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2 AS FERRAMENTAS DIGITAIS ENTRAM NA COBERTURA

2.2 As ferramentas digitais na visão dos jornalistas

2.2.3 O relacionamento com as fontes através do Twitter

Nenhum entrevistado disse ter usado o Twitter para se comunicar com os

presidenciáveis, embora eventualmente isso fosse feito com outras possíveis fontes com as

quais não se tivesse acesso via telefone, e-mail ou outro meio de contato. Nesse caso, o mais

comum era mandar uma mensagem para o entrevistado com um e-mail ou telefone pedindo

para que ele respondesse ou era feito um pedido para ele seguisse o jornalista, que poderia

assim mandar uma DM (mensagem direta) para a fonte explicando a pauta. A maior

preocupação era que os concorrentes não soubessem do que se tratava a reportagem.

Com parlamentares eu constantemente mandava recado público mesmo pedindo para que eles entrassem em contato comigo. Às vezes funcionava. (P.)

Eu devo seguir uns 200 políticos e jornalistas de política. Me lembro do Sirkis, que era um cara que eu falava muito pessoalmente. Dutra e o Guerra brigavam muito pelo Twitter. São fontes, são caras que a gente conversa por telefone. Tinha que acompanhar mais pela conversa deles do que para tirar uma aspa. (I.)

Recuero (2012, p. 151) postula que recursos como a DM são muito relevantes

justamente por gerar um espaço seguro, ou seja, um espaço onde é possível desenvolver

conversações que os atores envolvidos não estão dispostos a dividir com a rede social inteira:

“Essas conversações privadas também parecem ter relevância para a manutenção e o

aprofundamento dos laços sociais, uma vez que permitem ao ator focar em um grupo menor

dentro de sua rede, estreitando ali componentes como confiança e intimidade”.

De acordo com os entrevistados, a conversa com os presidenciáveis se dava através

da assessoria de imprensa ou nas ruas, durante a cobertura de uma agenda de campanha.

Vemos que, neste caso, o fluxo é unidirecional, sem interação da parte dos jornalistas. O

Twitter, assim, funcionaria como um telex de agência de notícias, que precisava ser

monitorado o tempo todo. A visão do jornalista sobre a ferramenta aparenta ser bem

profissional.

O Twitter era basicamente para ver se os candidatos falavam alguma besteira, se rendia alguma pauta, nunca entrei em contato com eles através do microblog. O contato que a gente tinha era com os assessores diretamente e na agenda. Até porque se eu estou fazendo uma exclusiva e entro em contato pelo Twitter, os meus concorrentes vão ver. (C.).

Tem candidato que fica dando declaração via Twitter, mas também tem pautas. É claro que a entrevista ainda é muito melhor do que uma declaração que o político vai editar e colocar no Twitter. Já mandei pedido de entrevista via Twitter em outras situações, mas normalmente serve mais como uma informação que você consome do que um lugar para diálogo, para troca. Nesse caso, o telefone é o melhor meio. (E.).

Não com o candidato. Eu não mandava nada em DM para o Serra. Mas para o contato com outras fontes sim (H.)

Além do Twitter, Q. lembra que o e-mail continua sendo um meio importante de

comunicação com muitas fontes. “O Cesar Maia, enquanto prefeito, era uma regra. Os

repórteres tinham que mandar e-mail. Ele não respondia por telefone em geral”. Souto (2011,

p. 4) ressalta que a dificuldade, em época de eleição, de se conseguir agendar uma entrevista

exclusiva (mesmo por telefone) com um candidato bem cotado nas pesquisas faz com que

muitos jornalistas recorram às assessorias para conseguir uma declaração do político sobre

determinado assunto. “Os assessores entrevistam o candidato e enviam respostas prontas por

e-mail que podem, assim, ser inseridas no texto final”.

Segundo D., o candidato à reeleição ao governo do Estado do Rio em 2010, Sérgio

Cabral, usava o microblog para se manifestar sobre determinado assunto caso a demanda dos

jornalistas acontecesse em um dia que ele não tivesse mais agenda pública:

Se não tivesse agenda pública, ele repercutia ou rebatia qualquer acusação via Twitter. As assessorias dos candidatos identificam quem está cobrindo, te colocam no mailing e fazem o contato diário. E a gente também fazia contato diário para mandar perguntas. Você não tem acesso direto ao candidato facilmente, com exceção do Gabeira, que atendia ao telefone. Com ele, era pouco mediado, ele atendia direto. Com o Cabral e os outros, isso não acontecia.

