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A individualidade das partículas quânticas

4.3 IDENTIDADE, INDIVIDUALIDADE E DISTINGUIBILIDADE

4.3.3 A individualidade das partículas quânticas

Vamos lembrar da discussão anterior sobre a individualidade e as po- sições dela advindas. De um lado, existem aquelas visões que procuram por um tipo de economia metafísica advogando um princípio que serviria de via dupla para alicerçar tanto a individualidade como a distinguibilidade (a “teo- ria dos feixes”). Por outro lado, existem aquelas posições que são enraizadas na insistência que essas duas noções deveriam se manter distintas, no mínimo conceitualmente (a teoria da “identidade transcendental”). A primeira posi- ção sustenta que devemos tentar alicerçar ambas distinguibilidade e individu- alidade nas propriedades dos objetos, o que requer um tipo de ‘garantidor’ de individualidade tal como o Princípio da Identidade dos Indiscerníveis (PII). O debate, então, passa a ser sobre o status desse princípio. Como vimos, certas formas de PII podem ser facilmente mantidas na mecânica clássica, especi- almente se assumirmos o chamado Princípio da Impenetrabilidade. Com tal assunção, a localização espaço-temporal, por exemplo, passa a permitir então um papel unificador em nossa metafísica: ela permite distinguir até mesmo aquelas coisas que partilham todas as suas outras propriedades, e em termos das quais elas são indistinguíveis. A localização espaço-temporal, somada à impenetrabilidade, agiria então como o princípio de individualidade buscado. A tradição alternativa insiste que distinguibilidade e individualidade devem ser mantidas distintas. De acordo com tal posição, o que faz uma coisa um ‘indivíduo’ não pode ser uma propriedade multiplamente instânciavel (esta

propriedade estaria relacionada somente com a indistinguibilidade), mas ao invés disso deve ser algo transcendente a tais propriedades. De acordo com alguns filósofos, tal característica metafísica poderia ser explicada em termos da auto-identidade dos objetos (‘a = a’). Vamos examinar o impacto de tais noções na MQ.

Voltando nossa atenção para o PII em si, lembramos as várias formas que este princípio pode tomar. PII1 declara que não é possível para dois in- divíduos possuírem todas as propriedades e relações em comum, PII2 exclui propriedades e relações que podem ser descritas como espaço-temporais, en- quanto que a forma mais forte, PII3 inclui somente propriedades monádicas e não-relacionais. Ambos PII1 e PII2 permitem a possibilidade que relações possam ser capazes de distinguir entidades e então conferir-lhes individuali- dade. Entretanto, tal alternativa tem sido questionada sob a tese de que desde que relações pressupõem diversidade numérica, elas não podem dar conta da individualidade.

Vimos acima que um dos primeiros argumentos contra a visão de que as partículas quânticas são indivíduos em algum sentido advém das estatís- ticas quânticas e do fato de que uma permutação dos objetos quânticos não gera nenhuma alteração nas medidas sobre o estado final do nosso sistema (o que faz com que a identidade e individualidade das mesmas, assim, não importe). Outrossim, vimos também que como a matemática clássica é atre- lada à noção de individualidade, para conseguirmos expressar esta ‘perda de identidade’ dos objetos quânticos temos que assumir hipóteses ad-hoc adici- onais (os preceitos do PI), que no fim também acabam por aditar-se ao fato de que os objetos quânticos podem ser realmente entendidos como não tendo identidade. Nesta seção exploraremos outras facetas da MQ que nos permi- tem sustentar a tese de que o PII falha nesse contexto, de modo que podemos realmente afirmar por outras razões (e não apenas devido ao que já vimos acima) que os objetos quânticos realmente podem ser vistos como desprovi- dos de individualidade. Vamos focar neste texto principalmente o status do PII1 frente à MQ e, no final desta seção, comentaremos rapidamente sobre as outras formas de PII. Como dito, a forma mais fraca do princípio é satisfeita no contexto clássico porque a descrição de estado dinâmico gera uma bem definida e unicamente determinada trajetória espaço-temporal para cada par- tícula. Esta descrição invoca o Princípio da Impenetrabilidade (IA) e, assim, a distinção via localização espaço-temporal é assegurada. No contexto quân- tico, podemos de pronto afirmar que PII1 é falso a partir do argumento de que, sob a interpretação padrão, trajetórias espaço temporais únicas em geral não existem e, em particular, o PII não está até mesmo implicado pela equação de Schrödinger (cf. (FRENCH e KRAUSE, 2006, seção 3.6)). Se puder ser mos- trado que nenhuma outra propriedade distinguível (e então individualizante)

é possível de ser assumida pelas partículas quânticas, então pode-se concluir que o PII1 não é satisfeito. Desde que esta é a forma mais fraca do princípio, ele em geral deve não valer na MQ.

