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Quando se aborda a questão do desenvolvimento humano fala-se daquilo que denominamos como o ciclo vital de cada indivíduo, que o acompanha desde o nascimento até à velhice, passando pela juventude e pela idade adulta. Considerando o homem como um ser social e em relação, não só com o meio envolvente, mas também com a própria sociedade, está desde que nasce inserido num grupo social primário, onde tem início todo o processo de socialização, que é a família (Foufe Quintas & Sánchez Castaño, 1998; Castillo & Sánchez, 2003; Alvarez Núñez, 1992). Aliás, é precisamente neste ambiente que ele cresce e adquire normas de conduta, valores que norteiam o seu percurso. Bernstein considera que a socialização na família se desenrola no conjunto de

C

O que é ser homem ou mulher é uma definição social, pois a fisiologia é sempre mediada pela cultura.

(Turner, cit. por Schouten, 2011, p. 29)

As pessoas, hoje, não andam, correm; Não param, cruzam-se;

Não conversam, gesticulam; Não escutam, ouvem; Não veem, olham; Não sentem, reagem, Não convivem, estão juntas.

As pessoas, hoje, caminham lado a lado sem jamais se encontrarem.

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situações fundamentais que estão ligadas umas às outras. Neste sentido, e no final da análise que estabelece, distingue quatro tipos de situações: uma situação de inculcação moral, que corresponde à relação de autoridade ao longo da qual se inculca à criança as regras morais com os seus distintos fundamentos; uma situação de aprendizagem cognitiva, em que a criança alcança o conhecimento objetivo das pessoas e dos objetos e obtém aptidões/ capacidades de índole diversa; uma situação de imaginação ou de descoberta, em que a criança é alentada a experimentar e a recriar espontaneamente o seu mundo, de acordo com a sua conceção e à sua maneira e, por último, uma situação de comunicação psicológica, em que a criança aprende a receber os seus estados afetivos, bem como os dos outros (1975).

Não obstante, para além da família enquanto principal instância de socialização nas sociedades contemporâneas, há outros elementos que fazem parte desse grupo de socialização primária, mais restrito, nomeadamente os amigos, os vizinhos, e essa socialização perdura, através de grupos secundários, de certo modo mais institucionalizados, sendo exemplo disso a escola, o trabalho. Ressalve-se que o homem sente necessidade de se integrar em diversos grupos ao longo do seu percurso de vida.

Se o homem sente essa necessidade de se integrar em grupos distintos, o que é afinal um grupo? Maisonneuve considera que um grupo abarca “conjuntos sociais de variadíssima grandeza e estrutura” em que o “único traço comum (…) consiste na pluralidade de indivíduos e na sua solidariedade implícita” (2004, p. 5). Shaw, por sua vez, acentua que um dos fundamentos essenciais pelos quais se constrói um grupo tem a ver com o facto de existir um conjunto de pessoas com carências comuns, designadamente afetivas, lúdicas, económicas, e que, por isso, se agregam a fim de encontrar soluções (cit. por Alvarez Núñez, 1992).

Alvarez Núñez considera que existem elementos basilares que acabam por estar subjacentes a qualquer grupo. Deste modo, salienta cinco itens que caracterizam um grupo: um conjunto de pessoas que exercem entre si uma interação numa relação direta, em que existe uma influência mútua; a existência de propósitos e metas comuns, compartidos entre os vários elementos, deixando-se em aberto o facto de haver algum elemento com um objetivo específico; deve haver igualmente uma diferenciação de papéis e uma estrutura em que cada elemento do grupo tenha um papel específico no com o intuito de concretizar os objetivos comuns ao grupo; deve existir outrossim um sistema de normas e regras que demarcam e organizam a conduta de cada elemento do

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grupo; por último salienta-se a existência de uma consciência do grupo, ou seja, uma apreensão deste como entidade singular e diferenciada, juntamente (2002, p. 204).

Importa salvaguardar que, independentemente do âmbito do grupo de que falemos (por exemplo, trabalho, lazer), está patente uma diversidade de papéis que pode ser distribuída pelos vários elementos, mas importa que o objetivo seja unívoco para que não haja dispersão.

