• Nenhum resultado encontrado

A inserção dos jovens no telejornalismo brasileiro

No documento barbaragarridodepaivaschlaucher (páginas 90-93)

4.2 A(S) JUVENTUDE(S) NA TV

4.2.1 A inserção dos jovens no telejornalismo brasileiro

É comum nos depararmos com representações estereotipadas da juventude, postura que poderia atuar no sentido de reforçar o imaginário coletivo desse grupo de sujeitos enquanto uma classe homogênea. Muitas vezes reduzida a uma visão unitária e limitada, a diversidade de tipos, modos e aspirações presente nessa fase da vida é ignorada. Desse modo, questões e variações sociais, econômicas, políticas e culturais, facilmente encontradas nessa categoria cheia de contradições e conflitos identitários, não seriam devidamente exploradas ou estariam camufladas em meio a abordagens simplórias (SCHLAUCHER, 2010).

Em pesquisa de conclusão de curso realizada em 2010 no âmbito das atividades do Grupo de Pesquisa Jornalismo, Imagem e Representação, sob orientação de Iluska Coutinho, a presente autora constatou que, de modo geral, os noticiários de TV produzem matérias jornalísticas que não dão conta da complexidade inerente à juventude. A partir da elaboração de diferentes facetas aplicadas de modo indiscriminado a toda a coletividade juvenil, representações estereotipadas seriam construídas e veiculadas nacionalmente todos os dias.

No estudo em questão, foram analisadas dez edições consecutivas do Jornal Nacional, telejornal de maior destaque no país43. Com isso, buscamos estabelecer um

panorama do modo como o principal noticiário da TV Globo constrói a(s) imagem(ns) dos jovens brasileiros. Cada um dos programas veiculados entre os dias 02 e 12 de agosto de 2010 foi submetido, inicialmente, ao método de Análise de Conteúdo Telejornalístico. Em seguida,

43 De acordo com os dados divulgados pela Secom, o Jornal Nacional é o telejornal mais assistido pela

população (56,4%). A confiança na Rede Globo, emissora que produz e transmite o JN há mais de 40 anos, foi apontada por 27,8% dos entrevistados como o principal motivo para se assistir ao programa. Para outros 23,3%, a preferência foi motivada pela identificação com as notícias veiculadas.

enfatizamos a análise textual44 do material que contou com a inserção de integrantes da

parcela da população alvo de nosso interesse – seja por meio de texto, imagens e/ou entrevistas. Nosso interesse se voltou especialmente para as sonoras45, um dos elementos característicos do telejornalismo.

No período analisado, foram exibidas 111 reportagens, 52 notas cobertas, 40 notas simples, sete VTs promocionais, quatro flashes, quatro entrevistas com candidatos à presidência da República e 10 notas de previsão do tempo. Os jovens foram representados pelo JN – seja através do texto de repórteres e apresentadores, de imagens e/ou de entrevistas – em 19 reportagens, três notas cobertas, três VTs promocionais e um flash. Considerando-se o número de matérias/informações veiculadas, essa parcela da população esteve presente em apenas 11,40% de todo o conteúdo veiculado nas dez edições analisadas. Em relação ao tempo, o recorte somou aproximadamente 304 minutos. Deste total, os jovens ocuparam cerca de 35 minutos, o equivalente a 11,18%.

No que diz respeito aos aspectos qualitativos da representação dos jovens no JN, é importante destacar que, embora presentes na narrativa audiovisual – e aptos a conquistar, em alguns casos, poder de fala – os jovens atuaram de forma coadjuvante em uma quantidade restrita de conteúdos transmitidos pelo JN. A concentração de abordagens da juventude nas temáticas relacionadas à Educação (100%), Segurança (21,05%), Eleições 2010 (15,38%) e materiais Promocionais (41,6%), apesar de esperada, não correspondeu totalmente às nossas expectativas. A presença de jovens não foi expressiva nas editorias de Cultura (12,5%), Esporte (3,4%), Política (0%) e Ciência e Tecnologia (0%) ao longo das 10 edições analisadas.

