Capítulo 3 – Herói-Soldado-Cidadão na Representação Cultural
3.3 A jornada do herói
A “jornada do herói”, também conhecida como “monomito”, é um conceito proposto
por Joseph Campbell que sintetiza as bases sob as quais são construídos todos os mitos
heroicos. De acordo com o pensador americano, independentemente do período histórico,
todas as culturas desenvolvem as histórias de seus heróis a partir das mesmas etapas e
estrutura narrativa. O que se altera são as roupagens e o modo de se contar a história, mas o
esqueleto é sempre o mesmo.
A discussão acerca da proposição de uma estrutura universal pode ser encontrada em
outros autores, mas a obra O herói de mil faces acaba sendo a inspiração para a maioria das
pesquisas acerca do tema. Portanto, com o propósito de apresentar de maneira sucinta a
definição do primeiro ponto da tríade do Herói-Soldado-Cidadão, apresentamos a seguir o
percurso argumentativo de Campbell.
Em todo mundo habitado, em todas as épocas e sob todas as circunstâncias, os mitos
humanos têm florescido; da mesma forma, esses mitos têm sido a viva inspiração de
todos os demais produtos possíveis das atividades do corpo e da mente humanos.
Não seria demais considerar o mito a abertura secreta através da qual as inexauríveis
energias do cosmos penetram nas manifestações culturais humanas. As religiões,
filosofias, artes, formas sociais do homem primitivo e histórico, descobertas
fundamentais da ciência e da tecnologia e os próprios sonhos que nos povoam o
sono, surgem do círculo básico e mágico do mito. (CAMPBELL, 2007, p. 15)
A fundação mais primordial da cultura é o mito. Uma vez que ele aponta, de forma
simbólica, as questões mais essenciais do indivíduo enquanto ser social se torna algo
indissociável de uma análise cultural. Observar a roupagem que o arquétipo assume, ajuda-
nos a compreender toda a sociedade, pois é nesta personagem que serão fixados símbolos
próprios daquele grupo.
A identificação com a coletividade nasce do mito, por isso o herói abdica da sua
individualidade em nome do grupo. É a coletivização máxima do ser humano, uma vez que
sua função atende a uma demanda da sociedade e não a uma demanda pessoal. Por isso, por
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mais que o constructo represente um ultra individualismo, ele acaba transparecendo o
entendimento das liberdades e sonhos desse povo.
O sonho é o mito personalizado e o mito é o sonho despersonalizado; o mito e o
sonho simbolizam, da mesma maneira geral, a dinâmica da psique. Mas, nos sonhos,
as formas são destorcidas pelos problemas particulares do sonhador, ao passo que,
os mitos, os problemas e soluções apresentados são válidos diretamente para toda a
humanidade. (CAMPBELL, 2007, p. 27)
Vale notar que é justamente no conceito do american dream que muitos estrangeiros
acreditam quando se lançam aos EUA. A ideia de que a terra das oportunidades está aberta a
todos, mas que é preciso batalhar por isso, é muito intensa em um país que nunca teve, em seu
território, uma soberania monárquica direta
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sensação de que as oportunidades, além de serem abertas, não têm restrições de berço.
Um mito pode então ser criado e construído, tanto intencionalmente como
acidentalmente. As sociedades, ao repetirem e reafirmarem as histórias, acabam por
transformá-las e distorcê-las e vão sempre revestindo mais e mais os fatos com os símbolos da
nossa psique. Mesmo que aparentemente a história contada pareça ser inovadora, ela carrega
em si os pressupostos semelhantes, tanto no sentido arquetípico como mitológico. A busca do
herói é sempre para perpetuar o seu povo e trazer uma solução aos problemas presentes. Para
Campbell:
[...] o cisma no espírito, bem como o cisma no organismos social, não serão
resolvidos por meio de um esquema de retorno aos bons tempos passados
(arcaísmo), por meio de programas que garantam produzir um futuro projetado de
natureza ideal (futurismo), ou mesmo por meio do mais realista e bem concebido
trabalho de re-união dos elementos que se encontram em processo de deterioração.