Não obstante, independentemente do tipo de grupo em que esteja inserido, “o indivíduo socializa-se, interiorizando valores, normas, disposições que o tornam um ser socialmente identificável” (Dubar, 1997, p. 79). Bernstein considera que, do ponto de vista sociológico, a classe social determina profundamente as formas de socialização. Aliás, assevera que a estrutura das classes influencia o trabalho e os papéis educativos, norteia as relações que as diferentes famílias possam ter umas com as outras e afeiçoa- se à experiência social primária adquirida no seio da família, acrescentando ainda que o sistema de classes influencia deveras a distribuição do saber entre os membros de uma sociedade (1975).

Para além do início de todo um processo de socialização, há outro aspeto que importa reter, ainda que tenuemente, e que tem a ver com os estudos desenvolvidos nomeadamente por Piaget, mais direcionados para a infância e adolescência, cuja teoria mantém a existência de um conjunto de mudanças que ocorrem com a idade e em que emerge o conceito de estádios de desenvolvimento cognitivos: sensório-motor, pré- operatório, operações concretas e operações formais (García Madruga & Carretero, 1991). Na teoria de Piaget é importante ressalvar que os estádios de desenvolvimento cognitivo pressupõem o aparecimento e a consolidação de mudanças qualitativas na estrutura da inteligência, assim como é possível efetuar previsões em torno das tarefas que estão associadas a determinada idade, de acordo com essa estrutura, uma vez que cada estádio possui uma determinada formalização de tipo lógico-matemático (Idem, p. 146). Conquanto, Piaget acabou por se focar essencialmente num universo de pequeninos e aquilo que nos ocupa neste estudo é um universo que corresponde à idade adulta. Não negamos que a infância e a adolescência são fundamentais para a construção do adulto, até porque na adolescência, por exemplo, é quando ocorrem as alterações físicas mais evidentes. Porém, vamos centralizar-nos mais em concreto na fase da idade adulta, que é aquela em que se insere o nosso objeto empírico.

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Quando pensamos na idade adulta a primeira e mais simples aceção que nos ocorre é que aquela que corresponde uma parte da vida do indivíduo que podemos situar num limite que vai desde os 20-25 anos até por volta dos 60-65 anos (Blanco Abarca, 1991; Rogers, 2002). Não obstante, consideramos que a idade não se pode constituir como uma forma de definição de um adulto, tendo em conta que diferentes indivíduos com a mesma idade não possuem o mesmo nível de desenvolvimento. Knowles considera que a noção de adulto pode ser entendida sob quatro aceções distintas: biológica, jurídica, social e psicológica (1990). De acordo com este autor somos adultos a partir do momento em que temos a capacidade de nos reproduzimos; em que podemos votar, conduzir, casar sem qualquer anuência; quando iniciamos no mundo do trabalho e, por último, quando temos ampla consciência de que somos responsáveis pelas nossas próprias vidas e possuímos a capacidade de autogestão (Knowles, 1990). Mucchielli, um pouco na lógica de Blanco Abarca e mesmo de Knowles, alude ao facto de este conceito englobar “homens e mulheres com mais de 23 anos e que ingressaram na vida profissional assumindo papéis sociais e responsabilidades familiares, contando com uma experiência direta do existir” (1998, p. 16). Mezirow encara, assim, o adulto como uma pessoa com idade suficiente para ser responsável pelos seus atos ou seja, alguém que está apto para compreender as suas decisões, para fazer opções lógicas com autonomia, tendo em consideração a sua responsabilidade social (2000, p. 24).

Consultamos, mais uma vez, o Dicionário de Língua Portuguesa, para percebermos qual a aceção que este nos daria acerca deste conceito e apercebemo-nos que o adulto é aquele que “já está em idade compreendida entre a adolescência e a velhice”, aquele “que já atingiu todo o desenvolvimento” (Dicionário Priberam de Língua Portuguesa). Esta visão genérica acaba por ser, do mesmo modo, uma visão também reducionista desta fase da vida dos indivíduos.

