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5 A FORMAÇÃO DOCENTE NA INTERFACE COM AS DIMENSÕES

5.1 FORMAÇÃO E A INDISSOCIABILIDADE DAS DIMENSÕES PESSOAL E

5.1.1 Formação e o perfil docente

5.1.2.14 Formação x novas demandas no trabalho

Na contemporaneidade, como afirmou Duarte (2010, p. 104), a noção de trabalho docente foi ampliada,

Compreende não só o trabalho realizado em sala de aula como o processo que envolve o ensino e a aprendizagem, mas, também, a participação do professor no planejamento das atividades, na elaboração de propostas político-pedagógicas e na própria gestão da escola, incluindo formas coletivas de realização do trabalho escolar e articulação da escola com as famílias e a comunidade.

Diante dessas várias funções, para Oliveira (2004), o professor foi levado a responder às exigências para além da sua formação e, por vezes, exercer papel de assistente social, psicólogo, enfermeiro, implicando sua desprofissionalização e perda de identidade.

Somam-se, ainda, os investimentos recorrentes das atuais políticas educacionais, em formação docente para a melhoria do desempenho escolar (OLIVEIRA, 2012, s/p), incidindo em uma formação voltada para uma educação pragmática e utilitária, observada por Ventorim e Pozzatti (2012).

Dessa maneira, liveira (2004) afirma que “[...] os professores vêem-se, muitas vezes, constrangidos a tomarem para si a responsabilidade pelo êxito ou insucesso dos programas” (OLIVEIRA, 2004, p. 1132).

Entretanto, os dados revelaram que mais de 80% dos profissionais da educação dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio da rede estadual do Espírito Santo, participantes desta pesquisa, observaram as transformações e repercussões das políticas educacionais sobre o seu trabalho e cerca de 94% não se culpavam pelos resultados da unidade educacional nas avaliações externas, como mostra a Tabela 70.

Por outro lado, o fato de uma parcela considerável ter se culpabilizado pela classificação de sua unidade educacional nas avaliações externas (16,15%), ter assumido novas responsabilidades de forma natural (91,71%) e de 98,74% terem procurado se adaptar a novas exigências profissionais (98,74%), como sinaliza a referida tabela, dimensiona uma questão tida como importante para liveira (2012, s p) “[...] em que medida essas políticas podem estar a serviço de naturalizar um modo de regulação que, baseado na autonomia116 dos sujeitos, desloca as responsabilidades do plano institucional ao plano individual”.

Essa preocupação, como já vimos, também foi registrada por Hypólito e Vieira (2012) que, sustentados por Dubar (2005), alertaram sobre a identidade profissional docente atribuída pelo Outro (Sistema Oficial), fundada na culpa e na responsabilização dos professores pelo fracasso ou sucesso escolar.

Nessa lógica, a perspectiva de identidade profissional atribuída (DUBAR, 2005) pode justificar o fato de que a participação em formação continuada, segundo o sentimento em relação às novas demandas do trabalho, tenha sido mais expressiva em termos percentuais, justamente por parte dos profissionais que “absorveram de forma natural as novas de

116 Segundo Oliveira (2012), a autonomia dos docentes é resultante da ênfase no trabalho coletivo, da instituição

legal da gestão democrática nas escolas públicas e da flexibilidade curricular, fatores que, por sua vez, também resultaram em uma maior intensificação do trabalho e maior responsabilização dos docentes pelo desempenho escolar.

demandas”, que “procuraram se adaptar a novas exigências profissionais” e que “se responsabilizaram pelo desempenho da unidade educacional nas avaliações externas” (48,36%, 47,59% e 46,63%, respectivamente), como mostra a Tabela 71.

Entretanto, os dados dessa tabela ainda revelaram que os menores índices de participação foram observados entre os profissionais que se “sentiam constrangidos a mudar sua forma de trabalho em razão dos resultados dos exames de avaliação” (34,12%), seguidos dos que “observavam as transformações e repercussões das políticas educacionais sobre o seu trabalho” (34,87%) e dos que se “sentiam forçados a dominar novas práticas, saberes, competências, funções e responsabilidades” (38,62%).

Sinalização que vai ao encontro dos argumentos, já mencionados, de Oliveira (2004), podendo também, sob o nosso entendimento, significar rejeição à identidade atribuída pelo Outro, como argumentaram Hypólito e Vieira (2012), ao discutir identidade docente com base em Dubar (2005, p. 325), para quem “[...] o reconhecimento é o produto de interações positivas entre o indivíduo que visa sua identidade ‘real’ e o outro significado que lhe confere sua identidade ‘virtual’; o não-reconhecimento resulta, ao contrário, de interações conflituosas, de desacordos entre identidades ‘virtuais’ e ‘reais’” (grifo do autor).

Tais resultados ainda podem indicar insatisfação com as políticas de formação, como revelaram as análises de Azevedo (2012) e de Oliveira e Maués (2012), mencionadas na Tabela 66.

Enfim, diante desse quadro, inferimos que as demandas no trabalho docente resultantes da nova regulação contribuíram para a participação insatisfatória em formação continuada.

TABELA 70 – Profissionais da edução segundo as novas demandas no trabalho

Novas demandas Opinião sobre as novas

demandas

Você está se sentindo forçado a dominar novas práticas, novos saberes, novas competências, novas funções e responsabilidades?

33,59%

Você assume novas responsabilidades de forma natural? 91,71%

Você procura se adaptar a novas exigências profissionais 98,74%

Você observa transformações e repercussões das políticas educacionais sobre o seu trabalho?

83,76% Você se considera responsável pela classificação de sua unidade educacional

nas avaliações realizadas pelos governos federal, estadual?

16,15% Você tem se sentido constrangido a mudar sua forma de trabalho em razão dos

resultados dos exames de avaliação?

23,40% Fonte: Banco de dados do ES/NEPE/UFES (2010).

TABELA 71 – Participação em formação continuada segundo as novas demandas no trabalho

Participação em formação continuada

Novas demandas Congressos, colóquios e seminários Ofertada por instituição universitária Prevista no calendário escolar Atividades de formação conjunta Média das participações segundo demandas

Você está se sentindo forçado a dominar novas (os) práticas, saberes, competências, funções e responsabilidades?

39,16% 15,66% 53,03% 46,62% 38,62%

Você assume novas responsabilidades de forma natural?

78,33% 16,62% 45,98% 49,44% 47,59%

Você procura se adaptar a novas exigências profissionais

82,04% 17,69% 44,99% 48,71% 48,36%

Você observa transformações e repercussões das políticas educacionais sobre o seu trabalho?

20,20% 21,11% 46,48% 51,68% 34,87%

Você se considera responsável pela classificação de sua unidade educacional nas avaliações realizadas pelos governos federal, estadual?

67,72% 15,77% 49,62% 53,41% 46,63%

Você tem se sentido constrangido a mudar sua forma de trabalho em razão dos resultados dos exames de avaliação?

24,39% 17,58% 49,45% 45,05% 34,12%

Médias das participações por formação continuada

51,97% 17,41% 48,26% 49,15%

Fonte: Banco de dados do ES/NEPE/UFES (2010). Nota: Dados adaptados pela autora.