Apenas o nascimento pode conquistar a morte – nascimento não da coisa antiga, mas
de algo novo. Dentro do espírito e do organismo social deve haver
— se
pretendemos obter uma longa sobrevivência
— uma contínua 'recorrência de
nascimento (palingenesia) destinada a anular as recorrências ininterruptas da morte.
(CAMPBELL, 2007, p. 26)
Mas essa “palingenesia” só faz sentido enquanto recurso da sociedade, como um
coletivo. É nesse ponto que existe uma forte dualidade do caubói, uma vez que ele é o self
made man, mas o faz para que seja possível a existência de seus compatriotas. Os soldados e
trabalhadores apresentados na revista encarnam esse espírito. A ideia de uma democracia que
permite ao indivíduo se desenvolver, mas que não o doma, é a raiz desse americanismo
tornado mítico.
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É importante ressaltar que nos EUA, enquanto território, nunca houve um líder monárquico. Apesar de ter
sido colônia da Inglaterra, o Estado americano, diferentemente de outros países, nunca passou por um
período autoritário ou de poder centralizado em uma única figura nobiliária.
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O herói, por conseguinte, é o homem ou mulher que conseguiu vencer suas
limitações históricas pessoais e locais e alcançou formas normalmente válidas,
humanas. As visões, idéias e inspirações dessas pessoas vem diretamente das fontes
primárias da vida e do pensamento humanos. Eis por que falam com eloqüencia, não
da sociedade e da psique atuais, em estado de desintegração, mas da fonte
inesgotável por intermédio da qual a sociedade renasce. O herói morreu como
homem moderno; mas, como homem eterno—aperfeiçoado, não específico e
universal—, renasceu. (CAMPBELL, 2007, p. 28)
Portanto, assim como o caubói, essa jornada é possível a todo e qualquer indivíduo.
Basta a aquele que quer se tornar um herói aprender a domar a natureza, ou as máquinas que a
dominam, para se tornar um salvador. Os soldados apresentados na Em Guarda superaram a
sua condição mais simples e assim atingem um novo patamar. O Estado ali apresentado fez
esse mesmo salto, seja através das superações realizadas pelas manobras militares ou pelas
invenções e reorganizações industriais.
O herói segue principalmente por três etapas, de acordo com Campbell: separação;
iniciação; e retorno. Elas são ainda internamente divididas por limiares menores, que
correspondem a processos internos e externos que a personagem deve passar para que
tenhamos assim a plena identificação, fazendo-a sair do plano meramente ficcional e se
tornando mitológico.
A tradução dessas etapas para um formato inteligível, fora do campo arquetípico e
incognoscível, são os rituais de passagem. Joseph Campbell vai justamente a partir da análise
e estudo aprofundado de diversos ritos e mitos propor que todos contem essas mesmas raízes.
Seja na história de Buda ou Jesus Cristo, seja no Finnegans Wake de James Joyce ou no Luke
Skywalker de George Lucas, todos se enquadram nos mesmos padrões.
O ritual de passagem, enquanto construção antropológica fundamente do monomito, é
resumido por Campbell em três sentenças: “Um herói vindo do mundo cotidiano se aventura
numa região de prodígios sobrenaturais; ali encontra fabulosas forças e obtém uma vitória
decisiva; o herói retorna de sua misteriosa aventura com o poder de trazer benefícios aos seus
semelhantes.” (CAMPBELL, 2007, p. 36)
Conforme apontamos nas análises do capítulo anterior, as narrativas que a Em Guarda
faz seguem, mesmo que de maneira superficial, essas três etapas. Em alguns momentos ainda
podemos observar com maior atenção os doze estágios propostos por Campbell, que
apresentaremos a frente. Assim como o caubói que se afasta do grupo para garantir a
segurança desse coletivo, os soldados se lançam ao combate, para garantir a segurança dos
seus ideais.
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Nos próprios casos estudados foram indicados os rastros dessa lógica. Para ilustrar
nossa argumentação retomamos o caso de Rickenbacker — O piloto encontra-se em sua
função cotidiana, comandar seus companheiros por um combate, entretanto, por forças
externas, se vê afastado de qualquer ajuda; utilizando-se da sua inteligência e capacidades
natas, consegue superar a situação; retorna ao convívio social trazendo consigo a maior parte
de seus companheiros e podendo retornar ao combate para defender os ideais pelos quais
preza.
