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CAPÍTULO 3- PROFESSORES DE HISTÓRIA: PRÁTICAS E PERFIS

3.2 A pesquisa na escola “A”

Antes dos relatos de observação sobre as aulas dos oitavos e nonos anos da escola “A”, faz-se necessário apresentar alguns dados que julgamos relevantes para o entendimento de alguns fatos ocorridos durante esta pesquisa. A professora titular das aulas

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de História, cujo nome fictício é Rute, assumiu seu cargo de professora de História de Ensino Fundamental na metade do ano letivo, mais precisamente no final de julho de 2010. Ela havia sido aprovada em concurso público realizado no final de 2008, no final do mandato do prefeito anterior, que não convocou de imediato os professores aprovados.

Após as eleições municipais do ano de 2008, o prefeito eleito, durante o seu primeiro ano de exercício, também não convocou os professores aprovados no concurso a assumirem seus cargos. Se eles não fossem chamados a assumir seus cargos, perderiam o concurso, que caducaria em 2010. Mediante essa situação, o Sindicato Municipal dos Professores de Itatiba solicitou à Secretaria Municipal de Educação de Itatiba a convocação dos professores aprovados para assumirem seus cargos.

Assim, mediante a intervenção do sindicato, alguns professores foram chamados a tomar posse na metade do ano letivo. Embora o direito dos professores concursados tivesse sido respeitado, a convocação para os novos docentes assumirem seus cargos acarretou também perdas, tanto para os professores não efetivos que ministravam aulas livres e tiveram que deixá-las, pois foram atribuídas para o professor concursado, quanto para os alunos, que estavam habituados com as práticas pedagógicas e com a presença do antigo professor.

Ao convocar os professores a assumirem as aulas na metade do ano letivo, a administração municipal não levou em conta tais consequências. Se os professores fossem chamados com antecedência para assumirem seus cargos, iniciariam em suas salas de aula no início do ano letivo de 2010. Essa ação não prejudicaria o andamento da aprendizagem escolar, nem a organização das escolas ou da vida pessoal dos professores.

No caso especificamente da escola “A”, o professor Joaquim, que havia assumido as aulas de História, até então livres, dos sétimos, oitavos e nonos anos, teve que deixar as dos últimos anos do Ensino Fundamental para a professora Rute, concursada, em virtude também da organização da escola.

O corpo gestor da escola “A”, que também assumiu a escola no início de 2010, organizou o horário das aulas da seguinte forma: no período da manhã, aulas para as séries finais do Ensino Fundamental; e, à tarde, para as séries iniciais, entendendo que, dessa forma, agrupando alunos de faixas etárias semelhantes em um mesmo período, contribuiria

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para melhor distribuição dos alunos na escola, evitando também problemas de indisciplina. Além disso, os alunos de Ensino Fundamental I, ou seja, de 6 a 10 anos, que estudavam no período da tarde, não teriam contato com os jovens dos últimos anos do Fundamental II, principalmente nos intervalos de aula, pois a preocupação, tanto da escola como dos pais, era de que os alunos menores corressem o risco de se machucar, pois os alunos maiores, em suas brincadeiras, poderiam, sem querer, machucar os menores.

A professora Rute, que assumiu as aulas de História, já era professora concursada de Ensino Fundamental da rede Pública Estadual, na área de alfabetização, com 25 anos de magistério público. É uma professora municipalizada, ou seja, trabalha na Prefeitura Municipal de Itatiba, emprestada para o município após a municipalização do Ensino Fundamental na cidade, concluída no ano de 2000, mas é efetiva no Estado, em situação funcional semelhante à de muitos professores da Rede Pública Municipal de Itatiba. Itatiba foi a primeira cidade do estado de São Paulo a municipalizar o Ensino Fundamental do primeiro ao último ano.

Rute foi diretora de escola designada durante muitos anos, ficando, portanto, sem atuar em sala de aula. Deixou o cargo de diretor de escola, que era um cargo em comissão, e voltou a lecionar no Ensino Fundamental, em sala de alfabetização, há pouco tempo.

Enquanto atuou em sala de aula, sua prática pedagógica foi dedicada à alfabetização de crianças de 6 a 10 anos. Nunca havia lecionado para adolescentes. Assumindo aulas nos últimos anos do Ensino Fundamental, deparou-se com alunos de 13, 14 anos e com uma dinâmica de ensino, de aprendizagem, de comportamento totalmente diferente daquela com que esteve habituada a trabalhar ao longo dos anos de atuação no magistério.

Alguns comportamentos desses adolescentes em suas aulas são entendidos por ela como indisciplina ou, ainda, como falta de interesse pelos estudos; e ela afirma que a indisciplina e o desinteresse estão presentes não apenas nas suas, mas em todas as outras aulas, de outras disciplinas, segundo queixa constante de seus colegas professores. “O

desinteresse é geral”, afirma veementemente.

Durante todo o tempo em que as aulas da professora foram observadas, pudemos constatar que elas se resumiam a textos didáticos sobre fatos históricos, lidos pelos alunos e

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explicados por ela. Logo após, questionários eram respondidos por uma pequena parcela dos estudantes.

Observamos também a preocupação da professora Rute com a forma de explicar os textos para ser entendida e com o desinteresse das turmas.

Essa prática pedagógica da professora nos fez decidir a observar também as aulas do antigo professor da turma, o professor Joaquim, que continuou ministrando aulas na escola, no período contrário, pois acreditávamos que, nas aulas dele, encontraríamos um repertório mais representativo e teríamos oportunidade de analisar, mais do que a diversidade de situações, estruturas emblemáticas para o estudo da cultura contemporânea. Interessou-nos, sobretudo, a relação que os alunos tinham com o professor, diferente da relação com a professora Rute.

Em um dos dias de observação das aulas da professora Rute, o professor Joaquim foi dar um recado aos antigos alunos da classe sobre um projeto de que a escola estava participando, no qual ele era o orientador de um grupo. A forma como os alunos receberam o professor, demonstrando grande simpatia por ele, chamou-nos a atenção. Além disso, o professor demonstrou-se solícito em nos auxiliar na pesquisa, dizendo que, se houvesse necessidade, poderíamos assistir também às suas aulas.

Estava aí a oportunidade de confrontar duas práticas pedagógicas diferentes em uma mesma escola e de refiná-las ou refutá-las, não com o interesse de compará-las para saber quais seriam as mais apropriadas, mas de pensar no movimento dos artefatos da cultura contemporânea nas aulas. De todo modo, há aqui um esforço para analisar em conjunto esse encontro de culturas. Culturas podem ser fronteiras entre as pessoas. E essas talvez sejam as mais difíceis de serem transpostas.