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7. O contexto de pesquisa: os hospitais e os profissionais de saúde

7.4 A Inserção dos hospitais em estudo no SUS

Com a criação do SUS, no âmbito das organizações de saúde da UFRN, fez-se necessário aperfeiçoar os recursos e adequar os serviços para que os princípios do sistema fossem atendidos, ao mesmo tempo em que o ensino, a pesquisa e a extensão fossem preservados. Diante deste quadro, a UFRN promoveu em 1999, na gestão do Prof. Ivonildo Rêgo como Reitor, o seminário denominado Projeto de Reorganização dos Serviços de Saúde da UFRN, que discutiu essas questões. Como resultado do seminário surgiu a proposta de criação do Complexo Hospitalar e de Atenção à Saúde da UFRN (CHS-UFRN) que recebeu

25 Como o Ambulatório de Alto Risco, o Mãe Cidadã, o Ambulatório da Linha de Cuidados, O Empoderamento

esta denominação em razão do pleito dos hospitais que reivindicaram que a nomenclatura os contemplasse de forma especial, uma vez que representavam a maior porção do complexo. Outra justificativa foi o fato de que algumas das unidades (CDI, LAC e UFSC) eram, de fato, inseridas na estrutura dos hospitais e por questões organizacionais tinham seus custos de manutenção e outros processos administrativos e organizacionais ligados a eles.

O CHS foi instituído através da Resolução Nº 004/2000-CONSUNI, de 28 de abril de 2000, integrando as atividades de variadas e pré-existentes instituições de saúde da UFRN. Entre essas estão: o Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL); Hospital de Pediatria (HOSPED); Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC); Hospital Universitário Ana Bezerra (HUAB); Unidade de Saúde Familiar e Comunitária (USFC); Unidade de Imagem, que posteriormente passou a ser denominada Centro de Diagnóstico por Imagem (CDI), o Laboratório de Análises Clínicas (LAC), o Departamento de Assistência ao Servidor (DAS), pertencente a Pró-Reitoria de Recursos Humanos e o Serviço de Fisioterapia do HUOL.

De acordo com seu documento de criação, constituíram-se como objetivos do Complexo:

 Economizar recursos financeiros em função tanto da falta de investimento na área social, quanto da nova lógica no trato das questões relacionadas às despesas e receitas /recursos e custos.

 A qualificação dos Recursos Humanos.

 A otimização dos equipamentos e recursos existentes.  Maior integralidade na atenção à saúde.

 Coordenação das atividades, evitando-se fragmentação e isolamento do SUS. Culturalmente, a articulação entre o ensino e a assistência foi enfraquecida, pois a hegemonia da gestão docente precisou ao longo do tempo ser substituída e subordinada à gestão hospitalar. Na prática, a assistência deixou de ser território comandado pelos professores, que de mandatários dos serviços passaram a serem clientes e colaboradores. Estabeleceu-se assim uma nova dinâmica funcional e organizacional nos hospitais do complexo, o que implicou mudanças na organização e prestação dos serviços, repercutindo nas condições de trabalho dos seus funcionários. Em outras palavras, ao passarem a fazer parte do SUS os hospitais precisaram adotar novos critérios de gestão focalizados em metas de produtividade e arrecadação pouco compatíveis com os parâmetros do exercício da docência em saúde, que até então funcionava com professores gerenciando enfermarias e leitos, com

rotinas que se estabeleciam para atender aos requisitos das disciplinas que ministravam e não por critérios como teto financeiro pago por procedimento, dias pré-estabelecidos por procedimento realizado, necessidade de rotatividade de leitos, determinação das internações por critérios pactuados para atender as demandas do sistema e não apenas da docência.

A criação do CHS representou também uma tentativa de integrar unidades com culturas organizacionais diversificadas, em virtude de seus históricos e do tipo de assistência que tradicionalmente prestavam. Porém, a integração nunca se efetivou da forma esperada dada a complexidade do HUOL em relação aos outros hospitais e às especificidades de cada uma das unidades hospitalares, sendo o CHS extinto como unidade administrativa em janeiro de 2012 e substituído pela Assessoria para a Gestão dos Hospitais Universitários, órgão assessor da Reitoria.

A vinculação dos hospitais universitários ao SUS demandou novas questões. A primeira diz respeito à necessidade de atendimento aos princípios estabelecidos pela Constituição Federal de 1988 que no capítulo VIII da Ordem social, na secção II referente à Saúde, no artigo 196, define:

A saúde é direito de todos e dever do estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Em seu artigo 198, a Constituição também determina que:

As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada, e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I. Descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II. Atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III. Participação da comunidade

Parágrafo único – o sistema único de saúde será financiado, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.

Atendendo a essas diretrizes e considerando que a rede de saúde citada faz parte do SUS, os hospitais universitários em estudo ficaram a ele subordinados, cabendo-lhes o papel de unidades de assistência terciária que significa prestar serviços de média e alta complexidade, sendo hospitais de referência na rede. Assim, ações de caráter preventivo deveriam deixar de ser executadas, pois são atribuições da rede básica constituída por

unidades municipais de saúde. Com isto a Unidade de Saúde Familiar e Comunitária que era anexa ao HUOL foi transferida para a gestão do município de Natal, embora ainda permanecendo fisicamente na UFRN, com quem mantém parceria.

Outra questão importante com relação à inserção dos hospitais no SUS diz respeito à vinculação dos hospitais da UFRN a dois ministérios diferentes e com demandas específicas, pois com a incorporação ao SUS os hospitais permaneceram pertencendo ao Ministério da Educação, de onde se originam todas as ações relativas à gestão de seus recursos humanos, mas presta contas ao Ministério da Saúde, de onde provêm seus recursos financeiros (através do pagamento de procedimentos). Esta dupla vinculação repercute, evidentemente, tanto na estrutura quanto no ambiente organizacional de cada um deles, como foi explicitado anteriormente na análise organizacional dos hospitais. Outro ponto importante a considerar é que a inserção dos hospitais no SUS e ao mesmo tempo numa dada região socioeconômica pode criar situações de difícil enfrentamento. É o caso do HUAB, que necessita aumentar o nível de complexidade para fazer frente às exigências ministeriais e obter mais financiamento, mas, no entanto, a demanda da população atendida, pelo nível de pobreza e despreparo da rede de saúde na região, necessita de cuidados de baixa complexidade, ocorrendo várias internações recorrentes de crianças com diarreias e pneumonias – que o Ministério da Saúde preconiza tratar em casa, com o suporte da Estratégia de Saúde da Família – e de parturientes vindas de cidades vizinhas para um parto normal porque faltou o médico na hora do parto.

Os hospitais da UFRN também prestam assistência à saúde dos servidores, pois algumas ações da Diretoria de Atenção à Saúde do Servidor (DASS)26 vinculada à PROGESP necessitam deste suporte. Esta diretoria presta assistência exclusivamente aos funcionários da UFRN. Não pertence ao SUS e seu atendimento não é aberto à população, mas utiliza-se do SUS priorizando a assistência ao servidor, pois é obrigação institucional da UFRN cuidar dos seus trabalhadores. Desta maneira, quando isto ocorre, os hospitais fogem aos princípios de universalidade e equidade do Sistema Único de Saúde. Vale ressaltar que a DASS mudou ao longo dos anos, o seu papel de unidade básica de saúde para um serviço de assistência mais complexo, voltado para a saúde ocupacional, atualmente devendo assistir à saúde psíquica do servidor, como será discutido a seguir.