• Nenhum resultado encontrado

A construção do conhecimento e da pessoalidade em formação: o papel

7. A carreira dos professores

7.1. A construção do conhecimento e da pessoalidade em formação: o papel

72

Estamos na era das "pessoas" e das grandes transformações. As escolas, assim como todas as outras entidades e organizações, estão no mundo, fazem parte deste grande contexto global de mudanças. Essa é a grande visão que desponta no cenário educacional: os professores precisam comandar as mudanças, em vez de serem levados por elas. A escola de hoje requer um professor mais crítico, criativo, que participe, que empreenda; um professor mais inteiro e com mais consciência profissional. É, pois, necessário, segundo Alarcão (1997), promover a consciencialização de que o professor não é simplesmente um agente de mudanças, mas um agente nas mudanças, fazendo parte delas, não sendo apenas um catalisador do processo. Isso exige uma reformulação na sua prática pedagógica e na concepção do acto de educar.

A formação dos professores tem de ter, por isso, uma vertente científica, tecnológica, humanística ou artística.

Como educador, a sua actividade tem de assentar numa sólida formação cultural, pessoal e social. O professor é uma figura de cultura. É por isso importante que ele possa adquirir formação noutras áreas do saber para além das da sua especialidade, sendo esta a opinião de Shulman (1987, citado por Alarcão, 1997) quando refere que “um professor para ser um verdadeiro profissional e agente de construção de conhecimento e de pessoalidade, deverá ser um especialista nas suas aéreas profissionais e dominar os processos e as estratégias do ensino-aprendizagem” (p.92). Para este autor o educador deverá ser capaz de se expressar, nunca perdendo o rigor, os seus conhecimentos, auxiliando-se dos conhecimentos em áreas como a Psicologia, a Pedagogia, a Sociologia e a Didáctica.

A experiência de várias décadas de formação de professores em Portugal, e a investigação educacional (tanto no nosso país como no estrangeiro), mostram que esta

_______________________________________________ Universidade do Algarve

Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Escola Superior de Educação Mestrado em Supervisão

73 formação não se pode reduzir à sua dimensão académica (aprendizagem de conteúdos organizados por disciplinas), mas tem de integrar uma componente prática e reflexiva. Só esta componente permite o reconhecimento dos principais caminhos a percorrer no contacto com o terreno da prática profissional, faculta experiências de formação que estimulam a mobilização e a integração dos conhecimentos e problemáticas por parte dos formandos, e proporciona o desenvolvimento da sua capacidade de compreensão do real através da observação e da intervenção. A competência do professor não se constrói por justaposição, mas por integração entre o saber académico, o saber prático e o saber transversal (Alarcão, 1997).

O conceito de professor pressupõe um profissional eficiente, que relaciona teoria e prática num processo de reflexão, realizando a prática da educação reflexiva. O pensamento pedagógico actual inclui na formação do futuro profissional uma forte componente de reflexão sobre a prática vivida, propondo a formação de profissionais capazes de enfrentar situações novas e diferentes na educação, e optar pelas decisões mais apropriadas.

O paradigma que proporciona um modelo formativo como o exposto, e que possibilita a interligação entre a teoria e prática, é a prática da reflexão, ou seja, o paradigma pedagógico e as propostas de Schön (citado por Alarcão, 1997). O pensamento pedagógico de Schön defende que a formação do futuro profissional deve incluir o componente da reflexão, pois só assim o profissional será capaz de enfrentar as situações novas e diferentes da vida real e tomar as decisões apropriadas.

A formação de professores baseada neste paradigma, deve valorizar a reflexão sobre a acção e realizada nos locais de trabalho, tendo em vista a construção de uma pedagogia da aprendizagem, ou seja, a criação de espaços onde se valorizem os processos de aprendizagem e desenvolvimento, fomentando, assim, o sucesso escolar.

74

Schön (1990) formula a sua perspectiva em torno de três aspectos: o conhecimento prático, reflexão da prática e a reflexão sobre a prática.

Para o autor o professor possui um conhecimento que utiliza para a solução de diferentes questões. É um conhecimento tácito, ou um conhecimento adquirido na prática. Este conhecimento “manifesta-se na espontaneidade” (Alarcão, 1996, p.37) e, portanto, não é sistematizado. É um conhecimento que se expressa na execução de uma dada tarefa, sem ter a necessidade de uma reflexão prévia.

Na medida em que o professor coloca a si próprio as questões do quotidiano tais como situações problemáticas, está a reflectir, está à procura de uma interpretação para aquilo que é vivido. Quando o professor faz esta reflexão ao mesmo tempo em que vive uma determinada situação, para Schön (1990), ele faz uma “reflexão na acção”. Esta etapa permite uma reorientação da acção no exacto momento em que a está a viver. Se esta reflexão se dá após a acção e tem carácter retrospectivo, o professor reflecte “sobre a acção”. Há, então, um certo distanciamento, um olhar distinto daquele que vivenciou aquela acção.

Por fim, um outro momento deste processo de reflexão é a “reflexão sobre a reflexão na acção”. Este processo é mais elaborado, e acontece quando o próprio profissional procura a compreensão da acção, elabora a sua interpretação e tem condições de criar outras alternativas para aquela situação.

Segundo a teoria de Spiro (1987), para a construção do conhecimento e da pessoalidade em formação de professores, o conhecimento necessário num certo momento não é, simplesmente, recuperado através da memória e na forma em que lá se encontra; para o autor, o conhecimento necessário é construído em cada caso com base no conhecimento anterior disponível. Novos contextos e aprendizagem avançada exigem que os conhecimentos e experiências existentes sejam seleccionados,

_______________________________________________ Universidade do Algarve

Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Escola Superior de Educação Mestrado em Supervisão

75 combinados e adaptados de forma também nova, ou seja o docente vai construindo o conhecimento à medida das suas necessidades.

A opinião de Van Manem (1977), por seu lado, é concordante com as teses de Schön, pois este autor defende uma reflexão “sobre a acção” e uma “reflexão sobre a reflexão na acção”. Como estratégia fundamental do acto pedagógico, Van Manem (1977) menciona o “tacto pedagógico”, o contacto, ou seja, considera que “o momento pedagógico acontece quando o educador consegue atingir o fundo pessoal do educando e provocar a sua mudança que, por sua vez, irá repercutir-se na mudança pessoal do educando” (p.56).

O facto de o docente reflectir sobre a sua prática, permite-lhe o envolvimento e numa partilha de experiências e saberes, o que constitui um instrumento privilegiado para o conhecimento da vida e para a interpretação da sociedade. Este facto, resulta num considerável contributo para o desenvolvimento pessoal do docente e, paralelamente, permite-lhe participar activamente na construção duma sociedade mais plural e participativa. Segundo Tavares (1998) “o sucesso do cidadão passa necessariamente pelo seu desenvolvimento pessoal. Assim, qualquer sistema de educação que não contribua de uma maneira clara e eficaz para esse objectivo é um sistema condenado irremediavelmente ao fracasso” (pp. 90-91).