Mas analisemos tal possibilidade com mais detalhes, focalizando, pri- meiramente, os estados 7’) e 8’) acima, onde temos uma partícula em cada estado. Poderíamos afirmar que para estes casos o PII é satisfeito, haja vista que temos apenas uma partícula em cada estado separadamente. Para o caso dos férmions, inclusive, poderíamos ainda afirmar que existe realmente uma propriedade individualizante: a partir do chamado Princípio da Exclusão, po- demos assumir o PII como valendo neste contexto porque tais partículas res- peitariam uma forma ‘quântica’ de IA. Expresso desta maneira, o Princípio da Exclusão poderia ser reconhecido como uma generalização do IA clássico, e dado que dois férmions não podem estar no mesmo estado, então temos um ‘tipo’ de IA e o PII1 é satisfeito.

Mas esta tentativa de salvar o PII para os elementos da MQ a partir desse ‘IA quântico’ nas situações 7’) e 8’) não é efetiva. Recordamos que se tivermos duas partículas, rotuladas como 1 e 2 e distribuídas em dois estados

a1 e a2 , então o que temos são as seguintes possibilidades: 7’) √1 2( a11 ⊗ a22 + a12 ⊗ a21 ); 8’) √1 2( a11 ⊗ a22 − a12 ⊗ a21 ).

Se considerarmos o estado anti-simétrico dado por 8’), que formal- mente incorpora o Princípio da Exclusão via anti-simetrização do apropriado vetor, não é verdade que cada partícula esteja em um estado diferente. Na rea- lidade, cada partícula compartilha de ambos os estados |a1i e |a2i na super- posição do produto de estados expresso em 8’). Tais estados são chamados de estados “entangled”; os quais não podem ser designados para partículas separadas, fazendo com que as partículas pertençam a ambos os estados a1 e a2 ao mesmo tempo e que também compartilhem, ao mesmo tempo, das mesmas propriedades estado-dependentes.26 Além disso, na MQ, os estados puros perfazem os chamados “estados maximamente especificados”, isto é, aqueles para os quais temos todas as informações possíveis. Todavia, para os estados entangled, não existem estados puros que possam ser designando para partículas separadas, o que significa basicamente que o sistema não pode ser separável (veja nota anterior). Por fim, é possível ainda provar que 26Formalmente o que acontece é que a função acima não é fatorável, o que nos permitiria assim obter cada uma das parcelas isoladamente e conseguirmos determinar qual partícula está em qual estado. O que temos é o sistema conjunto, descrito pela função ψ, e ela simplesmente nos diz que temos uma partícula no estado A e outra no estado B, mas jamais poderemos saber qual é qual (cf. (DA COSTA, et. al., 2012)). Esta situação é tipicamente ‘quântica’ e não tem análogo na descrição ‘clássica’ da realidade. Schrödinger, inclusive, disse que se trata da peculiaridade da MQ (SCHRÖDINGER, 1935).

estados entangled não são possíveis de serem distinguidos de estados puros por meio de observações, e que dois férmions em um estado entangled, por exemplo, atualmente têm as mesmas propriedades monádicas e relacionais um em relação ao outro(FRENCH e KRAUSE, 2006, p. 156). Isto tudo significa que se pensarmos nesses estados como representando as proprieda- des relevantes das partículas, o PII (em todas as formas) acaba sendo violado até mesmo para férmions que ‘respeitam’ o Princípio da Exclusão. O mesmo acontece para os bósons em 7’), para os quais até mesmo nem vale o princí- pio de exclusão. Além disso, para ambos os estados 7’) e 8’), se separarmos as partículas depois de estarem entangled (no sentido de partículas que es- tavam separadas, entraram em estado entangled, e depois foram separadas novamente), é impossível identificarmos qual partícula é qual . É neste sen- tido que Penrose (PENROSE, 1989, p. 294) afirma que “partículas diferentes de um mesmo tipo [querendo aqui dizer que se tratam de partículas indistin- guíveis, mas não a mesma] não podem ter identidades se separadas uma das outras”. Com a impossibilidade de separarmos tais partículas nos casos em apreço, somado ao fato de não termos nenhum tipo de particularização para elas, temos um quadro claro onde se apresenta a perda de individualidade para esses objetos.

