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No plano constitucional, o tema da informação assume três faces: o direito de informar, o dever de informar e o direito de ser informado.

O direito de informar está intimamente ligado à garantia fundamental da livre manifestação de pensamento (art. 5º, inc. IV) e a toda disciplina específica contida no capítulo da Comunicação Social, sobretudo nos artigos 220 e 221, nos quais fica evidente que a informação não sofrerá qualquer restrição, exceto nas hipóteses previstas na própria Constituição da República. Ademais, será dada preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família, como verdadeira concretização do princípio da dignidade da pessoa humana.

Com relação ao dever de informar, em que pese a sua previsão expressa quanto aos poderes públicos de todos os entes federados, nos termos do caput e parágrafo primeiro do artigo 37 da Constituição Federal, por meio da concretização dos princípios da moralidade e da publicidade, na esfera privada a sua existência depende da intepretação sistemática do texto constitucional.

Assim também entende Alexandre David Malfatti69, pois:

Se a Constituição Federal tem como princípio supremo a dignidade da pessoa humana, garantindo - para sua concretização - direitos individuais e sociais fundamentais (vida, saúde, educação, habitação, assistência social, etc.), não parece difícil extrair o dever de informação das pessoas que tenham atividade empresarial ou não, ligadas direta ou indiretamente à existência digna do ser humano. O direito de ser informado encontra amparo no direito fundamental previsto no artigo 5º, inciso XIV, da ordem constitucional em vigor70, cujas disposições não devem ser interpretadas restritivamente, como se a administração pública fosse o sujeito passivo desse comando, mesmo que o legislador constituinte tenha dado maior detalhamento ao exercício deste direito em face do poder público

                                                                                                                          69

MALFATTI, Alexandre David. O direito de informação no Código de Defesa do Consumidor, p. 93.

70

“XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.

(art. 5º, inc. XXIII e LXXII71). Tanto é assim, que o próprio remédio constitucional para a garantia do acesso à informação, o habeas data, pode ser manejado contra entidades privadas que tenham registro ou banco de dados de caráter público72.

O direito à informação do consumidor enquanto direito fundamental não está expressamente previsto na nossa Carta Magna, diferentemente do que ocorre na Constituição de Portugal, in verbis: “artigo 60.1 Os consumidores têm direito à qualidade dos bens e serviços consumidos, à formação e à informação, à protecção da saúde, da segurança e dos seus interesses económicos, bem como à reparação de danos.”

Esse direito fundamental, como lecionam José Joaquim Gomes Canotilho e Vital Moreira73, seria integrado por três níveis: o direito de informar, o direito de se informar e o direito de ser informado, como mencionado no início desta seção:

O primeiro consiste, desde logo, na liberdade de transmitir ou comunicar informações a outrem, de as difundir sem impedimentos; mas pode também revestir uma forma positiva, enquanto direito a informar, ou seja, direito a meios para informar. O direito de se informar consiste, designadamente, na liberdade de recolha de informação, de procura de fontes de informação, isto é, no direito de não ser impedido de ser informar, embora sejam admissíveis algumas restrições à recolha de informações armazenadas em certos arquivos (ex: arquivos secretos dos serviços de informação). Finalmente, o direito de ser informado é a versão positiva do direito de se informar, consistindo num direito a ser mantido adequadamente e verdadeiramente informado, desde logo, pelos meios de comunicação (cfr. arts. 38º e 39º) e pelos poderes públicos (art 48º-2), sem esquecer outros direitos específicos à informação                                                                                                                          

71

“XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

[...]

LXXII - conceder-se-á ‘habeas-data’:

a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público;

b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo”

72

Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin, ao comentar a natureza jurídica dos arquivos de consumo disciplinados pelo artigo 43 da Lei n. 8.078/1990, leciona: “Assim, o CDC, ao legalmente enxergar caráter público nos arquivos de consumo, quis simplesmente abrir as portas da ação constitucional, mostrando ser ela instrumento adequado para seu controle, nos exatos termos do art. 5º, LXXII, da Constituição Federal.” Cf. (Das práticas comerciais. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. (Coord.). Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. v. 1, p. 432).

73

CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição. Coimbra: Coimbra, 1991, p. 93 apud ARBEX, Fabricio Cobra. A informação nas relações consumeristas: direito do consumidor e dever do fornecedor. Dissertação (Mestrado em Direito)-Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo-SP, 2013, p. 27.

reconhecidos na Constituição, diretamente (arts. 54º-5/a, 55º-6, 60º-1 e 268º-1) ou indirectamente (cfr. arts. 56º-2/a, 77º-2, etc.).

Como não existe direito fundamental à informação do consumidor em nosso país, faz-se necessário observar a disciplina constitucional da defesa do consumidor e a ordem lógica e sistemática dos princípios constitucionais para se chegar à conclusão de que é certa a existência de um princípio constitucional de informação no âmbito das relações de consumo, no que tange a: (i) direito de informação por parte do fornecedor, como o direito de fazer publicidade dos produtos e serviços que coloca no mercado de consumo; (ii) dever de informação por parte do fornecedor, que terá a obrigação de informar o consumidor sobre os produtos e serviços que lança no mercado, especialmente quanto a eventuais riscos à saúde e à segurança, tornando o ato de escolha mais transparente e consciente; e (iii) direito de ser informado por parte do consumidor, sendo este uma decorrência lógica do dever anterior.

3 OS DIPLOMAS INFRACONSTITUCIONAIS VOLTADOS À PROTEÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA E A FIXAÇÃO DO TEMA REALIZADA PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Até o momento foram estudados os alicerces que dão sustentação à análise a seguir realizada, iniciada pela disciplina infraconstitucional em matéria de proteção à pessoa com deficiência, com enfoque na acessibilidade e na inclusão.

Com efeito, acessibilidade e inclusão são conceitos fundamentais para que a pessoa com deficiência faça parte da sociedade em patamar de igualdade com todos os indivíduos, quer dizer: que não se sinta discriminada no convívio cotidiano em sociedade, pois só assim se consagra a observância do princípio da dignidade da pessoa humana.

A adoção das medidas necessárias para que seja assegurada a igualdade de direitos à pessoa com deficiência ganha contornos relevantes quando se está diante da proteção ao consumidor, naturalmente vulnerável, por ser a parte mais fraca na relação de consumo.

O estudo detalhado das normas de proteção e defesa do consumidor é de fundamental importância para a percepção da real dimensão do problema, especialmente os riscos a que as pessoas com deficiência visual estão expostas no consumo de produtos industrializados de primeira necessidade, como alimentos e medicamentos.