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Quando questionadas se elas mesmas já sofreram alguma discriminação, as diretoras entrevistadas argumentaram:

(hesitação) Não tive nenhum tipo de discriminação, nenhuma. Nem na fábrica, não... No trabalho, eu tenho uma LER nesse braço, eu fui meio deixada de lado porque não tinha um posto de trabalho mais adequado pra eu poder trabalhar. Então pelo período que eu fui pra reabilitação, depois fui afastada pro trabalho sindical, eu fiquei meio assim, eu não me senti discriminada, mas eu me senti fora do processo, que é uma discriminação, não é? É uma discriminação, é uma discriminação. (Rosi)

Depois de uma negativa, Rosi comentou que, por conta de uma LER (Lesão por Esforço Repetitivo), sentiu-se discriminada na fábrica onde trabalhava. No processo produtivo do setor metalúrgico as mulheres concentram-se em postos nos quais prevalece o trabalho parcelado, repetitivo e intenso, isto é, nos postos taylorizados, afastadas, em sua maioria, dos setores onde ocorreu a introdução de máquinas tecnologicamente mais sofisticadas (ARAÚJO; OLIVEIRA, 2006). Esses postos ocupados pelas trabalhadoras requerem as qualidades culturalmente atribuídas às mulheres, tais como atenção, cuidado, higiene e habilidades manuais, nos quais são executadas as funções que, por sua repetitividade, aliada à intensificação do ritmo de trabalho, são responsáveis por ocasionar o aumento dos casos de LER.

Ainda sobre se elas mesmas já foram alvo de discriminação, as diretoras comentaram:

Preconceito tem, eles acham que a gente não vai conseguir conciliar por causa dos filhos. [O sindicato] é um ambiente totalmente machista: “Os caras vão ficar paquerando, vão ficar dando em cima, é

melhor mulher não ir”; “Tem filha, é um sacrifício!”. Então tem sim, tem bastante. Têm aquelas piadinhas sem graça, “Lugar de mulher é no tanque”. Já não aguento mais essa piada. Os companheiros aqui falam. Vira o disco, sabe! (Simone)

Se tem é um pouco assim, eles conseguem sublimar, né? Até porque é um pouco... a direção do nosso sindicato, eles já compraram essa briga e defendem a importância das lutas das mulheres e de ter as mulheres no dia-a-dia do sindicato, na vida sindical. Eu acho que deve ser uma briga interna deles também porque deve haver essa questão do machismo, mas ainda não senti isso, não senti. (Ana Nice)

Eu tenho amizade com o pessoal. Tem pessoas que acham que não é mulher séria, sabe? Essas mulheres que vão muito pro sindicato... Os homens, talvez, eles não querem que as mulheres deles [vão ao sindicato]... Eles vão, mas não querem que as mulheres que trabalham na mesma empresa, ou que trabalham em outra empresa, que participem do sindicato. Tem homem que é machista. A maioria, pessoal sério, não. Mas sempre tem um cabecinha. (Ana Maria)

Às vezes até aqui dentro do sindicato tem [preconceito]. Mulher eles tratam assim: “Ah, tá de TPM!”. Se você está alterada ou sei lá, brigando por alguma coisa, eles falam: “Ah, está de TPM”; “Brigou com o marido!” Quer dizer, eles podem ficar estressadinhos, mas a gente não, porque se ficar estressadinho está de TPM. Então eu acho que ainda é uma discriminação com a mulher, né? Eles podem, eles mandam e desmandam. A gente se for brigar por alguma coisa está de TPM. Só tem que aceitar e ficar quieta. Mas aqui é difícil a gente ficar quieta, a gente vai pra cima, a gente briga. O espaço aqui é democrático, tem o direito de falar mas também tem o direito de ouvir. (Tania)

E Tania acrescentou:

A discriminação eu acho... a discriminação antes era mais acirrada, agora não mais. As cotas, eles... tudo eles usam as cotas e a gente se sente discriminada, a gente só consegue espaço por conta de cota. Eu acho que isso está deixando um pouco de lado e a mulher, pela qualificação, está se preparando pra tudo e aqui dentro não é diferente, a gente tem curso de formação [sindical], tem as malditas cotas. [Com] essa nova direção, tudo tem a participação das mulheres. Eles abrem espaço pr’as mulheres participarem. Claro que há as dificuldades ainda, é cultura isso, da mulher ... a gente ainda carrega esse preconceito da mulher ter que ficar em casa cozinhando, mas aqui dentro do sindicato está mudando bastante isso, eles já respeitam mais. Nas mesas, quando tem evento, sempre tem a participação de uma de nós. (Tania)

Às vezes tem ainda alguma brincadeirinha desagradável mas a gente tem que ter habilidade de passar por cima desse tipo de brincadeirinha sem se machucar. Fingir que não ouviu e depois dar a resposta quando der, à altura que eles merecem. Brincando mas atinge. (Gilza)

Quando questionadas se, em suas opiniões, as mulheres desfrutam do mesmo poder de decisão que os colegas sindicalistas, Tania e Gilza relataram:

Não! As mulheres e os homens ... não. Ainda não, não temos, ainda quem manda são eles, a maioria. A [diretoria] executiva é composta só de homem atualmente. Agora, nessa próxima executiva nós vamos ter [uma mulher na composição da diretoria executiva]. Daí pra frente eu acho que a coisa muda um pouquinho mas ainda nós não vamos ter aquele poder de decisão. Ainda nós vamos depender dos homens. (Tania)

(risos) Elas têm o mesmo poder de decisão, mas não tanto quanto os homens. São mais fragilizadas, mas quando vamos todas juntas, a gente consegue. Mas o poder ainda não está de graça nas nossas mãos. Ainda falta um pouco. (Gilza)

As entrevistadas referem-se, muitas vezes, em seus depoimentos, a situações de discriminação. Porém, verificou-se a dificuldade com que, em alguns momentos, fossem retratadas as situações em que elas próprias estivessem envolvidas, sobretudo em referência ao espaço sindical. Embora tenha havido relatos que abordam algumas experiências de discriminação, as denúncias foram realizadas de maneira dispersa ao longo das narrativas. Essas experiências não foram comentadas quando se fazia uma pergunta direta, como quando se questionou se a entrevistada já sofreu ou tem conhecimento de outras companheiras que tenham sido alvo de discriminação. A resposta apresentou-se, muitas vezes, de maneira negativa, isto é, houve uma tendência a negar, a afirmar que “existe sim, mas eu nunca presenciei”, “já existiu”, “deve ter havido”, “mas comigo não, nunca aconteceu”. Referir-se, em alguns momentos, ao preconceito como algo distante delas mesmas, ou como algo localizado no passado pode demonstrar que essas situações se dêem, por vezes, de maneira mais implícita, e que sejam vivenciadas sem que se passem tão apercebidas pelas próprias diretoras. Ainda é relevante salientar que boa parte das entrevistas foram conduzidas no espaço sindical, o que também sustenta a possibilidade de que, justamente por comporem a diretoria na instância sindical, denúncias enfáticas resultem, de certo modo, em desprestígio da instituição ou delas mesmas perante os demais diretores.