Vamos considerar agora os casos 5’) e 6’) que valem apenas para bó- sons. Aqui, temos uma violação definitiva do PII, “desde que a correspon- dente simetria da função de onda significa que dois, ou mais, bósons podem possuir todas as mesmas propriedades estado-dependentes e assim serem in- distinguíveis [plenamente]” (FRENCH e KRAUSE, 2006, p. 150). Em re- sumo, como mostra a estatística, isso quer dizer que mais de um bóson pode ocupar o mesmo estado, levando ao uma falha do (equivalente em MQ) prin- cípio da impenetrabilidade. Além disso, as trajetórias espaço-temporais dos bósons não podem servir para individualizá-los. Tome, por exemplo, dois fó- tons: nos pontos em que suas trajetórias se cruzam e os fótons compartilham todas suas propriedades espaço temporais em comum, se torna logicamente impossível determinar qual fóton em cada ponto tem cada história. O mesmo acontece quando experimentalmente temos uma colisão entre duas partículas deste tipo: seria necessário seguir o caminho do movimento de cada uma, “mas não temos nenhuma chance de conseguir isso” (SCHILLER, 2012, p. 1053-4) porque o erro da leitura da posição da partícula é maior do que o tamanho da partícula em si. Experiências mostram ainda que em peque- nas distâncias é impossível dizer se as partículas mudaram sua direção ou não, e essa impossibilidade é uma consequência direta do quantum de ação (ibid.). Além disso, como já pontuado, de acordo com a interpretação pa- drão da mecânica quântica, trajetórias espaço-temporais únicas em geral não existem. Em outras palavras, se a interpretação padrão é adotada, então pode

ser mostrado que a família de observáveis correspondendo à posição de par- tículas individuais não pode fornecer distintas trajetórias espaço-temporais (cf. (FRENCH e KRAUSE, 2006, p. 173)). Ademais, “se lembrarmos que a teoria quântica descreve as partículas como nuvens, a indistinguibilidade parece ser mais natural. Quando duas nuvens se encontram e posteriormente se separam, é impossível dizer qual é qual” (SCHILLER, 2012, p. 1054). Com efeito, nenhuma experiência pode rastrear partículas com propriedade intrínsicas idênticas de tal modo que elas podem ser distinguidas com cer- teza(ibid.). Essa impossibilidade foi verificada experimentalmente com to- das as partículas elementares, com núcleos, com os átomos e com numerosas moléculas (SCHILLER, 2012, p. 1058).. Aqui vemos que a alternativa clás- sica de tanto individualizar como distinguir as partículas em termos de sua localização espaço-temporal, em conjunção com o Princípio da Impenetra- bilidade (que agiria como um garantidor), padece de várias dificuldades, de modo que muitas características intuitivas que temos para dotar um objeto de individualidade (como poder seguí-lo o tempo todo — isto é, possuir conti- nuidade espaço-temporal tendo assim uma trajetória determinada —, poder rotulá-lo, reidentificá-lo em outras situações etc.27) acabam sendo frustra- das (cf. (UFFINK e HILGVOORD, 1988)). Somado a isso, o impacto das relações de incerteza, juntamente com argumentos da impossibilidade de va- riáveis ocultas (que mostraremos abaixo), por fim também levam à posição de que a individualidade espaço-temporal não pode realmente ser mantida no contexto quântico (WICK, 1996, cap. 5) e, assim, a abordagem do problema da individualidade segundo uma teoria de feixes de propriedades parece ser completamente descartada.28

Mas uma questão que se coloca é se são indistinguíveis e se não se pode seguí-los, como a ciência sabe (experimentalmente) que temos dois fó- tons em um certo estado, por exemplo? Como os físicos podem contar par- tículas indistinguíveis? A resposta é que se sabe o número de fótons através do ‘peso’ do sistema: saber que, por exemplo, existem dois fótons em uma caixa, pode ser determinado por notar que o total de energia da frequência v na caixa é 2hv e empregar a equação de Plank:

O segundo passo é a especificação de um observável útil para determinar o número de partículas. A forma

27Ou seja, a genidentidade de Reichenbach.

