• Nenhum resultado encontrado

A formação dos profissionais da educação no Estado do Espírito Santo

O livro "O trabalho docente na educação básica: o Espírito Santo em questão", organizado por Bartolozzi,77 Oliveira e Vieira (2012), com o objetivo de contribuir com o conhecimento sobre o trabalho docente em suas dimensões constitutivas e com o debate para a elaboração de políticas educativas, com vistas à melhoria das condições em que se realiza o trabalho dos profissionais da educação, a valorização desses sujeitos e a elevação da qualidade da Educação Básica, traz os resultados da pesquisa TDEBB no Espírito Santo, contemplados em 11 capítulos, dos quais elegemos sete – dois derivam da pesquisa e tratam do objeto, três sistematizam dados gerais e não necessariamente tratam do nosso objeto e dois não derivam da pesquisa, mas tratam do objeto – para a análise, conforme Quadro 6.

Nacional de Formação de Profissionais do Magistério para a Educação Básica (Decreto nº 6.755/09); Parfor/MEC/2009; Lei do Piso Nacional Salarial/2008 e outros.

77 Eliza Bartolozzi Ferreira – doutora em Educação; professora do Programa de Pós-graduação em Educação do

Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (DEPS/PPGE/CE/UFES); coordenadora do Nepe/Ufes e da TDEBB no Espírito Santo. Foi secretária adjunta da Anped (gestão 2009-2013) (BARTOLOZZI; OLIVEIRA; VIEIRA 2012).

QUADRO 6 – Capítulos selecionados no livro “O trabalho docente na educação básica: o Espírito Santo em questão”, segundo categorias de análise

Categorias de análise e capítulos selecionados Derivam da pesquisa e tratam

do objeto

Sistematizam dados gerais da pesquisa e não tratam necessariamente do objeto

Não derivam da pesquisa, mas tratam do

objeto

Trabalhadores docentes do Espírito Santo: identidades e

processos de formação

(VENTORIM, Silvana;

POZZATTI Mariana)

O trabalho docente na rede estadual do Espírito Santo: apontamentos sobre a carreira e suas condições de trabalho (LIEVORE, Sue Elen)

O trabalho docente na educação básica no estado do Espírito Santo: conhecendo novos docentes e suas condições (OLIVEIRA, Dalila A.; VIEIRA, Lívia F.)

O trabalho docente no Espírito Santo: aproximações gerais sobre o perfil e suas condições de trabalho (BARTOLOZZI, Eliza; VENTORIM, Silvana; CÔCO, Valdete) O trabalho docente na educação infantil no Espírito Santo ( CÔCO, Valdete)

Identidades docentes (novos e recorrentes problemas enfrentados por uma categoria profissional) (HYPOLITO, Álvaro M; VIEIRA, Jarbas S.) Formação inicial e continuada: a prioridade ainda postergada (FREITAS, Helena C. L.) 02 03 02 TOTAL 07

Cabe salientar que foi recorrente, nos capítulos analisados sobre os demais Estados, o destaque às políticas educacionais implementadas pelo Estado Brasileiro a partir da década de 1990, de cunho neoliberal, que desencadearam novas regulações no âmbito do trabalho, da carreira, das condições e na formação docente, centradas nesta última, sem levar em conta dimensões objetivas e subjetivas de realização do trabalho docente igualmente importantes.

É ainda oportuno destacar que, a partir das definições de regulação citadas, principalmente, pelas autoras Oliveira e Vieira (2012b, 2012c, 2012d, 2012e, 2012f), essa regulação pode ser definida como um grupo de regras tomadas e executadas por instância superior, como a governamental, investida de autoridade para encaminhar e direcionar as ações e relações dos atores sobre os quais detém um certo poder legítimo

Os dados da pesquisa TDEBB sobre o Estado do Espírito Santo, evidenciados principalmente por Oliveira e Vieira (2012c), Ferreira (2012) e Ferreira, Ventorim e Côco (2012), revelaram que dentre os 1.481 entrevistados no Estado, a maioria é do sexo feminino (82%), casada (51,7%), de cor branca e parda (84%). Indicaram também que o Espírito Santo se destaca por concentrar, dentre os Estados pesquisados, o maior percentual de trabalhadores docentes formados em Pedagogia (45%); pós-graduados (66,6%); com hábito de leitura em jornais (89,9% sempre ou frequentemente); e que trabalham menos horas extraclasse (87,5%, até cinco horas).

Entretanto, os dados mostraram que o Estado capixaba se assemelha em muitos aspectos aos demais Estados pesquisados, no que tange ao aumento de salário como alavancador da busca por formação continuada, visto que os títulos preponderam nos planos de cargos e salários, bem como em relação ao fato de as formulação e implementação de uma política nacional de formação de profissionais da educação serem interpeladas pelas tradições políticas, econômicas e culturais.