Não obstante, a definição que acaba por estar patente em cada um destes autores e mesmo no dicionário, acaba por se tornar demasiado incompleta, uma vez que, tal como salienta Blanco Abarca, o tempo e a idade, também uma natureza cronológica, detém um significado sociocultural de maior relevo (1991, p. 203). Fundamentando-se em estudos de distintos autores, e na sequência desta incompletude do conceito, Blanco Abarca alude ao facto de o indivíduo não ser unicamente um ser histórico quando se pensa na idade, mas ele é um ser social, um elemento ativo de una estrutura de papéis e estatutos (Ibidem). Aliás, este não pode ser encarado simplesmente de acordo com os

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distintos momentos da sua cronologia, há uma diversidade de ocorrências que se estendem ao longo desses anos, que alternam segundo a sociedade e os momentos que vão preenchendo a própria história (Blanco Abarca, 1991).

Rogers, considera ainda, nesta lógica, que esta designação pode remeter-nos para um estádio no ciclo da vida, afinal todos somos inicialmente crianças, posteriormente jovens e só depois adultos, mas pode também encaminhar-nos para um subconjunto social, em que os adultos são necessariamente distintos das crianças ou pode ainda incluir um conjunto de ideias e valores, que correspondem à vida adulta (2002). O mesmo autor salvaguarda que este é um conceito em que se sentem dificuldades em termos de definição, mas quer a infância, que encerra o início da vida de um indivíduo, quer a vida adulta estão imbuídas de uma construção social. Singer traça algumas linhas em torno desta temática, acrescentando que “de todas as idades, é aquela que forma, dirige e modela a realidade social e individual” (2004, p. 89).

Levinson, nas pesquisas que efetua, distingue três períodos no ciclo de vida de um homem adulto, considerando aquilo que podemos designar como uma idade adulta preambular, uma meia-idade adulta e uma idade adulta tardia (1978). Não esqueçamos que para as mulheres, tal como para os homens, as épocas são distintas, cada uma com o seu carácter peculiar. Em cada época homens e mulheres atravessam a mesma sequência de períodos no desenvolvimento da idade adulta e as mesmas idades (Levinson, 1996, p. 413).

Embora se pudesse pensar que esta fase da idade adulta era marcada pela estabilidade, Levinson reitera que ela é preenchida por momentos de estabilidade realmente, mas também por períodos de transição (1978). Tal como salienta Fonseca, acerca da perspetiva de Levinson, existe uma “alternância de períodos de «construção de estruturas» e períodos de «mudança de estruturas» ” (2005, p. 46). Se pensarmos no dia a dia, constatamos que há, efetivamente, momentos em que não necessitamos de mudar aquilo que temos, mas há outros em que, por diversas circunstâncias, nos conduzem a momentos de reflexão, de exploração e mesmo transformação, o que acaba também por nos encaminhar para novas aprendizagens e faz com que haja um constante dinamismo nas práticas dos indivíduos.

Outrossim, para percebermos um pouco mais toda esta imbricação, veja-se a Figura 3.1, em que se tenta perceber as ocorrências a nível social e a nível individual

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que acabam por conduzir à maturidade do indivíduo adulto e a partir do qual vamos percebendo aquilo que temos vindo a mencionar.

Nível social Nível individual

- Matrimónio

- Paternidade/ Maternidade - Trabalho

Socialização

Fonte: Adaptado de Blanco Abarca, 1991, p. 207. Figura 3.1  Critérios que definem a maturidade

Idade cronológica Na nossa sociedade situa-se entre os 20-25 anos e os 60-65 anos

Através da idade cronológica o indivíduo adquire

Estatuto da idade

Este estatuto e posiciona- mento na estrutura da idade traduz-se no ato de assumir

Papéis

Posição e localização do indivíduo no seio do estrato da idade adulta

- Ações, atitudes, comportamentos que se esperam das pessoas que se encontram dentro da faixa da idade adulta.

- Normas da idade, buscas e expectativas sociais, tarefas de desenvolvimento

O conteúdo destes papéis varia consoante

- Industrialização; - Oscilações económicas; - Acontecimentos históricos;

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Efetivamente, a idade cronológica em cada indivíduo apresenta limites temporais, tal como já salientámos. Contudo, essa idade cronológica, a nível social, permite a cada indivíduo aquilo que é denominado como o estatuto da idade e que lhe vai permitir desenvolver determinados papéis sociais  o de marido/ esposa, o de pai ou mãe e o de trabalhador/ trabalhadora, sendo estes apenas alguns de entre uma infinidade de outros papéis sociais que acabam por estar associados à idade adulta (Blanco Abarca, 1991). Tal como salvaguarda Fonseca “o desenvolvimento supõe a ocorrência de mudanças ao nível do funcionamento e do comportamento individuais” (2005, p. 19).

