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Avaliação do posicionamento dos veículos diante dos números

CAPÍTULO 3 - DO DISCURSO DA MÍDIA SOBRE A OPINIÃO PÚBLICA ÀS

3.2 A opinião pública sobre o Governo Lula

3.2.1 Análise das matérias informativas: articulações entre os tópicos das pesquisas

3.2.1.3 Demais tópicos de avaliação do desempenho do governo

3.2.1.3.2 Avaliação do posicionamento dos veículos diante dos números

Os veículos, nas matérias que tratam das pesquisas de opinião, adotam o ponto de vista do Governo e da população na hora de classificar os índices das pesquisas. Os índices são considerados ‘positivos’ quando são favoráveis ao governo e são considerados ‘negativos’ quando são desfavoráveis ao governo.

No entanto, há uma diferença entre a perspectiva utilizada para classificar os índices como ‘positivos’ ou ‘negativos’ e a posicionamento adotado para apresentação da pesquisa. Embora os veículos adotem a perspectiva do governo para classificar os índices, nem sempre escolhem os índices favoráveis ao governo na hora de construir as matérias.

Nesta chamada da primeira página, por exemplo, podemos observar a escolha de aspectos ‘negativos’ revelados pela pesquisa para integrarem o texto da matéria do dia 02 de novembro, da

Folha de S. Paulo:

Título: Lula é aprovado por 42%; medo do desemprego sobe

Sub-título: Para 54%, política de emprego é ruim ou péssima; 34% temem ser

demitidos

Após dez meses, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva é aprovado por 42% dos brasileiros, segundo o Datafolha. Em agosto, 45% consideravam a administração Lula ótima ou boa. A oscilação negativa de três pontos percentuais está dentro da margem de erro da pesquisa.

A taxa de reprovação do governo é de 11% (contra 10% antes), e a de regular, 44% (42% em agosto). A aprovação de Lula (60%) é maior que a do governo. Mas, em sete meses, caiu cinco pontos a taxa daqueles que consideram que o presidente trabalha muito.

Também caiu quatro pontos o percentual dos que afirmam que Lu la respeita mais os pobres. O governo é considerado ruim ou péssimo no combate ao desemprego por 54%. Essa taxa era de 50% em agosto e de 43% em março - uma alta de 11 pontos em sete meses.

Para 34%, o maior temor é ficar sem trabalho. O resultado é cinco pontos superior ao verificado em levantamento de novembro de 2001. Entre os brasileiros das classes mais pobres, esse percentual chega a 42%. Para 41%, o desemprego irá crescer.

na pesquisa privilegiou os índices negativos, com destaque para taxas de desaprovação, índices de ‘ruim’ ou ‘péssimo’, medos e expectativas negativas. Nas matérias que tratam da pesquisa, no interior do jornal, é possível encontrar índices positivos para o Governo. Por exemplo, na avaliação pessoal do presidente, 60% dos entrevistados consideram o desempenho ótimo ou bom, 31% regular e 6% ruim ou péssimo. Há ainda uma matéria que trata da estabilidade da avaliação de desempenho do governo ao longo do ano. No entanto, nenhum desses índices positivos foi escolhido pelo veículo para compor a chamada da primeira página.

Nesse sentido, a análise das matérias revela uma diferença de tratamento entre os dois veículos. Embora em ambos, no corpo das matérias, os diversos itens das pesquisas sejam apresentados e comparados aos índices anteriores, indiferentemente de serem positivos ou negativos para o governo, nos títulos e subtítulos, ou seja, na hora de destacar determinados aspectos das pesquisas, os veículos utilizam políticas editoriais distintas.

Em O Globo, com exceção de uma única matéria que diz respeito à reforma da previdência, todas as matérias trazem nos títulos e subtítulos um equilíbrio entre aspectos negativos e positivos. Se o título é positivo, o sub-título é negativo e vice-versa, como podemos observar nas matérias a seguir:

? O Globo, 24 de abril. Manchete: “Sensus: cai a popularidade de Lula”; subtítulo: “Pesquisa mostra, porém, que aprovação ao governo do petista subiu”.

? O Globo, 04 de junho. Manchete: “Popularidade de Lula continua alta”; subtítulo: “Sensus: apoio à política econômica, porém, caiu de 60,9% para 57,6%”.

? O Globo, 1o de outubro. Manchete: “Aos nove meses de gestão, Lula perde popularidade”; subtítulo: “Índices de aprovação do governo e do presidente ainda são muito altos, mas percentual de desaprovação cresce desde março”.

Já a Folha de S. Paulo, não desenvolve uma política editorial tão clara em relação ao destaque dos aspectos das pesquisas que podem ser considerados positivos ou negativos para o governo. Até meados do mês de abril encontramos matérias que dão destaque somente a aspectos positivos das pesquisas e outras que dão destaque somente aos aspectos negativos das pesquisas. Após esse período, não encontramos mais matérias com destaque somente para aspectos positivos, mas encontramos várias matérias com destaque somente para os aspectos negativos.

Aspectos positivos são abordados de forma mais neutra. Em algumas matérias, mesmo tendo havido crescimento nas taxas de aprovação, o título não aborda o assunto. Na matéria de 24 de abril, por exemplo, há um crescimento da taxa de aprovação ao Governo, o qual passou de 45% para 47,7%, mas o título não destaca o crescimento: “Governo Lula é aprovado por 47,7%”. Também na matéria de 04 de junho, embora tenha havido um crescimento de 3,9% (acima da margem de erro da pesquisa que é de 3%) na taxa de aprovação ao governo, o título da matéria anuncia: “Governo mantém boa avaliação, diz Sensus”.

Quando o título é composto por um índice positivo, como na matéria de 31 de agosto, o aspeto negativo se faz presente: “Apesar da crise, aprovação a Lula sobe de 42% para 45%”, neste caso, através de uma avaliação do jornal e não através de índices negativos da pesquisa.

Essa forma de abordagem, com atenção especial aos tópicos negativos das pesquisas e sem dar destaque aos aspectos positivos, segue até o final do ano, na cobertura da Folha de S. Paulo.

Na perspectiva da Análise Crítica do Discurso, essas operações que conformam o sentido do texto são marcadas por e fazem parte do posicionamento político dos sujeitos diante do mundo. Ao longo da nossa análise, notamos as diferenças entre os posicionamentos dos veículos analisados e como isso se revela (e determina) as estratégias discursivas adotadas por cada um. O veículo O Globo adota uma perspectiva mais favorável ao Governo Lula, embora crítica em alguns momentos.

Uma vez que as pesquisas, em sua maioria, revelam grande aprovação por parte da população, o veículo não investe em estratégias discursivas mais elaboradas para se contrapor aos resultados ou questionar a capacidade da população de avaliar o governo. Já a Folha de S. Paulo, que desde o início do ano adota o pressuposto de que o governo não será capaz de tirar os seus projetos do papel (como veremos na análise dos editoriais), desenvolve estratégias discursivas mais complexas para sustentar argumentos que põem em dúvida o resultado das pesquisas.