Os dados revelaram, sobretudo, que a necessidade de formação e capacitação é uma prioridade para os profissionais por diversos fatores, mas o principal é a remuneração (seguida da diminuição dos alunos em sala de aula). Além disso, o Espírito Santo apresenta o menor percentual dentre os Estados pesquisados de docentes que trabalham em apenas uma unidade (44,5%) e que levam atividades do trabalho para casa (63,2%).

Soma-se, ainda, o fato de que a maior parte dos profissionais trabalha em mais de uma instituição de ensino (55%); possui graduação (83%), cursada em instituição privada (56%, seguida da instituição pública federal com 43%); é concursada (55,8%), mas está insatisfeita com a remuneração recebida (80%) de, no máximo, quatro salários mínimos,78 apesar de o trabalho na educação proporcionar grandes satisfações (79%).

Dessa forma, a intensificação do trabalho é observada no predomínio da atuação dos educadores em mais de uma unidade de ensino; na realização da atividade do trabalho em casa; no não recebimento de orientação para realizar trabalho com os alunos com necessidades especiais; no aumento das exigências sobre o trabalho em relação ao desempenho dos alunos; e no trabalho coletivo prejudicado pela falta de tempo.

Em outras palavras, o cenário capixaba é de precariedade das políticas de formação continuada, uma vez que a grande parte dos docentes tem o trabalho coletivo prejudicado pela falta de tempo (70%) e vivencia a baixa valorização salarial, apesar de a maioria absoluta possuir certificação em nível de pós-graduação. Ademais, assim como em nível nacional, os docentes estão insatisfeitos com a política de formação adotada, que deve ser reformulada e melhorada. Também não tem sido significativa a participação desses sujeitos em atividades de formação continuada, como congressos, seminários e colóquios em educação.

78 A maioria recebe de dois a três salários mínimos que, no ano de 2009 (ano de aplicação do survey), era de R$

A respeito da rede estadual do Espírito Santo (representa 26% do universo total entrevistado no Estado), os dados mostram que a maioria dos docentes é pós-graduada (63,7%), licenciada (84%, sendo 16,7% em Pedagogia), formada em instituição particular (50,3%, sendo 47% em instituição federal) e não participou de colóquios, congressos e seminários no último ano. Porém, a participação em processos de formação continuada foi significativa, quando ofertada no espaço escolar onde o trabalhador atua e prevista no calendário. Foi irrisória a participação do MEC na oferta de atividades formativas.

Lievore79 sinaliza que as políticas de formação no Espírito Santo estão voltadas aos princípios mercadológicos, de treinamento do trabalhador para atuar de forma pragmática no mercado produtivo e de responsabilização da escola e do trabalhador docente submetidos a processos avaliativos em escala nacional, com base em critérios quantitativos articulados a critérios de produtividade, assiduidade, eficiência e eficácia, como os vinculados à política de bonificação.80

Entretanto, Ventorim e Pozzatti81 ressaltam a defesa da formação sócio-histórica do educador, implicando, dentre outros aspectos, rever a formação básica e assegurar condições dignas de trabalho e formação continuada. Perspectiva que se pauta no entendimento de que

[...] a formação extrapola o aprendido no mundo acadêmico, considerando para esse fim o desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional da profissão docente no processo de construção e reconstrução das identidades docentes. Portanto, formação e identidades são processos contínuos [...]. Pela formação inicial e continuada, no mundo do trabalho, se constrói o professor considerando sua história de vida, sua prática, seus saberes, suas experiências [...] (VENTORIM; POZZATTI, 2012, p. 85). Dessa forma, trabalhadores docentes, identidades e formação se constituem resultantes dos trajetos pessoais e profissionais no contexto da constituição da docência e do trabalho docente (VENTORIM; POZZATTI, 2012, p. 86).

Em outros termos, a formação bem como o processo de constituição da identidade são concebidos como um continuum que se dá a partir da experiência que o sujeito obteve com a

79

Sue Elen Lievore – mestranda do PPGE/Ufes; bolsista do Fundo de Apoio a Ciência e Tecnologia do Munícipio de Vitória (Facitec); pesquisadora do Nepe/Ufes (BARTOLOZZI; OLIVEIRA; VIEIRA 2012).

80 De acordo com a Sedu/ES, a bonificação por desempenho (instituída pela Lei Complementar nº 504/2009), ou

bônus pelo desempenho, é um prêmio em dinheiro, concedido anualmente aos profissionais que atuam nas escolas e unidades administrativas da Sedu, calculado com base nos indicadores coletivos e individuais ou resultados apurados pela unidade de ensino onde exerce suas funções e o seu papel individual (FERREIRA; VENTORIM; CÔCO, 2012).

