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2.1 Tópicos Sobre a Fundamentação Legal e Normativa da Assistência Social

2.1.3 A Perspectiva Territorial como inovação da Política de Assistência Social

Ao adotar a territorialização como um dos eixos estruturantes do SUAS, a PNAS busca traçar uma estratégia para otimização dos recursos e gastos públicos ao passo que possibilita uma política social mais comprometida com as peculiaridades das cidades brasileiras. O conceito de território do qual a literatura na área do serviço social se aproxima, tendo como referência as autoras Dirce Koga e Aldaíza Sposati, se remetem à abordagem de Milton Santos, expoente brasileiro do Movimento de Renovação da Geografia37.

Na perspectiva desse movimento, influenciado por obras de autores como Marx, Engels, Lênin e Rosa Luxemburgo, entre outros, os métodos de interpretação passam a centrar-se no

36 Sistema online de funcionalidades específico para a gestão do SUAS, vinculado ao MDS, com informações sobre: planejamento das ações co-financiadas; prestação de contas; conta corrente, saldos e repasses; e Benefício de Prestação Continuada (BPC) (BRASIL, MDS, disponível em: www.mds.gov.br/assistenciasocial/redesuas/suasweb. Acesso em 24/01/2015).

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materialismo histórico-dialético, através da explicitação de determinados processos sociais enquanto reprodução ampliada do capital e de conflitos políticos em diversos países (SAQUET e SILVA, 2008).

O território é compreendido, então, como uma dimensão que vai além do espaço geográfico, que se relaciona com a dinâmica de ocupação, formação (econômica, política, social e cultural) e das relações sociais estabelecidas em espaços delimitados de diferentes escalas, resultando, conforme Marcos Aurélio Saquet (apud BORDO, 2013), na formação de territórios heterogêneos e sobrepostos que se fundam nas contradições sociais.

A perspectiva territorial perpassa ainda pela relação entre a forma pela qual a população se estabelece em um espaço e a forma pela qual o poder público responde a esta “ocupação” através do direcionamento de serviços, equipamentos e investimentos públicos, remetendo-nos ao padrão de urbanização brasileiro delineado por Nakano (2009) que fragmenta as cidades entre legal e irregular, formal e informal.

Isso significa dizer que a compreensão da forma pela qual as cidades, por exemplo, se constituíram ao longo da história, bem como das relações presentes nesse processo de formação (ressaltando a presença da lógica capitalista) trazem consigo possibilidades diferenciadas de compreensão das vulnerabilidades sociais expressas no território, as quais não se fazem representadas apenas pelos cálculos estatísticos e indicadores socioeconômicos em si.

Nesse sentido, nas palavras de Milton Santos (2000 apud KOGA; ALVES, 2012, p.78- 79), o território “se torna um conceito utilizável para a análise social quando o consideramos a partir de seu uso, a partir do momento em que o pensamos juntamente com aqueles atores que dele se utilizam”.

Considerando que é no território que se materializa as expressões da questão social, a política de assistência social vincula a territorialização ao princípio da descentralização político-administrativa e à função da vigilância socioassistencial sob a perspectiva do porte dos municípios. Assim, busca-se a criação de elementos que subsidiem a prevenção ou enfrentamento das situações de vulnerabilidade e risco social e a identificação de grupos populacionais em situações similares bem como das possíveis potencialidades existentes no território.

A abordagem territorial adotada pela política de assistência social é considerada como um grande avanço na medida em que “reconhece os condicionamentos de múltiplos fatores

sociais, econômicos, políticos, culturais, nos diversos territórios, que levam segmentos sociais e famílias a situações de vulnerabilidade e risco social” (COUTO, et. al., 2012, p. 73) e possibilita a organização de serviços e programas sob a lógica da proximidade do cidadão.

Os CRAS, por sua vez, figuram como a possibilidade de aproximação entre o poder público e os “territórios vulneráveis”, que são identificados, conforme aponta Koga (2009), através das variáveis sugeridas pela NOB/2005, que, com base na matricialidade sociofamiliar, sugerem aspectos como a condição de infraestrutura habitacional, a renda, a presença de trabalho infantil e a presença de grupos geracionais e/ou pessoa com deficiência.

No entanto, deve-se ter atenção sobre a utilização da abordagem territorial pelas seguintes questões, que podem distorcer o seu significado (COUTO et. al., 2012):

● a não utilização de ações que possibilite a atribuição de estigmas aos denominados “territórios vulneráveis”, de modo que leve a sua segregação e ao isolamento e despolitização da participação popular dos indivíduos, limitando sua mobilidade pela cidade.

● as noções de risco e vulnerabilidade social, as quais não devem ser, simplesmente, remetidas aos territórios onde se inserem e se organizam os serviços socioassistenciais, mas compreendidas como situações geradas por “uma cadeia complexa de fatores” (COUTO et. al.,, 2012, p. 75) à qual estão expostos indivíduos, famílias e classes sociais não atendidos ou atendidos precariamente pelo sistema de proteção social público;

● a compreensão de que grande parte das vulnerabilidades sociais vivenciadas pelos usuários da política de assistência social não se originam na dinâmica local, mas em processos estruturais decorrentes de fatores como os rumos da política econômica e sua dissociação das políticas sociais, a precarização do trabalho e o enfraquecimento das instituições de proteção social. Nesse sentido, é necessário considerar diferentes escalas territoriais (microterritórios e macroterritório nacional).

Resumidamente, essa apresentação dos componentes legais, normativos e conceituais da assistência social não chega a contempla-la por inteiro, entretanto é suficiente e necessária para que se dê continuidade à discussão pertinente a este estudo.

A seguir serão assinalados alguns aspectos do debate teórico sobre a assistência social e sua garantia enquanto direito social, para só no capítulo seguinte, adentrar-se, então, na especificidade dos benefícios eventuais.