5 A FORMAÇÃO DOCENTE NA INTERFACE COM AS DIMENSÕES
5.1 FORMAÇÃO E A INDISSOCIABILIDADE DAS DIMENSÕES PESSOAL E
5.1.1 Formação e o perfil docente
5.1.2.13 Formação x enunciados correspondentes à vivência profissional
A vivência profissional dos trabalhadores em educação participantes desta pesquisa, de acordo com os dados da Tabela 68, confirmados na Tabela 69, ambas à frente, era marcada pela falta de condições para o trabalho docente, visto que o sentimento que correspondia à vivência profissional de 87,41% dos profissionais era o “de que o trabalho realizado poderia ser mais eficiente, se fosse planejado e executado em condições mais favoráveis”.
Tal resultado, para nós, corrobora a concepção de condições de trabalho docente em Oliveira (2010), uma vez que, para essa autora, “ conceito de condições de trabalho está intimamente vinculado às condições de vida dos trabalhadores” ( VE ; V E , 2012b, p. 156). s condições de trabalho compreendem
[...] o conjunto de recursos que possibilita uma realização de trabalho e, que envolvem a infraestrutura da instituição, os materiais disponíveis, os serviços de apoio, as relações de emprego, ou seja, as circunstâncias indispensáveis para que a atividade de trabalho se realize e se desenvolva (ASSUNCAO, 2003; KUENZER, 2007; SANTOS, 2008; apud OLIVEIRA et al., 2009a, p. 13). Nos estabelecimentos escolares as condições de trabalho são identificadas com os recursos humanos (todos os trabalhadores que compõem as escolas); os recursos físicos e materiais (edificação, equipamentos, itens de consumo, material didático); os recursos financeiros (caixa escolar, e outros administrados pela escola); as relações de emprego (recrutamento e seleção, contrato de trabalho, jornada, salário, estatuto profissional, formação continuada, cobertura previdenciária), que têm influência na consecução do trabalho (OLIVEIRA et al., 2009a, p. 14).
Entretanto, a despeito do sentimento de falta de condições favoráveis para a realização do trabalho, os profissionais nutriam o sentimento “de que têm muito a contribuir com a educação”, como o principal enunciado que correspondia às suas vivências profissionais (97%).
Sentimentos que refletem a configuração identitária em Dubar (2005), uma vez que podem ser em função da aceitação e/ou interiorização da identidade profissional que lhes é atribuída, fundada na culpa e responsabilização pelo sucesso ou pelo fracasso das escolas, dos alunos e da educação. Nesse sentido, ao invés de uma relação de ruptura, esses trabalhadores mantinham uma relação de continuidade com a instituição, visto que o trabalho está para eles no centro da configuração identitária. Dessa forma, para Dubar (2005, p. 325):
As identidades construídas nos moldes da continuidade implicam um espaço potencialmente unificado de realização, um sistema de emprego no qual os indivíduos mobilizam trajetórias contínuas. Esse espaço pode ser do tipo profissional (seguindo o modelo geral de ofício) ou do tipo organizacional (seguindo o modelo geral da burocracia da empresa) [...]. As identidades construídas nos moldes da ruptura implicam, ao contrário, uma dualidade entre os dois espaços e uma impossibilidade de construir para si uma identidade de futuro no interior do espaço produtor da identidade passada (DUBAR, 2005, p. 324, grifo do autor). [...] a ruptura é acompanhada de um conflito entre a identidade atribuída pela instituição e a identidade forjada pelo individuo [...].
Porém, esses trabalhadores, mesmo adaptados ao sistema, não buscam novas formações (DUBAR, 2005), como podemos constatar nos baixos índices de participação em todas as formas de formação continuada analisadas, cujos maiores e mais significativos foram em torno de 50%, conforme a Tabela 69.
