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2 AS FERRAMENTAS DIGITAIS ENTRAM NA COBERTURA

2.2 As ferramentas digitais na visão dos jornalistas

2.2.8 A contribuição da ferramenta para a cobertura

Ao analisarmos os depoimentos, podemos notar que o Twitter foi usado em diferentes

situações para ajudar na cobertura da campanha 2010. Para G., o microblog contribuiu na

apuração em pelo menos quatro situações diferentes:

A primeira é aquela coisa de você medir o comportamento do candidato pelo que ele está dizendo ou escrevendo; a segunda é você pautar as crises e as estratégias de campanha; a terceira é acompanhar a agenda do candidato, aquela coisa básica do dia a dia: onde ele está, o que está fazendo. Isso é bem chato, mas importante. E a quarta é rastrear personagens. (G.)

J. e P. também destacam esse papel de agenda desempenhado pelo Twitter como uma

das principais contribuições do microblog para a cobertura:

Os candidatos podem pautar a imprensa pelo Twitter. Coisa que antes acontecia principalmente por meio de discursos. Hoje ele não precisa chamar a imprensa para fazer um comunicado, pode se manifestar através do Twitter. Em níveis estratégicos para a campanha foi bacana. Para os eleitores poderia ser interessante se o candidato estimulasse pensamentos, debates sobre propostas. O Serra fez dois ou três tweets criticando propostas da Dilma. (J.) Hoje (2013) ainda me baseio muito no Twitter para guiar meu dia, para ter um panorama do que está bombando, quais assuntos e temas. Tem sim um papel de agendamento. (P.)

A repercussão nas redes sociais do desempenho dos candidatos nos debates, que como

explicado anteriormente, mudou significativamente a dinâmica da cobertura, foi outra

contribuição da ferramenta na análise dos jornalistas:

Como era uma ferramenta inovadora, o Twitter movimentou as campanhas e serviu não só para aproximar o candidato do eleitorado, mas para divulgar agenda, repassar avisos e trocar alfinetadas com adversários. [...] Acredito que, sem o Twitter, os embates entre os candidatos teriam uma repercussão menor. Isso porque os debates, com suas gafes e provocações, ganhavam mais dimensão nas redes sociais. (M.)

Como vimos anteriormente, independentemente de as ondas ou o movimento das redes

serem criados pelas militâncias, eles pautaram não só a mídia, mas também as campanhas. G.

lembra que o debate religioso, tão abordado nas eleições 2010, foi uma discussão que teve

grande difusão nas redes sociais e na internet como um todo:

O interesse maior era tentar rastrear o que estava sendo dito, o que estava sendo trocado. E ambos, tanto o Facebook quanto o Twitter tiveram um papel importante na reta final do primeiro turno e no início do segundo turno. Foi um debate meio acirrado sobre a questão religiosa, moral, o aborto, a união civil de pessoas do mesmo sexo. Eu me lembro que isso foi muito explorado nas redes sociais, inclusive com links para vídeos. Essa guerra que praticamente pautou as campanhas majoritárias no fim do primeiro turno essencialmente aconteceu nas redes sociais. A Dilma ficou tão assustada com o efeito desse rolo compressor

que ela convocou uma coletiva no QG dela em Brasília reunindo lideranças religiosas ao lado dela pra dizer que não era hostil a essas questões, que não era hostil à vida, à família, esses conceitos fundamentais do cristianismo. (G.)

A busca por um grande furo no Twitter não foi o foco principal do uso da ferramenta

no auxílio da apuração, segundo os relatos dos entrevistados:

As campanhas, se forem divulgar algo pesado, não vão fazer via Twitter, vão ligar e passar para o papel. Agora, o Twitter democratizou o debate no sentido de colocar o que as fontes quiserem discutir. Eles (Dutra e Sérgio Guerra) não precisam ir para um ambiente físico para brigar. O Twitter se transformou num palco de debate político paralelo. Fora os exageros, acho legal, é um lugar para as pessoas falarem coisas. (H.)

