• Nenhum resultado encontrado

Subcapítulo II – Contribuição das decisões internacionais em matéria de proteção de

2. A criação do Tribunal Penal Internacional permanente

O Tribunal Penal Internacional resulta de um longo processo de negociação393, que culminou no Estatuto de Roma, de 1998. O TPI, após a entrada em vigor do ETPI394, foi instalado na cidade holandesa de Haia. Afirma o artigo 1.º do ETPI o seguinte:

É criado, pelo presente instrumento, um Tribunal Penal Internacional. O Tribunal será uma instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, de acordo com o presente Estatuto, e será complementar das jurisdições penais nacionais. A competência e o funcionamento do Tribunal reger-se-ão pelo presente Estatuto. O caráter permanente deste Tribunal, afirmado no artigo 1.º (ETPI), é o que o distingue em larga medida das experiências percursoras referidas. Outra questão importante é relativa à

392 Na totalidade, e a título de curiosidade, Issa Hassan Sesay foi sentenciado a 681 anos de prisão, por ter sido considerado culpado de 17 crimes: Morris Kallon foi sentenciado a 520 anos de prisão por ser considerado culpado de 16 crimes e por último Augustine Gbao foi sentenciado a 222 anos de prisão por 14 crimes. Cf. TESL, Trial Chamber II, Prosecutor v. Issa Hassan Sesay, Morris Kallon, Augustine Gbao (Case No. SCSL-04-15-T), Sentencing Judgement, 8 de abril de 2009, pp. 93 - 98.

393 Cf. Alexandre Teixeira Neto Guerreiro, A Resistência dos Estados Africanos à Jurisdição do Tribunal Penal

Internacional, cit., p. 32.

111

complementaridade deste Tribunal, que se pretende ser “complementar das jurisdições penais nacionais”, na letra do artigo 1.º (ETPI). Entende-se assim que há uma primazia jurisdição nacional, na figura dos tribunais penais nacionais, sobre a jurisdição internacional, na figura do TPI395.

A questão da complementaridade TPI é essencial para a definição da sua jurisdição. Como afirma Wladimir Brito “[é] dominante a ideia de que o princípio da complementaridade é a pedra angular da construção do Tribunal Penal Internacional”396. Este princípio é, de resto, afirmado no preâmbulo397 do Estatuto de Roma e no seu articulado, mais concretamente no artigo 1.º e no artigo 17.º. Este artigo, sob a epígrafe “questões relativas à admissibilidade”, reza o seguinte:

1 - Tendo o em consideração o décimo parágrafo do preâmbulo e o artigo 1.º, o Tribunal decidirá sobre a não admissibilidade de um caso se:

a) O caso for objeto de inquérito ou de procedimento criminal por parte de um Estado que tenha jurisdição sobre o mesmo, salvo se este não tiver vontade de levar a cabo o inquérito ou o procedimento ou não tenha capacidade efetiva para o fazer;

b) O caso tiver sido objeto de inquérito por um Estado com jurisdição sobre e tal Estado tenha decidido não dar seguimento ao procedimento criminal contra a pessoa em causa, a menos que esta decisão resulta do facto de esse Estado não ter vontade de proceder criminalmente ou da sua incapacidade efetiva para o fazer; (…)

Assim, o TPI julga casos em que, de forma inequívoca, os Estados parte do ETPI, não cumpram o definido no artigo 17.º, a) e b), ou seja, não queiram ou não tenham meios para julgar o caso. Nas palavra de Wladimir Brito “[p]oder-se-á assim dizer que a jurisdição do Tribunal Penal Internacional é subsidiária da jurisdição penal nacional e só pode ser exercida quando esta última se revelar absolutamente incapaz pelas razões indicadas nos n.os 2 e 3 do citado artigo 17.º”398.

O TPI exerce a sua jurisdição relativamente a suspeitos da prática dos crimes da sua competência desde que cometidos por um nacional ou nos territórios de um Estados membro399,

395 Cf. Wladimir Brito, Direito Internacional Público, cit., p. 606. 396 Wladimir Brito, Direito Internacional Público, cit., p. 603.

397 “Sublinhando que o Tribunal Penal Internacional criado pelo presente Estatuto será complementar das jurisdições penais nacionais”, Cf. Preâmbulo do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

398 Wladimir Brito, Direito Internacional Público, cit. p. 606.

399 Cf. art. 12.º, n.º2, do ETPI Recorde-se que, nos ternos do n.º1 deste artigo, “O Estado que se torne Parte no presente Estatuto aceitará a jurisdição do Tribunal relativamente aos crimes a que se refere o artigo 5.º”.

112

sendo certo que se nenhum destes Estados for parte no Estatuto poderá aceitar que o Tribunal exerça a sua competência em relação ao caso concreto400. Por outro lado, o Tribunal pode sempre conhecer de uma caso que resulte da comunicação, pelo Conselho de Segurança, da existência de indícios da sua verificação401. O TPI tem competência para julgar os “crimes de maior gravidade com alcance internacional”402 e que são definidos no artigo 5.º do mesmo Estatuto, que afirma o seguinte:

A competência do Tribunal restringir-se-á aos crimes mais graves que afetam a comunidade internacional no seu conjunto. Nos termos do presente Estatuto, o Tribunal terá competência para julgar os seguintes crimes:

a) O crime de genocídio;

b) Os crimes contra a Humanidade; c) Os crimes de guerra;

d) O crime de agressão.403

Ainda bastante relevante nesta matéria é o artigo 9.º do ETPI que define os elementos constitutivos dos crimes e que remete para o texto normativo “elementos dos crimes”, no qual é compilada uma especificação dos diferentes elementos que integram cada um dos crimes sob a jurisdição do TPI. Não são admitidas quaisquer reservas ao Estatuto de Roma, como prevê o artigo 120.º404 estando deste modo “blindado”405, o que tem sido uma dificuldade na relação do TPI com os Estados parte ou outros que não são parte. Por último é importante referir que os crimes sob competência do TPI são imprescritíveis, como definido no artigo 29.º406 do ETPI.

O TPI ainda não tomou qualquer decisão relativa aos jornalistas vítimas de violência em conflito armado que se traduza em crimes que sejam da sua competência. No entanto é de esperar que este órgão jurisdicional venha a ter uma importância incontornável no que aos crimes cometidos contra jornalistas em conflito armado se refere, contribuindo positivamente, por um lado, para o fim da impunidade dos autores desses crimes e, por outro, para a criação de uma consciência de que é necessária uma maior proteção destes profissionais no teatro das operação militares. 400 Cf. art. 12.º, n.º3, do ETPI. 401 Cf. art. 13.º, b), do ETPI. 402 Artigo 1.º ETPI 403 Artigo 5.º ETPI.

404 “Não são admitidas reservas a este Estatuto”. Cf. Artigo 120.º do ETPI. 405 Jorge Bacelar Gouveia, Manual de Direito Internacional Público, cit., p. 782. 406 “Os crimes da competência do Tribunal não prescrevem”. Cf. Artigo 29.º do ETPI.

113