Capítulo 2 – O Herói-Soldado-Cidadão na Em Guarda
2.1 Em Números
De acordo com a pesquisa quantitativa realizada, a partir da observação e catalogação
das edições da revista Em Guarda, vemos que: existem, no total, 63 matérias sob o tema
Soldados, sendo 21 no primeiro ano, 18 no segundo, 20 no terceiro e apenas 4 no último ano
de publicação do periódico. Por sua vez, são 709 as imagens categorizadas como Soldados,
sendo 196 no primeiro ano, 234 no segundo ano, 192 no terceiro ano, e apenas 87 imagens no
último ano.
Essa oscilação temática nos ajuda a compreender como o enfoque da revista se alterou
ao longo de sua existência. E ao observar os números, interessa-nos colocá-los em
comparação com outros temas, com a ajuda de um gráfico que possibilitará melhor
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visualização dessa mudança. Seguem, abaixo, dois gráficos nos quais comparamos imagens e
matérias das categorias Soldados, o terceiro tema de maior reincidência nas várias edições da
revista; e América Latina, o tema com o maior número de aparições.
Tabela 1 - Relação de matérias com o mesmo tema por ano
Tabela 2 - Relação de imagens com o mesmo tema por ano
Podemos ver que há uma relação inversamente proporcional, principalmente ao
observarmos a frequência das imagens entre o terceiro e o quarto ano da publicação. Isso
ocorre claramente, pois é nesse intervalo que o conflito bélico termina, e assim a revista já
não tem tanto material para tratar do tema Soldados. Ao observarmos a disparidade entre o
total de matérias no quarto ano isso fica ainda mais patente, uma vez que a diferença é de 48
textos. É também interessante notar que até o terceiro ano da publicação a distância da
quantidade entre os dois temas – Soldados e América Latina – manteve-se constante nas
matérias publicadas, o que pode ser entendido como uma linha editorial. E chama a atenção
que esse equilíbrio proporcional se rompe no último ano de publicação da revista.
Este levantamento, que se encontra anexo e aqui brevemente pontuado, foi realizado
justamente para podermos realçar a importância dos temas na revista, uma vez que torna
tangível afirmações como a de que: depois do tema “América Latina”, os temas “Cidadão” e
“Soldado” são os de maior importância para a revista. Tendo isso em vista podemos reafirmar
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que há uma clara intenção da revista em apresentar esses tópicos, cabendo assim à análise
qualitativa que fazemos a seguir a investigação do modo como se deu essa representação. O
que esperamos é mostrar uma das dimensões da Política de Boa Vizinhança, que se deu
através da busca de uma hegemonia americana.
Foi justamente em função desse destaque numérico que escolhemos trabalhar com
essa relação do Herói-Soldado-Cidadão. A opção de não tratarmos o tema da América Latina
se justifica por abarcar um conjunto muito maior de questões, as quais não conseguiríamos
explorar em uma única dissertação, e também dá-se o fato de outras pesquisas já terem
abordado, mesmo que sem contar com a coleção completa, essa representação. Nosso
principal foco é, então, na categoria Soldado.
2.2 Temas de Análise
Nesta seção nos dedicamos a observar como o tema Soldado foi representado ao
longo de todos os anos da revista Em Guarda. Tomamos como percurso analisar as matérias e
imagens dos quatro anos a partir de três subtemas comuns, sendo eles: Preparo; Humanização
e Heróis. É a partir da própria observação do nosso objeto que então faremos as colocações e
proposições.
2.2.1 Preparo
Neste primeiro recorte analisaremos matérias, englobando os quatro anos, que tratam
especificamente do treinamento e preparo dos combatentes americanos. É importante ressaltar
essa questão uma vez que esse preparo é mostrado como maneira de apontar como,
alegadamente, a capacidade desse indivíduo é superior a do seu inimigo. Esse mesmo
exercício é interessante para destacar a capacidade de transformação por parte das forças
armadas americanas.
Abrimos a observação com o seguinte trecho da primeira edição do primeiro ano:
“A grande maioria dos marinheiros dos Estados Unidos possuem educação
secundária e acham-se, por conseguinte, bem preparados de início para os diversos
ofícios e especialidades que a manutenção de uma esquadra moderna requer” (EM
GUARDA, 1941, p.31).