Uma frase de Campbell merece ser lembrada para podermos localizar a discussão
dentro da política de Boa Vizinhança: “O herói composto do monomito é uma personagem
dotada de dons excepcionais” (CAMPBELL, 2007, p. 41). Esses dons, como observamos ao
longo dos casos relatados, estão presentes no próprio ser do americano. É na sua american
ingenuity e em seu Destino Manifesto, naturais de todos os cidadãos, que vemos essa
possibilidade de se realizar o herói.
De acordo com o autor do Herói de mil faces, o mito pode ser dividido em doze
etapas. São elas: o estranhamento; o chamado à aventura; a recusa do chamado; o encontro
com o mentor; a travessia do primeiro limiar; o ventre da baleia; a aproximação da caverna
oculta; a provação suprema; a recompensa; o caminho de volta; a ressurreição; e o retorno
com elixir. Mesmo que aparentemente uma história heroica não conte com uma das etapas, o
conceito cíclico e quatro pontos centrais (chamado à aventura; ventre da baleia; provação
suprema; e recompensa) sempre são respeitados.
Para explicar mais claramente cada um dos pontos, ainda que brevemente, poderíamos
entender que: “o estranhamento” é o momento no qual o herói em potencial, ainda não
concretizado, se sente fora dos padrões e muitas vezes é rechaçado pela sociedade como um
todo. Essa exclusão é justamente um recurso para nos gerar empatia pelo personagem e
mostrar como essa diferenciação é algo intrínseco ao indivíduo, reforçando o quão especial e
superior ele é frente a outros humanos.
O segundo ponto destacado é “o chamado à aventura”. Como o próprio nome diz, é
quando repentinamente é revelado ao indivíduo que de fato ele tem algo de diferente frente ao
resto da sociedade, algo que não poderá ser superado ou alterado. Justamente por isso ele deve
partir em uma missão, que aparenta não poder ser realizada pelo indivíduo, que de fato, ainda
não se tornou o herói. Num primeiro momento, há uma recusa a esse chamado, pois o
personagem ou não acredita na sua veracidade ou se sente incapaz de cumprir o que lhe foi
colocado.
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A partir do “encontro com o mentor” ou da ocorrência de uma ajuda sobrenatural, o
herói compreende que tem uma capacidade especial a ser desenvolvida, assim sendo aceita a
missão, e passa a enfrentar as provações. É neste ponto que se cruza o primeiro limiar, ou
seja, o indivíduo aceita a sua condição como herói e pode passar a ser reconhecido como tal,
deixando de ser um "comum". Claro que tal fato só se torna concreto e pleno com o retorno
dele à sociedade, que o reconhece como um ser heroico, porém neste ponto do mito o
indivíduo passa a ter a consciência do seu potencial e da sua missão.
No caso dos soldados da Segunda Guerra Mundial essas cinco etapas se fecham no
momento em que ele parte para o seu treinamento. A partir daquele ponto ele deixa de ser
apenas um cidadão e se concretiza enquanto soldado-cidadão. Passa a ser de fato possível que
ele seja um herói, mas isso dependerá de outras condições e situações, às quais só surgiram
para o “verdadeiro” herói.
Uma das mais importantes provas é o chamado “ventre da baleia”, no qual as novas
habilidades do herói, ainda não plenamente desenvolvidas, são colocadas à prova. Ao final
deste momento, algo lhe é tomado, seja outra capacidade ou um objeto ou um companheiro de
jornada, com o intuito principalmente simbólico. Isso ocorre justamente para pôr em prova a
fé do herói nas suas capacidades e seu comprometimento com a sua missão, fazendo com que
o motivador deixe de ser visto como algo meramente humanitário para se tornar uma causa
pessoal em prol do bem e do interesse de todos os humanos. Essa etapa recebe esse nome em
homenagem ao mito bíblico de Jonas, que é engolido por uma baleia e depois tem a planta da
qual a sombra se aproveita morta por Deus, como prova de suas reais preocupações, ou seja, é
lembrado do motivo real pelo qual foi enviado.
