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O PENSAMENTO DE BOFF NA DISCUSSÃO SOBRE ECOLOGIA

3.1 Parte 1: Científica

3.1.3 A nova lógica: o diálogo da inclusão

Diante da percepção desta complexidade, Boff propõe uma nova lógica, a lógica designada por ele de pericorética, a qual procura o diálogo em todas as direções e em todos os momentos, supondo a atividade mais inclusiva possível. Nesta lógica, tudo interage com tudo em todos os pontos e em todas as circunstâncias. O presente borbulha com características distintas de um passado não muito distante, e se mostra nessa complexidade antes nunca vista, e, por isso, há a necessidade do novo em todos os conceitos para que se tenham ferramentas competentes aptas para lidar com esta nova realidade.

Neste sentido, tudo está em evolução, pois veio do passado, se concretiza no presente e se abre para um futuro próximo. Pensar em ser humano, como parte do processo, implica pensar em interconexão.

Seguindo, Boff insere mais um elemento em seu pensamento, o cuidado. Ao introduzir esse termo, ele recorre à figura da mulher como geradora de vida. A mulher se torna fonte de inspiração na elaboração de uma nova aliança, pois sua sensibilidade lhe mune da capacidade de ouvir a mensagem das coisas e de re-ligar todas as coisas numa totalidade dinâmica.

Ao propor um novo paradigma, no contexto científico, na perspectiva de uma nova lógica, Boff também propõe a unificação das perspectivas de mundos, ou seja, o universo deve ser compreendido apenas por uma abordagem onde espírito e matéria se pertencem mutuamente, uma vez que são resultados de um princípio gerador inicial. A implicação é que tal universo unificado tem a força de se auto- organizar em todas as direções, seja espiritual, seja material. Nesta dinâmica a

evolução faz todo sentido, pois ganha a capacidade de explicar tudo o que não é matéria a partir da idéia de que num simples átomo há um quantum de espontaneidade que se desenvolve por si próprio até alcançar as estruturas mais complexas. Esta é outra base que ele lança rumo à compreensão de uma divindade plenamente compreendida como parte de todas as coisas.

Neste jogo de relações com base na auto-organização de todas as coisas, a vida é compreendida desde a origem do universo como resultado das reações das primeiras energias que se interagiram gerando o autoconsciente encontrado no ser humano. Esta é a tentativa de Boff em se basear na ciência para entender a totalidade do ser humano matéria e espírito, destacando o trabalho de bioquímicos, para afirmar que o processo evolucionário avança e se torna ainda mais complexo, o que resulta em maior interioridade, consciência e autoconsciência, onde tudo possui certo nível de vida e espírito.

Há algumas dificuldades nesta reflexão. Uma por exemplo, o fato de certo alimento participar de minha vida não pode significar que eles possuem espírito que alimenta meu espírito, ainda que carregue em si uma marca comum presente em cada partícula desde o início da criação. Refletir nesta direção é conferir identidade às coisas inanimadas e chegar ao ponto que buscar o contato com determinada matéria para que tal gerasse no ser vivo algum acréscimo imaterial. É certo que Boff está dizendo isto, pois é enfático em afirmar que uma montanha é portadora de espírito e vida uma vez que também tem uma linguagem que se percebe no discurso do universo (BOFF, 2004, p.50).

Para Boff a visão dicotomizada de seres bióticos e abióticos é uma redução da realidade, pois a própria ciência confere a captação de energia em ambas as

categorias, chegando a afirmar que tudo é energia e tudo está interconectado com tudo e por isso tudo possui sua interioridade e é espiritual. O que ocorre no homem é que este espírito ganha expressão autoconsciente. Assim, a própria natureza é quem confere o ser humano ser como é, nas palavras de Boff, o ser noosférico da evolução. Neste sentido e neste ponto da reflexão, um ser divino e único, distinto no sentido ontológico, é totalmente retirado de cena, uma vez que Deus é projeção da mente deste ser, o qual não se conta que é parte desta divindade. Esta seria a nova concepção religiosa, pois agora há uma nova realidade que está levando a humanidade a uma nova reflexão. Neste sentido a divindade se materializa no acaso, ou o acaso se materializa no divino, pois é sua fonte e sua essência.

A conclusão de Boff é que Deus é o elemento unificador, que faz o caos ser generativo e que mantém a ordem sempre aberta a novas intenções. Em outras palavras, todas as coisas existem em forma de caos e ordem como dimensões da mesma realidade e necessários para a evolução no universo. Na base originária deste universo estão as dimensões da mesma realidade complementares e recíprocas. Daí a idéia do processo evolucionário, num percurso que está totalmente aberto para o futuro. Neste ponto Boff destaca breve solução para o problema ecológico, nesta evolução com caráter irreversível de troca constantes de energias, no qual o ser humano tem poder para retardar o processo, prolongando as condições de sua vida e do planeta. Boff insiste que o universo tem a capacidade de se auto-organizar de modo a gerar vida complexa, capaz de fugir do que ele chama de entropia. Diante de tal reflexão, como compreender que o universo consciente, que evolui de tal forma a materializar sua consciência em forma humana, permite que dentro de si mesmo tal situação de crise irreversível? Se evolui, se aprende com

seus erros, se já passou por situações semelhantes, como esta consciência materializada do universo age de modo tão destruidor? Está claro a interdependência entre todos os seres do universo, mas a partir daí conferir a tudo uma consciência comum é ignorar a distinção ontológica entre criador e criatura, assunto que trataremos mais adiante.