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5. O MÉTODO DE ENSINO DE FILOSOFIA PARA CRIANÇAS EM MATTHEW

5.2 A escola e sala de aula: uma comunidade de investigação

Para Matthew Lipman a escola, e especificamente, a sala de aula é o lugar no qual as crianças trocam suas experiências de vida – vale resaltar que o que importa não é a quantidade de vida, mas a qualidade de vida, que se dá pela experiência de vida reflexiva – podendo ser alimentadas pela discussão filosófica. As crianças trazem consigo sua formação de vida em relação ao ambiente que se interage, seja na relação com pessoas da comunidade, como família, parentes, amigos, professores, seja com o mundo em que as rodeia, como a casa, as ruas, lugares que se conhece. A própria escola e a sala de aula também é um ambiente que em seu contato demarca experiência de vida, essas relações quando bem vividas e aproveitadas interferem na formação da criança. Como a sala de aula pressupõe lugar de conhecimento, torna-se também lugar propício para a discussão e para a investigação filosófica, ou seja, lugar em que as crianças se tornam mais abertas para questionamentos e discussões de temas filosóficos. (BROCANELLI, 2010, p. 82)

Sendo assim, considera-se que a escola e a sala de aula é o lugar privilegiado e institucionalizado que possui o caráter de ensinamento e aprendizagem, sendo também o lugar em que Matthew Lipman entende como mais apropriado para a aplicação do ensino de filosofia para crianças. Portanto, é dentro da escola, na sala de aula, que Matthew Lipman chamará essas aulas de Comunidade de Investigação.

Segundo Matthew Lipman, a expressão teria sido proposta pelo compatriota Charles Sanders Peirce (1839-1914), filósofo, cientista e matemático, primeiramente quando se referia aos grupos de cientistas e pesquisadores, que por utilizarem procedimentos semelhantes na busca dos mesmos objetivos, formariam um tipo de comunidade, onde todos colaborariam para a obtenção dos objetivos comuns. Depois de sua ideia, o termo passou a ser utilizados por grupos que tinham o interesse num estudo mais aprofundado em determinado assunto, independentemente de sua função no meio científico ou não científico. (BROCANELLI, 2010, p. 84)

A sala de aula se torna ponto de encontro da comunidade de investigação onde as crianças se põem em estado de discussão filosófica e diálogo. Podemos chamar esta discussão de investigação filosófica. Para Matthew Lipman a investigação filosófica na sala de aula possibilita o desenvolvimento da criança em direção sempre crescente a um pensar melhor ao passo em que as crianças se tornam capazes de alcançar respostas aos assuntos e problemas importantes durante a sua própria vida, tornando-se habilidosas em tomadas de escolhas, decisões e opiniões. Como afirma Lipman: “A educação filosófica tem mais êxito quando incentiva e capacita as pessoas a se envolverem no questionamento crítico e na reflexão inventiva.” (LIPMAN, 2014, p. 127)

Matthew Lipman pensou sobre a questão de como se assegurar que a metodologia da comunidade de investigação fosse capaz de atingir seus objetivos; como garantir que os estudantes produzam ideias mais significativas e questionamentos relevantes e fundamentados, assim Lipman inclui o professor como àquele que garantirá o desenvolvimento do pensamento provocativo e questionador. Em segundo lugar é importante que os alunos estejam dispostos a dialogar e a discutir as ideias sugeridas na aula. Como podemos observar a seguir:

As condições que satisfazem a essas exigências incluem um professor que seja provocativo, questionador, impaciente com o pensamento descuidado, e um grupo de estudantes ávidos por se envolver num diálogo que os desafie a pensar e produzir ideiais. Os componentes mínimos de um ambiente adequado para incentivar uma criança a pensar filosoficamente são um professor questionador e um grupo de estudantes preparados para discutir aquelas coisas que realmente interessam a eles. (LIPMAN, 2014, p. 157) Matthew Lipman destaca que a função do professor dentro da comunidade de investigação é o de árbitro do processo de discussão, devendo ser visto como um facilitador, cuja intenção deve ser o de estimular as crianças a pensarem sobre seus próprios problemas

por intermédio das discussões em sala de aula. O professor não deve estar preocupado com o andamento de conteúdos específicos, mas com aquilo que surge de interessante nas discussões, o que torna as aulas significantes para os estudantes. Deste modo destacamos sobre o pensamento lipminiano:

Seria muito penoso se o professor que aplica esse programa achasse que existe uma quantidade específica de conteúdo que precisa ser coberto a cada dia, que precisa ser extraído de cada episódio e, eventualmente, dominado pelos estudantes. Pelo contrário, uma aula de sucesso é, geralmente, aquela em que os estudantes se envolvem numa animada discussão que lida com uma outra coisa do livro, embora a conversação pode distanciar-se bastante do tema inicial. Essas discussões são capazes de provocar impressões duradouras nas crianças.(LIPMAN, 2014, p. 158)

Dentro do processo de discussão filosófica, Matthew Lipman, destaca que o mais importante é o desenvolvimento do juízo intelectual das crianças, portanto é menos essencial para a educação filosófica a quantidade de informações. Assim, expõe que “cada diferença faz a diferença.” (LIPMAN, 2014, p.158) Isso implica que qualquer pensamento diferente, por menor que seja, pode fazer uma grande diferença na mudança dos processos de pensamentos das demais crianças, pois como diz o próprio autor: “A descoberta de que as aparências podem enganar pode mudar por completo a vida dessa criança.” (LIPMAN, 2014, p. 158)

Segundo Lipman: “A ênfase do programa de Filosofia para Crianças está no processo de discussão.” (2014, p. 158) Na comunidade de investigação o professor media o processo de discussão fazendo com que todos os pontos de vistas sejam averiguados, demonstrando o zelo e o respeito por cada opinião. O professor não antecipa conclusões mais dá maior importância ao desenvolvimento das discussões filosóficas. Podemos destacar sobre os professores:

Os professores não precisam apresentar-se aos seus alunos como possuidores de uma grande quantidade de informações. É melhor parecer para a classe um questionador que está interessado em estimular e facilitar a discussão. Um professor não precisa afirmar que está, inquestionavelmente certo ou errado. Mas o professor pode muito bem mostrar interesse nas diferenças entre os pontos de vista, ou nas confirmações ou contradições de opiniões particulares. Foi observado que num clima intelectual de dar e receber, os estudantes que até então estavam retraídos ou reservados, começam a manifestar suas opiniões porque percebem que até então estavam retraídos ou reservados, começam a manifestar suas opiniões porque percebem que, nesse clima, cada ponto de vista será respeitado e levado a sério. (LIPMAN, 2014, p. 158-159)

A discussão filosófica tem caráter rigoroso e inclui aspectos de princípios de lógica, portanto a discussão filosófica dever ser cumulativa, pois cresce e desenvolve, e por meio dela os participantes descobrem novos e muitos horizontes. Para tanto, para que uma discussão filosófica se desenvolva é necessário que o professor seja possuidor de uma arte de “estimular com habilidade os comentários das crianças de modo a propiciar o desenvolvimento da discussão, e ao mesmo tempo, conseguir a maior participação possível de classe.” (LIPMAN, 2014, p. 159-160)

O professor traz consigo a arte de ser um questionador talentoso, de acordo com Matthew Lipman, o professor é aquele que deve “reconhecer oportunidades para que as crianças explorem novas perspectivas, do mesmo modo que criará oportunidades para indicar como as ideias podem se juntar e reforçar umas às outras.” (LIPMAN, 2014, p. 160)

Apesar de enfatizar o papel do professor na condução da discussão filosófica, Matthew Lipman entende que o professor deve motivar e dirigir uma situação em que haja maior interação estudante-estudante, intervindo numa discussão. A seguir alguns o professor Matthew Lipman, 2014, nos mostra exemplos de perguntas filosóficas que ajudam a alimentar o diálogo filosófico:

- Quais as razões que você tem para dizer isso?