Agora tendo consciência das suas capacidades, tendo aprimorado as suas habilidades e
compreendendo a realidade de uma maneira mais complexa, o herói está finalmente pronto
para se aproximar da caverna oculta, o local onde será desfraldada a batalha ou o teste final. A
jornada final para este ponto assume uma tensão maior e é nela que já vemos o herói pleno de
sua potencialidade, mas ainda não pleno como indivíduo. Ele só alcançará essa plenitude
quando terminar o ciclo, em especial levar o elixir a todos os humanos.
Nos casos narrados na revista Em Guarda esse momento é aquele no qual o soldado
atinge a situação máxima de risco. Seja fruto de um acidente ou de um acaso, o herói que tem
a sua aventura narrada deve enfrentar um impasse único. Fugir de um terreno hostil, ocupado
pelos nazistas ou pelos japoneses, ou mesmo destruir um navio inimigo podem representar
essa provação máxima.
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Esse elixir é um objeto ou um ato representativo, que trará à humanidade uma nova
compreensão de si ou uma superação. A coletividade, através dessa conquista, atinge um novo
limiar de evolução. O herói traz ao povo essa possibilidade, dedica sua maior conquista ao
bem comunitário. No caso de Prometeus, um dos mais emblemáticos, é o fogo que é roubado
do Olimpo e trazido a todos, transformando a humanidade.
Em um momento de guerra intensa, como o retratado pela revista, dominar um novo
território é em si o elixir. Libertar os prisioneiros, ou ainda simplesmente retornar com vida,
podendo assim mostrar a sua superioridade frente o inimigo, é em si o que precisa ser trazido
à humanidade. Devemos ter em mente que esse conflito continha em si questões muito fortes
de imagens e representações, ou seja, mostrar as habilidades e capacidades dos seus soldados,
sobrepujando o inimigo, tinham um impacto muito grande na moral e no ânimo dos que
viviam no período.
A provação suprema então é encontrada. Nesta etapa o herói concretiza aquilo que foi
professado e cumpre seu papel, declarado anteriormente pelo mentor. Como consequência
desse encontro, é-lhe entregue alguma recompensa, material ou não, que o tornará um
semideus ou até um Deus perante a sociedade. Isso pode ocorrer num plano simbólico apenas,
como o fato de salvar a humanidade mesmo que ninguém saiba disso, ou num plano concreto,
como destruir o inimigo principal que desencadeou todos os problemas apresentados.
Vale ilustrar essa passagem com a matéria sobre o Sargento Kelly. O jovem que veio
de um berço comum, sem privilégios materiais, pode dominar um posto e defender seus
colegas frente os nazistas. O seu retorno aos EUA e as comemorações disso marcam a
provação e a afirmação dele enquanto herói. Mas um herói comum, que integra uma nação de
tantos outros.
O caminho de volta é marcado, então, pela reafirmação dessa superioridade, seja na
forma de uma exaltação ou ainda de finalizar resquícios que ainda possam existir da batalha
final. Muitas vezes o herói é desafiado por outros entes, de forma a provar que de fato ele é o
excepcional. Além disso, ele também poderá ser confrontado para que outro tente assumir o
seu lugar. Como é de se esperar, ele supera com facilidade esses desafios, isso é colocado para
representar o quanto o indivíduo extrapolou as barreiras humanas, se tornando assim o herói.
Ao se aproximar então do mundo comum, o herói é reconhecido, com destaque e
honrarias, pois agora concretizou a profecia. Por isso usa-se a ideia de ressureição, uma vez
que ele ressurge, mas sob outra ótica, de acordo com o mundo comum. O ponto então central
que encerra a jornada é a entrega do elixir, ou ao representante do povo ou à toda população.
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O elixir pode ser desde um objeto místico até algo mais simples, o melhor exemplo neste caso
é o já citado o fogo trazido por Prometeu.
Mostrar essas doze etapas da “jornada do herói” nos ajuda a compreender como o
Herói-Soldado-Cidadão se repete tantas vezes na revista. Sendo missão da Em Guarda
divulgar apenas informações verídicas e confiáveis, mas que gerem empatia e aproximação
com os EUA, esse formato mítico de narrativa se torna o mais tangível. O monomito, pela sua
facilidade de compreensão e assimilação, é um formato muito interessante para a conquista
dos “corações e mentes” dos vizinhos do sul.
