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Capítulo 1 – O Percurso até a OCIAA

1.2 A Política Interamericana e a Boa Vizinhança

A influência dos EUA no continente remonta desde a sua criação como nação e da

criação dos seus mitos centrais, com os chamados Pais Fundadores. O Destino Manifesto se

compõe de sacralidade e racionalidade, ou seja, de uma missão “divina” com uma necessidade

econômica e política. Oliveiros, em Nossa América: Indoamérica, ao tratar do imperialismo

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no continente, resgata desde os primórdios da colonização americana, apontando como

intrínseca à existência desse novo Estado a sua expansão.

A realização da igualdade de condições confundiu-se, assim, ao nível da consciência

expressa, com a conquista territorial e a expansão concomitante do comércio e da

atividade econômica em geral. Esta é a razão que explica porque a vocação imperial

coexistiu com a visão da igualdade e com a missão redentora dos demais povos.

(OLIVEIROS, 1971, p.123)

É num eixo de atuação conjunta dos interesses empresariais com uma missão Estatal

do Destino Manifesto, conforme também aponta Érica Monteiro, que se constroem,

independentemente do período, as relações dos EUA com os demais países do continente. As

oscilações programáticas se ligam mais ao modo como essa integração ocorre, sendo em

alguns momentos mais coercitiva, como o Big Stick, ou mais sedutora, como a Boa

Vizinhança.

Para Alexandre Alves Jr., autor de Discursos Americanos de Cooperação no Contexto

da 2ª Guerra Mundial, o próprio conceito de América Latina é “disputado e flexível”. Torna-

se necessário apontar e adotar, conforme o contexto observado, a acepção utilizada no mesmo

período. Portanto, adotamos como compreensão a ideia de que a América Latina é uma

vizinhança que precisa da ajuda dos Estados Unidos da América para se defender e se

desenvolver.

A política de Boa Vizinhança, mesmo antes da Segunda Guerra Mundial já começava

a despontar. Tanto que é do presidente Hebert Hoover a expressão good neighboor, proferida

em 1928 em Amapala, Honduras, durante viagem oficial pelo continente. A grande questão,

por mais que houvessem esforços para a realização de uma política interamericana mais

amistosa, era de que ela não encontrava grande apoio e precisava de um contexto interno para

se solidificar.

Alexandre Alves Jr., em uma profunda revisão bibliográfica, aponta como os

diferentes historiadores compreenderam o período e a política. Dentre todos os autores

podemos ver que foi um momento da política externa americana que se dispunha a se

aproximar de seus vizinhos tanto por interesses comerciais como por interesses políticos.

Apesar de discordâncias mais focais as tônicas se repetem em todos os historiadores

indicados.

Frederick Pike propõe, por sua vez, que a política de Boa Vizinhança é fruto de

mudanças tanto políticas como culturais internas e externas. Os pensadores e escritores

americanos desde os anos 1930 vinham reformulando a visão sobre as Américas, e isso se

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relaciona inclusive com representações internas da mulher e do homem. Estava instaurado um

momento de uma crise de identidade, olhar e se aproximar dos vizinhos ao sul era inclusive

um modo de se reaprender. (PIKE, 2001)

As mudanças da política externa podem ser notadas através das mudanças

principalmente nos discursos dos representantes de Estado e nos acordos firmados entre os

participantes. As Conferências Panamericanas foram progressivamente se tornando um fórum

importante para todos os países do continente. Foi um espaço no qual os países latino-

americanos podiam apontar e propor medidas em conjunto para se opor aos EUA,

principalmente quanto aos intervencionismos das décadas anteriores.

Nos anos que antecederam a Segunda Guerra Mundial, os EUA já passaram a utilizar

esse ambiente para reforçar ainda mais os laços comerciais com seus vizinhos ao sul. Esse

cooperativismo tinha inspiração não apenas em um ganho econômico estreito por parte dos

americanos, mas também em questões maiores. Podemos observar uma corrente que pregava

mais diálogo por parte dos americanos desde muito antes, como na participação de Elihu Root

na 3ª Conferência Panamericana em 1906 e no artigo de Roosevelt de 1928.

Elihu Root propunha “a retórica da fraternidade e da igualdade continental como um

caminho alternativo para defender os interesses de seu país na região.” (ALVES JR, 2014,

P.74). Isso mostra, já em 1906, como havia diferentes formas de política interamericana sendo

pensadas e propostas dentro dos próprios EUA. Franklin Delano Roosevelt se influencia desse

pensamento, mais de diálogo do que de coerção, e o afirma em 1928.

No artigo, Our Foreign Policy: a Democratic View, Roosevelt faz referências a Elihu

Root e sua proposição de política externa. Adota uma visão wilsoniana, ou seja, de que as

relações internacionais podem ser estabelecidas e estabilizadas através de fóruns mundiais,

como a Liga das Nações e a ONU. É na via de uma diplomacia mais formalizada e

preocupada com a negociação que Roosevelt compreende um avanço do Sistema

Internacional para uma paz duradoura.

Portanto, assim como Alexandre Alves Jr, entendemos que “a Política de Boa

Vizinhança foi muito mais do que uma estratégia pontual que visava apenas responder às

necessidades norte-americanas [sic] nos anos 30 e 40.” (ALVES JR, 2014, p.75). Ela estava

de fato inserida num reposicionamento global dos EUA, assumindo a sua posição enquanto

potência mundial.

Entendemos, portanto, que o grande diferencial e o que marcou de fato as relações

interamericanas no período foi essa mudança para uma proposição na qual as questões

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culturais também foram inclusas e a política deixou de ser apenas unilateral. Isso coaduna

com a posição de Roosevelt também quanto à política externa em outros âmbitos. A questão é

que ele compreendia que a relação dentro do continente deveria receber uma atenção especial.

O OCIAA e Rockefeller têm, então, seu lugar e razão de ser nesse processo.