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Quando olhamos para a literacia na vida adulta a nível internacional deparamo- nos com três grandes momentos-chave, em que são desenvolvidos estudos que procuram compreender e avaliar as aptidões e as competências dos adultos no domínio da literacia. Ao falar acerca destes estudos não pretendemos analisá-los até à exaustão, até porque já longas páginas se escreveram sobre o tema, mas é nosso intuito perceber de que forma influenciaram o estudo desenvolvido em Portugal acerca desta temática, as suas preocupações e objetivos e de que forma é que esses estudos direcionam posteriormente as políticas públicas delineadas.

Assim, na década de 90, mais concretamente em 1994, surgiu o primeiro estudo internacional de literacia direcionado para os adultos, denominado IALS – International

Adult Literacy Survey. Esta pesquisa alargada processa-se a partir de 1994 e representa,

até à data, a pesquisa de maior alcance realizada a nível internacional em torno destas questões e em que Portugal participou. Esta pesquisa é uma pesquisa comparativa à volta da literacia dos adultos, e tornou-se um esforço colaborativo que envolveu várias organizações internacionais, agências intergovernamentais e governos nacionais (Kirsh, 2001).

É importante salvaguardar que esta pesquisa abrange uma população situada entre os 16 e os 65 anos. Ressalve-se igualmente que este estudo acabou por se tornar num elemento basilar para a investigação desenvolvida em torno da literacia, tal como veremos mais adiante.

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Nesta pesquisa a literacia é definida como sendo a capacidade de usar a informação impressa e escrita para responder às necessidades que a sociedade coloca, para atingir metas pessoais e para desenvolver os conhecimentos e os potenciais de cada um (Kirsh, 2001; Kirsh & Murray, 1998). Dada a proliferação dos documentos escritos, a definição acaba por chamar a atenção para o facto de não se entender a literacia tão-só como um conjunto de competências isoladas de leitura e de escrita, mas a sua aplicação em contextos concretos e em situações distintas no que diz respeito às várias esferas da vida de um adulto. Tal como se diz expressamente na definição, são tidas em conta as necessidades e as ambições de cada indivíduo, sem que se descurem as da própria sociedade.

Esta pesquisa fundamenta-se em dois objetivos basilares, sendo que o primeiro está associado ao desenvolvimento de escalas que permitam a comparação do desempenho da literacia dos adultos com uma vasta sucessão de competências. O segundo objetivo prende-se com a descrição e a comparação das competências de literacia dos adultos nos diferentes países (Kirsh, 2001).

Nesta pesquisa, a literacia é avaliada de acordo com três domínios que abrangem um conjunto de competências relevantes para a concretização de tarefas díspares. Falamos da literacia em prosa, relativa ao conhecimento e às competências necessárias para compreender diferentes tipos de textos em livros, jornais, enunciados; a literacia documental, entendida como o conhecimento e as competências essenciais para a localização e o processamento de informação constante em formulários, mapas, impressos e, por último, a literacia quantitativa que envolve operações aritméticas, baseando-se em documentos escritos, nomeadamente livros de cheques (Thorn, 2009; OECD & Statistics Canada 2000; Kirsh & Murray, 1998; Kirsh; Jungeblut & Mosenthal, 1998).

Importa ainda salientar que o facto de a literacia nos remeter para um continuum de aptidões leva a que haja níveis de literacia com graus de dificuldade distintos. São considerados cinco níveis de literacia: nível 1, onde se enquadram pessoas com baixas competências, em que o indivíduo tem dificuldades em compreender uma informação simples do dia a dia; no nível 2 encontram-se pessoas que até desenvolvem competências, mas o seu baixo nível de proficiência dificulta-lhes enfrentarem as novas exigências com que se deparam; o nível 3 é considerado o mínimo adequado para encararem as necessidades do quotidiano numa sociedade cada vez mais complexa e,

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por último, os níveis 4 e 5, em que se enquadram os sujeitos que revelam competências mais elevadas no processamento da informação escrita (OECD & Statistics Canada, 2000).

No relatório final apresentado em torno deste estudo são realçadas algumas ideias, de certo modo mesmo conclusões, e às quais é pertinente fazer menção. A pesquisa do IALS acaba por ilustrar a distribuição das proficiências de literacia não só em cada país, mas também entre os diferentes países numa escala internacional. As deficiências no que respeita às competências de literacia não dizem somente respeito a grupos marginais, mas a largas proporções da população adulta em todos os países, mesmo nas economias mais desenvolvidas se encontram défices relativamente a estas proficiências. Em alguns países um número significativo de adultos com baixa escolarização demonstram até elevados níveis de competência de literacia, mas noutros tal não acontece, uma vez que apenas uma pequena porção de adultos adquire o nível de competências necessárias. Muitas vezes, adultos com baixas competências de literacia não tem consciência desse défice de competências relativas à literacia e nem sequer consideram tal facto como um problema (Idem).

A segunda pesquisa concretizada em torno desta temática, conhecida como ALL –

Adult Literacy and Life Skills Survey – ocorre entre 2002-2006. Inicialmente estavam

envolvidos sete países e mais tarde associaram-se-lhe mais cinco. Esta pesquisa envolve o esforço empreendido pelos governos, agências de estatística nacionais, instituições de pesquisa e agências multilaterais, sendo o desenvolvimento e a gestão deste estudo coordenados pelo Statistics Canada e pelo Educational Testing Service, em colaboração com outras instituições (OECD, 2005).