81

Mariana Pozzatti – graduada em Educação Física; pós-graduada lato sensu em Educação Física Escolar, em Gerontologia Social e em Formação de Mediadores EAD; mestranda em Educação Física pela Ufes; membro do Instituto de Pesquisa em Educação Física (Proteoria/CEFD/Ufes) (BARTOLOZZI; OLIVEIRA; VIEIRA 2012).

instituição escola na condição de discente, no ingresso nos cursos de formação inicial, em sua prática cotidiana profissional e nos cursos de formação continuada.

Nessa direção, Hypolito e Vieira82 (2012) afirmam que as identidades docentes são instáveis, dinâmicas, multifacetadas e relacionais, constituídas numa complexa rede de poderes e discursos oficiais e que as novas políticas de regulação desencadeadas, em especial, a partir dos anos 1990, têm incidido no trabalho docente constituindo novas identidades fundadas na atribuição aos docentes da responsabilização pelo fracasso da educação e do aluno das escolas públicas.

Portanto, esses autores afirmam, fundamentados em Dubar (2005), que se trata de identidades profissionais virtualmente construídas/fabricadas e atribuídas pelo sistema aos docentes, com o intuito de controlar e operar o processo educacional público e de conformar e justificar a adoção de políticas de formação voltadas para o desempenho e pragmatismo.

Em suma, como apontam Ferreira, Ventorim83 e Côco84 (2012), o Espírito Santo apresenta a tendência dos demais Estados abrangidos pela pesquisa, no que se refere à condução de suas políticas educacionais, sob a lógica gerencialista a partir dos anos de 1990, sinalizadas, sobretudo, pelas políticas educativas dentre as quais destacamos o “Plano de Desenvolvimento”, instituído em 2006 para garantir um ensino de qualidade com padrão internacional, via estratégias de empenho contínuo e consistente de formação e valorização docente e também a melhoria da gestão do Sistema Educacional e da implantação de um sistema próprio de avaliação e monitoramento de todas as escolas.

Além do plano mencionado, destacamos a instituição em 2007 da modalidade de remuneração para o Magistério por subsídio que, segundo as autoras, pôs fim a todas as conquistas alçadas e regulamentadas ao longo da carreira, como a progressão a partir da titulação, de cursos de formação continuada e por tempo de serviço, culminando na perda da operacionalidade do

82 Jarbas Santos Vieira – doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul; pós-doutor pela

Universidade de Barcelona, Espanha; professor associado da Universidade Federal de Pelotas; atual coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação (OLIVEIRA; VIEIRA, 2012).

83

Silvana Ventorim – doutora em Educação; professora do Departamento de Linguagens, Cultura e Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (DLCE/PPGE/CE/Ufes); pesquisadora integrante do grupo de pesquisa da TDEBB no Espírito Santo; pesquisadora do Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física (Proteoria) e do Nepe/Ufes (BARTOLOZZI; OLIVEIRA; VIEIRA, 2012).

84 Valdete Côco – doutora em Educação; professora do Programa de Pós-graduação em Educação do Centro de

Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (DLCE/PPGE/CE/UFES); pesquisadora integrante do grupo de pesquisa da TDEBB no Espírito Santo; coordenadora do Grupo de Pesquisa Formação e Atuação de Educadores (Grufae); tutora do Programa de Educação Tutorial: Projeto Educação – Ufes e integrante do Núcleo de Educação Infantil – Nedi/Ufes (BARTOLOZZI; OLIVEIRA; VIEIRA, 2012).

Plano de Carreira do Magistério Estadual do Espírito Santo. Acrescentamos a adoção do bônus desempenho em 2009, que premia a eficiência e eficácia na atividade profissional.

Assim, o Espírito Santo, bem como os demais Estados integrantes da pesquisa TDEBB, tende a investimentos isolados em formação para o cumprimento de metas na educação, não garantindo a valorização do trabalhador e nem a melhoria significativa das condições de trabalho, como pontuou Lievore (2012), ressaltando que a lei do subsídio e a política de bonificação de desempenho instituídas na rede estadual de ensino do Espírito Santo representam mecanismos de regulação que contribuíram para a precarização e enfraquecimento da classe e não para a valorização do Magistério, sinalizando que a formação docente no Espírito Santo, no geral, expressa o pragmatismo constatado nacionalmente pela pesquisa TDEBB.

Enfim, como evidenciado, nos demais Estados, o avanço na carreira é que impulsiona os docentes do Espírito Santo a participarem da formação continuada. Nesse sentido, múltiplas questões se articulam demonstrando que a formação inicial e a continuada, por si sós, não é suficiente para alçar a qualidade desejada na educação.

3.3 SÍNTESE DAS ANÁLISES PROCEDIDAS NOS ESTADOS DA ARTE E/OU ESTADO