/89. Considerou o Ministro que não existia diferença substancial entre o que analisado na ADI nº 1851 e a questão da ADI nº 2.777.

Nesse momento, aparecem importantes reflexões do Ministro sobre as consequências das interpretações postas, conforme se passa a detalhar.

Segundo explica o Ministro Jobim em seu voto antecipado, não se afigura possível equiparar, para fins do direito à restituição, a não realização do fato gerador e a simples ocorrência a menor que o presumido. Isso porque demandaria do Fisco a necessidade de proceder à fiscalização das etapas subsequentes da cadeia de produção, o que inviabilizaria a existência da sistemática da substituição tributária.

Além disso, alertou o Ministro Jobim para o risco de a interpretação diversa (do relator Ministro Cezar Peluso) dar margem à “guerra fiscal” e comprometer a própria estrutura da federação. Afastando a interpretação extensiva do art. 150, § 7º, da CF/88, o posicionamento do Ministro Jobim foi noticiado da seguinte forma:

Ressaltou que a regra do art. 150, § 7º, da CF, limita a restituição de valores na hipótese de não se configurar o fato gerador presumido, o qual, composto por dois elementos — a saída da mercadoria do estabelecimento do substituto e a presunção de circulação posterior, isto é, da venda futura da mercadoria — seria definitivo, ou seja, ele ocorre ou não. A presunção constitucional, nesse dispositivo, diria respeito unicamente à ocorrência desses elementos, nada se relacionando, entretanto, com a base de cálculo concreta do imposto — valor presumido arbitrado da venda final — que, por estar excluída do esquema lógico da norma jurídica, não poderia ensejar nem restituição do valor recolhido a maior pelo Fisco, nem pagamento suplementar do contribuinte pelo valor tributário recolhido a menor. Não havendo direito à