28Na MQ existem várias outras situações em que não é possível distinguir entre dois caminhos possíveis de uma partícula e há autores que sustentam, inclusive, que na escala microscópica os próprios conceitos de espaço e de tempo necessitam qualificação. Por exemplo, Max Jammer (JAMMER, 2010, p. 290), afirma claramente que “o resultado obtido por Salecker e Wigner com respeito às limitações que cercam as medidas de intervalos espaço-temporais na mecânica quântica, (...) priva as noções tradicionais de espaço e tempo de qualquer significado operacional na microfísica”.

mais fácil é escolher um dos números quânticos que se somam sob uma composição, tal como a carga elé- trica. A contagem é então calculada pela medição do total da carga dividida pela unidade de carga. Este mé- todo tem diversas vantagens. Primeiro de tudo, não é importante se partículas são distinguíveis ou não; contar [deste modo] sempre funciona. (SCHILLER, 2012, p. 1055, grifo meu).

Usando tal alternativa conseguimos saber quantas partículas indistin- guíveis existem no átomo mesmo sem poder distinguí-las ou seguí-las de al- guma forma. Podemos deste modo ver que este tipo de contagem não é via métodos ordinários, os quais pressupõem a distinção entre os objetos: neste ‘método quântico’ de contagem, podemos contar sem determinar o que está sendo tratado como indivíduo ou o que está sendo contado como o ‘primeiro’, o segundo etc.29

Entretanto, poderíamos argumentar (como fez Barnette (BARNETTE, 1978)) que tais fatos acima enunciados confundem a questão epistemológica com a metafísica: do fato que após as trajetórias terem se cruzado não existir nenhum modo de falar, por exemplo, qual fóton veio de onde, não nos com- pele a desistir do apelo metafísico de que o predicado “possuir uma história H” seja satisfeito por um e somente um fóton durante todo o tempo após as trajetórias se cruzarem. Dado que este predicado vale para apenas um e so- mente um objeto o tempo todo, isto faz com que PII não seja violado. O que Barnette clama, assim, é semelhante com a distinção entre distinguibilidade e individualidade: somente porque não existe um predicado que satisfaça o primeiro, não significa que o último esteja comprometido (cf. (FRENCH e KRAUSE, 2006, p. 157-8)).

No entanto, este tipo de reposta é problemática. Para Teller (TEL- LER, 1983, p. 314), não é o caso que na prática não se possa distinguir os dois fótons mas, ao invés disso, que não existe nada em princípio que possa servir para individualizá-los. Em tais situações, diz esse autor, questões epis- temológicas não podem ser separadas das metafísicas: a metafísica pode estar dependente de que características estão disponíveis e que podem, a princípio, servir para individualizar as partículas. Dado a ausência total de tais carac- terísticas para os dois fótons no mesmo estado, é desvirtuar a questão dizer que os mesmos são individualizados por diferenças em alguma propriedade histórica. Além disso, não é claro como podemos entender a noção de ‘ter uma história’ neste contexto: se ‘ter uma história’ envolve não somente via- 29Nossa teoria de conjuntos alternativa que veremos no próximo capítulo também deverá refle- tir tal fato: deveremos ter um cardinal, mas não um ordinal; falar sobre o número de partículas em cada átomo, mas não disso extrair o ‘individuo-partícula’ em cada átomo a partir de sua posição na ordem numérica.

jar ao longo de alguma trajetória espaço-temporal, mas também satisfazer o Princípio da Impetrabilidade, então sobre a mais óbvia interpretação da MQ, como vimos, fótons não têm histórias.