Vemos, então, na tríade do Herói-Soldado-Cidadão uma construção arquetípica
própria. Pensada mesmo que não intencionalmente, ela está repleta de simbologias e
expectativas muito próprias da cultura americana do período estudado. A imagem do caubói,
posteriormente, vai ganhando outras conotações. A identificação do soldado com a missão
nacional, depois da Guerra do Vietnã também passa a ser outra.
Ao analisarmos o período da Segunda Guerra Mundial estamos observando um
momento de muita intensidade nos EUA. O governo Roosevelt ficou marcado, mesmo que
apenas no sentido folclórico, como um momento de renascença e pujança. Saiu-se de uma
crise econômica nunca antes vista e ganhou-se uma guerra. Mesmo que o crescimento e
estabilidade posteriores tenham sido frutos dos ganhos econômicos do conflito, a
representação que fica é muito mais idílica.
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APONTAMENTOS FINAIS
Compreender os processos de americanização tanto do Brasil como dos demais países
da América Latina é uma demanda importante para o entendimento das nossas próprias
histórias. Diferentemente da Europa, o continente americano não criou uma identidade
regional. Desde a fundação dos EUA essa identidade foi tomada de assalto, e reclamá-la de
volta, como tentaram historiadores e sociólogos, não tem se mostrado uma via produtiva.
Desde a mitologia grega, a Europa é mais do que apenas uma região, se tornando uma
entidade, e indo mais além, uma identidade. O nosso continente não pôde passar pelo mesmo
processo. Enquanto ainda era chamado de novo mundo e se descobria sobre as suas próprias
mitologias, o pragmatismo americano se ocupou de definir quem e como seria a América.
Eles demoraram para criar uma identidade nacional, mas garantiram o nome o quanto antes.
Criaram-se principalmente duas Américas: uma ao norte, pragmática e democrática;
uma ao sul, idílica e autoritária. Enquanto que acima do Rio Grande tenta-se desde o princípio
se afastar das estruturas monárquicas, abaixo chega-se a abrigar uma família de imperadores.
E as diferenças vão crescendo sempre mais e mais, seja pela religião ou pelo modo de
colonização.
A afirmação dos americanos vai se dar através da sua expansão territorial. Como
apontaram Teddy Roosevelt e Jackson Turner, além de outros pensadores, é na fronteira que o
americano se tornar americano. É no limiar do domínio do selvagem que o indivíduo
demonstra a sua excepcionalidade e assim pode se transformar em integrante dessa ideologia,
afinal a identidade, para os EUA, é uma opção de vida, e não apenas um rótulo.
O frontiersman é o colonizador que se transforma em nacional. Ele deixa para trás a
sua maneira e seu entendimento de civilização. Passa a abraçar os aprendizados dos índios e
da natureza para poder sobreviver num ambiente, inicialmente, hostil. Sua interferência faz
com que a região, antes ameaçadora, agora se torne seu lar. Mesmo que a fronteira ainda
esteja ladeando seu território, ela já foi superada, enquanto conceito limitador para aquele
momento.
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Por isso nos centramos na imagem do cowboy. A sua representação no imaginário,
tanto do período como de hoje em dia, se sustenta no mais profundo do americanismo. Sem
abandonar as estruturas originais ou sem destruir as demais, essa imagem vai lentamente se
difundindo entre os mais diferentes povos e localidades. O que antes era apenas um vaqueiro,
vira sinônimo de independência, liberdade e realização pessoal.
O americano, como vemos na Em Guarda, é um indivíduo excepcional. Mesmo que
seja atacado ele não se abala, ao contrário, ele busca ainda mais forças para superar o inimigo.
O mesmo indivíduo ainda busca o apoio do seu vizinho ao sul, como um grande irmão
estende a ajuda ao caçula para que ambos tenham ganhos. Apesar dessa visão tão positiva, na
hora da prática, apenas um lado acaba recolhendo os frutos e o lucro.
Observar, então, como os americanos se tornaram americanos pode nos trazer
respostas à demanda de auto-compreensão. É válido entender como eles se apresentaram, e se
No documento
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP IBERÊ MORENO ROSÁRIO E BARROS
(páginas 116-184)