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A CRISE DO MEIO AMBIENTE E A TEOLOGIA DE LEONARDO BOFF: UMA RESPOSTA NA PERSPECTIVA DA TEOLOGIA EVANGELICAL

4.1. Uma perspectiva evangelical quanto ao problema do meio ambiente

4.1.10 O alvo escatológico

O texto de Romanos é claro na afirmação de que a criação foi subjugada à nulidade, mas ela será redimida do cativeiro.

Porque a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua vontade, mas por causa do que a sujeitou, na esperança de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação geme e está juntamente com dores de parto até agora. E não só ela, mas nós mesmos, que temos as primícias do Espírito, também gememos em nós mesmos, esperando a adoção, a saber, a redenção do nosso corpo. Porque, em esperança, somos salvos. Ora, a esperança que se vê não é esperança; porque o que alguém vê, como o esperará? Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o esperamos (Romanos 8. 20 – 25).

Para a tradição teológica cristã é ponto central a convicção de que a história tem origem e fim, onde ambos estão enraizados no plano e poder de Deus. Para que possa haver uma história da salvação, o tempo tem que ter seus limites e deve se mover sem repetição numa única direção (DALEY, 1994, p. 311). Nesse sentido, vale a frase de Bart (2000, p. 484): Cristianismo que não seja totalmente escatologia, nada, absolutamente nada tem a ver com Cristo. Ou seja, o cristianismo verdadeiro se completa, se realiza, se confirma, através da morte e da ressurreição de Cristo.

Diz o Dr. Shedd (1991, p. 7):

Segundo o Novo Testamento, o fim (eschaton) foi inaugurado com a encarnação, morte e ressurreição de Jesus Cristo, o Messias. Os “últimos dias” (Hb 1.2) já começaram. Paulo afirma: “Vindo, porém, a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu filho” (Gl 4.4), apontando para o início de uma nova época.

A palavra escatologia pode ser compreendida como doutrina religiosa sobre as últimas coisas. É a esperança dos cristãos de que sua presente sede por Deus será preenchida, que sua presente necessidade de livramento e salvação será

realizada. É a expectativa de que nossas opções e padrões de ação nesta presente vida humana encontrarão relevância última na retribuição administrada por um Deus que é bom, sábio e poderoso (DALEY, 1994, p.13).

McGrath (2005, p. 626) entende que a escatologia do Novo Testamento é bastante complexa. Ele também compreende que o tema central aponta para o fato de que um evento ocorrido no passado inaugurou algo novo, que será sua consumação final apenas no futuro. Neste sentido, o cristão encontra-se preso na tensão entre o “agora” e o “ainda não”. A saber, para o crente a escatologia pode significar uma confiança de que, a união com Deus em conhecimento e amor, que já se iniciou na presente vida de fé, será consumada algum dia numa existência livre de todas as limitações que a vida terrena impõe.

Para Ladd (2001, p. 509), o alicerce de todo pensamento teológico de Paulo é o do dualismo apocalíptico desta era e da era vindoura. Os eventos da consumação escatológica não são eventos meramente destacados que estão no futuro, sobre o qual Paulo especula. São, pelo contrário, eventos redentores, que já começaram a se mostrar na história. Neste sentido, as bênçãos do século vindouro não estão mais exclusivamente no futuro, mas tornam-se objetos da experiência presente.

O próprio cosmos, que foi dilacerado pelo conflito e rebelião contra Deus e está gemendo com dores de parto, será restaurado à paz com seu Senhor. A meta do propósito da redenção por parte de Deus é a restauração da ordem em um universo que foi perturbado pelo mal e pelo pecado. Assim, a restauração final inclui o mundo material. Esta é a salvação que é e será operada na criação.

O alvo escatológico tem sua base na ação soberana de Deus. Este agir soberano é a manifestação do seu amor como garantia da esperança escatológica.

Esta esperança escatológica, diante do sofrimento, não é etérea e nem deve ser reduzida a uma visão puramente antropológica, mas deve ser compreendida no sentido universal que liga as realidades, antropológica e cosmológica. Neste contexto temos, em termos de conteúdo, a semelhança na presença incontestável do sofrimento e esperança pela glória futura. É Deus quem presenteia toda a criação com a esperança.

Ao perfil soteriológico do texto pertence a inclusão da criação na esperança escatológica dos filhos de Deus. Esta inclusão livra o pensar escatológico da abstração filosófico-antropológica individual e coletiva e obriga a perguntar de maneira nova pelas conseqüências que emergem das dimensões universais concretas da esperança escatológica tal qual concedida em Rm 8.18 – 27 (WIESE, 2004, p.102).

A revelação dos filhos de Deus, como expectativa escatológica da criação, é uma afirmação singular, pois em nenhum outro lugar no Novo Testamento os filhos de Deus são objetos de esperança escatológica. Antes, pelo contrário, filhos de Deus é o sujeito da esperança escatológica. Por isso, são agentes ativos no cosmos numa expectativa comum: certeza da libertação final do poder do pecado de todo o cosmos.

Essa expectativa apresenta o quão glorioso será aquele dia quando todas as restrições resultantes do pecado do homem terão sido removidas. Então veremos a maravilhosa criação atingindo a auto-realização e, finalmente, chegando ao seu alvo, à completa liberdade e, assim, participando da gloriosa liberdade dos remidos do Senhor (HENDRIKSEN, 2001, p.356).

A libertação prevista para a criação é libertação da escravidão da corrupção, no tempo da revelação dos filhos de Deus. A implicação está na compreensão da corrupção como condição de ser escravo da morte, da deterioração e da

transitoriedade, que é o próprio oposto da condição da glória. Quando, finalmente os filhos de Deus se tornar manifestos, a criação receberá sua própria e total liberdade. Assim, ela poderá cumprir o pleno desígnio do criador (CRANFIELD, 2005, P.821).

A libertação escatológica da criação não tem um fim próprio. A conclusão é clara, pois esta libertação conflui para a liberdade da glória dos filhos de Deus (21b). A implicação desta afirmação está na relação e finalidade primeira entre ambos. A ligação entre a esperança escatológica da criação e dos filhos de Deus representa um exercício concreto da cidadania humana no trato da criação como um todo. Isto requer um pensar teológico responsável e coerente (WIESE, 2004, p.199).

Os cristãos são livres e, ainda assim, esperam pela libertação derradeira. São redimidos e ainda esperam pela redenção definitiva. São glorificados e ainda aguardam pela glorificação plena.

A criação e o ser humano estão muito próximos um do outro. Segundo Paulo, a sorte de um recai sobre o outro, a expectativa de um também é a expectativa do outro. Isto pode ser percebido na conexão entre os versos 19 a 23, cujo elo central é o próprio Deus, o sujeito da libertação e revelação.