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A EPIDEMIOLOGIA NA PRÁTICA DOS SERVIÇOS DE SAÚDE

No documento vigilancia saude (páginas 31-34)

Por vários motivos, nas últimas décadas essa atividade foi sendo abandona- da ou expressivamente reduzida no país, com evidentes prejuízos ao adequa- do desempenho dos serviços de saúde.

Mais recentemente, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) tem bus- cado a retomada dessa prática, incentivando a utilização mais ampla da epide- miologia por meio do acompanhamento e análise sistemática da evolução de indicadores demográficos, sociais, econômicos e de saúde, para melhor com- preensão dos determinantes das condições de saúde da população (ver no Anexo 1 o elenco de indicadores selecionados pela OPAS). Essa atividade tem recebido a denominação “análise da situação de saúde”.

A simples observação da evolução de alguns indicadores apresentados na tabela 3 nos oferece uma idéia das profundas modificações ocorridas em nos- so país nos últimos quinze anos e das repercussões que essas mudanças deve- riam determinar nas prioridades a serem observadas pelas políticas implemen- tadas pelo setor da saúde.

Esse quadro de contínuas modificações salienta a relevância da capacitação dos serviços de saúde para a análise e interpretação desses indicadores à luz, por exemplo, de conceitos como o de “transição epidemiológica”.

Com fundamento nesse conceito, busca-se compreender as profundas mudanças que ocorreram nos padrões de morbi-mortalidade nas últimas déca- das. Entre elas a queda da mortalidade infantil e a significativa diminuição da morbi-mortalidade pela doença diarréica, que repercutiram, por exemplo, no aumento da “esperança de vida”.

A evolução desse cenário deve ser acompanhada com atenção por todos os profissionais que assessoram ou decidem a respeito de políticas de saúde. Cita- ríamos, como exemplo, o processo de envelhecimento da população e suas implicações nas características da demanda dos serviços de saúde, que geraram necessidades de desenvolvimento de novas especialidades e de modificações da infra-estrutura e equipamentos dos serviços de saúde.

Em 1997, Monteiro e colaboradores elaboraram uma interessante análise a respeito da melhoria dos indicadores de saúde associados à pobreza no Brasil nos anos 90. Exemplificando com as tabelas 4 e 5, os autores concluem que indicadores intimamente relacionados à pobreza – como a mortalidade infantil e a desnutrição nos primeiros anos de vida – têm evoluído de forma continua- mente favorável nas duas últimas décadas em todo o país.

Entretanto, há que se notar que os indicadores de saúde observados nas áreas urbanas do Nordeste estão ainda distantes daqueles observados nas cida- des do Centro - Sul. Além disso, pode-se observar que os progressos registrados na área rural do Nordeste nas duas décadas são menores do que os observados na área rural do Centro-Sul, acarretando um acirramento das desigualdades dessas regiões.

Para que alcancemos melhores condições de saúde e bem-estar para a popu- lação brasileira, quaisquer que sejam as políticas de saúde implementadas daqui

para a frente, elas deverão ser fundamentadas numa análise criteriosa da evolu- ção desses indicadores, usando como instrumento para análise a epidemiologia. A introdução do acompanhamento de indicadores demográficos, sociais, eco- nômicos e de saúde nas rotinas dos serviços locais e da análise periódica desses dados à luz do método epidemiológico, permitirá o aprimoramento da aplicação dos recursos disponíveis e um maior impacto dos programas desenvolvidos.

Tabela 3

Evolução de alguns indicadores sociais, demográficos e de saúde no Brasil, nas décadas de 1980 e 1990

INDICADORES 1980 DÉCADA DE 1990

População urbana (%) 67,5% 78,4% (1996)

Taxa de fecundidade 4,3 2,3 (1996)

Crescimento populacional anual (%) 2,5 (1970/1980) 1,4 (1991/1996)

Pop. de < de 5 anos (em milhões) 16,4 15,6

Pop. analfabeta = > 10 anos 25,3% 16,2% (1995)

% de domicílios com água 53,3% 84,3% (1996)

Mort. inf. proporc. p/ diarréias (%) 24,5 9,7 (1992)

Desnutrição em < de 5 anos (%) 18,4 (1975) 5,9 (1996)

Mort. proporc. p/ doenças infec. 9,3 4,7 (1992)

PIB per capita (em R$) 3.510 (1985-1989) 3.460(1992-1996)

% de idosos (60 anos e +) na pop. 6,1% (1985-1989) 7,4% (1992-1996)

Razão de dependência (ver Anexo 1) 0,73 0,58

Renda familiar per capita (em R$) 276 (1985-1989) 195 (1992-1996)

Fonte: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE; PNDS – 1996; C. A. Monteiro et al., 1997.

Tabela 4

Evolução de taxas de mortalidade infantil em estratos urbanos e rurais. Brasil, 1977–1995

ESTRATO/REGIÃO 1977 – 1985 1987 – 1995 VARIAÇÃO ANUAL (%) URBANO Norte (51,1) (42,1) – 17,0 Nordeste 120,4 62,8 – 4,8 Centro-Sul 47,0 33,0 – 3,0 Brasil 68,8 41,2 – 4,0 RURAL Nordeste 135,2 84,4 – 3,7 Centro-Sul (61,2) 28,8 – 5,3 Brasil 100,9 60,8 – 4,0

( ) Taxas baseadas em menos do que 1.000 nascidos vivos. Fonte: PNDS – 1986 e 1996.

Tabela 5

Evolução da prevalência (%) de crianças com retardo de cresci- mento em estratos urbanos e rurais. Brasil, 1975, 1989 e 1996

ESTRATO/REGIÃO 1975 1989 1996 VARIAÇÃO ANUAL (%) 1975 – 1989 1989 – 1996 URBANO Norte 39,0 23,0 16,6 – 2,9 – 4,3 Nordeste 40,8 23,8 13,0 – 3,0 – 6,5 Centro-Sul 20,5 7,5 4,6 – 4,5 – 5,5 Brasil 26,6 12,5 7,7 – 3,8 – 5,5 RURAL Nordeste 52,5 30,9 25,2 – 2,9 – 2,6 Centro-Sul 29,4 12,3 9,9 – 4,2 – 2,8 Brasil 40,5 22,7 18,9 – 3,1 – 2,4 Fonte: ENDEF – 1975, PNSN – 1989 e PNDS – 1996.

Neste ponto, vale salientar a necessidade de diferenciarmos a análise da situação de saúde da vigilância em saúde pública, pois esta última – como vere- mos em item específico, mais à frente – preocupa-se exclusivamente com o acompanhamento de específicos eventos adversos à saúde na comunidade, ten- do em vista a agilização e aprimoramento das ações que visam seu controle.

A análise da situação de saúde, por sua vez, constitui uma aplicação mais ampla da epidemiologia, pois analisa continuamente indicadores demográfi- cos, sociais, econômicos e de saúde visando identificar os fatores determinan- tes do processo saúde-doença, preocupando-se, portanto, não só com a saúde da população, mas também com as condições de bem-estar da comunidade. Logo, a análise sistemática desses indicadores constitui um instrumento funda- mental para o planejamento de políticas sociais do setor da saúde, campo não abrangido pela vigilância.

No documento vigilancia saude (páginas 31-34)