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Podemos ler, a partir do trecho, como a revista quer apresentar o cidadão americano
enquanto um soldado em potencial, já preparado e capacitado para integrar as forças, mais do
que por razões físicas e, sim, por conhecimento técnico e tático.
Vale trazer aqui uma definição do Soldado-Cidadão, conceito que remonta as
discussões desde Maquiavel, quando este recomendava ao Príncipe que construísse as Forças
Armadas a partir da população que a ele se subordinava. Em sua obra principal o autor
italiano, após discorrer profundamente sobre os problemas do uso de tropas mercenárias, entra
na defesa dos benefícios do uso de tropas próprias definindo-as como: “As armas próprias são
aquelas compostas ou pelos súditos, ou pelos cidadãos, ou pelos teus criados”
(MAQUIAVEL, 2007, p.145).
Os benefícios primários seriam a maior confiança nas tropas e o compromisso de
lealdade entre comandados e comandante. Mas é no período da revolução francesa que o
conceito ganha um escopo ainda maior. Uma vez que durante o período o conceito de cidadão
ganha uma definição mais ideológica do que apenas geográfica, cabe ao indivíduo deveres e
direitos antes não assegurados. Como a revolução se entendia como um dever a ser difundido,
o decreto de 23 de agosto de 1793, da Assembleia Nacional, colocava todos os franceses
como parte das forças armadas.
17Esse esforço nacional de defender os ideais da Nação, que é um dever de cada
cidadão, é o que compreendemos aqui por soldado-cidadão. E é justamente nesse eixo que se
apresenta a primeira matéria analisada, que mostra como os soldados já estão prontos, por
serem bons cidadãos. Eles fazem a mudança de sua condição civil para a condição militar de
maneira quase ininterrupta, uma vez que seu conhecimento prévio e a sua dedicação aos
valores da nação são ferramentas para compor o corpo militar.
O próprio trecho acaba também por destacar uma pretensa superioridade das forças
americanas frente às dos demais países, uma vez que eles “possuem educação secundária”,
algo elevado naquele período. Ou seja, as suas qualidades civis são transpostas à sua
potencialidade militar, fazendo com que ele seja um soldado “esclarecido” e não apenas um
repetidor mecânico. Em outra frase mais à frente, este pensamento é reforçado, trazendo à
discussão a questão da liderança dos EUA nas Américas: “Os oficiais da Marinha vêm da
célebre Academia Naval de Annapolis, onde também se preparam muitos oficiais das
Marinhas da América Latina” (EM GUARDA, 1941, p.31).
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As imagens dessa primeira matéria, por sua vez, complementam as imagens da
fotorreportagem que trataremos a partir daqui, presentes na mesma edição. Esta conta com 14
imagens, sendo cinco delas de uma página inteira cada. Consideramos que ela engloba
também as outras duas matérias, uma vez que as três tratam dos mesmos temas, porém com
atenção especial para recortes distintos.
Quatro das cinco imagens de página inteira nos chamam a atenção por mostrarem os
marinheiros como exemplares. Os tipos físicos são extremamente atléticos e as poses altivas
remetem a grandes heróis. É interessante lembrar que os nazistas divulgavam propagandas nas
quais mostravam o povo alemão com corpos e disciplina superiores aos padrões do resto do
mundo, com ligações inclusive à imagem de deuses gregos.
Figura 1 - Edição 1, Ano 1, p. 42
Como vemos na figura 1, os jovens mostrados nas imagens não são fracos ou
despreparados, mas sim homens de grande força e condicionamento físico. Mesmo que eles
estejam realizando grande esforço físico seus semblantes transmitem a mensagem de
tranquilidade e determinação. O sincronismo que uma equipe de remo também nos remete a
um esforço conjunto e não individual, ou seja, um marinheiro americano não vai ganhar a
guerra sozinho, mas sim todo o conjunto.
Essas mensagens, passadas através da imagem, podem ser contrapostas justamente às
produções de Leni Riefenstahl. Nos filmes “Triunfo da Vontade”, de 1935, e “Olympia”, de
1938, a diretora correlaciona a juventude alemã com deuses e heróis gregos, como podemos
ver abaixo. Entendemos, portanto, que ao mostrar o físico dos soldados americanos a revista
quer passar ao leitor a ideia de que todo soldado americano é tão preparado quanto o alemão,
reafirmando a confiança que se deve ter nessas tropas.