Caso ainda quiséssemos manter a possibilidade de tratarmos as partí- culas quânticas como indivíduos admitindo entre elas uma possível distinção através de alguma forma de haecceties, e entendendo essa substância como um tipo de “variável oculta”, podemos ficar em apuros. Segundo alguns auto- res, assumir algum tipo de propriedade ou relação que apesar de desconhecida poderia conferir uma diferença entre os objetos leva aos chamados “no-go theorems”; os quais declaram que uma particular situação não é fisicamente possível. Especificamente, tal termo descreve resultados em mecânica quân- tica — como os teoremas de Bell e de Kochen-Specker — que reprimem os tipos possíveis de variáveis ocultas que podem ocorrer nas teorias quânticas. Falando por alto, o teorema de Bell afirma que as hipóteses do realismo local de que uma partícula possui valores definitivos que não dependem do pro- cesso de observação, bem como a de que a velocidade de propagação dos efeitos físicos é finita, são incompatíveis com a interpretação padrão (orto- doxa) da MQ. O teorema de Kochen-Specker, por sua vez, exclui as teorias de variáveis ocultas que requerem que os elementos da realidade física sejam não contextuais (i.e. independentes do aparelho de medição). Sendo assim, se aceitarmos algum tipo de variável oculta, devido à exatidão das previsões quânticas somos levados a ter que descartar ou a Teoria da Relatividade Res- trita (RR); algo um tanto caro aos físicos, ou então a visão de que as coisas são separáveis. Os físicos, obviamente, optam por esta última alternativa por ela poder coexistir juntamente com a RR, de modo que tudo leva a crer que realmente não há, na MQ, nenhuma outra propriedade (em particular, algum tipo de variável oculta) para além das descritas pela teoria.30

Em resumo, temos o seguinte quadro. Existem basicamente dois ti- pos de partículas quânticas: férmions e bósons. Em grandes quantidades, 30O artigo principal de Bell (BELL, 1964) foi publicado em 1964, e uma discussão muito abrangente se encontra em (BELL, 1987) e em (WICK, 1996, cap. 8). Para uma prova simples do teorema de Kochen-Specker, veja (BITBOL, 1996, anexo 3). Para uma análise geral de tais teoremas e dos problemas deles advindos, veja (PESSOA Jr., 2003; PESSOA Jr., 2006). Não obstante, este tema, qual seja, de que usando-se a lógica clássica como fundamento da MQ sería- mos levados a considerar possíveis variáveis ocultas de algum tipo (lógico), é novo e necessita ser estudado. De toda forma, vale ressaltar que na mecânica quântica padrão as chamadas partículas elementares são objetos simples, no sentido de que possuem relativamente poucas propriedades essenciais descritas de modo preciso pela teoria. Elétrons, por exemplo, são caracterizados por possuírem uma certa massa, uma certa carga elétrica, um certo valor de spin (em valor abso- luto, igual a 1/2) etc. e, de certo modo, podemos listar todas as suas propriedades essenciais (intrínsecas) contrariamente à maioria dos objetos macroscópicos que nos cercam. Aqui se vê mais uma vez a problemática relativa a assumir propriedades individualizantes na MQ: de certa forma, pode-se dizer como pressuposto básico enormemente comprovado pelo sucesso da teoria que ‘não há mais’ o que assumir!

estas partículas se comportam de forma diferente, isto é, obedecem diferen- tes estatísticas: como vimos, as primeiras obedecem as estatísticas de Fermi- Dirac, e as segundas as de Bose-Einstein. Um sistema não pode ser ao mesmo tempo um férmion e um bóson. Além disso, tais partículas se comportam de uma forma diferente das partículas clássicas, que obedecem a estatística de Maxwell-Boltzmann, e a qual é distinta dos dois tipos de estatísticas quânti- cas: como vimos, em uma permutação, um férmion e um bóson não geram uma nova contagem. Estas diferenças influenciam o modo como as partículas quânticas podem ser consideradas indivíduos: nas novas estatísticas, sugere- se, a individualidade das partículas constituintes deve ser abandonada. Além disso, se quisermos ainda assim tentar sustentar a individualidade com ou- tras propriedades (como espaço-temporais), também incorremos em proble- mas. Por fim, foi mostrado que nenhuma propriedade intrínseca ou estado- dependente pode ser identificada com propriedades monádicas ou relacionais e que, além disso, dois bósons ou dos férmions — em um estado simétrico ou anti-simétrico — têm as mesmas propriedades monádicas e as mesmas pro- priedades relacionais um com o outro. Dadas tais características, até mesmo a