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4. Condições de trabalho em saúde

4.1. Estudos antecedentes sobre as condições de trabalho

A Revolução Industrial além de demarcar o início do modo de produção capitalista despertou a atenção dos pesquisadores para as condições em que o trabalho era realizado. Os primeiros debates, em consequência disto, giravam em torno de como deveria ser organizada a produção em termos de tempo e custo e quanto deveria ser produzido por cada trabalhador, sem que fosse dada importância às questões sobre as relações de trabalho.

Adam Smith (1776/1983). O autor, de origem escocesa, viveu na Inglaterra e interessou-se pela maneira como as nações enriquecem e evoluem. Para Smith o enriquecimento é o resultado da natureza humana, já que considera que o ser humano é naturalmente direcionado ao desejo de progresso e busca de melhoramentos. A evolução resulta na busca de meios mais eficazes para realizar o trabalho, entre eles a divisão do trabalho. Para ele, então, esta divisão (que implicava em uma condição de trabalho na medida em que o trabalho de produzir uma peça era dividido entre vários trabalhadores) era uma condição natural e superior às formas anteriores tendo em vista o incremento produtivo.

Em uma visão oposta está Marx que acredita que a evolução resulta da luta de classes. Ao contrário de Adam Smith, Marx (1863/1987) faz uma crítica contundente ao modo de produção capitalista afirmando que

A produtividade do capital, antes de mais nada consiste, mesmo considerando apenas a subsunção formal do trabalho ao capital, na coerção para se obter trabalho excedente, trabalho acima da necessidade imediata, coerção que o modo capitalista de produção partilha com modos de produção anteriores, mas que exerce e efetiva de maneira mais favorável à produção. (Marx, 1863/1987, p.384).

É certo que ao fazer esta crítica a intenção de Marx não era ainda discutir as condições de trabalho, mas acaba por fazê-lo quando expõe que no modo de produção capitalista as condições objetivas de trabalho (material, meios de trabalho e de subsistência) não são

subsumidas4 ao trabalhador, mas ao contrário, é o trabalhador que é subsumido a elas. (Marx, 1863/1987, p. 384). Já se nota em Marx uma abordagem das relações de trabalho. Na mesma linha de pensamento de Marx, Engels (1845/1986) foi um dos primeiros teóricos a discutir efetivamente condições de trabalho ao abordar a vida de operários ingleses. Em 1842, Engels chegou a Manchester, na Inglaterra (o centro do capitalismo da época) para cuidar dos negócios da sua família. Influenciado pela filosofia crítica alemã, logo percebeu que o progresso tecnológico da época gerava uma massa de trabalhadores maltrapilhos, entre eles, crianças, extenuados por quatorze horas de trabalho diário, espoliados pela desnutrição e pelo frio. Do choque de realidade resultou a obra “A situação das classes trabalhadoras na Inglaterra” (1845/2008), que discute a situação do proletariado na Inglaterra, descrevendo e analisando criticamente suas condições de vida e trabalho.

No final do Sec. XIX, outro teórico que manifestou interesse pelas condições de trabalho foi Frederic Taylor5 que iniciou sua vida como operário nos Estados Unidos, na

Midvale Steel Co., onde fez carreira chegando a engenheiro em 1885. Seu interesse girava em torno de como tornar a produção mais ágil (Taylor, 1911/2008). O autor também considerou um aspecto que, para ele naquele momento, era motivacional: os trabalhadores produziam mais se visualizassem um ganho salarial maior em consequência disto. Sua teoria foi importante na consolidação da Administração como ciência. A teoria pautava-se no uso do método científico, supunha a harmonia de interesses entre capital e trabalho, cooperação dos empregados, busca do rendimento máximo e desenvolvimento do empregado para obter maior produtividade. A aplicação da teoria resultava na organização do trabalho em termos de controle do tempo e parâmetros de produtividade, na organização do trabalho através da rotinização e nas relações baseadas na hierarquia, supervisão e trabalho coletivo (embora cada trabalhador realizasse um fragmento da atividade total, seguindo os preceitos da divisão do trabalho). (Taylor, 1911/2008, Chiavenato, 1996).

Como Taylor, Fayol e Ford também acreditavam que o aumento da produtividade resultava da diminuição da fadiga física. Deste modo, preocuparam-se com a realização da tarefa no menor tempo possível e com menor esforço do trabalhador, sem contudo haver preocupação com o bem-estar. Daí a ênfase em planejamento da tarefa, parcelamento,

4 Manteve-se a tradução para o português, adotada na tradução da obra, do verbo alemão subsumierem utilizado

para expressar subordinação do trabalho ao capital. Alguns autores discutem Marx adotando a tradução como submissão.

5 Seu interesse era voltado para o modo como as condições de trabalho resultavam em acúmulo de capital, não

treinamento operacional e adequação de instrumentos e métodos de trabalho (Braverman, 1980; Chiavenato, 1996).

O reflexo da Administração Científica para a Psicologia foi uma abordagem do trabalho voltada para a indústria onde as preocupações giravam em torno da adequação do homem ao trabalho. Para isto era preciso compreender a divisão de tarefas, tempos e movimentos, selecionar, treinar e avaliar adequadamente os empregados (Schein, 1982; Zanelli e Bastos, 2004; Borges, Oliveira e Morais, 2005; Borges-Andrade e Pagotto, 2010). As condições em que o trabalho era realizado eram importantes na medida em que proporcionavam esta adequação. Desta forma o trabalho deveria ser realizado de forma a proporcionar o menor gasto de tempo possível com menor esforço físico de modo a se obter maior produtividade de cada trabalhador individualmente.

Se o enfoque principal de Taylor foi relativo ao modo de execução da tarefa e no perfil do trabalhador, os estudos de Elton Mayo, realizados entre 1924 e 1932 na fábrica da Western Eletric, em Hawthorne, no Estados Unidos, resultou numa abordagem das relações humanas no trabalho. (Chiavenato, 1996, Motta, 1996). Esse autor inicialmente abordou os efeitos da iluminação do ambiente de trabalho sobre o rendimento dos trabalhadores, mas ao final evidenciou o papel e a importância das relações interpessoais e sociais no trabalho e seus efeitos na produtividade. Portanto, centrou-se nas condições de trabalho periféricas a tarefa. Tanto Mayo como outros teóricos (entre eles Kurt Lewin, John Dewey, Morris Viteles e George C. Homans) fizeram oposição à Administração Científica concluindo que o trabalho é uma atividade grupal e que os trabalhadores reagem melhor aos estímulos do grupo que aos incentivos salariais. (Chiavenato, 1996, Motta, 1996, Zanelli & Bastos, 2004).

Os estudos, até aqui mencionados, contribuíram para o surgimento na Administração,

da Escola das Relações Humanas. Na Psicologia, contribuíram para o salto da abordagem industrial, apoiada em princípios tayloristas, para uma perspectiva organizacional mais ampla. Esses estudos abordaram aspectos transversais das condições em que o trabalho era realizado, mas não delimitavam um construto teórico e, por conseguinte, não estabeleciam limites de abrangência dos fenômenos relativos às condições de trabalho. No entanto já adotavam um enfoque sistêmico das relações entre o indivíduo e seu trabalho.