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CAPÍTULO 1 – CARTOGRAFIA DA PESQUISA

1.8 Apresentação dos dados

1.8.1 Apresentação dos resultados da categoria profissional

1.8.1.1 Feminização do magistério

O questionário aplicado aos 46 professores da área de Ciências Humanas do Ensino Fundamental da rede municipal de ensino de Itatiba, como dito anteriormente, teve como objetivo traçar o perfil socioeconômico e cultural dos pesquisados, a fim de subsidiar um estudo quantitativo e qualitativo da população de professores estudada.

A análise das condições de vida e de trabalho dos professores, de seu perfil socioeconômico revelou muitas semelhanças entre o corpo docente de ambas as escolas pesquisadas. Segundo Goodson (1995), o estilo de vida do professor, dentro e fora da sala de aula, suas identidades, seus hábitos e culturas, têm grande relevância sobre seus modos de ensinar, razão pela qual precisam inserir-se como ponto de partida para pensar e discutir tais práticas pedagógicas.

Para analisar os dados coletados, optamos por apresentar separadamente o perfil socioeconômico e o cultural dos professores. Iniciaremos com os dados que revelaram o perfil socioeconômico dos docentes das escolas pesquisadas. A partir dos dados coletados, pudemos descobrir quem são esses professores, quais são seus hábitos, seus gostos, como vivem e trabalham.

Nas duas escolas pesquisadas, identificamos semelhanças entre os dois grupos, mas também, singularidades. O corpo docente dessas escolas constitui-se na sua maioria, assim como em todo o país, por mulheres: 85% dos professores são do sexo feminino e 15%, do masculino. Dos 46 professores entrevistados, 39 eram mulheres. Em ambas as escolas, as mulheres predominam: são 90% na escola A e 82% na escola B.

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A feminização do magistério é característica marcante, principalmente na Educação Básica, de acordo com o Censo do Professor, realizado em 199714; com o Censo dos Profissionais de Educação Básica de 200315; e com o Educacenso16, realizado em 2007. Em 1997, o Censo de Professor já apontava que 85% da amostra era composta por mulheres.

A presença feminina no quadro do magistério aconteceu ao longo de todo o século XIX, a princípio de forma lenta e depois de forma assustadoramente forte, relacionada principalmente com a expansão do ensino público primário; e continuou pelo século XX, até hoje.

Segundo Louro (2000)17, seus estudos não só no Brasil, mas também realizados em outros países, revelaram que o magistério tinha passado por um processo de feminização em muitas sociedades. A autora nos chama a atenção sobre o gênero como uma construção social feita sobre as diferenças sexuais. Ela ressalta que privilegia o conceito de gênero não como aquele ligado ao desempenho de papéis masculinos ou femininos, mas, sim, ligado à produção de identidades múltiplas e plurais de homens e mulheres no interior de práticas sociais e, assim, nas relações de poder.

Essas relações, ainda na esteira dessa autora, determinam as formas como as instituições são organizadas e percebidas. No Brasil, a escola foi inicialmente um espaço marcadamente masculino.

Conduzida ao longo dos séculos XVII e XVIII por jesuítas e oratorianos e dirigida à formação de meninos brancos da elite, aos poucos, a instituição escolar viu-se obrigada a acolher meninos de outras etnias e também meninas. E, para atender a essa nova demanda,

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O Ministério da Educação e Cultura – MEC –, por meio do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP –, realizou, pela primeira vez em 1997, o Censo do Professor em âmbito nacional, de professores de escolas públicas e privadas da educação básica, com o objetivo de orientar as políticas educacionais. Os dados foram divulgados em 1999.

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Também o MEC, através do INEP, realizou em 2003 o Censo dos Profissionais do Magistério, para atualizar os dados de 1997 e consolidar as políticas públicas implementadas na área. O censo não obteve êxito em seu propósito inicial, pois, apesar de ter sido organizado para ter um alcance censitário, a coleta de dados coincidiu com o final do ano letivo em algumas escolas, o que impossibilitou a entrega dos formulários. As análises foram feitas por estimativa. Os dados foram divulgados em 2006.

16 No ano de 2007, o INEP adotou o “Educacenso”, possibilitando novas informações e modificações

metodológicas e conceituais.

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precisou se transformar. Quando a escola se viu obrigada a incorporar grupos sociais antes excluídos, procedeu garantindo as diferenças. Mas, segundo Louro, ela se transformou, sem, no entanto, “alterar uma das suas características principais: a de constituir-se como um espaço diferenciador, isto é, como uma instância que produz diferenças” (LOURO, 2000, p.27).

Quando, em meados do século XIX, com a abertura de escolas para meninas, as mulheres passaram a marcar uma presença maior do que se desejava, isso resultou em apelos para contê-las e discipliná-las. A autora aponta também outro argumento utilizado naquela época: as mulheres têm, por natureza, uma inclinação para o trato com crianças e, dessa forma, o magistério deveria ser representado como uma extensão da maternidade.

Porém, houve um objetivo político na ampliação da participação das mulheres no magistério: elas ganhavam menos e, para que se pudesse expandir o ensino a todos, era preciso que o governo gastasse menos com professores. Como os homens não aceitariam menores salários, era necessário que a mulher aceitasse o posto – não pelo salário, mas pela sua vocação natural para essa profissão. Dessa forma, se justificava o fato, por exemplo, de apenas o homem ensinar geometria (RABELO; MARTINS, 2006).

No século XX, a presença feminina no magistério intensificou-se de tal forma que, nos anos 20 e 30, compunha a maioria. O censo demográfico de 1920 apontava que 75% do professorado do ensino público primário era constituído por mulheres e que, com a extensiva oferta de vagas nos cursos primários, nos finais dos anos 1930 e meados de 1940, a presença das mulheres se estendeu aos demais níveis de ensino (VIANNA, 2001/2002). Em meados de 60, com a oferta de mais escolas e também de cursos para formação no magistério, as mulheres se fizeram cada vez mais presentes nas práticas docentes.

Nessa abordagem histórica, não gostaríamos de fugir a essa visão homogeneizante do magistério nem pretendemos dar conta da multiplicidade de sujeitos que exercem e exerceram a atividade docente no Brasil, com as suas práticas que foram e são muitas e diversificadas. A inserção das mulheres brasileiras no magistério foi um dos caminhos encontrados por elas para a entrada no mercado de trabalho, conciliando-o com as atividades domésticas. O magistério passou a ser considerado um trabalho feminino, e,

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durante algum tempo, ao homem coube o papel de gerente das escolas. Aos poucos, o homem se distanciou do magistério infantil.

Por mais que o magistério tenha passado por muitas mudanças, a desvalorização do papel de professora vem se perpetuando em nossa sociedade. Mesmo assim, a mulher foi conquistando aos poucos seu espaço na educação, quebrando barreiras culturalmente construídas.