O uso do Twitter pelo candidato Sérgio Cabral também foi citado por B.:

O Cabral, por exemplo, algumas vezes só se pronunciou pelo Twitter. Algumas aspas dele a gente tirou de lá. Depois das eleições, ele tuitou muito menos pelo que eu vejo. Ele tem as

equipes do governo que usam bastante, mas ele pessoa física é menor. O próprio Gabeira usou muito nas eleições, mas o acesso a ele era mais fácil. (B.).

Outra prática comum, segundo os jornalistas, é eles serem alertados por fontes

através de um telefonema ou e-mail sobre um conteúdo que possa ser interessante e que está

nas redes sociais:

Uma das matérias mais quentes que eu fiz na campanha surgiu assim. Uma fonte me deu um toque de que o Indio tinha dito um monte de bobagem num site para militantes do PSDB, a Rede Mobiliza. Comecei a buscar esse troço, e pelo Twitter, localizei um político que falava da história. Consegui achar isso, e era um vídeo em que ele (Indio) dizia que o PT era ligado às Farc. Sábado de manhã, eu avisei à redação, e foi página 4 de domingo. Derrubamos a matéria que estava lá, o Serra teve que se explicar, a Dilma falou sobre o caso. Nasceu assim. O Twitter não tinha nada a ver, mas serviu como uma bússola. (I.)

No caso da declaração da Mara Gabrilli eu não me lembro se eu peguei navegando ou se alguma fonte me ligou para avisar porque acontece muito isso. As fontes também monitoram. (K.)

As fontes me mandavam muitas indicações. O Arnon de Mello, filho do Collor, que era simpatizante da campanha do Serra era uma delas. No início, eu até questionei: mas você não é o filho do Collor? Vários colegas da redação também me encaminhavam conteúdos sempre que viam alguma coisa interessante. (P.)

Os depoimentos nos indicam que fontes primárias, como os políticos e os assessores,

passam a desempenhar um papel mais ativo na pauta jornalística. É evidente que muitas

dessas fontes que os jornalistas citam são adversários políticos buscando prejudicar

concorrentes. Machado (2003, p.27) chama atenção para o fato de que o processo de

constituição de assessorias de comunicação ou relações públicas orientadas para incluir temas

particulares no fluxo dos sistemas de circulação de notícias seja um indício de que a

profissionalização das fontes constitui uma das especificidades do processo de coleta de

dados, produção e circulação de conteúdos no jornalismo em sociedades complexas como a

que vivemos.

A relação entre internautas, políticos e jornalistas, no entanto, nem sempre é pacífica,

como já vimos no início do capítulo dois, no qual abordamos as disputas entre os campos, e

como nos indicam os relatos de G., K. e P.:

Tem um deputado, por exemplo, que está muito mais interessado em saber o que eu estou dizendo e onde eu estou indo para poder me sacanear. E aí eu fiquei muito mais na posição de observador (no Twitter). A investigação jornalística exige um certo cuidado na relação com as redes sociais. Eu já tive até um e-mail falsificado. [...] Ano passado (2011) eu fui impiedosamente atacado pelo Twitter. Esse deputado me xingou de tudo que você podia imaginar quando a gente mostrou situações que o envolviam em fraudes que é a própria essência da carreira política dele. Ele também entrou num bate-boca com outro político. Nós fizemos uma página 3 só reproduzindo essa briga no Twitter. Foi a maior baixaria. (G.) O Twitter abriu outra coisa que é a possibilidade de o jornalista ser criticado diretamente. O jornalista e o veículo, isso acontece com muita frequência. (K.)

Em 2010 houve um patrulhamento muito forte de militantes. Eu tinha bate-bocas homéricos via Twitter. Eu percebia uma guerrilha virtual. Costumava dizer que eu apanhava de dia dos

petistas e à noite dos tucanos. Eu nunca tinha visto um clima tão acirrado. Toda vez que você escrevesse algo que desagrada a um partido ou candidato, muitas pessoas vinham e batiam. Eu adoro um debate. Dependendo do nível, respondia, ou às vezes, bloqueava. (P.)

O conflito, no entanto, é visto por Recuero (2012, p. 168) como algo natural, ou tão

natural quanto a cooperação, porque há uma perene disputa entre os atores e grupos pelo

capital social constituído na rede.