Este estudo baseia-se no IALS, embora se constatem algumas alterações relativamente ao que foi delineado no estudo anterior, mantendo o objetivo basilar da pesquisa no facto de se pretender avaliar o impacto das competências dos adultos. A principal mudança que se verifica numa primeira análise entre o IALS e o ALL está relacionada com a substituição da avaliação quantitativa pela numeracia, que exige competências que permitam gerir problemas matemáticos em situações diversas e a introdução da avaliação de resolução de problemas, que nos encaminha para o domínio da cognição. Tal como acontecia no IALS, o ALL define as competências ao longo de um continuum de proficiência.

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Quando se abordam os perfis comparativos de competências dos adultos nesta pesquisa há algumas ideias que sobressaem e que nos levam o focar a nossa atenção nessa direção. Salienta-se que, dependendo do país, entre um terço e mais de dois terços da população adulta não alcança aquele que os especialistas consideram o nível mínimo para lidar com as exigências da sociedade. Os resultados do ALL confirmam os dados alcançados com o IALS, em que muitos adultos revelam dificuldades em lidar com a literacia e com a numeracia. Foca-se ainda que a idade e as competências estão inversamente relacionadas em todos os países e que essa relação é complexa, não deixando, a este propósito, de se salvaguardar que as competências podem ser adquiridas, desenvolvidas, conservadas e perdidas ao longo da vida. De acordo com o mesmo relatório, afora os possíveis efeitos do envelhecimento, a influência da idade nas competências não funciona de modo isolado, até porque, contrariamente, denota experiências de vida que ocorrem em distintas etapas (OECD, 2005).

Pode-se dizer, de certa forma, que um sucessor destas pesquisas é o Programa

Internacional de Avaliação das Competências dos Adultos, vulgo PIAAC, sob a égide

da OCDE que o lançou, e que se encontra em curso neste momento e cujos resultados finais serão apresentados em 2013. Daí que tenhamos dito anteriormente que o IALS representa, até agora, a pesquisa de maior alcance a nível internacional. Saliente-se que o PIAAC tem início na 2.ª metade de 2007. Este estudo é um “retrato atual” e é considerado como a mais ampla pesquisa internacional para a avaliação de competências cognitivas realizada até hoje e envolve 27 países, que constituíram as suas equipas, e Portugal é convidado a participar neste estudo pelo facto de ser um Estado- membro integrado na OCDE (Sociólogo, 60 anos, Anexo 4T; Ávila, 2011).

Mediante esta pesquisa pretende-se averiguar e mensurar conhecimentos e competências da população fundamentais para exercerem a sua participação nas sociedades atuais, envolvendo uma população que compreende indivíduos com idades entre os 16 e os 65 anos, sendo as entrevistas concretizadas no alojamento. De acordo com o relatório de atividades relativo a 2010, considera-se que a integração de Portugal neste estudo permitirá seguir de perto os novos desenvolvimentos teóricos, metodológicos e empíricos relativos a esta área de investigação. Naturalmente, os dados que daí advém possibilitam situar Portugal no contexto internacional no que diz respeito às competências da população adulta, assim como analisar e compreender o desenvolvimento dessas proficiências, mediante a comparabilidade de dados não só

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entre os países participantes, mas também deste estudo em relação aos anteriores (Ávila, 2011).

Este estudo torna-se ainda um desafio relativamente aos anteriores pelo facto de implementar algumas inovações, sendo que a divulgação destes resultados permitirá determinar novas estratégias de trabalho e redefinir políticas públicas em Portugal. Além disso, há também um número mais alargado de países participantes relativamente aos estudos anteriores; está patente um alargamento das próprias dimensões/ competências analisadas e avaliadas e há um papel central na utilização das tecnologias da informação. Esta pesquisa emprega “ferramentas diferentes, muito suporte eletrónico. Há 20 anos não havia tantas tecnologias culturais novas. Há um novo impulso em reconhecer a consciência pública dessas ferramentas e expandir a visibilidade no domínio das novas TIC” (Sociólogo, 60 anos, Anexo 4T).

Além disso, não podemos descurar que aquilo que é inovação é precisamente “a resolução de problemas – problemas intelectuais operativos - esta resolução de problemas é enriquecida em contextos quotidianos, que impregnam o quotidiano” e se compararmos este com o primeiro estudo desenvolvido internacionalmente – IALS – a originalidade está justamente no recurso às “novas tecnologias e na resolução de problemas intelectual formalizado” (Ibidem).

O Quadro 2.1 congrega os três estudos anteriormente mencionados e a evolução relativamente às competências avaliadas, constatando-se de uns para os outros, a incrementação de novas competências, ou seja, vai-se verificando um alargamento dos domínios referentes à literacia.

Quadro 2.1  Competências avaliadas no IALS, no ALL e no PIAAC IALS 1994-2000 ALL 2002-2006 PIAAC 2008-2013 Literacia em prosa Literacia documental Literacia quantitativa Literacia em prosa Literacia documental Numeracia Resolução de problemas --- Componentes de leitura Literacia em leitura Literacia em leitura Numeracia Resolução de problemas em cenários tecnologicamente enri- quecidos

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