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A esfera de visibilidade midiática

CAPÍTULO 2 - DO SISTEMA MIDIÁTICO E DA ABORDAGEM

2.1 A mídia como subsistema social

2.1.1 A esfera de visibilidade midiática

Em sociedades complexas e diferenciadas, compostas por um número de cidadãos improvável de ser reunido em locais onde se dê uma comunicação face a face, e onde a atividade jornalística se desenvolveu como um campo autônomo capaz de mediar as relações entre os outros campos ou subsistemas sociais, grande parte da comunicação entre a esfera política formal e a esfera civil se dá através da mídia.

No Brasil, desde o término do regime militar, com o fim da censura, podemos notar um crescimento nos fluxos de informação política presentes na sociedade, tanto na quantidade, quanto na variedade e na multiplicidade das fontes, fazendo com que todo o tipo de informação sobre política, políticos, Estado, Governo e questões públicas chegue a todo instante, pelos mais variados canais, a um público cada vez maior. Para Wilson Gomes:

A alteração a que assistimos é, essencialmente de natureza cognitiva. Formou-se um domínio multivariado, livre, intenso, veloz e de fácil acesso, composto por repertórios de informação sobre a esfera política, sobre as questões de Estado e sobre o estado da opinião pública, um domínio que funciona como uma grande cena da qual toda a cidadania pode se tornar espectadora e consumidora, a esfera de visibilidade pública política. Em sociedades desse tipo, a esfera civil não depende mais das

conveniências da esfera política para formar a sua opinião e a sua disposição,que

serãoconvertidasoportunamenteem votos. (GOMES, 2004, p. 113).

A conformação dessa esfera de visibilidade midiática ou esfera de visibilidade pública política, como denomina Wilson Gomes, tem diversas implicações para a prática política, principalmente no que tange à relação entre a esfera política formal e a sociedade civil.

A noção de ‘publicidade’, que apontamos anteriormente como dimensão fundamental para a participação dos cidadãos na política, ganha uma flexibilidade maior nessa esfera. Dimensões de publicidade mais fracas (visibilidade) e mais fortes (deliberação) convivem e se sobrepõem, quando a política é vivida na esfera de visibilidade midiática, pois a mídia se torna tanto um palco para a performance dos atores políticos, quanto uma arena para debates públicos entre diversos atores oriundos de diversos campos sociais.

Mas, seja qual for a ‘publicidade’ que está em jogo, para os atores do campo político, principalmente para aqueles com interesse em processos eleitorais, estar ‘visível’ e construir uma imagem pública positiva se torna uma preocupação central. E, assim, eles passam a integrar, no seu modo de agir e nos seus cálculos, a lógica de operação da mídia, se colocam em relação sistêmica, buscando produzir inputs e influenciar o subsistema da mídia.

Dessa forma, a comunicação se torna um problema central para os atores políticos, que passam a levar em consideração as estratégias e os valores para se tornarem ‘passíveis’ de visibilidade ou para se tornarem notícia e que procuram não somente adequar os seus discursos e argumentos à gramática própria dos mídia como também manter uma relação positiva com os agentes destes sistemas de mediação; levando isso a um crescente profissionalismo da atividade de

comunicação ou de marketing político. Mas é preciso levar em conta os riscos da visibilidade, pensar na sua repercussão e contemplar a audiência, que é também formada pelo público de eleitores; pois os efeitos da visibilidade não são, por si só, favoráveis à construção de uma imagem pública positiva ou à capitalização em embates e disputas políticas.

Pode-se considerar que a visibilidade midiática e o reconhecimento do público que se pode conquistar com ela são recursos escassos e, por outro lado, os atores, fatos e acontecimentos políticos são muitos. Sendo assim, as performances e os debates que alcançam essa visibilidade não se desenvolvem livres de disputas, competições, contraposições. Eles acontecem sempre em relação uns com os outros.

Portanto, a constituição de um ator político ou de um argumento nessa esfera de visibilidade se dá sempre diante da constituição de vários ‘outros’. Outros atores políticos, outros fatos, outros agentes do campo midiático - que podem cooperar ou não na construção de sua imagem pública; principalmente diante do ‘público’ ou da ‘opinião pública’.

É diante do público que se encena o ‘espetáculo’, é pelo direito do público à informação e pela obrigação dos governos de serem transparentes que se dá a publicidade, é para formar (ou influenciar) a ‘opinião pública’ que os debates acontecem. E, principalmente, é para que o julgamento final do público - o voto - os favoreça, que os políticos se comprometem publicamente com propostas, políticas, promessas.

A vida pública, tomada em sua parte visível, se volta toda para o público: para mostrar ao público resultados positivos da prática política, para validar interesses e políticas públicas, para administrar a impressão pública e, também, para que a sociedade civil se torne parceira na definição, na condução e na fiscalização de políticas públicas, para ampliar a participação, para consolidar a cidadania.

O público (entidade privilegiada para essa esfera de visibilidade midiática) pode ser visto sob diversas perspectivas de acordo com as relações que estabelece com o sistema dos mídia. Ora ele é o consumidor dos produtos que são os meios de comunicação, ora o cidadão que tem direito à informação e deve ser motivado a participar da vida pública. Mas é ainda, e principalmente, a opinião pública, cujos julgamentos interessam a todos, pois as condições que aumentam a visibilidade dos atores políticos também os expõem mais ao julgamento.

O princípio democrático da accountability, entendido como “o dever de prestar contas sobre as próprias ações” ou a “obrigação de dar satisfações”, relativo ao direito do representado de exigir que seu representante preste contas do exercício de seu mandato, passa a se realizar também no campo midiático (MAIA, 2004, p. 03). Nesse sentido, a avaliação do público incide tanto sobre o funcionamento real das instituições e atores políticos quanto sobre a sua performance na esfera de visibilidade pública política.

E a apreciação do público sobre a performance dos atores e instituições políticas é, também, abarcada pela mídia: a opinião pública ganha visibilidade, passa a existir para o público através da mídia e a ocupar, junto com os atores políticos, a cena política midiática.