Não esqueçamos, todavia, que há uma série de fatores  industrialização; oscilações económicas; acontecimentos históricos ou mesmo características culturais ou de uma subcultura  não só a nível individual, mas também social. O processo de socialização de cada indivíduo acaba por ser feito disso mesmo. Aliás, “as abordagens culturais e funcionais da socialização acentuam uma característica essencial da formação dos indivíduos: esta constitui uma incorporação dos modos de ser (de sentir, de pensar e de agir) de um grupo, da sua visão do mundo e da sua relação com o futuro” (Dubar, 1997, p. 79).

Através da Figura 3.1, anteriormente apresentada, constatamos que ali acabam por estar patentes os critérios que definem a maturidade de um adulto. Quando falamos da maturidade de um adulto não podemos olvidar um conceito relevante, que é a motivação. Esta noção foi apresentada por Maslow, um dos autores mais proeminentes nesta área, que analisa a importância da recompensa de necessidades na motivação humana. A motivação é, enquanto “processo”, aquilo que provoca e impele para a adoção de uma determinada conduta, que sustém uma atividade e que a orienta num determinado sentido, o que nos leva a considerar que é aquilo que espicaça, que conduz e condiciona comportamentos (Balancho & Coelho, 1996, p. 17). Castillo e Sánchez frisam que a motivação pode ser entendida como a causa ou a razão que move uma pessoa a atuar de determinada forma (2003, p. 20). Pode, assim, a motivação ser considerada como a força motriz que impele e move os indivíduos em muitas situações. É inegável que todos os indivíduos têm necessidades e essas necessidades são fonte da motivação. Aliás, sempre que sobrevém uma determinada carência, cada pessoa atua consoante essa motivação, de modo a satisfazê-la. Mediante uma leitura da Figura 3.2 deparamo-nos com cinco tipos de necessidades, que se apresentam de forma

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ascendente, hierárquica e em níveis distintos e que contribuem para o crescimento permanente dos indivíduos.

Fonte: Adaptado de Maslow, 1970; Castillo & Sánchez, 2003, p. 20; Rogers, 2002, p. 96.

Figura 3.2  Pirâmide das motivações de Maslow

Posto isto, podemos constatar que na base da hierarquia estão as necessidades que denominamos como básicas  fisiológicas. Nestas englobamos a fome, a sede, o sono, o descanso, mas também a atividade. Logo de imediato encontramos as necessidades físicas e de segurança, onde se insere a estabilidade, a proteção, o bem-estar psicológico e a confiança. A meio da hierarquia fala-se das necessidades de pertença e de amor, em que se enquadra a necessidade que as pessoas têm de amor e de afeto, mormente a de criar amizades, relações que se alimentam quotidianamente, como é exemplo a necessidade de os indivíduos se inserirem em grupos distintos. As necessidades de estima ocupam o quarto patamar desta pirâmide e estão associadas ao respeito e à estima, não só de cada pessoa, mas em relação a todos os outros com quem se relaciona. No topo da hierarquia emergem as necessidades de autorrealização que, tal como o próprio nome sugere, estão associadas à autossatisfação de cada indivíduo.

Não obstante esta hierarquia ela não é forçosamente a mesma para todas as pessoas, uma vez que essa situação depende da importância que cada pessoa atribui às

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suas necessidades individuais e depende também das circunstâncias que envolvem as pessoas e que podem levá-las a alterar essa ordem hierárquica (Castillo & Sánchez, 2003; Maslow, 1970; Rogers, 2002).

Falar desta fase da vida dos indivíduos torna-se necessário na medida em que este é o universo, num panorama mais macro, dos cursos de educação de adultos e deste grupo em particular. O dinamismo que caracteriza a idade adulta deve acompanhar do mesmo modo a política educativa que em Portugal se vai desenvolvendo, com o intuito de apoiar estes adultos na sua constante construção a todos os níveis.

3.2. O universo feminino e as questões de género: uma ponte com o objeto empírico

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