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CAPÍTULO 3 O MUNICÍPIO DE SANTA GERTRUDES E A ADOÇÃO DO ‘SISTEMA

3.9 A decisão de adotar o ‘sistema de ensino’ apostilado 170 

Para compreender a relação entre a administração pública e a iniciativa privada, novamente, nos reportamos à clássica conceituação em que público é entendido como estatal, e o privado é entendido pela gerência e propriedade de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. Rememoramos Adrião (ADRIÃO, 2006a; ADRIÃO; BORGHI, 2007) ao afirmar que continua em curso o rearranjo da educação pública, iniciado nos anos 1990, oportunidade em que houve a transferência de responsabilidade e gestão da educação para os municípios; contudo, não ocorreu alteração das condições objetivas de funcionamento, o que culminou em diversos arranjos locais para responder às demandas por acesso e qualidade, visto que a maioria dos municípios não dispunha e ainda não dispõe de recursos técnicos e financeiros. Como também, em Barretto (1995) e Adrião e Borghi (2007) destaca-se o fato de que a maioria dos municípios brasileiros ainda carece de condições objetivas para a sua auto-regulação; portanto, ao assumirem novas demandas educativas, os municípios necessitam de apoio das outras esferas governamentais.

Trazemos informações e apresentamos algumas depreensões, geradas a partir dos relatos dos entrevistados sobre a decisão de se adotar o ‘sistema de ensino’ apostilado no município de Santa Gertrudes.

A secretária municipal de educação 1 contou que a decisão de adotar o ‘sistema de ensino’ partiu do município, do prefeito municipal e da secretária municipal de educação que tomaram a iniciativa pela parceria. Para a escolha do ‘sistema de ensino’ foram ouvidos os professores e a equipe técnico-pedagógica que avaliaram as propostas e materiais apresentados. A depoente disse que houve outras instituições interessadas, porém, não se lembrou quais eram os outros ‘sistemas de ensino’ analisados, optaram pelo Sistema Objetivo Municipal de Ensino - Some, segundo ela, “tudo foi feito em comum acordo com as escolas”.

Conforme seu relato, a principal motivação para que o município firmasse a parceira “foi à busca da melhoria da qualidade de ensino”. O tempo previsto para a parceria seria de um

ano, pois “a Secretaria Municipal de Educação estava preocupada com a aceitação ou não do sistema apostilado, tanto por parte do corpo docente, como do corpo discente”. A parceria poderia ser renovada através de novo contrato.

De acordo com a secretária municipal de educação 2, quando ela assumiu a Secretaria Municipal de Educação, em janeiro de 2005, o contrato de parceria entre a Prefeitura Municipal de Santa Gertrudes e o Sistema Objetivo Municipal de Ensino (Some) teve que ser prorrogado, “pois o início do ano letivo da rede municipal de ensino fundamental estava para começar e não havia livros didáticos para os alunos porque o município não tinha feito a solicitação ao Programa Nacional do Livro Didático”. Ainda, segundo suas declarações, “a solicitação deveria ter acontecido em agosto e setembro do ano anterior”; nesse contexto: “prorrogar o contrato foi a alternativa para garantir os livros didáticos aos alunos do ensino fundamental I e II (1.ª a 4.ª séries e 5.ª a 8.ª séries)”. Concordou com o depoimento da secretária municipal de educação 1, quanto ao fato de que, em 2004, foi a Secretaria Municipal de Ensino de Santa Gertrudes quem decidiu pela adoção do ‘sistema de ensino’ instituindo o material apostilado para todo o ensino fundamental.

A secretária municipal de educação 3 reforçou os depoimentos de suas predecessoras. Acredita que, na época, o que levou o município a fazer a parceria foi a intenção de organizar os conteúdos trabalhados pelos professores do ensino fundamental.

Na mesma direção a diretora de escola 1 sustenta que a razão para a contratação do Some foi “fazer com que todas as escolas do município sigam a mesma diretriz”.

A diretora de escola 2 relatou que “a decisão da parceria entre a prefeitura e o Some - Sistema Objetivo Municipal de Ensino, em 2004, partiu de pessoas ligadas à Secretaria Municipal de Educação de Santa Gertrudes”. Em sua opinião, a motivação do município em adotar o ‘sistema de ensino’ passava pela “intenção de se oferecer aos alunos um ensino de boa qualidade”.

Segundo a representante da instituição privada Some “o contato ocorreu por intermédio da Secretaria Municipal de Educação de Santa Gertrudes com a empresa, havia interesse em conhecer o ‘sistema de ensino’, houve a visita de um pedagogo do Some ao município para apresentação do material apostilado”. Posteriormente, o contrato foi firmado com a prefeitura municipal. Ela informou que o contrato de parceria foi estabelecido por meio de processo licitatório e, a princípio, a validade era de um ano, havendo possibilidade de prorrogação do

mesmo. Com relação à prestação de contas da instituição, acerca do valor recebido da prefeitura, a entrevistada evidenciou que os trâmites são legais, “como o município tem que prestar contas ao Tribunal de Contas, a empresa contratada deve estar em dia com sua responsabilidade fiscal e jurídica”.

Todos os entrevistados indicaram que a decisão de adotar o sistema de ensino apostilado no município de Santa Gertrudes partiu da Secretaria Municipal de Educação, de comum acordo com o prefeito municipal. A representante da instituição privada referendou tal informação ao relatar que “o contato ocorreu por intermédio da Secretaria Municipal de Educação de Santa Gertrudes com a empresa, havia interesse em conhecer o sistema de ensino, houve a visita de um pedagogo do Some ao município para apresentação do material apostilado”. Depreendemos do exposto que esta foi uma alternativa encontrada pelo município de Santa Gertrudes para responder às novas responsabilidades relativas à organização do ensino fundamental após o processo de municipalização.

Sob esse ângulo, concordamos com Martins (2003) ao afirmar que as esferas executivas têm procurado responder às novas demandas com diferentes estratégias de governo que variam conforme as características históricas, políticas, econômicas e culturais dos municípios envolvidos. E, também, com Adrião (2007) ao destacar que na descentralização da educação pública, via municipalização do ensino e implantação do Fundef, houve redistribuição de responsabilidades, delegando aos municípios nova função e induzindo parcerias entre municípios paulistas e o setor privado.

Como principais motivações que levaram o município a adquirir o material didático apostilado, apresentaram-se os seguintes depoimentos: para a secretária municipal de educação 3 “foi a intenção de organizar os conteúdos trabalhados pelos professores do ensino fundamental”; para a diretora de escola 1 “trabalhar com apostilas faz com que o ensino em todas as escolas do município siga a mesma diretriz, e no caso do ensino fundamental I, acaba até economizando material”; para a diretora de escola 2 “a intenção de se oferecer aos alunos um ensino de boa qualidade”. Podemos inferir que os relatos remetem, especificamente, ao aumento dos encargos pedagógicos e à necessidade de garantir educação de qualidade. Novamente, concordamos com Adrião (2007) ao pontuar que as dificuldades encontradas pelos municípios em ter um corpo técnico capaz de assumir a gestão educacional local têm culminado na dependência político-

pedagógica de outros sistemas, como esta parceria estabelecida entre o município de Santa Gertrudes e a iniciativa privada Sistema Objetivo Municipal de Ensino (Some).

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