Ademais, a falta de condições adequadas de trabalho, como dimensão que incidiu na baixa participação dos profissionais da educação em atividades e programas de formação continuada, pode ser visualizada nas médias participativas, segundo os enunciados correspondentes às vivências profissionais, revelados na Tabela 69, visto que, dentre os aspectos com os mais baixos índices de participação (“o pensar que em outra profissão poderia utilizar melhor as habilidades intelectuais” com 34,12%, e “o pensar em parar de trabalhar na educação” com 34,12%), está “o sentimento de que trabalho realizado poderia ser mais eficiente, se fosse planejado e executado em condições mais favoráveis” (com 39,12%).
A despeito da falta de condições adequadas de trabalho constituir-se num aspecto que contribuiu para uma participação menos expressiva, as maiores médias de participação em formação continuada foram observadas entre os profissionais que “ainda escolheriam trabalhar em educação, se tivessem que recomeçar minha vida profissional” (45,87%), segundo a Tabela 69.
Trata-se de indicação que pode ter relação com o aspecto missão destacado em Gatti, Barreto e André (2011), ao evidenciarem que, apesar da luta pela profissionalização do Magistério no Brasil na busca pelo reconhecimento político, social e econômico, revelada na análise de liveira (2010), a atividade dos professores “[...] é vista também como uma missão; a de formar cidadãos, transmitir valores, cuidar, o que cria uma tensão de status – ‘mero funcionário ou missionário visionário?’ ( TT ; B ET ; D É, 2011, p. 94, grifo das autoras).
TABELA 68 – Profissionais da educação segundo os enunciados correspondentes à vivência profissional
Enunciados Nível de correspondências dos
enunciados à vivência profissional
Eu me sinto frustrado com o meu trabalho 23,75%
Eu sinto que tenho muito a contribuir na educação 97,00%
Eu penso em parar de trabalhar na educação 24,50%
Eu sinto que a educação me permite utilizar o máximo minhas capacidades
73,25% Eu penso que em outra profissão, eu utilizaria melhor minhas
habilidades intelectuais
38,75%
Trabalhar na educação me proporciona grandes satisfações 76,75%
Eu escolheria ainda trabalhar em educação, se eu tivesse que recomeçar minha vida profissional
66,33% Eu sinto que meu trabalho poderia ser mais eficiente, se fosse
planejado e executado em condições mais favoráveis
87,41% Fonte: Banco de dados do ES/NEPE/UFES (2010).
TABELA 69 – Participação em formação continuada segundo os enunciados corespondentes à vivência profissional
Enunciados
Participação em formação continuada Congressos, seminários e colóquios em educação Ofertada por instituição universitária Prevista no calendário escolar Atividades de formação conjunta Média das participações segundo enunciados
Eu me sinto frustrado com o meu trabalho
51,58% 20,00% 50,53% 42,26% 41,09%
Eu sinto que tenho muito a contribuir na educação
41,24% 17,27% 44,07% 48,45% 37,76%
Eu penso em parar de trabalhar na educação
40,82% 12,24% 40,82% 44,90% 34,70%
Eu sinto que a educação me permite utilizar o máximo minhas capacidades
41,98% 17,75% 45,05% 53,24% 39,51%
Eu penso que em outra profissão, eu utilizaria melhor minhas habilidades intelectuais
36,77% 12,26% 41,29% 40,65% 32,74%
Trabalhar na educação me proporciona grandes satisfações
48,21% 17,92% 45,60% 51,79% 40,88%
Eu escolheria ainda trabalhar em educação, se eu tivesse que recomeçar minha vida profissional
50,87% 20,87% 51,74% 60,00% 45,87%
Eu sinto que meu trabalho poderia ser mais eficiente, se fosse planejado e executado em condições mais favoráveis
46,11% 16,14% 46,97% 47,26% 39,12%
Médias das participações por formação continuada
44,70% 16,81% 45,76% 48,57%
Fonte: Banco de dados do ES/NEPE/UFES (2010). Nota: Dados adaptados pela autora.