[...] não acho que foi determinante (no resultado das eleições), não acho mesmo. Nenhum grande fato, nenhuma grande reportagem nasceu de uma postagem no Twitter. [...] A nota que eles (os políticos ou ou assessores) querem emplacar para um colunista como o Ancelmo eles passam diretamente para o Ancelmo. Se ele botou no Twitter deixou de ser exclusiva e, portanto, não interessa às colunas. Ele pode colocar um comentário ali que um colunista vai aproveitar aquilo para fazer um comentário encima do comentário e virar uma nota. Mas as colunas, em princípio, trabalham com informações exclusivas. Aquilo que é botado no Twitter obviamente não é exclusivo. Pode ser usado para uma análise. (Q.)

Para I., a rede tende a tornar o jornalista mais “preguiçoso”. Cabe a ele, no dia a dia da

produção, não perder o desejo de ir para a rua e apurar as informações sob o risco de fazer um

jornalismo mais óbvio ou até mesmo ser enganado caso não confira o que está na rede. A

tentação de pegar algo que está facilmente disponível é grande, mas em muitos casos, como o

de Aécio Neves citado acima, o tiro pode sair pela culatra:

Está rolando um outro fenômeno de alguns jornalistas que ficaram preguiçosos em cima do Twitter. Uma coisa é o presidente do PT e do PMDB ficarem se xingando na rede, isso é matéria. Outros faziam matérias com apurações feitas no Twitter de coisas que você pode ligar, apurar e confirmar. O Twitter é como uma bússola para te guiar sobre o que está rolando e não deve ser usado sempre como fonte.

Há os mais críticos ao uso da ferramenta, que acreditam que o seu potencial foi

superdimensionado durante a cobertura de 2010:

A impressão que eu tinha, e que agora pode ser ampliada, era de que foi superestimado o impacto que o Twitter tinha na população em geral. Para o jornalista é importante porque ele é um microcosmo. Todos jornalistas estão ali. Acredito que os candidatos usavam o Twitter também para pautar os jornalistas. Serra tinha um milhão de seguidores, que é um número elevado, mas dentro do universo total de eleitores é uma quantia pequena. Acredito que o impacto do Twitter é menos significativo do que se propagou. (J.)

O Twitter fascinou o jornalista. Havia um certo deslumbramento com isso. Agora, já temos um olhar mais amadurecido em relação à ferramenta. (R.)

Além do fato de o Twitter ter uma plataforma bem propícia à cobertura jornalística,

como vimos no capítulo 1, não podemos esquecer que os jornais estão se inserindo nesses

novos meios para mostrar que estão sempre antenados com o que acontece no mundo. É uma

tentativa de marcar a presença do veículo e do jornalista nesse novo ambiente

comunicacional.

A contribuição do Twitter mesmo após a matéria ter sido veiculada também aparece

no discurso de R.: “Jogar a matéria com o link no Twitter parecia ser o último ato. Hoje, o

jornalista depois recorre ao microblog para ver os comentários, corrigir algo, se necessário,

observar os compartilhamentos...”. Esse relato ilustra bem o que Zago (2012) chama de

recirculação jornalística. Segundo a autora, interagentes podem usar o Twitter para comentar,

expressar opinião, criticar, reagir com humor a determinados acontecimentos jornalísticos e

para filtrar notícias (quando eles postam pequenas notas, links ou manchetes), vindo a

contribuir para o que ela chama de recirculação jornalística. “A recirculação jornalística

compreenderia, assim, acontecimentos jornalísticos filtrados e comentados por interagentes,

que contribuem, direta ou indiretamente, para aumentar o alcance de uma informação

jornalística no Twitter” (ZAGO, 2012, p.5). Diante da possibilidade de o conteúdo recircular

em sites de redes sociais, há uma mudança na cadeia de produção, na medida em que a

repercussão da recirculação pode resultar na produção de uma nova notícia. Além das etapas

tradicionais de apuração, circulação e consumo, a recirculação insere-se como uma fase

potencial posterior ao consumo, para quando o interagente se apropria do conteúdo

jornalístico e o faz circular novamente a partir de suas próprias palavras. Como a própria

autora pondera, já se tinha outras maneiras de passar adiante notas e comentários sobre

notícias, até mesmo em blogs e fóruns, o diferencial do Twitter diz respeito à maneira rápida e

sintética como o processo se dá e é capaz de suscitar conversações.