- Por que você concorda (ou discorda) com esse ponto? - Como você está definindo os termos que acabou de usar? - O que você quer dizer com essa expressão?

- O que você está dizendo é coerente com o que você disse antes? - Será que você poderia esclarecer esse comentário?

- Quando você disse aquilo, o que você estava pressupondo exatamente? - O que se segue do que você acaba de dizer?

- Será que você e ele não estavam se contradizendo? - Você tem certeza de que não está se contradizendo?

- Quais as alternativas que existem para a formulação que você fez? (LIPMAN, 2014, p. 171-172)

Matthew Lipman esclarece que para se dirigir uma discussão filosófica o professor tem que desenvolver uma sensibilidade a fim de saber que tipo de pergunta é apropriada em cada situação. O professor pode deter-se sobre algum comentário de um aluno, explorá-lo, pode não aprofundar outro comentário caso perceba que seja contraprodutiva. Portanto destaca: “Não há nenhuma receita para a técnica da discussão perfeita.” (LIPMAN, 2014, p.172)

Na comunidade de investigação a discussão filosófica se desenvolve a partir de alguns objetivos: na medida em que os estudantes expressam pontos de vistas ou opiniões; os estudantes são estimulados a se expressarem, esclarecendo e reformulando suas ideias; os estudantes explicam com maior detalhe suas ideias e pontos de vista; os estudantes interpretam o significado do que é dito uns pelos outros; os estudantes buscam coerências em suas ideias; os estudantes pedem definições quando aparecer um termo que cause confusão de clareza; os estudantes buscam pressuposições; os estudantes pedem razões – apresentação sistemática de ideias; os estudantes obtêm e analisam alternativas. (LIPMAN, 2014, p.173- 179)

Inferimos que a escola e a sala de aula se torna um lugar de preferência para que o método do programa de filosofia para crianças que seja aplicado com êxito. É na sala de aula que acontece a comunidade de investigação e torna a investigação filosófica o objetivo central da aula. A metodologia lipminiana apresenta-se na prática pedagógica de discussão e participação de todos os estudantes, como podemos ler a seguir:

Na comunidade de investigação deve predominar o diálogo, por ser uma forma pedagógica de discussão onde todos podem participar e expressar o seu pensamento, sendo, cada um, respeitado e considerado de valor por todos da Comunidade. Tudo que é dito pelos membros da Comunidade é levado em conta para que se solucione o problema em discussão ou uma oportunidade de atuação de mais um colega, momento privilegiado para o aprimoramento do seu raciocínio através do questionamento e da investigação. (BROCANELLI, 2010, p.87)

Considerando os pressupostos a seguir; de que a sala de aula é um ambiente aberto para a discussão dialógica, e que todos seus membros estudantes possuem autonomia para expor suas ideias perante a Comunidade de Investigação, podemos inferir que essa metodologia pode possibilitar uma educação que forme sujeitos autônomos, na medida em que a metodologia oferece oportunidade para que os estudantes fomentem discussões filosóficas aprimorando raciocínios lógicos, ideias sistemáticas, e seus diversos pontos de vista, colocando-os à prova da discussão e ao mesmo tempo tornando-os habilitados a reflexão e a criticidade.

Porém carece aqui analisar os temas filosóficos sugeridos por interesse dos próprios alunos e de como o professor vai mediar uma discussão que possibilite encontrar relevância ao conectar-se a temas referentes à crítica da realidade social e da indústria cultural de consumo, do ponto de vista frankfurtiano.

Vale a pena ressaltar a importância das novelas filosóficas, pois elas são pontapés para incitar o interesse dos estudantes aos temas filosóficos. Porém elas podem ou não determinar quais temas filosóficos é do interesse dos estudantes numa determinada aula.

A seguir apresentamos as novelas filosóficas e o pensar filosófico. As novelas filosóficas são tidas como o mais importante material didático desenvolvido por Matthew Lipman e seus colaboradores.