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Figura 2 - imagem do filme "Olympia", de 1938
Por sua vez, outras imagens vão assumir outros papéis, que vão contribuir ainda mais
na construção da imagem desse soldado, e no caso desta edição em especial, desse marinheiro
que é preparado e se destaca frente a qualquer outro combatente. A disciplina que a imagem
dos soldados praticando esportes passa é muito importante, uma vez que um dos grandes
trunfos das tropas alemãs era a sua organização e preparação, frutos de uma doutrina rígida e
modelar.
Esse adestramento das tropas alemãs foi um dos pontos que atraiu grande atenção dos
comandantes brasileiros em um primeiro momento, portanto, uma das motivações para uma
aproximação por parte dos americanos. Vale relembrar que naquela altura dos
acontecimentos, o Brasil, através da sua diplomacia, atuava com forte aproximação
pragmática com a Alemanha, através de trocas comerciais, visando assim, adquirir um arsenal
e uma estrutura melhores.
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Figura 3 - Edição 1, Ano 1, p. 43
É justamente dentro dessa lógica que a revista mostra imagens como esta acima,
Figura 3, que apresenta a guarda de fuzileiros navais dos EUA. É interessante notar como
inclusive na legenda a revista reforça essa extrema qualidade do adestramento, colocando os
marinheiros como “[...] alinhados em perfeita parada”. As fardas de gala e a organização sob a
qual os marinheiros se encontram traz ao leitor a ideia de que eles estão muito bem
preparados para o embate.
As personagens da imagem têm um olhar altivo e uma postura rígida, um mesmo
padrão que se repete em outras imagens e é reincidente em algumas capas. Assim como
animais que demonstram e amedrontam outros através das suas posturas, o ser humano acaba
fazendo o mesmo e até mimetizando esses seres. O olhar ao longe e focado em um ponto
distante nos lembra da águia, animal que é signo de determinação e objetividade. Assim como
o peito estufado e os braços ladeados nos lembra um leão ao rugir, que o faz para marcar o
território que domina. Essa pose sempre nos remete a uma superioridade e à divindade, e vem
desde as nossas construções mais primitivas, conforme podemos observar em esculturas de
deuses gregos ou nos rabiscos das cavernas.
Ray Birdwhistell, antropólogo, propõe em seus estudos que a comunicação entre duas
pessoas não se restringe ao verbal, sendo os gestos e posturas parte dessa troca de
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informações. O que nos mostra como as imagens que vemos na revista não são escolhas
aleatórias ou apenas ilustrações do texto, mas sim mensagens em si mesmas. Ele se propõe a
fazer uma ciência que estude as estruturas e os contextos nos quais são construídas as
simbologias dos gestos e posturas humanas, a chamada ciência cinética. Mas deixa claro que
não se pode criar um manual para se ler essas palavras, em função da necessidade de uma
contextualização:
Com a aproximação do nosso estudo a um ponto no qual precisamos lidar com o
significado social, precisamos de estamentos claros sobre a estrutura do contexto
social das ocorrências comunicacionais. [...] O significado não é imanente de um
símbolo particular, palavra, sentença ou ato de qualquer duração, mas no
comportamento elucidado pela presença ou ausência de tal comportamento em
contextos particulares (BIRDWHISTEL, 1970, p.96)
18.
O contexto para nós é claro. Assim como a intencionalidade da utilização das imagens,
que por mais que soem subjetivas, estão presentes nos documentos oficiais sobre a OCIAA e
sobre a revista: “Uma revista pictográfica que retratasse e dramatizasse as medidas de defesa
tomadas pelos Estados Unidos” (ROWLAND, 1946, p.46). Assim, podemos compreender as
representações trazidas na revista Em Guarda, em textos e imagens, que se propõem a mostrar
o quão preparados e capazes estão os soldados-cidadãos, o quanto os EUA estão em guarda
para a defesa das Américas.