Temos que lembrar também que o Twitter serviu não só de fonte para os jornalistas,

mas também para direcionar os leitores para o site dos veículos de imprensa:

Preferencialmente a gente colocava uma notícia no Twitter com link. Mas, obviamente, algo muito importante que acabou de chegar, um coloca no Twitter, outro faz o flash e depois a gente publica de novo com o link. Sem dúvida, as redes sociais são uma forma de captar acesso, de trazer pessoas para o site. São usadas assim nos jornais do mundo todo. (Q.)

De maneira geral, R. acredita que há uma evolução profissional no uso das redes

sociais por parte dos jornalistas: “Já ouvimos muito coisas do tipo ‘fulano colocou no Twitter,

faz matéria sobre isso’, mas não aprofundavam. Fulano morreu, busca foto dele no Orkut. No

início o uso das redes era mais como ferramenta, hoje é mais que isso, é um ambiente a ser

explorado”. E mesmo com as novas redes surgindo, o acompanhamento tem sido mais fácil

pois se tem a experiência de coberturas anteriores auxiliadas por plataformas semelhantes: “O

Facebook foi mais preponderante na eleição de outubro passado na qual as pessoas, por

exemplo, passaram a adotar o Freixo no sobrenome, fazendo campanha para o candidato. Esse

volume de posts relativos à campanha no Facebook não tinha em 2010”, enfatizou R.

É importante ressaltamos que os resultados obtidos por esta pesquisa dizem respeito a

um contexto de produção de jornalismo impresso/online. Certamente, os jornalistas de rádio e

TV tinham rotinas semelhantes de acompanhamento, mas por terem menos tempo e espaço de

divulgação de conteúdos, esses profissionais poderiam não seguir tantas fontes no microblog.

Como afirma Barros Filho (2002), apesar de o campo jornalístico ser um só, há vários

subcampos com suas peculiaridades:

O campo jornalístico é constituído por muitos sub-campos. Embora estes apresentem aspectos comuns que justifiquem a constituição de um campo geral do jornalismo - relativamente autônomo em relação a qualquer outro espaço social - discriminam-se por singularidades que também os constituem enquanto espaços sociais com autonomia relativa. Assim, os jornalismos televisivo, radiofônico e impresso aproximam-se e, ao mesmo tempo, se singularizam como espaços destinados a uma produção específica e, portanto, a uma subjetivação própria de um certo profissional. (BARROS FILHO, 2002, p.167).

Não podemos deixar de considerar que nem todos os jornalistas faziam o

acompanhamento do microblog. Além da negativa de um repórter ao contato desta

pesquisadora alegando que não fazia uso do Twitter, observamos que, no trabalho de Souto

sobre “a cobertura das eleições presidenciais de 2010 do ponto de vista do repórter”, não há

uma menção sequer ao microblog ou a outra rede social na rotina de cobertura.

Ao longo deste capítulo 2, mostramos como os jornalistas veem o impacto da

introdução de ferramentas digitais como o Twitter na cobertura eleitoral. No capítulo a seguir,

veremos como o acompanhamento que eles faziam do que acontecia nas redes sociais foi

colocado no jornal e quais foram as implicações das replicações e análises dos tweets para a

construção jornalística. A análise do material publicado nos possibilitará ainda verificar quais

os tipos de posts que mais despertavam o interesse dos jornalistas e quais as fontes que mais

foram parar em reportagens ou notas através do Twitter.