De modo geral, observamos que as sonoras de integrantes dessa parcela da população têm a função de confirmar o discurso dos repórteres, que encontram respaldo na fala dos especialistas. A juventude, enquanto personagem das tramas noticiosas, tem apenas a função de ilustrar os acontecimentos, compor os cenários e dimensionar os fatos noticiados a partir de aspectos passionais. Porém, ainda que os jovens não tenham sido os responsáveis pela legitimação do conteúdo transmitido pelo JN durante o período de análise, sua participação na narrativa audiovisual foi importante para o telejornal. Suas falas têm como teor, principalmente, experiências particulares de vida que, ao serem tornadas comuns, são capazes de sensibilizar o telespectador e/ou desencadear processos de reconhecimento.

44 Vale salientar que o texto telejornalístico é composto por elementos como texto, som e imagem e ainda por

formatos, ritmo e edição, aspectos observados na análise.

Ainda assim, tal forma de representação aponta para um jovem que não é protagonista das histórias que vivencia. Embora tenham obtido certo destaque em alguns momentos, esses sujeitos não cumprem um papel principal nas narrativas do JN. Quase sempre vistos “de fora”, a partir do olhar de um “superior”, seja ele um adulto na função de especialista, guardião ou político, os jovens raramente expressam suas próprias vontades e expectativas em relação aos temas em que estão inseridos predominantemente.

Desse modo, os conteúdos que abordaram assuntos relacionados à juventude, até mesmo as reportagens que contaram com a inserção de depoimentos de jovens, não deram conta de expressar toda a complexidade característica dessa categoria. Os contextos nos quais os jovens estão inseridos somados ao modo como são retratados pelo Jornal Nacional contribuem para a manutenção de uma visão estereotipada e, até mesmo, pré-conceituosa dessa categoria social. Para se ter uma ideia, os papéis personificados pelos jovens representados nas tramas noticiosas do JN giraram em torno do “estudante”, do “delinquente”, da “vítima” e da “promessa de futuro”.

A partir dessas constatações, pudemos confirmar a possibilidade de apreensão da juventude como um problema social (PAIS, 1993). As tensões relativas a ela foram as principais geradoras de pautas jornalísticas no Jornal Nacional, como, por exemplo, os problemas no campo educacional abordados nas editorias Eleições 2010 e Educação; a violência retratada na editoria de Segurança; o consumo de drogas também citado na cobertura eleitoral; e a falta de oportunidades para alguns jovens, vista como uma motivação para a realização de ações sociais divulgadas na editoria Promocional, quase sempre relacionadas ao projeto “Criança Esperança”, da Rede Globo.

Essa observação reforça a abordagem proposta por Helena Wendel Abramo (1997, p. 25):

Quando os jovens são assunto dos cadernos destinados aos “adultos”, no noticiário, em matérias analíticas e editoriais, os temas mais comuns são aqueles relacionados aos “problemas sociais”, como violência, crime, exploração sexual, drogadição, ou as medidas para dirimir ou combater tais problemas.

Vale ressaltar também que os conteúdos relacionados à juventude apresentaram o mesmo tratamento que as demais matérias veiculadas pelo Jornal Nacional. Não há uso de linguagem diferenciada e nem de recursos sonoros e efeitos visuais voltados para essa parcela da população. Não foi possível perceber nenhum esforço por parte da produção do telejornal

no sentido de atrair a atenção particular da audiência jovem durante o exame crítico das edições gravadas, ainda que este não constitua o público alvo do programa.

Além disso, ao longo do período analisado, não houve espaço satisfatório para abordagens de destaque que revelassem jovens lideranças, práticas cidadãs e iniciativas políticas juvenis. Não houve lugar suficiente para a discussão de temas que contribuíssem para o desenvolvimento crítico dos jovens e nem para a consolidação da cidadania dos mesmos. Sendo assim, intensifica-se a percepção da juventude como uma classe homogênea e despolitizada.

Essas marcações poderiam ser indícios das possíveis causas de um afastamento do público jovem do gênero telejornalístico em sua expressão tradicional – um modelo que não promoveria representações que de fato dialogam com esses sujeitos. Entretanto, conforme evidenciado anteriormente, é possível identificar ações que buscam atrair e incluir a audiência jovem. Esse é o foco de nosso próximo item.

No documento barbaragarridodepaivaschlaucher (páginas 90-93)