Recorremos brevemente a Umberto Eco e suas análises estruturais das narrativas. O
autor italiano nos mostra como as imagens carregam as mensagens de uma maneira simbólica,
principalmente através dos chamados “tipos”. Os símbolos que criamos muitas vezes são bem
concretos, mas outras vezes perdemos as raízes dos seus significados e nos restam apenas as
impressões. É através das construções arquetípicas e mitológicas que identificamos e
correlacionamos com a fala do autor. É na tipicidade – a transformação em “tipos”, que
“resulta da relação de fruição entre personagem e leitor, e um reconhecimento que o leitor
realiza diante da personagem” (ECO, 1979, p.216) – que podemos então compreender de fato
o que é dito subjetivamente.
Umberto Eco, ao analisar os quadrinhos de Steve Canyon, nos dá uma contribuição
direta de como podemos ainda distender a nossa observação. Propõe uma semântica
iconográfica, a partir da qual podemos compreender uma imagem e as informações ali
apresentadas. Vejamos como Eco pratica essa proposição:
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Tradução livre.Texto original: “L acts of whatever duration but in the behavior elicited by the presence or
absence of such behavior in particular contexts.”
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A simpatia despertada pelo rosto de Steve não se baseia, portanto, numa simples
virtude evocativa do fato plástico, mas na qualidade de “signo” que o fato plástico
assume, e pela qual nos reporta, com função hieroglífica, a uma série de tipos, de
padrões, de idéias da virilidade que fazem parte de um código conhecido pelos
leitores. A simples delimitação gráfica dos contornos “está para” alguma coisa mais,
é elemento convencionado de uma linguagem. Em resumo, Steve é elemento
iconográfico estudável iconologicamente, como o santo de miniatura, com seus
atributos canônicos e um dado tipo de barba ou de auréola (ECO, 1979, p.216).
O mesmo pode ser feito em relação às imagens da revista analisada, tanto as que já
foram apresentadas como as que ainda o serão. São diferentes elementos iconográficos já
convencionados, os quais nos permitem assimilar as informações. Essa linguagem, portanto, é
composta pelo contexto no qual ela é produzida, o contexto no qual ela é consumida e pelos
conhecimentos que circundam esse texto. Uma revista que se propõe a divulgar a cultura e o
exército americano num período de tensão pré-guerra, e de guerra como se deu
posteriormente, quer trazer para si o heroísmo e as imagens de fortaleza e de proteção.
Figura 4 - Edição 1, Ano 1, p. 47
Justamente a terceira imagem da revista, que destacamos para analisar, traz esse
discurso da pujança e do poderio bélico e militar ainda mais escancarado. O combatente posa
para a foto como se estivesse de fato utilizando a arma, porém podemos imaginar que pela
qualidade da iluminação utilizada, assim como pela limpeza de seus trajes, que essa é uma
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cena montada. A personagem na verdade está aí para representar a prontidão e a ausência de
medo em se utilizar toda a capacidade das forças de guerra.
O enquadramento da foto é bem interessante ao colocar a personagem em uma posição
de superioridade. Utilizando a técnica de plano em contra-plongée, o fotógrafo coloca o leitor
da revista como um alvo que está abaixo do combatente e justamente sob a mira da arma. O
soldado, através do seu semblante sereno, porém ríspido, nos dá a ideia de que ele domina o
artefato com destreza. Assim como indica a legenda, ele se apresenta enquanto um
“combatente destemeroso”.
Também vale pontuar o posicionamento da arma e da câmera de maneira a nos
lembrar uma pose de valorização fálica. A arma está localizada de determinada maneira no
eixo do torso da personagem que a segura e que nos remete a um homem que agarra
orgulhosamente seu maior símbolo de masculinidade. A virilidade é um fato importante para
ser ressaltada em um período de guerra, uma vez que o imaginário ocidental coloca o gênero
masculino como o protetor. Dessa maneira, a revista nos lembra então que os soldados são
viris e, por isso, podem responder pela defesa das Américas.
Figura 5 - Edição 1, Ano 1, terceira capa
Esta quarta imagem sintetiza de uma maneira muito peculiar todo esse conjunto
imagético construído até aqui. Atendo-nos a três das simbologias presentes, vemos um
resumo de todos os tópicos citados até aqui. São elas: A presença de uma mulher que compõe
no quadro a função de uma família tradicional, assim nos lembrando da civilidade do militar,
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ou seja, o seu lado cidadão; o marinheiro que na sua farda de gala carrega uma condecoração,
uma clara marca do seu heroísmo, coragem e preparo; e, por fim, a boca de uma possante
artilharia, lembrando-nos de todo o material bélico que protege as Américas, além de remeter
a um símbolo fálico que reforça a virilidade em toda a cena.
Já este segundo texto analisado, sob o título “O homem arma de guerra”, trata com
mais atenção de como os recursos humanos têm sido utilizados na guerra, tanto no front como
na produção industrial. O texto em análise poderia gerar dúvidas quanto à sua catalogação,
podendo em algumas passagens ser colocado como “Cidadãos”. Porém, a maior ênfase é no
alistamento de novos soldados e na capacidade de treinamento. Assim como se explicita no
trecho transcrito a seguir:
Eram procedentes de tôdas as camadas sociais, ricos e pobres, das profissões
liberais, operários, estudantes, agricultores e comerciantes, e todos o fizeram
voluntariamente. Todo registro foi realizado sem a ocorrência de um simples
incidente desagradável – o que constitue um tributo ao patriotismo dos cidadãos
norte-americanos e à eficiência do regime democrático (EM GUARDA, 1942, p.6).
É válido notar como o texto faz questão de ressaltar que as forças armadas dos EUA
eram compostas por pessoas de diversos estratos sociais. Essa situação se contrapõe aos
moldes praticados em séculos anteriores, nos quais os altos quadros eram compostos por
aristocratas e nobres. A revista destaca que o alistamento das pessoas teria sido voluntário.
Enfatiza, portanto, que não houve obrigatoriedade no ato, mas que por vontade própria os
homens se decidiam por se engajarem nas tropas. Podemos compreender que isso era feito
dentro de uma lógica de que seria parte da sua obrigação enquanto cidadão que defende o
ideal da democracia e da liberdade. O ato patriótico, como o próprio texto alude, é maior do
que a sua individualidade.
Retornando à abertura do texto analisado, ainda vemos sobre a mobilização nacional:
Os Estados Unidos estão mobilizando como nunca antes na história do país, seus
recursos mais fundamentais
– as reservas do poder humano inherente à sua
população de 133.000.000 de habitantes. No correr dêste ano, o govêrno espera que
a fôrça do labor da nação inteira esteja aplicada aos vários trabalhos planejados.
Todo o conjunto da população aproveitável [...] servirá em qualquer setor militar ou
civil, passando todos a devotar suas energias para a derrota do inimigo (EM
GUARDA, 1942, p.6).
Vemos assim que a revista compreende todo tipo de esforço como parte de um grande
contingente de batalha, e não apenas os soldados. Todo civil passa a “devotar suas energias
para a derrota do inimigo”, mesmo que seja através de um trabalho aparentemente secundário.
Isso mostra como a coletividade da população está atuando por um único ideal. O cidadão
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americano, como nos ressoa através do texto, se sente impedido de se tornar passivo à luta,
não apenas pela participação de seus compatriotas, mas pelos valores que são parte da sua
própria identidade.
Desta maneira, todo homem se torna uma arma de guerra. Sua força, seja como
soldado ou como operário, estará sendo dedicada ao combate. Em diversos textos a revista
inclusive nomeia esse corpo de trabalhadores civis que atuam nas fábricas como o front
interno. Devemos ter claro que para uma guerra de trincheira que depende tanto dos recursos
materiais, como a que se travou na Segunda Guerra Mundial, a produção e a logística são tão
importantes quanto o preparo técnico das tropas. Justamente por isso surgem táticas que
almejam o corte das linhas de comunicação e de suprimentos inimigas.
Em outro texto, intitulado “Os paraquedistas em ação”, destacamos o seguinte trecho:
“Munidos de granadas de mão e fusis-metralhadoras, êles são verdadeiros arsenais
ambulantes” (EM GUARDA, 1942, p.16). Essa comparação do combatente com um arsenal
completo é importante para nos mostrar o quão bem equipados são os soldados americanos.
Trata-se, portanto, de questão que merece atenção, já que uma das dificuldades que se
No documento
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP IBERÊ MORENO ROSÁRIO E BARROS
(páginas 45-97)